Correia Garçao ODE Pois torna o frio Inverno, sacudindo Das estridentes asas gelo agudo, As retalhadas maos, amável Lídia, Aqueçamos ao fogo. Enquanto pelos montes, que branquejam, As cristalinas cas de anosos troncos Com os raios do sol estao brilhando Quais brilham de Marília. Da travessa Marília, os ledos olhos, A chaminé um pouco nos sentemos: Já silvando entre ondadas labaredas A seca lenha estala. Conversemos, bebamos, murmuremos: Contigo as Graças veem, comigo Amores, Que no varrido lar ao lume secam As orvalhadas penas. Os frouxos arcos bocejando largam, E, nas cruéis aljavas reclinados, Porque velam de noite, sonolentos, (Coitados!) adormecem. Ferve o cheiroso ponche, que desterra, A pesada tristeza, os vaos temores, Que deixa voar solto o pensamento Nas asas da Alegria. Reluzindo na mesa os cristais limpos, Nos pedem que bebamos, que brindemos: Ora bebamos, Lídia, deixa aos Astros O governo das Orbes. Nao queiras triste penetrar a densa, Caliginosa névoa do futuro: Nao percas um instante de teus dias: Olha que o tempo voa! Voam com ele nossas esperanças, Castelos sobre nuvens levantados! A mais pomposa cena da Fortuna D´improviso se troca! Apenas vi raiar um doce riso No angélico semblante de Marília. Dos olhos me fugiu o lindo gesto Que os olhos me levava. Qual sonhado tesouro em negra cinza, Se tornou todo o meu contentamento: Ah, Marília cruel! que te custava Trazer-me este engano? Voai, feri, Amores, essa ingrata; Fazei-a suspirar por quem lhe fuja; Prove o tormento igual a meu tormento: Em vao, em vao se queixe. Perdoa, Lídia, se blasfemo e grito, Que ponche também faz dizer verdades; É Marília formosa, mas ingrata... Creio que o tempo muda. Bocage Soneto Olha, Marília, as flautas dos pastores, Que bem que soam, como estao cadentes! Olha o Tejo a sorrir-se! Olha: nao sentes, Os Zéfiros brincar por entre as flores? Ve como ali, beijando-se, os Amores Incitam nossos ósculos ardentes! Ei-las de planta em planta as inocentes, As vagas borboletas de mil cores! Naquele arbusto o rouxinol suspira; Ora nas folhas a abelhinha pára, Ora nos ares, sussurrando, gira. Que alegre campo! Que manha tao clara! Mas ah! Tudo o que ves, se eu nao te vira, Mais tristeza que a morte me causara.