IMTRODUCÄO Ä LITERATURA 3 Aos nossos pais, Laudinel e Olinda e Frederico c Julia {in memoriam) CÄPITULO 1 - LINGUAGEM E LITERATURA ........................................ 4 Funcöes da linguagem ........................................................................... 5 Os niveis de significacäo da palavra: denotacäo e conotacäo .............. 8 Leitura ........................................................................................ 9 Pense e responda ....................................................................... 10 O que é literatura?.................................................................................. 10 Os géneros literários................................................................... 14 Estilos de época.......................................................................... 17 Figuras de linguagem (I).............................................................. 18 CAPÍTULO 2 - AS LIHGUAGENS DA LITERATURA ............................. 22 A linguagem do poema ......................................................................... 22 O verso e seus recursos musicais ............................................. 23 Leitura ........................................................................................ 26 Pense e responda ....................................................................... 26 A linguagem do texto narrativo ............................................................. 28 Exercícios ................................................................................... 29 A linguagem do teatro............................................................................ 30 O encontro das artes ................................................................. 30 Leitura ........................................................................................ 31 Pense e responda....................................................................... 33 CAPÍTULO 3 - O QUINHEMTISMO MO BRASIL.................................... 34 A colonizacáo do Brasil ......................................................................... 36 A producáo cultural do Brasil-Colönia........................................ 36 A producáo literária ............................................................................... 37 Jose cle Anchieta........................................................................ 38 Leitura........................................................................................ 39 Pense e responcla........................................................................ 40 Texto complementer .................................................................. 41 HISTORIA SOCIAL DO BARROCO ....................................... 43 CAPÍTULO 4 - BARROCO: A ARTE DA INDISCIPLINA ......................... 44 A linguagem barroca.............................................................................. 45 Leitura ........................................................................................ 45 Pense e responda....................................................................... 46 Caracteristicas da linguagem barroca ........................................ 47 Figuras de linguagem (II) ............................................................ 49 Do texto ao contexto histórico .............................................................. 50 Texto complementar ............................................................................. 52 Barroco: uma arte de mau-gosto?.............................................. 52 CAPÍTULO 5 - O BARROCO MO BRASIL ............................................. 54 Oregório de Matos: adequacäo e irreveréncia....................................... 55 A lírica........................................................................................ 56 Leitura ........................................................................................ 58 Pense e responda....................................................................... 58 A satira ....................................................................................... 59 Leitura ........................................................................................ 60 Pense e responda....................................................................... 60 Pe. Antonio Vieira: a literatura como missäo ........................................ 60 Leitura ........................................................................................ 63 Pense e responda....................................................................... 64 Em dia com o vestibulär ....................................................................... 64 _! HISTORIA SOCIAL DO ARCADISMO.................................. 67 CAPÍTULO 6 - A ARCADIA.................................................................. 68 A linguagem arcade ............................................................................... 69 Leitura ........................................................................................ 69 Pense e responda....................................................................... 70 Caracteristicas da linguagem arcade .......................................... 70 Do texto ao contexto histórico .............................................................. 73 CAPÍTULO 7 - O ARCADISMO MO BRAS1L ......................................... 76 Os arcades e a Inconfidencia ................................................................ 77 Ser árcade na colónia............................................................................ 78 Cláudio Manuel da Costa: a consdencia arcade ................................... 79 Leitura ........................................................................................ 81 Pense e responda....................................................................... 81 Tomáš Antonio Qonzaga: a renovacáo arcade ...................................... 81 A poesia lírica: Marília de Dirceu............................................... 83 Leitura ........................................................................................ 83 Pense e responda....................................................................... 84 A poesia satírica: Cartas chilenas................................................ 84 Leitura ........................................................................................ 85 Pense e responda......................................................................... 86 Antologia................................................................................................. 87 CAPÍTULO 8 - A ÉPICA ÁRCADE ........................................................ 88 Basílio da Gama: O Uraguai.................................................................... 88 Santa Rita Duráo: Caramum............................................................... 92 Leitura ........................................................................................ 93 Pense e responda....................................................................... 95 Em dia com o vestibular ....................................................................... 95 HISTORIA SOCIAL DO ROMAWTISMO ............................. 97 CAPÍTULO 9 - ROMANTISMU: A ARTE DA BURQUESIA ...................... 98 A linguagem da poesia romántica ......................................................... 101 Leitura ................................................................<.....■.......•••....... 1°1 Pense e responda....................................................................... 1°2 Ampliando o estudo do texto.................................................... 102 Caracteristicas da linguagem romäntica.................................... 103 Do texto ao contexto histórico .............................................................. 106 CAPÍTULO 1 0 - O ROMAMT1SMO HO BRASIL .................................... 110 Qoncalves Dias: um projeto de cultura brasileira ................................. 112 A épica ....................................................................................... 113 Leitura ........................................................................................ 114 Pense e responda....................................................................... 116 A lírica ........................................................................................ 117 Leitura ........................................................................................ 117 Pense e responda....................................................................... 118 Antologia................................................................................................ 119 CAPÍTULO 1 1 - O ULTKA-ROMANTISMO ............................................ 120 Álvare.s de Azevedo: a antítese personificada ....................................... 122 As faces de, Ariel e Caliban ........................................................ 122 Leitura ........................................................................................ 124 Pense e responda ....................................................................... 125 Ampliando o estudo de texto..................................................... 125 A ironia nu a terceira face de Álvares de Azevedo..................... 126 Casimiro de Abreu: a pucsia bem-comportada...................................... 127 Leitura........................................................................................ I29 Pense e responds ....................................................................... '30 Fagundes Vurela: uma poesia e,m transicáo .......................................... 131 Leitura ........................................................................................ 131 Pense e responda ....................................................................... 132 Antológia................................................................................................ 133 CAPÍTULO 1 2 - O CONDOREIRISMO ................................................. 135 Castro Alves: a linguagem da paixáo..................................................... 137 A poesia social ........................................................................... '38 'O navio negreiro'....................................................................... '38 Leitura ........................................................................................ 139 Pense e responda ....................................................................... '40 A poesia lírica............................................................................. '40 Leitura ........................................................................................ '40 Pense e responda ..................................................................... 142 Soušändrade: a comunicacäo solitária.................................................. 142 Antológia................................................................................................ 144 Em dia com o vestibular ....................................................................... 145 _I A PROSA ROMÁNTICA............................................................... 151 CAPÍTULO 1 3 - O ROMANCE ROMÁNTICO E A 1DENTÍDADE NACIONÁL................................................................ 152 A linguagem da prosa romántica........................................................... 154 A Horeninha, de Joaquim Manuel de Macedo ........................... 155 Leitura ........................................................................................ '33 Pense e responda ....................................................................... ' 37 Características da prosa romántica ............................................ 1 57 CAPÍTULO 1 4 - O ROMANCE 1ND1AN1STA ...„.................................... 159 Razóes do indianismo na literatura............................................ 159 José de Alenear e o romance indianista ............................................... 160 Jraceiria: a invencáo de uma lcnda ............................................ 161 O Quarani: o mito da povoacáo.................................................. 163 Leitura ........................................................................................ '64 Pense e responda ....................................................................... 106 Texto complementar ............................................................................. 166 O índio, o portuguěs e o necjro no romance romántico nacionál 166 CAPÍTULO 15 - O ROMANCE REQIONAL ........................................... 1 67 Os espacos nacionais ............................................................................ 168 O Sul: O gaúcho, a alma pampa................................................. 168 O Nordeste: protesto de Franklin Távora ................................... 169 O Centro-Oeste: Visconde de Taunay ........................................ 171 Leitura ........................................................................................ '72 Pense e responda....................................................................... 173 CAPÍTULO 16 - O ROMANCE URRANO .............................................. 174 Manuel Antonio de Almeida: a malaridragem em cena ......................... 175 Mernórias de, um saryento dc milícias........................................ 175 Alenear e a críticu sociál........................................................................ ' 7f> Senhora....................................................................................... 176 Leitura ........................................................................................ I77 Pense e responda ....................................................................... '79 CAPÍTULO 1 7 - A PROSA QÓTICA ..................................................... 181 Álvares de Azevedo: amor e mořte ....................................................... 183 fíoíte na taverna: o relato do absurdo ....................................... 183 Leitura ........................................................................................ 184 Pense e, responda ....................................................................... 186 Texto complementar ............................................................................. 186 O diabo é o pai do RocKÍ.......................................................... 186 Em dia rom o vestibular ....................................................................... I87 HISTÓRIA SOCIAL DO REALISMO, DO NATURALISMO E DO PARNASlAPilSMO........................... 19I CAPÍTULO I 8 - O REAL1SMO: A REALIDADE DESNUDA .................... 192 A linguagem da prosa realista ............................................................... 193 Leitura ........................................................................................ 193 Pense e responda....................................................................... 198 Características da linguagem da prosa realista .......................... 199 Do texto ao contexto historico .............................................................. 200 CAFÍTULO 1 9 - O REALISMO NO BRASIL .......................................... 203 Machado de Assis: a linguagem pensante............................................. 204 Memoriam FúsLumas de Brás Cubas: a ruptúra do romance ...... 205 Leitura........................................................................................ 205 Pense e responda ....................................................................... 206 Dom Casmurro: um olhar suspeito ............................................ 207 Leitura ........................................................................................ 208 Pense e responda ....................................................................... 209 O tlumanitismo .......................................................................... 209 Leitura ........................................................................................ 210 Pense e responda....................................................................... 21° CAPÍTULO 20 - A PROSA NATURALISTA............................................ 211 A linguagem da prosa naturalista .......................................................... 213 Leitura ........................................................................................ 213 Pense e responda....................................................................... 214 Características da linguagem naturalista.................................... 215 Aluísio Azevedo e a paisagem coletiva ................................................. 217 Leitura ........................................................................................ 218 Pense e resporída....................................................................... 219 Raul Fompéia e O Ateneu....................................................................... 219 Leitura ........................................................................................ 220 Pense e responda ....................................................................... 221 CAFÍTULO 21 - O PARNASIANISMO NO BRASIL ................................ 222 A linguagem da poesia parnasiana........................................................ 224 Leitura ........................................................................................ 224 Pense e responda....................................................................... 225 Características da linguagem parnasiana ................................... 225 Olavo Bilac: o ourives da linguagem ..................................................... 226 Leitura ........................................................................................ 227 Pense e responda....................................................................... 228 Raimundo Correia: a pesquisa da linguagem ........................................ 228 Leitura ........................................................................................ 229 Pense e responda....................................................................... 229 Antológia................................................................................................ 230 Em dia com o vestibulär ....................................................................... 231 HISTÓRIA SOCIAL DO SIMBOLISMO................................ 235 CAPÍTULO 22 - SIMBOLISMO: A LINGUAGEM DA MÚSICA ................ 236 A linguagem da poesia simbolista ......................................................... 237 Leitura ........................................................................................ 238 Pense e responda ....................................................................... 239 Características da linguagem simbolista .................................... 239 Do texto ao contexto histórico .............................................................. 239 CAPÍTULO 23 - O SIMBOLISMO NO BRASIL ...................................... 241 Cruz e Sousa: o cavador do infinito ...................................................... 242 A poesia metafísica e a dor de existir........................................ 243 Leitura ........................................................................................ 244 Pense e responda....................................................................... 244 Alphonsus de Guimaraens .................................................................... 244 Leitura ........................................................................................ 245 Pense e responda ....................................................................... 246 Antológia................................................................................................ 246 CAPÍTULO 24 - O TEATRO BRASILEIRO NO SÉCULO XIX ................. 249 O teatro romäntico ................................................................................ 250 Martins Pena e a comédia de costumes..................................... 250 O teatro realista ..................................................................................... 251 Franca Junior: uma comédia exemplar ..................................... 251 Artur Azevedo: a crítica aos costumes ....................................... 251 Leitura ........................................................................................ 251 Pense e responda ....................................................................... 253 Antológia................................................................................................ 253 Em dia com o vestibular....................................................................... 256 _I HISTÓRIA SOCIAL DO MODERMSMO.............................. 261 CAPÍTULO 25 - O PRÉ-MODERNISMO ................................................ 262 Euclides da Cunha: a defesa de Canudos ............................................. 263 Canudos: miséria, fanatismo e violéncia ................................... 264 Os sertóes: denúncia da violéncia ............................................. 265 Leitura ........................................................................................ 266 Pense e responda....................................................................... 267 Lima Barreto: o crítico marginal ............................................................ 267 Triste ttm de Folicarpo Quaresma: entre o ideal e o real .......... 268 Leitura ........................................................................................ 269 Pense e responda....................................................................... 270 Monteiro Lobato: o moderno antimodernista........................................ 271 A obra......................................................................................... 271 Leitura ........................................................................................ 273 Pense e responda ....................................................................... 274 Augusto dos Anjos: o átomo e o cosmos ............................................ 274 Leitura ........................................................................................ 276 Pense e responda ....................................................................... 276 CAPÍTULO 26 - A AKTE MODERNA: LIBERDADE E ACÄO .................. 277 As vanyuardas européias ....................................................................... 278 A linguuyem modernista ........................................................................ 286 Leitura ........................................................................................ 280 Pense e responda....................................................................... 287 Caracteristicas da linguagein modernista .................................. 288 Do texto ao contexto histórico .............................................................. 290 CAFÍTULO 27 - O MODERNISMO ľlO BRAS1L .................................... 293 Antecedents da Semana de Arte Moderna .......................................... 294 A Semana de Arte Moderna ................................................................... 297 A irnportancia da Semana .......................................................... 298 Leitura ........................................................................................ 299 Pense e responda ....................................................................... 299 Do texto ao contexto histórico .............................................................. 300 A primeira fase do Modernismo ............................................................ 302 A oryia intellectual ...................................................................... 302 A Anta e o Tamanduá: a luta ideológica .................................... 304 Pau-Rrasil: a poesia da exporlacäo ............................................ 304 Verde-Amarelo e Anta: a reacäo ................................................. 304 A Antropofagia: a degluticäo cultural ......................................... 305 Leitura ........................................................................................ 306 Pense e responda....................................................................... 307 CAFÍTULO 28 - OS ANDKADES: DEMOLICÄO E CONSTRUCÁO ........ 308 Oswald de Andrade: o antropólago do Modernismo ............................. 309 A poesia ..................................................................................... 311 Leitura ........................................................................................ 312 Pense e responda ....................................................................... 312 A prosa e o teatro ...................................................................... 313 Mário de Andrade: vanguarda e tradicäo ............................................... 314 A poesia : um canto de amor a Sáo Paulo e ao pais ................. 316 A prosa: experimentalismo e crítica social ................'................ 318 Leitura ........................................................................................ 319 Pense e responda....................................................................... 322 CAPÍTULO 29 - MAMUEL BANDEIKA E ALCANTARA MACHADO ........ 323 Manuel Bandeira: o resgate lírico .......................................................... 323 Bandeira e o Modernismo .......................................................... 324 Infäncia e saudade ..................................................................... 325 Leitura ........................................................................................ 326 Pense e responda....................................................................... 328 Pasárgada: a liberdade conquistada............................................ 329 Leitura ........................................................................................ 330 Pense e responda ....................................................................... 330 Texto complementar ............................................................................. 331 Manuel Bandeira: o humilde e o sublime .................................. 331 Alcantara Machado: a voz dos ítalo-paulistas ........................................ 333 Leitura ........................................................................................ 334 Pense e responda ....................................................................... 336 Antologia................................................................................................ 336 Em dia com o vestibular ....................................................................... 338 A SEGIMDA FASE DO MODERNISMO. A PROSA ...... 343 CAPÍTULO 30 - O ROMANCE DE 30 .................................................. 344 Qraciliano Ramos: a prosa nua ............................................................. 346 Sáo Bernardo............................................................................... 348 Leitura ........................................................................................ 349 Pense e responda ....................................................................... 350 Antologia................................................................................................ 351 CAPÍTULO 31 - RACHEL DE QUEIROZ E JOSÉ LINS DO REQO ......... 352 Rachel de Queiroz e o drama da seca no Nordeste .............................. 352 Leitura ........................................................................................ 353 Pense e responda ....................................................................... 355 José Lins do Rego: realidade e ficcäo no engenho ............................... 355 ľogo morto e o ciclo da cana-de-acucar .................................... 356 Leitura ........................................................................................ 357 Fense e responda....................................................................... 359 CAPÍTULO 32 - JORQE AMADO E ÉRICO VERÍSSIMO: O REGIONAL E O URBAľiO ...................................... 360 Jorge Amado: as mil faces da Bahia ..................................................... 361 Terras do sem-fim....................................................................... 363 Leitura ........................................................................................ 363 Pense e responda....................................................................... 365 Érico Veríssimo: história e crítica na ficcäo .......................................... 365 O tempo e o vento...................................................................... 366 Leitura ........................................................................................ 366 Pense e responda....................................................................... 368 Antologia................................................................................................ 368 Em dia com o vestibular ....................................................................... 369 A SEGUNDA FASE DO MODERNISMO. A FOESIA..... 371 CAPÍTULO 33 - A POESIA DE 30 ....................................................... 372 Carlos Drummond de Andrade: urn bruxo com amor .......................... 373 A obra......................................................................................... 374 A fase gauche: consciéncia e isolamento .................................. 374 Leitura ........................................................................................ 375 Pense e responda....................................................................... 376 Ampliando o estudo do texto .................................................... 377 A fase social ou a comunicacäo viável ...................................... 378 Leitura ........................................................................................ 379 Pense e responda ....................................................................... 380 A terceira fase: o signo do näo .................................................. 380 A lase final: tempo de memoria ................................................ 382 Antológia ................................................................................................ 383 CAPÍTULO 34 - MURILO MEM DISS E JORGE DE LIMA ........................ 385 Mínilo Mendes: o franco-atirador da poesia .......................................... 386 A obra......................................................................................... 387 Leitura ........................................................................................ 388 Pense e responda ....................................................................... 389 Jorge de Lima: a consciénda mutants .................................................. 390 A obra poética ............................................................................ 390 Leitura ........................................................................................ 392 Pense e responda ....................................................................... 393 Antoloyia ................................................................................................ 393 CAPÍTULO 35 - CECÍLIA MEIRRLES E V1MÍCIUS DE MORAES ............ 395 Cecilia Meireles: o efěmero e o eterno ................................................. 396 A poesia: o neo-simbolismo ....................................................... 396 A poesia histórica: Romunceiro da lnconficiéncki....................... 398 Leitura ........................................................................................ 399 Pense, e responda ....................................................................... 399 Vim'cius de Moraes: um cantor modernista ........................................... 400 A poesia: da transcenděncia espirilual ao amor sensual........... 401 Leitura ........................................................................................ 404 Pense e responda ....................................................................... 405 Em dia corn o vestibular ....................................................................... 406 A LITERATURA COriTEMPORATíEA ................................... 409 CAPÍTULO 36 - A GERACÄO DE 45 ................................................... 410 Clarice Lispector: a escritura seivagem ................................................. 411 As movacoes .............................................................................. *1 Leitura ........................................................................................ 414 Pense e responda....................................................................... 416 A1 7 Antológia................................................................................................ ^l' CAPÍTULO 37 - QUIMARÄES ROSA: A L1MGUAGEM REIMVENTADA ... 418 A novidade da linguagem ...................................................................... 419 Regionalismo e universalismo.................................................... 421 Leitura ........................................................................................ 422 Pense e responda....................................................................... 424 Cirande sertäo: veredas ou a história de uma travessia ........................ 424 Leitura ........................................................................................ 426 Pense e responda....................................................................... 42^ CAPÍTULO 38 - JOÄO CABRAL DE MELO METO: A LIMGUAGEM-OBJETO ........................................... 427 Morte e vida severina............................................................................. 43^ Leitura ........................................................................................ 430 Pense e responda....................................................................... 432 Antológia................................................................................................ 453 CAPÍTULO 39 - TEMDÉWCIAS DA LITERATURA COMTEMPORÁNEA ... 434 Os alios 50-60 ....................................................................................... 434 O Concretismo: o poema-ícone ................................................. 435 A poesia praxis e outras concretudes ........................................ 436 Ferreira Guliar: a poética da resistěncia .................................... 437 Leitura ........................................................................................ 438 Pense e responda....................................................................... 439 Tropicalismo: chiclete com banana ........................................... 439 A literatura brasileira hoje ..................................................................... 442 444 A poesia ..................................................................................... ^ A prosa ....................................................................................... 445 Leitura ........................................................................................ 447 Pense e responda....................................................................... 448 Antológia................................................................................................ 448 CAPÍTULO 40 - O TEATRO BRAS1LEIRO MO SÉCULO XX .................. 451 Melson Rodrigues, o desbravador ......................................................... 453 Leitura ........................................................................................ 454 Pense e responda....................................................................... 4&5 Em dia com o vestibular ....................................................................... 456 L ■» O texto literário deve ser o ponto de pallida para o estu-do de um movimento literário ou de um autor. 8 Procure compreender o que caracteriza um movimento literário ou um autor, buscando definir seus temas mais co-muns, sua visáo de mundo, suas preocupacňes formais, as llgacoes com a tradigáo literária e com o contexto histórico. • Ao estudar uma sequěncia de vários autores, procure perce- ber as diferencas entre os temas e os aspectos formais presentes nas suas obras. « Ao estudar um único autor, procure observar sua relagäo com o movimento literário e suas ligacoes com a tradicäo, etc. Observe também as mar-cas pessoais de seu estilo, a sua forma particular de es-crever. e Complemente seus estudos teóricos lendo mais textos na 'Antológia' e tentando perce-ber neles o que aprendeu. s Em aulas de literatúra, procure fazer anotacôes pessoais durante a abordagem de textos. • Periodicamente, faca resu-mos teoricos sobre autores, geracoes de autores e movi-mentos, procurando carac-teriza-los e confronta-los entre si. • Complemente seus estudos com leituras de obras relati-vas ao movimento literario estudado. • Procure relacionar tudo o que ler em literatura com o mundo que nos cerca e compreender as marcas do passado no presente - na milsica, no cinema, no teatro, na teve, na literatura atual. Literatura é, antes de tudo, uma forma especial de tratar e de utilizar a linguagem. Neste capítulo, voce vai ficar conhecendo as fancies que a linguagem pode desempenhar, assim como algumas das possibilidades de significac,ao das palayras e de cria£äo artística por meio delas. Vai também tomar contato com alguns conceitos fundamentals para iniciar os estudos de literatura, como, por exemplo, o de literatura, generös literários e estilos de época. océ já notou como estamos rodeados de linguagem? Em qualqucr lugar, a qualquer momento, estamos recebendo mensagcns e informa9Ôes: do jornal, da tevé, do out-door, da fotografia, do cinema, da música, da moda, etc. Essas informacôes säo transmitidas por meio de diferentes tipos de linguagem: a jornalística, a publicitária, a cinematográfica, a musical, etc. A linguagem jornalística, por exemplo, por fazer uso da palavra, é uma linguagem verbal; já a linguagem cinematográfica, por fazer uso näo apenas de palavras, mas também de fotografia, de moda, de cenários, de músicas, da expressäo corporal, etc., é mista ou transverbal, já que faz uso da linguagem verbal e de linguagens näo-verbais. A linguagem verbal, por exigir poucos recursos - falar ou escrever , é a mais utilizada pelo ser humuno. E, dependendo da intencionalidade de quem a utili/a, pode assumir diferentes funcôes. Funcôes da linguagem. Observe esta ti ra de Dik Browne, na qual conversam os amigos Hagar e Eddie Sortudo: HAGAR _ DIK BROWNE Entre eles estä ocorrendo um ato defala. Se tomarmos apenas a situaeäo do primeiro baläo, quando Hagar estä falando, notamos nela a presenca dos seis componentes indispensäveis em qualquer ato de fala: • o emissor. Hagar aquele que diz algo a alguem. • o receptor. Eddie Sortudo - aquele com quem o emissor se comunica. • a mensagem: o texto ("Tern que existir mais na vida do que passar todas as noites aquü") - tudo o que e transmitido do emissor ao receptor. • o cödigo: a lingua portuguesa - a convencäo social que permite ao receptor compreender a mensagem. • o canal (ou contato): a lingua oral (conjunto de sons e ar) - o meio fisico que conduz a mensagem ao receptor. • o referente (ou contexto): a reflexäo existencial de Hagar - o assunto da mensagem. E importante notar que, numa conversa, o receptor rapidamente passa da condicäo de receptor para a de emissor, e vice-versa. E o caso, por exemplo, de Eddie Sortudo, que, no segundo e no tereeiro balöes, passa a ser o emissor das mensagens, enquanto Hagar torna-se o receptor. Dependendo da eiifase que se deseja dar a cada um desses componentes da comunicaeäo, a linguagem pode assumir diferenles funcöes. Por isso, assim como säo scis os componentes do ato de fala, säo tambem seis as funeöes da linguagem. 1. Fmtfäo emotiva (ou expressiva): ocorre quando o emissor e posto em destaque. Leia estes versos de Vinicius de Moraes: Louco amor meu, que quando loca, Pere E quando fere vibra, mas proforc Ferir a fenecer - e vive a esmo Observe que a mensagem estä centrada na expressäo dos sentimentos do eu que fala no poema, isto e, do eu lirico. E um texto pessoal, subjetivo. Alem disso, o destaque do emissor e reforcado pela presenca de verbos e pronomes em lfpessoa. Pontos de exelamaeäo e interjeicöes säo comuns nesse tipo de funcäo. Os textos liricos, que expressam o estado de alma do emissor, exemplificam a funcäo emotiva da linguagem. 2. Fmtfäo apelativa (ou conativa): ocorre quando o receptor e posto em destaque. Leia o an.iin.cio de öculos, a seguir, veiculado na imprensa ä epoca do impeachment do presidente Collor. Observe que a linguagem se organiza no sentido de convencer o receptor, mediante estŕmulos, a comprar ócu-los. Esses estímulos säo feitos tanto por tneio do apelo direto ao receptor ("Näo feche os olhos...", "essa armacäo", "Voce compra...") quan-to por meio do apelo ideológico. A imagem do rapaz "cara-pintada" sugere que o brasileiro de hoje, seja jovem, seja adulto, näo deve "fechar os olhos" diante de qualquer "ar-macäo", isto é, deve ser consciente de seus direitos, reivindicar, näo ser enganado, aproveitar as boas opor-tunidades. E comum, na funcäo apelativa da linguagem, o emprego de verbos no imperativo e verbos e pronomes na 2ľ ou na 3f pessoas (neste caso, em concordäncia com o pronome de tratamento voce). Os textos de publicidade e propaganda säo o melhor exemplo da funcäo apelativa da linguagem. V0C£ COMPRA QS OCULOS E GANHA AS LENTES DE GRACA COSMOS E A HARMONIA DOS MUNDOS Cosmos, a série de TV de 1980 produzida e narrada pelo aströnomo Carl Sagan, sai, finalmente em video no Brasil. Em Janeiro chega ás locadoras o episódio A Harmonia dos mundos, onde Sagan conta a história do "ultimo astrólogo científico e primeiro aströnomo moderno", o alemäo Johannes Kepler (1571-1630). Kepler descobriu que a Terra e os planetas do sistema solar movimentam-se ao redor do Sol em órbitas elípticas (abaixo) e náo circulares. Telefone da Europa-Carafc (011) 579 6522 FutifSo referenda!: ocorre quando o referente é posto em destaque. Leia o texto ao lado. Observe que o objetivo do emissor č simplesmente o de informal- o seu receptor, com o maximo de clareza, sobre o lancamento cm video da série Cosmos. A énfase é dada ao conteúdo, ás informaeóes veiculadas pela mensagem. Os textos cuja linguagem tem funcao referencial sao dota-dos de objetividade, uma vez que visam traduzir ou relra-tar a realidade. Os textos jornalísticos e científícos sao o melhor exemplo da funfáo referencial da linguagem. (Extraido de Supennteressante, janelro/95.) Funf&o metalingíiístiea: ocorre quando o código é posto em destaque. Leia este texto do lingiiista Ferdinand de Saussure: • A lingua é um sislema de signos que exprimem idéias, eré comparável, por isso, á eserita, ao alfabeto dos surdos-mudos, aos ritos simbóHcos, ás formas de polidez, aos sinais militates, etc., etc. Elaé apenas o principal desses sislemas. Observe que o lingtiista, ao conceituar lingua, fez uso da propria lingua; ou seja, usou o codigo lingiiistico para transmitir aos seus receptores suas reflexoes sobre o proprio codigo lingiiistico. Dizemos tambem que ha metalinguagem ou funcao metalingtiistica da linguagem em, por exemplo, um poema que reflcte a cria9ao poetica; um filme que tematiza o proprio cinema; um programa de televisao que debate o papel social da televisao; etc. O melhor exemplo da funcao metalingiiistica da linguagem sao as aulas de linguas, os livros de gramatica e os dicionarios. 5. Funfdo fdtica: ocorre quando o canal e posto em destaque. Leia estes quadrinhos: 1AMSÍM &Č01 MAS w4"o AM (Angeli. Chiclete com Banana, p. 9.) Observe que, no primeiro quadro da tira acima, nao houve, na verdade, a intencao de transmitir alguma informacao nova. O interesse do emissor, ao emitir a mensagem, foi apenas o de testar o canal, o que tern o mesmo valor de um aceno com a mao, com a cabeca ou com os olhos. Exemplos tipicos de funcao fatica da linguagem: as primeiras palavras de quern atendc ao telefone ("Aid!", "Pronto!"), os cumprimentos diarios ("Oi", "Tudo bem?", "Boa tarde"), as conversas de elevador ou as piniK ras palavras de uma aula ("Sentem-se", "Vamos comecar?", /j.-*Rropto?", "Atencao, gente"). ji , , . . , "'(>. ftiitftto poetica: ocorre quando a propria mensagem e posta em destaque. ' 'Lliin estes versos do poeta Jorge de Lima: ay **iŮ ttelegado proibhi bombas, fogn ft iChamalotes checoslavos enchem o- chäo, i'";íi --..i de chamas rübias; í •' t Chagas de enxofre chmesas, \i ' chiam, , ', cfypram, cheiram, \ nulna efruva de eliispas, chispas de todos os tons, :< ;gj||tas de fodas as cores jí : "• ř . ' c no fim t ô'1'* V , sempře uafiií */-•'-■£ ' Tchi - bum! ■ .ť Observe que a preocupacäo do poeta, mais do que informar o receptor sobre os fogos de artificio, é chamar a aten9äo para o modo corao foi organizada a mensagcm. Ao sclccionar as palavras que compoem o texto, o poeta escolheu as que, por meio da sonoridade, sugerem a queima dos fogos de artificio. Essas preocupacôes de ordem literária reveladas pela construcäo da linguagem evidenciám a funcäo poética, que ocorre principalmente em textos literários, tanto em prosa como em verso. Quando voce ouvc as musicas do seu conjunto musical preferido, costuma prestar atenijäo nas letras? Saber interpretar um tcxto poético é saber lida r com os níveis de significacäo de suas palavras, isto é, com a sua conotasäo. O texto que segue, por exemplo, é a letra de uma música gravada pelo grupo Engenheiros do Havaí. Vocé é capaz de compreender a critica sugerida por esta letra, por meio de conota?ôes? (Se possível, ou9a a melódia cnquanto lé.) Os niveis de, significacao da palavra: cl^notagao e conotagao Observe o cartum a seguir. Voce deve ter percebido que a personagem nao ficou salisfeita com o resultado do seu pedido: pretendia que o genio lhe desse condic;oes para viver plenamente feliz, sem nenhum problema, tendo usado a expressao mar de rosas no scntido conotativo. , ,, Mas o genio interpretou literal-mente o pedido, ou seja, enten-deu a expressao no sentido denotative Quando empregamos as palavras em seu sentido comum, do dicionario, estamos no nivel da detwtapao. Quando as usamos em sentido figurado, diferente daquc-le que lhe e proprio, estamos no nivel da conotapao. A conotacao, juntamente com a funcao poctica da lingua-gem, c bastante ulilizada nos Lextos literarios. Com ela, as palavras ganham novos signifi-cados, sentidos figurados, criam imagens, emococs. As diferencas fundamental-entre denotaijao e conotacao podem ser assim sintetizadas: t 'f Palavra com significacäo restrita .;s Palavra com significajäo ampla ľniavra na sentido comum do Palavra cujos sentidos extrapolam • dicionário o sentido uomuni Palavra utilizada de modo objetivo Palavra utilizada de modo artístico 1 intuujKni e\;f.ii .■ pivcisu Linguagem rica e expressíva Somos quem podemos ser Um dia me disseram que as nuvens näo éram de algodäo s Um dia me disseram que os ventos ás vezes erram a direcjío V \.\E tudo ficou täo claro, um intervalu na escurídäo I '|Uma estrela de brilho raro, um disparo pára o oora^äo q • . . • >)A vida imita o video, garotos inventam um novo ingles (Vivendo num pais sedento, um momenta de embriaguez , , >, Somos quem podemos ser ■ Sonhos que podemos ter - . |)Um dia me disseram quem eram os donos da situacäo f vs. ejSeiTi querer eles me deram as chaves que abrem cssa prisäo é fr-i\:. , E tudo ficou täo claro '»'*'' r,*jo que era caro ficou comum f Como um dia depois do outro <= pComo um dia um dia comum Slzili mm A vida imita o video, garotos inventam um novo ingles ;»!Vivendo num pais sedento, um momento de embriaguez ftjSomos quern podemos ser •»«Sonhos que podemos ter allra dia me disseram que as nuvens näo eram de algodäo «Sem querer eles me deram as chaves que abrem essa prisäo ilQuem ocupa o trono tern culpa jQuem oculta o crime tambem (.mem duvida da vida tern culpa í : : Quem evita a dúvida também tem :¥ tinha uma pedra no meio do caminho :% „,i! tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra m Nunca me esquecerei deste acontecimcnto tk na vida de minhas retinas tao fatigadas m Nunca mc esquecerei que no meio do caminho; 11 •> tinha uma pedra J -tf^--^* • tinha uma pedra no meio do caminho "> "ZJU-.. * no meio do caminlio tinha uma pedra. ' (Em ReunlHo. Rio de Janeiro, J. Olympio, 19B0. p. 12v) WW* í llustrasôo: Mauríclp Negro O poema de Drummond, se lido em seu sentido puramente denotativo, perderia muito de seu significado. E e a palavra pedra, empregada conotativamente, a responsavel pela significa§ao geral do texto. Pedra, pela sua natureza dura e intransponivel, sugere no contexto uma situacao problematica vivida pelo cu lirico. Seria um problema emocional, economico, politico, existencial? Seria a propria dificuldade de escrever, de encontrar as palavras exatas? Note tambem como as palavras pedra c caminho se alternam dentro dos versos, de modo que scmpre uma esteja isolada pela outra, sugerindo pela propria construcao a ideia de obstaculo, de impedimento. Portanto, no poema de Drummond, nota-se a presenca de dois procedimentos ja estudados acerca da linguagem literaria: a multiplicidade de sentidos das palavras (a conotacjio) e a preocupacao com o modo como elas sao organizadas no texto (funfao poetica da linguagem). Literatura e sociedade iiiitupsiuugriifiii Como todo tipo de arte, a literatura está vinculada á sociedade em que se origitia. Näo há artistas "indiferentes" á realidade, pois, de alguma forma, todos participant dos problemas vividos pcla sociedade, apesar das diferencas de intercsscs c de classe social. Partindo das experiéncias pessoais e sociais que vive, o artista transcria, on recria, a realidade, dando origem a uma supra-realidade ou a uma realidade fictional. Por meio dessa supra-rcalidadc, o artista consegue transmitir seus sentimentos e idcias ao mundo real, de onde tudo se origina. A reacäo do publico em face, da obra também pode modificar as atitudes futuras do artista. Por vezeš, a literatura assume formas de denúncia social, de crítica á realidade circundante. Dizemos entäo que sc trata de uma literatura engajada, que serve a uma causa político-ideológica ou a uma luta social. Observe como Drummond capta o clima de medo que existiu durante a Segtmda Guerra Mundial: Congresso internacionál do modo Provisoriamenle níio cantaremos o amor que se reŕugtou mais abaixo dos: subtemmeos Cantaremos o medo, que esteriliza os abracos, näo cantaremos o ódio porque esse-näo exíste, existe apenas o medo, nossopai e nosso companheiro, [...] Assim, a obra literária é um objeto vivo, rcsultado das relacocs dinámicas entre eseritor, público e sociedade. E, assim como a obra de a rte nasce vinculada a čerta realidade, ela também pode interferir nessa mesma realidade, auxiliando no processo de transformaclo sociál. Literatura e iinaginacäo Como transcriacäo da realidade, a literatura nao precisa necessariamente estar presa a ela. Tanto o eseritor quanto o ' leilor fazem uso de sua imaginacäo: o artista recria livremente a realidade, assim como o leitor recria livremente o texto * literário que lě. Modernamente, os eseritores e os críticos literários těm insistido bastante na abertura da obra literária, isto é, nas várias possibilidades de leitura que um mesmo texto literário pode oferccer. O leitor, em vez de ser considerado como passivo, alguém que simplesmente recebe o texlo, tem sido visto como participante, porque também usa sua imaginacäo para ler o texto e, dessa forma, reeria-o. O poeta portugués Fernando Pessoa já havia tratado disso neste poema do • comeco do século XX: " ' 0 poeta é um fingidor Finge, täo cotnpletamente: Qnc'ctiega a íingir que é dor A dor que deveras sente E os que léem o que esereve, Na dor lida sentem bem, Näo as duas que ele teve, Mas só a que eles näo těm. E assim nas calhas de roda Gira a entreter a razäo Este comboio dc corda Que se cháma o coraeäo, (Em Obra poétlca. Rio de Janeiro, Aguilar, 1969. p. 164-5.) Literatura e prazer Para os gregos, a arte tinha Lima funpao hedomstica, isto e, devia causar prazer, retratando o belo. E, para eles, o belo na arte ocorria na mcdida em que a obra era verossimil, ou seja, semelhantc a vcrdade ou a natureza. Modernamente, esses conceitos desapareceram, mas a arte ainda cumpre o papel de proporcionar prazer. A literatura, jogando com palavras, ritinos, sons e imagens c conduzindo o leitor a mundos imaginarios, causa prazer aos sentidos e a sensibilidade do hornem. Observe a repeticao dos sons /r/, /p/ e /b/ e as imagens destes versos do 'Soneto de separacao', dc Vinicius de Monies, e perceba como esses efeitos causam prazer a nossa sensibilidade: De repente do riso fcz-sc o pranto Silencioso e bianco como a bruma H das bocas unidas fez-se a espuma E das maos espalmadas fez-se o espanto. Literatura e história literária lluslracéo; Léa de Camargo Nevos Estudar literatura c, basicamente, ampliar nossas habilidades de leitura do texto literário. No 2- grau, esse estudo é aerescido da história literária, que objetiva acompanhar a evolujäo cronológica da literatura de determinado povo e cultura, observando suas transformacôes de acordo com o momento histórico. Por isso, a história da literatura organiza-a em movimentos, períodos e geracôes, a fim de fazer um estudo mais pormenorizado dela. deveras: realmente. calhas: trilhos. comlioio: conjunto de veieulos; no conlexU), brinqiicdo de corda. Os generös uceranos Todo texto literário apresenta dois pianos essenciais: o piano da forma e o do conteúdo. No primeiro, temos os aspcctos que envolvem a construcao do texto, ou seja, o vocabulárió, a sintaxe, a sonoridade, as imagens, a disposicäo das palavras no papel; no segundo, temos as idéias. Portanto, enquanto a forma envolve os aspectos lingiiísticos e gráficos do texto, o conteúdo envolve os significados do texto e suas relates com o mundo. Apesar dessa divisäo, ambos os pianos atuam juntos no texto literário, e uma alteracäo num dos pianos implies alteracäo no outro. De acordo com a forma que os textos podem assumir, eles costumam ser organizados em dois grandes grupos: os textos em verso e os textos em prosa. Alem dessa divisäo, ha outras classificacöes que procuram organizar e hierarquizar os textos literários. A mais antiga delas, e que ainda hoje é considerada, baseia-sc na obra Arte poetka, de Aristoteles. De acordo com cssa coneepfäo clássica, há trés géneros literários: lírico, épico e dramático. Género lírico E certo lipo de texto no qual um eu lírico (a voz que fala no poema, que nem sempře corresponde á do autor) exprime suas emocöes, idéias e impressöes em face do mundo exterior. Normalmcntc os pronomes e os verbos estäo cm lfpessoa e há o predoinínio da funcäo emotiva da linguagem. Observe o lirismo destes versos de Manuel Bandeira e de Adriana Calcanhoto: Ardo em desejo na tarde que arde! Oh, oomo é belo dentro de mim Teu corpo de ouro no flm da tarde: Teu corpo quo arde dentro de mim Que ardo contigo no fim da tarde (Manuel Bandeira) Nada ficou no lugar Eu quere quebrar essas xicaras En voll enganar o diabo,': Eu quero acordar sua família Eu vou escrever no scu muro -E violentar o seu gosto (Adriana Calcanhoto) Atualmente também se fala de lirismo no cinema, na fotografia, na pintura, na melódia de urna música, etc. Quase sempře o sentido dado á palavra, nesses casos, está relacionado á emocäo e á subjetividade. Um e/ern|ilu íle hraniu na arte fotografica. Género épico Nesse género há a presence de um narrador que fundamentalmente conta a história passada de terceiros. Isso implica certo distanciamento entre o narrador e o assunto tratado, coisa que näo ocorre no género lírico. Os verbos e os pronomes quase sempre estäo na 3" pessoa, porque se trata "dele" ou "deles". Além disso, os t.extos épicos pressupôem a presenca de um ouvinte ou de urna platéia, que estariam eseutando o narrador. Os textos épicos säo geralmcnte longos e narram histórias de um povo ou urna nacäo, envolvendo aventuras, guerras, viagens, gestos heróicos, etc. Normalmente apresenlam um tom de exaltacäo, isto é, de valorizacäo de seus heróis e seus feitos. Os poemas épicos intitulam-se epopéias {epos = verso + poieô = faco). As principals epopeias da cultura ocidental säo: Iiiada e Odisséia, de Homero; Eneida, de Virgüio; Os lustadas, de Luis de Camöes; Paraiso perdido, de Milton; e Orlando Furioso, de Ludovico Ariosto. No Brasil, foram feitos vários poemas épicos, principalmcnte seguindo o modelo de Camoes. Os mais importantes säo Caramuru, de Santa Rita Duräo, e O Uraguai, de Basüio da Gama. Modernamente, também se chama de épicos a certos filmes cujo tema säo aventuras e guerras que definem a história de um povo. Säo tidos como épicos, por exemplo, filmes como 1900, de Bernardo Bertolucci, e Ram, de Akira Kurosawa. Género dramático Trata-se do texto eserito para ser encenado no teatro. Nesse tipo dc texto, nao há um narrador contando a história. Ela "acontece" no palco, ou seja, é representada por atores, que assumem os papéis das personagens. Todo o texto se desenrola a partir de diálogos, obrigando a uma sequéncia rigorosa das cenas e de suas relacoes de causa e conseqůěncia. Observe, como exemplo, este fragmento da peca Gota ďágua, de Chico Buarque de Holanda, cm que Joana e Jasao, os protagonistas, brigám porque ele arran-jou outra mullier. Observe que o texto foi eserito em versos, pois seu autor tenta realcar o trabalho com o texto, como era feito anligamente no teatro. Perceba também como o enredo se constrói a partir do diálogo entre as personagens. JOANA Cé gosta da filha do Creonte, Jasäo? JASÄO Näo quero falar nisso agora... JOANA Gosta näo. Tá só perturbado, né? Responde pra mim... JASÄO Tava falando, deixa eu continuar, sim? JOANA Responde duma vez, hoffiem, toma coragem. Voce gosta mesmo da raor^a?... JASÄO (gritando) Mulher, páru, deixa eu falar... (tempo) Vocé sabe... cu näo tenho [cára pra ohnlar voces pra corner... É sacauagem quceu näo von fazer. Mas liimhérn veja o men lado Cedo ou tarde a gente ia ter que separar Quando eu te conheci, tava pra completar viňte anos, näo for? Eu nem tinha completado Vocé tinha trinta e quatro mas era bem conservada, a carroceria, bommolejo e a batéria carregada de desejo Entäo näo queria saber de idade, a nem quero saber, porque pra mim quem gosta gosta e o amor näo vé" dociimentó nem certidäo Só que dez anos se pässaram desdc entäo [...] Alem da concepcäo clássica dos generös literários, há também a conceppäo moderna, que leva em consideraeäo outras modalidades de texto, que näo existiam no tempo de Aristoteles. Todas elas se filiam á modalidade narrativo e, por isso, säo generös que apresentam parentcsco com os poemas épicos. Estes, a partir do século XIX, comccaram a desaparecer, dando lugar a um genero novo, de grande aeeitaeäo junto ao publico burgués: o romance. Contudo, já desde a Idade Média vinham se formando outros tipos de texto narrativo, mais curtos, como a novela e o conto. Além desses, no Brasil vem sc firmando cada vcz mais um género narrativo poueo conhecido no exterior, a crônica, que já encontrou grandes expressôes em nossa literatura, como Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga e Luis Fernando Veríssimo. A distincäo entrc esses gčneros narrativos modernos é controverli-da, mesmo porque uma das tendéncias da literatura contemporänea é inisturar os generös e relativizá-los. Com ľreqiiéncia, deparamos com i textos que näo apresentam a seqiiěncia narrativa traditional de "comeco, meio c fim", ou com textos que usam, na prosa, recursos da pocsia. Voce aprofundará seu conhecimento sobre os gencros literários, tradicionais e modernos, á mcdida que eles forem aparecendo no estudo da literatura brasileira. Lstüos de epoca O hörnern muda através dos tempos e, com ele, mudam também as formas de expressäo artistka. Observe a diferenca de assunto e de linguagem destes dois textos: =£;--.. , ?" «Ä " k ° Quinlieiilismo Sciscciitism» ou l!.iri-,u Sctcccntkmn ■ : Oll ! Arcadismo 1500 ll.HI 176S MARCOS 1 Pero Vaz de Caminlia escreve a Carta Publieacäo de Frosofoímu de Bento Tcixeira Publ.caclo de Olmts, de Claudio Manuel da Costa SAUTORES ♦ Pero Vaz de Caminlia * Pero M, Gándavo • Gabriel Soaresde Sousa s José de Anchieta * Gregóriu de M a los • Pe. Antonio Vieira Claudio Manuel da Costa Tomiis Antonio Gonzaga - Silva Alvarenga ■ Alvarenga Pciioto Santa RitaDuräo Basilio da Gama PRINCIPAI! Realismu Romantismu Naturalismo Parnasiiinisnio 18.16 IHS1 Publieacäo de Smpiros Publieacäo de Memoria! poétkos e saudades, de fôstmmsne llrás Cubai, de Goncalves deMagalhäes Madiado de Assis, e de 0 Xiiilalo, de Aluisio Aze- vedo ♦• Goncalves Dias ■■ Machado de Assis • Alvares de Azevedo ■> M'lisil • Casimire de Abreu Aaiu-üo • Junqueira Freite Raul Pompčia • Fagundes Varela Oldvo üilac i Castro Alves R.iimundo Correia ■■> Jose de Atberlo de OJivcini Abwar -/ Manuel Antonio de Almeida • Joaquim Manuel de : Macedo • Visconde de Taunay • Bernardo Guimaräes ■*. Franklin Távora Mnrcninha Moreninlia, Moreninha Tu és do campo a rainha Tu és senhora de mim; Tu matas todos d'amores Faceira, vendendo as flores Que colhes no teil jardim. (Casimiro de Abreu) Cola zero Stop. A vida parou h ou foi o automóvel? (Carlos Drummond de Andrade) O primeiro texto pertence ao Romantismo, do século XIX, e ilustra a grande preocupayäo com os sentimentos do hörnern da época; a linguagem mostra-se musical e ritmada. Já o segundo texto é de um poeta moderno, que viveu a época das máquinas e da aulomatizaeäo. E natural que sua linguagem, para expressar a tecnologia da vida moderna, seja mais sucinta, econômica, como é a linguagem de tränsito. Em cada periodo da literatura, chamado de estilo de época ou movimento literário ou estética literária, existeni obras e autores que apresentam certas afinidades entre si. Isto é, pode haver semelhancas entre suas obras quanto á linguagem, aos temas, á forma de ver e sentir o mundo. Säo cssas afinidades que fazem um movimento literário ser diferente de outro. Sim ilí-iii■ ■ 1893 Publieacäo das ohms Mivai e llrarjučis, de Cruz e Sousa '» Cruz c Sousa " Alphonsiis de Guimarucní. b Pedro Kiikcrry 1 ľií-Mmleim'srno 1902 Piihlieacäo de Os ser/y;'.*, de Ľuclidcs da Cuniia • Fuclides dn Cuniia Grata Aranlia • Lima Barreto ľ- Monteiro I ohaio • Augusto dos Amos Modtmismo Scmana de Arte Moderna ■ Oswald de Andrade ■ Mário de Andrade Miineeí liaiidcira Alcantara MnĽhado Oraciliano Ramos ■ Jose Lins do Rcgo i Rachel de Qiieiroz > Jorge Amado i Éríco ■. Veríssimo Carlos Drummond de Andrade Murilo Mendes ■ Jorge de Lima ' Vinicins de Monies . Cecília Mcirelcs IW4 Publieacäo de terto da ra-wfilo seivagem, de Clarice Lispcclor Ciarice Lispcclor Guimaräes Rosa Joäo Cabrat de Melo Neto Concrelismo poeua praxis h5s 1 ancuinenlo da revisla Augusto de Campus Ilaroldo de Campus Décio Pienatari Ferreira Gull.ir Mas, ao falar de escritores e seus respectivos movimentos literários, näo podemos ser rígidos. Devemos tomar cuidado porque o escritor, quando escreve, nem sempře cstá preocupado em pertencer a este ou áquele movimento. Alem disso, entre uma époua e outra da literatura, é comum haver uma fase de transicäo, em que o velho e o novo se misturam. Machado de Assis, por exemplo, que durante certo tempo foi um escritor romántico, rompeu com o Romantismo, dando origem ao Realismo em nossa literatura. As vezeš há determinados escritores que näo se ligám á tendencia literária vigente em sua época. Mas a originalidade de sua obra é täo grande, que chega a despertar, em autores de outras épocas, interesse pelo mcsmo projeto. Esses escritores, de épocas diferentes mas com projetos artisticos comuns, näo pertencem ao mesmo movimento. Mas perseguem a mesma tradipao literária. Por exemplo, há escritores filiados á tradicäo gótica no Romantismo, no Simbolismo e na atualidade. Ocorrem também situacôes de um autor estar muito á frente de seu tempo, o que traz problcmas de reconhecimento ao artista. É o caso, por exemplo, do poeta Joaquim de Sousa Andrade, ou Sousändrade, como ele é mais conhecido. Viveu na époea do Romantismo, mas sua obra já prenunciava aquilo que aconteceria cinqíienta anos depois na literatura, ou seja, o Modernismo. Só a partir da década de 70 do século XX, ele foi definitivamente reconhecido. Apresentamos, nas duas páginas anteriores, o esquema da periodizaeäo da literatura brasileira e seus marcos significativos, para que vocě tenha uma visäo da sequéncia histórica dos movimentos literários. Figuras de linguagem (I) Os escritores utilizam diversos recursos para fazer literatura. As figuras de linguagem, por exemplo, säo recursos empregados com muita freqůéncia. Por isso, antes de iniciar o esludo da história literária cm lingua portuguesa, convém reve r algumas figuras indispensáveis. Outras seräo vistas mais á frente, conforme a necessidade e o assunto dos capítulos. Comparacäo Consiste em aproximar dois seres pela sua semelhanca, de modo que as características de um sejam atribuídas ao outro. Na comparacäo sempře há um elemento comparativo expresso: como, tal qua!, semeíhante a, que nem, etc. Observe a comparacäo entre prunto e bruma, ncstcs versos de Viníci us de Moracs: De repente do riso fez-sc o praniu Silencióso e branco como a bruma. Metafora É uma espécie de comparacáo implícita entre dois seres, já que o elemento comparativo íica subentendido. Por exemplo, se modificássemos o verso de Vinícius de Moraes para o pronto é uma bruma, tcríamos uma metafora. Observe que se diz que A (pranto) é B (bruma), em virtude de čerta semelhanca entre os dois elementos (a cor branca e o siléncio). Veja estas outras metáforas: = O samba 6 pai do prazor () sainlw 6 filhu dd - kW KM > ILUSTRAGAO: FRANCISCO JOSE DA COSTA A emocao desses momen-tos talvcz possa ser compara-da ao espanto e ao éxtase vividos pelos espanhóis, ao descobrirem a America, e pelos Portugueses, ao chega-rem ao Brasil, cm 1500. Voce já imaginou? O contato com os nativos nus, a lingua e os costumes estra-nhos, as bclezas naturais, os animais, as plantas e os frutos exóticos, os misteři os da terra descoberta, a possibilidade de descobrir riquezas - tudo isso encantou e espantou os pri-meiros europeus que por aqui estiveram. Vamos conhecer um pouco dos escritos que registrum esses primeiros con-tatos. \ ■ \ 0 % 1 \* . "Nan cronicas, nem memórias, pois nao resultavara ie nenhuma ljitencjio literária: os escritos dos cronistas eviajantes eram uma _tentativa de descrever e eatalogar a terra e o povo recem-descpbertos, Ěntrctanto, permeava-os a fantasia de seus autores, exploradores europeus que filtravam fatos e dados, acrescentando-lhes jlementos mágicos e caracteristicas muitas vezeš fantásticas." Carlos Vogt e José Augusto G. Lemos* I.".líLbríl de 1961. "A Terra é azul!". Esta frase, do astronauta russo Yúri Gagárin, soou como uma revelacao. Jamais haviamos imaginado morar num planeta azul. O azul, de alguma forma, nos dava nossa identidade: terráqueos. Julho de 1969. O astronauta americano Armstrong prcpara-se para pisar o solo lunar. Milhoes de pessoas o acompanham pela tevé. Antes de pór o pé na lua, ele diz uma frasc historical "Um pequeno passo para o homem e um gigantcsco salto para a humanidade". E, antes de voltar para o planeta azul, deixou no solo lunar esta inscricáo: "Viemos em paz em nome de toda a humanidade". "Toda a humanidade", escreveu elc, esquecendo a velha competicao entre russos e americanos. Era, na verdade, um momento de uniao das forcas humanas para superar os limites do mundo conhecido. Nesto capítulo, estudare-mos os primeiros contatos cio RolnnÍ7arlnr portugués com os puvos ir.dígunas do Brasil. P.-irri □btci mas informacöes sobio o asscnto. sugerimos: aos filmes Como era gostaso o meu francos-, 1492, a conquista do paraísa; Cristóvaa Colombo e Danqa com iabos; rompare a visäo sobre o índio apresentada nesses filmes com aquela presente nos filmes que tratam do trabalho da cavalaria no Oeste americano. sobre as relapóes da literatura do século XVI com o movimento Pau-Brasil, de Oswald de Andrado, e com o Tropicalismo (século XX). a música 'Tropicália', de Caetano Veloso, que se encontra no disco Tropicália ou Panis et circensis (1968), prestando atencáo na parte iniciál, falada. * Em Cronistas e viajantes. Säo Paulo, Abril Educa^äo, 1982. 4" capa. Literatura Comentada. O primeiro texto escrito no Brasil, em 1500, a conhecida Carta, de Pero Vaz de Caminha - o escrivao-moř da esquadra liderada por Cabral -, rccistra com detalhes essas impressöes do dcscobrimcnto da terra brasilcira, i;i..s será coiönia portuguesa por mais de trés séculos: A t'eifäo delcs c serem Bardos, quase avermelhados, de rostos reguläres e narizes bem feitos; andam ttus sem nenhuma cobertura; nem se importam de ccori" ni'iil'.ur.i.i roisa, nem de mostrar suas vergonhas. E sobre isto säo täo inocentes, como em mostrar 6 rosto. A Carta de Caminha abre um periodo de trés séculos, chamado dc Era Colonial, no qual nossa literatura busca uma identidade propria, oscilando sempře entre os modelos culturais Portugueses e o interesse pela vida ďa propria coloníá. ~ - Ä ccílooizagäo do Brasil A produgäo literárla Os trés séculos de colonizafäo vividos pelo Brasil (1500-1822) podem ser divididos em trés momentos significativos: • o século XVI: em que a metropole proeurou garantir o domínio sobre a terra descoberta, organizando-a em capitanias hereditárias e enviando jesuítas da Europa e negros da Africa para povoá-la; m o século XVII: em que Salvador, na Bahra, povoada de aventureiros Portugueses, índios, negros c mulatos, tornou-se o centro das decisôes políticas e do comércio de acúcar. • o século XVIII: em que a regiäo de Mínas Gerais transformou-se no centro da exploracäo do ouro e das primeiras revoltas políticas contra a colonizacäo portuguesa, entre as quais sc destacou o movimento da Inconfidéncia Mineira (1789). A producáo cultural do Brasil-Colonia _É dificil precisar o momento exato em que surgiu uma literatura brasiíeira, de fato, porque a vida cultural no periodo colonial estava diretamente ligada á cultura portuguesa. Álém disso, nao estavam *soTid1Eč¥das "áš condÍ9oes necessáriaspara a literatura florescer e se expandir, tais como existéncia de um publico leitor ativo e influente, grupo de escritores atuantes, vida cultural rica e abundante, sentimcnto de nacionalidade, imprensa, gráficas e liberdade de expressáo, e até mesmo a irrrpressao de livros era proibida. Por isso, alguns historiadores da literatura preferem chamar a cssa producao literária do Brasil-Colonia de "manifestacdes Jjterájriaill_jrru_ "ecos da literatura no Rrasil'1. Spmente na segunda metade do século XVIII. com a fundagao _de cidades e de ccntros comerciais ligados á extracao do ouro, em Minas Gerais, e com o surgimento jcte^escritores comprotrietidos com as causas políticas de independéncia, é que se criaram algumas das condi-9oes necessárias para a form,19,10 da literatura bray só se deu de forma efetiva no século XIX, após^jndejicndencia política de 1822 e a dinamizagao da vida cultural do pais. f { A produ9áo artística e cultural do Quirnhcritómj3jM_Brasil nao pode ser considerada brasiíeira, defatq^ísso porque quem a produzia - cronistas. viajantes. jesuítas - ejumjxortugueses que aqui se encontravam_pj3r_uni^p.erlodo- curto, c co:i: uma finalidade específica. Nao havia, ainda, nenhuma identificacao com a terra,_considerada uma espécie de "Portugal nos tró-picos",_Além disso,. os modelos literários que cultivavam - na poesia, na prosa ou no teatro - _ej;anilolalrriejite_lusitanos.- Apesar dessas condigoes, a produgáo literária do periodo abre a nós, brasileiros. um rico filao litorano, que -.oni nuiis tarde fartamentccxplorado por nossos escritoresL_o interesse pelos índios, pelas belezas naturais da terra e pelas nossas origens históricas. Oswald de _Andrade,.45ox exemplo, eseritor brasileiro do século XX, críou um movimento de poesia intitulado Poesia Pau-Brasil, em boa parte_mšjňrado_ nesse_Brasil cabralino deserito pelos cronistas e viajantes do século XVI. Veja este poema, que reproduz um fragmento extraído diretamente da Carta de Caminha, em que sáo deseritas as índias: iliri.nuwíti) dp ítf.ďŕ^ éuiclo-lltu ľ iqrn as meninas da gare Eram trés ou quatro mocas bem mocas e bem gentis Comcabelos muipretos pelas espáduas E suas vergonhas táo altas e täo saradinhas Que de nós as muito bem olhannos Näo tínhamos nenhuma vergonha No Brasil-Colonia do século XVI, as principals produgoes säo . cróiiicas de viagens, cartas e tratados. chamados de literaturu tle iiifarmafjiw. eseritos em prosa, cuja finalidade era narrár c "Jěšorever" as viagens e os primeiros contatos com a terra brasiíeira c scus nativos, intbrmando tudo o que pudesse interessarjios^gOTejnaiUe^p^uguescA Dessa literatura informativa sobre o Brasil merecem destaque: .»- aCarta, de Pero Vaz de Caminha; 1 - "p Ďiáfio de navegapäo, de Pero Lopes de Sousa (1530); (, -_o_Tratado da terra do Brasil e a Bistória da Provmcia de _ Santa Cruz a qtw vulggnnente chamamos Brasil, de Pero de Magalháes Gandavo (1576); \[ * - OŤráiadodesc7ÍtivoaoBimíl,áe.G^ňuBo'd^ - os Diálogos das grandezas do Brasil, de Ambrósio Fernandos Brandäo (1618); fj - as cartas dos missionários jesuítas eseritas nos dois primeiros _ séculos de catequese; 9 - &TAtóríaJoJ)raitl, de Frei Vicente do Salvador (1627); - as Duas viagens ao Brasil, de Hans Staden (1557); 6 - a Viagern á terra do Brasil, de Jean de Léry (1578). 3 \» a poeüja e o teatrof cuKivudos pelos jesuiliis, noladamenle por Jose ' deAnchicta, cuja finalidade central era a catequese dos índios. Jose de Anchieta Jose de Anchieta cliegou aq Brasil ein 1553 e, jun-tamente com o Pe. JMariuel da Nöbrega, fundou um colcgio em Piratininga, nücleo da futura cidade de Säo Paulo. Tendo em vista a catequese,Anchieta escreveu yärios tipos de texto com finalidadc pcdagögica, como jjoemas, hinpSi^cjincöes e autos (genero teatral originado na Idadc Media), alem de cartas que informavam sobre o andamento da catequese no Brasil e de mna gramatica da lingua tupi. Ao lado dessa producäo, há aquelas de interesse puramente pessoal, que satisfaziam seu espirito devoto, como sermôes e poemas em latim. O poema abaixo ilustra as preocupajöes religiosas de Anchieta e dembnstra o modclo literário medieval a que cstava filiado, com o emprego da "medida^velha", a redondilha - o que comprova a_total indiferenca do religioso diante do Renascimenlo que naquele momento ocorria na Europa. A Santa Ines Cordeirinha Jinda, como folga o povo porque yossa vinda lhe dá lutne novo! Cordeirinha santa, de lesu querida, vossa santa vinda o diabo espanta. Por isso vos canta, com prazer, ó povo, porque vossa vinda lhc dá lume novo. Nossa culpa escura fugřrá depressa, pois vossa cabeca vcm com luz täo pura. Vossa formosura honra é do povo, porque vossa vinda lhe dá lutne novo. Virginal cabeca pola fé cortada, corn vossa chegada, já ninguém pereca. Vinde mui deprcssa ajudar o povo, pois, com vossa vinda, lhe dais lume novo. V6s sois, cordeirinha, de lesii formoso,: mas o vosso esposo jä vos fez rainha. Tambem padeirinha sois de nosso povo, pois, com vossa vinda. lhc dais lume novo. {Em Eduuido Poitwla. org. Jose de Anchieta ^Poesia. Ifo do Jcr.oiro. As r, 1959. o. 28-9.) Entretanto, foi com o teatro que Anchieta cumpriu plenamente sua missäo catequctica. Para as comemoracöcs de datas religiosas; escrevia e leyava aojgüblico autos que veiculavam a fe e os mandamentos religiosos de urna forma amena e agradävel, diferentemente da pratica 4iscursiva e cansativa dos sermöes. O seu publico era constituido de indigenas, soldados, colonos, marujos e comerciantes, razäo pela qual o autor escreveu autos polilingües, para que tivessem maior alcance. Porem seu alvo central era o indio. Tendo observado o gosto do silvicola pelas festas, dancas, müsicas e representagöes, AßcWcta soube unir a essa Jsndencia natural ji_mpra|jdogmas catölicos, fazendo uso de pequenos jogos dramaticos. Assim, ao mesmo tempo que divertia a plateia, alcanfava os seus objetivos. A Carta de Pero Vaz de Caminha,_escriväo da frota de Pedrc^Álvares Cabral, eserita a el-rei D, Manuel intbrmando sobre o "achamento" do Brasil e as suas primeiras impressôes sobre a natúTezäTe os índios, constitui para a nossa história uma auténtica certidäo de nascimento. (Folhetlm Humor, S8o Paulo, n? 269,14/3/82.) Os textos que seguem säo fragmentos da Carta. Texto I Dali houvemos vista de homens que andavam pela praia, cerca de sete ou oito, segundo os navios pequenos disseram, porque chegaram primeiro. Ali lanjamos os batéis e esquifes á água e vieram logo todos os capitäes das náves a esta nau do Capitäo-mor e ali conversaram. E o Capitäo mandou no batel, a terra, Nicolau Coelho para ver aquele rio; e quando comecou a ir para lá acudiram, á praia, homens, aos dois e aos trés. Assim, quando o batel chegou á foz do rio estavam ali dezoito ou vinte homens, pardos, todos nus, sem nenhuma roupa que lhes cobrisse suas vergonhas. Traziatn arcos nas mäos e suas setas. Vinham todos rijos para o batel c Nicolau Coelho fez-lhes sinal para que deixassem os arcos e eles os pousaram. Mas näo pôde ter deies fala nem entendimento que aproveitasse porque o mar quebrava na costa. Texto U Capitäo, quando eles vieram, estava sentado em uma cadeira, com uma alcatifa aos pés, por estrado, e bem vestido com um colar de ouro muito grande ao pescoyo [...] Acendetam-se tochas e entraram; e näo fizeram nenhuma mencäo de cortesia nem de falar ao Capitäo nem a ninguém. Mas um deles viu o colar do Capitäo e comecou a acenar com a mäo para a terra e depois para o colar, como a dizer-nos que havia ouro em terra; e também viu um castical de prata c da mesma forma acenava para terra e para o castical como que havia, também, prata. Mostraram-lhe um papagaío pardo que o Capitäo aqui traz; tomaram-no logo na mäo e acenaram para terra, como que os havia ali; mostraram-lhe um carneiro e näo fizeram enso dele; mostraram-lhe uma galinha e quase tiveram medo dela e näo Ihe queriam pôr a mäo; c depois a pegaram como que espantados. Texto III De ponta a ponta é toda praia rasa, muito plana e bem formosa. Pelo sertáo, pareceu-nos do mar muito grande, porque a estendcr a vista nao podíamos ver scnao lerra e arvoredos, parecendo-uos terra muito longa. Nela, até agora, nao pudemos saber que hajá ouro nem prata, nem nenhuma coisa de metal, nem de ferro; nem as vimos. Mas, a terra em si é muito boa dc ares, tao frios e temperados, como os de Entre-Douro e Minho, porque, neste tempo de agora, assim os achávamos como os de lá. Aguas sáo muitas c infindas. De tal maneira é graciosa que, querendo aproveitá-la dár-se-á nela tudo por bem das águas que tem. Mas o melhor fruto que nela se pode fazer, me parece que será salvar esta gente; c esta deve ser a principál semeňte que Vossa Alteza nela deve lancar. (Em Cronístas e viajantes. Sao Paulo, Abril Educacáo, 1982, p. 12-23. Literatura Comentada.) AS COBRAS/iuis Fernando Verissimo <3M po ufbf (O Estarfo de S. Paulo, 22/B/93.) Viajantes e missionários: testemunhos do tempo Os primeiros escritos da nossa vida documentam pre-cisamente a instauracäo do processo: säo informacôes que viajantes e missionários europeus colheram sobre a natureza e o homem brasileiro. Enquanto informacäa, näo pertencem á categoria do literário, mas á pura crônica histórica [...], No entanto a pré-história das nossas letras interessa como reflexo da visäo do mundo e da linguagem que nos legaram os primeiros observadores do pais. É gracas a essas tomadas diretas da paisagem, do índio e dos grupos sociais nascentes, que captamos as condicôes primitivas de uma cultura que só mais tarde poderia contar com o fenômeno da palavra-arle. E näo é só como testemunhos do tempo que valem tais documentos: também como sugestôes lemáticas e formais. Em mais de um momento a inteligencia brasileira, reagindo contra certos processos agudos de europeizacäo, proeurou nas raizes da terra e do nativo imagens para se afirmar em face do estrangeiro: entäo os cronistas voltaram a ser lidos, e até glosados, tanto por um Alencar romäntico e saudosista como por um Mário ou um Oswald de Andradc modernistas. (Alfredo Bosi. História concisa da literatúra brasileira, Sáo Paulo, Cultrix, 1975. p. 16-6.) pal.nra-aiir: hli ..it.ii.i. l{losaili)iiii;ic:io, (í':,fefihi> o certo do eiľ:ulo'? O exemplo é muito simples, mas busca ilustrar o conilito vivido pelo hoinem do século XVII. '■(:■ kapitulo que :.'"i.»i;e voce vai '•oirÍJeccr os fatores históricos qui' rcdfíibiiíiaiii para a tomiacäo de uma nova mentalidade na sor-f":!"!!!' •■uropéi:; sio :ís'ch1o X^ 1! '.mia mentalidade inais espiritual e religiosa, era grande parte medieval - e verá de que forma o hoinem da época tenta conciliar esses valores com m \,iioi". i',-!?asceiul.»í.»:.. íílíida■presenle;:. ;»i conhecer também a nov n »vi\ que expriaie essa contj:tdi«:«o, o Barroco, e tomar contafi: com sua liiifiiia^em e suas car-'ftcristieas inais comuns. Meste capítulo e nos se-guintes, vocé estará estudando o Barroco na literatúra e nas artes em geral. Para saber mais, sugerimos: ' i'! - ao filme Caravaggio, existente em video, que trala da vida e da obra de um dos mais importantes pintores do pré-Barroco. ' 1 . !;.: a músioa de Vivaldi, a maior celebridade da música barroca. <,:i : a obra Boca do Infemo, de Ana Miranda (Editora Compa-nhia das Letras), que trata da vida do poeta baiano barroco Gregório de Matos e inclui também o Pe. Antônio Vieira, autores a serem estudados nos próximos capítulos. \ ■'. '•' si i i VAK: em museus e bibliotecas de sua cidade sobre a obra de grandes artistas plásticos barrocos e pré-barro-cos, como Caravaggio, Tintoretto, Giuseppe Arcimboldo, Georges de la Tour e Antoon Van Dyck; e também sobre o genial Antonio Francisco Lis-boa, o Aleijadinho, arquiteto, pintor e escultor brasileiro, que deixou significativas obras no Barroco mineiro. as cidades que possuem igrejas e obras dos séculos XVII-XVIII, como Ouro Preto, Mariana, Säo Joäo del Rei, Sabará, Tiradentes, Dia-mantina, Salvador, Olinda e Recife, dentre outras; e também os museus de sua cidade, informando-se sobre a existencia de obras do referido período. fr. BHDH mĚKm wĚĚm var- O Renascimento caracterizou-se pelo racionalismu, pelo equilíbrio, pela clarc/a e linearidade dos contornos. Já o Barroco tenta conciliar duas concepcoes de mundo _opqstas:^rfteval e_ a raiascenteta. Assim, vaíores como o humanismo, o gosto pelas coisas terrenas, as satisfacoes mundanas e carnais, trazidos pelo.RenajsdmentO; fundem-se a valores espirituais trazidos pela Contra-Rcforma, do que resulta uma forma t de viver conflituosa, expressa na arte barroca. V r/ Barroco na arte marcou um momento de crise espiritual da sociedade européia. O homem do século XVII era um homem dividido cntre duas mentalidades, duas formas diferentes de ver o mundo. Convivcndo com o sensualismo e os prazeres materials trazidos pelo Renascimento, os valores espirituais tao fortes na Tdade Média e desprezados pelo Renascimento - voltaram a exercer forte influéncia sobre a mentalidade da época. Uma nova onda de religiosidade foi trazida pela Contra-Reforma e pela fmidagao da Companhia de Jesus. O que decorreu ďaí foram naturalmente sentimentos contraditórios, já que o homem estava dividido entre valores opostos. E a _arte_ barroca, que exprime essa contradicao, igualmente oscila entre o clássico (e pagáo) c o medieval (eristao), apresentando-se como uma arte índisciplinada. Čomparado aos outros dois movimentos que integram a Era Clássica, o Classicismo e o Arcadismo, o Barroco representa um desvio da orientacao „clássicaj. Já que procurava, ao mesmo tempo," fúndiř "a experiéncia renascentista ao reavivamento da fé crista medieval. Punha em risco, assim, certos princípios muito prezados pela tradicao clássica, como o predomínio da razáo e o equilíbrio. ERA MEDIEVAL i. epoea (séc. XH-XIV) 2? época (séc. XV-XVl) ERA CLÁSSICA ClAtbiUsMU i-iXVI) BARROCO (séc. XVII) ARCADISMO (séc.XVlil) 7! A linguagem barroca A linguagem é a expressäo das idéias c dos sentimentos humanos. Assim, a linguagem barroca exprime os sentimentos conflituosos vividos pelo homem no século XVII; seus temas e sua construeäo combinam-se para expressar a concepeáo barroca do mundo. Vocé vai ler, a seguir, dois textos barrocos: o primeiro é um poema de Gregório de Malos, o principál poeta barroco brasileiro. O segundo pertenec ao Pc. Antonio Vieira, grande orador portuguĚs que viveu no Brasil no século XVII. Tcxto I Kiisťaiidn a < ii«t , ou uma so chaga ate que näo tinlia ja que a9oitar nem ferir. A outros estirados e desconjuntados no ou estendidos na ou os membros com pentes e garfos de ferro, a que propriamente chamavam cscorpiöes, ou metidos debaixo de grandes pedras de moinho, lhes espremiam como em o sangue, e lhes moiam c imprensavam os ossos, ate ficarem uma pasta confusa, sem figura, nem semclhanca do que dantes «am. A outros cobriam todos de utsy resina c enxofrc, e ateando-lhes o fogo, os faziam arder em pc como tochas ou luminärias,; nas festas dos idolos, esforgando-os para este suplicio como lhes dar a beber chumbo derretido. (Em Antonio Dimas, org. Gregörio de Matos. Säo Paulo, Abril Educacäo, 1981. p. 97.) ulgo/es: canaseos. desfiar: desfazer em fios. Chagas: feridas. eciileo: instrument o de torlura. cafasia: cadafalso (cm forma de leito), feito de grades, em que se tortura- vam os märtires, arar: sulcar, lavrar. ranlur: pentear. lagar: (anque onde se espreinetn fratos, a fim de tomá-los liquidos. pez: breu, piche. Caracteristicas da linguagem barroca Alem das caracteristicas da linguagem barroca observadas nos textos estudados, outras me-recem destaque: 9 reiiiiinte formal: voce deve ter notado que o nivj^lin^üistico dos dois textos é sofisticado. O primeiro texto, por exemplo, apresenta cM^uc^e^^rMtícas ^jabj^radas^ e o segundo apresenta principalmente um voca-bulário de_ niyel_eleyado. ü Barroco literärio foi uma arte 1. Os dois textos apresentam semelhanca quanto ao terna, evidenciando uma prcocupagao tipicamente barroca. Explicite cssa semelhanca. 2. Observe a postura do eristao em cada um dos textos. a) Como pode ser interpretado, no texto I, o desejo do eu lírico de unir-se ao corpo torturado de CristoV b) Que semelhanca há entre a postura do eristáo nos dois textos? 3. A linguagem barroca normalmente busca transmitir eslados de conflito espiritual. Por isso faz uso de certas figuras de linguagem, tais como a hipérbole, a antítese, as inversoes, as metáforas, alem dc alegorias, de imagens violentas c de sugestoes de som e cor que traduzem o sentido trágico da vida. a) Destaque do texto I um exemplo de antítese c outro de inversao. b) Destaque do texto II exemplos de sugestoes sonoras c de imagens violentas. 4. O Barroco apresenta čerta atragao pelo mórbido como forma dc exprimir a fragilidade e o grotesco da conditio humana. Expliquc de que forma se manifesta essa atitude em cada um dos textos lidos. da arislocracia c esse refinamen-to era desejado por seu publico consumidor, porque Ihe confe-ria status. »Jigurapäo.: em vez de dizer as coisas de forma direta e objeti-va, o texto barroco prefcre a Jiguracap, a sugestao por meio de metáfqraSs, de_ cpmparaQÔes, símbolos e alegorias. No texto I, por excmplo, observe como o autor vai sugerindo o sofrimen-to de Cristo por meio dajróé-Jiiqiw, isto é, por meio da referencia ás partes maltrata-das: os bracos, os olhos, os pés, a cabeca. o sangue. » conflito espiritual: o h o mem barroco sente-se dilaccrado e angustiado diante da alteracäo dos valores, dividindo-se entre o jnundo espiritual e p niundp material. As figuras que melhor expressam esse estado de alma säo &_antitese c oparadoxo. No texto I, por exemplo, cheio de ^entimentq de culpa, o eu lírico renega a vida pecaminosa em troca da salvacäo espiritual. » Jemas contruditórios: há o gosto peía confrontacäo violenta de Jemas opostos, como amor/dor, jvida/morte, juventude/velhice, pecado/perdäo, etc. • aej'emeridade do tempo e o carpe diem: o hörnern barroco tem consciéncia de que a vida terréná é éfémera, passageira, e, por isso, é preciso pensar na salvacao espiritual. Mas, já que a vida é passageira, sente, ao mesmo tempo, desejo de gozá-ia antes que aeabe, o que resulta jirrm__sentimejUo_ contraditório, já que gozar a vida implica pecar, e, se há pecado, näo há salvacäo. » eultiswv: é o rebuscamento formal, caractcrizado pelo jógo _dej)ajjivras e pelo excessivo emprcgo de figuras de linguagem. Também conhecido como gongorismo,jela mfluencia do estilo do poeta espanhol Luis de Góngora, o cultismo cxplora efcitos sensorials, tais como cor, tom, forma, volume, sonoridade, imagens violentas e fantasiosas - enfim, recursos que sugerem a superacäo dos limites da realidade. • jMweptismo: (do espanhol cgnceptg, "idéia") č o jogo de idéiaSj constituído pelas _sutilezas do raciqcínio e do pensamento lógico, por analogias, etc. Embora seja mais comum o cultismo manifestar-se mi_pjjesia e o cor.eeptismo na prosa, é perfeitamente normal aparecerem ambos cm um mesmo texto. • jogo de clmolescitrp: embora esse aspecto seja mais visível nas artes piiásticas (observe a reproducao do quadro dc abertura da unidade), o Barroco aprecia fundir a luz á sombra, o que traduz o_conflito resultante do desejo de fundir a fé á razäo. i ■:■ -i.l Com base no que foi estudado, podemos esquematizar a linguagem barroca deste modo: QUANTO A FORMA QUANTO AO CONTEUDO • Vocabulário selecionado • Gosto pelas inversöes sintáticas • .Rguracäo excessiva, com ánfase em certas flguras de linguagem, como a metafora, a jmtítese e a hipérbole a Sugestôes sonoras e cromáticas_ • Gosto por construcöes complexas e raras • jConflito espiritual. • Oposicäo entre o mundo material e o espiritual • Consciéncia da efemeridade jlc^tempp • Carpe diern s Morbidez • Gosto por jadocíniqs com: plexos, intrincados j Figuras de linguagem (II). Alem da metafora, da metonímia e da antítese, figuras de linguagem já estudadas, outras merecem ser consideradas, pois säo encontradas com frcqücncia na linguagem barroca. Säo elas: Hipérbole Consiste mima expressäo intencionalmente exagerada, com a finalidade de impressionar o interlocutor: f Estou esperando vocé há xécuhsl s r: Já lhc faleiiisso um milhäo de vezes. "Queria querer gritar setecenmsimil vezes Como säo lindoS, COmO SäO lindos OS burgUCSCs" : (CaetarióVeloso) Inversäo É a inversäo da ordern natural da oraeäo, com o objetivo de enfatizar certas palavras ou expressöes. Observe estes fragmentos de escritores barrocos: 1 A ,2 DizJJristo que "saiujo pregador evangélicoja semear" a palavra divina. (Pe. Vieira) Ordern direta: Cristo diz que o pregador cvangélico saiu a semear a palavra divina. •• .O remédio sprá segui^o irrajrido j Carninho, dnde dos mais vejó as pisadas (Gregório de Mates) Ordern direta: O remédio será seguir o caminho imundo, onde vejo as pisadas dos mais. ^ Obser'- -ŕ j. Alguns autores distinguem os tipos de inversäo. Nocaso, a frase do Pe. ( Vieira seria urnJ^eVto^mera inversäo na ordern dos termos da oraeäo) c nos versos / de GregÓTio de Matos há vxa%m\ástrofe (que consiste em colocar o determinante, formado porjmia preposicäo + um substantivo, antes do determinado): "dos mate vejo as pisadas". Veja estes outros versos de Castro Alves: "O vendaval da sorte do mar lan<;ou-se na gelada areia" (na gelada areia do mar). I Anáfora Consists na repeticao de palavras, geralmente no inicio de versos ou oracoes. Observe a anafora dcstes versos de Gregorio dc Matos: , A vos, pregados pes, por nao deixar-me, : A yds, sangtte yertido, para ungir-roe. A vos, cabeea baixa, pra chamar-me. Paradoxo Ľ urna espécie de antítese, porém mais radical. Enquanto a antitcsc é a mcraLaproximacäq de ejementosppostos, o paradoxo funde-os^quebrando a logica. Veja que conceito paradoxal Camôes deu para o amor: Amor é fogo que arde sem se ver É ferida que dói e nun se sente É um contentamentó descontente E dor que desatina sem dóer; E Vinícius de Moraes, também tratando do amor: Que näo seja imortal posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. Parabola É um tipo de comparacäo, construído em forma de narratiya. Conta-se jjma_história_para se extraírem dela ensinamentos que possam ilustrar outra situacäo ou resolver os seus probíemas. Nos textos barrocos, säo utilizadas com frequéncia_as parabolas bíblicas,Jomadas como exemplo pelos padres para convencer scus ouvintcs nos sermôcs. As parabolas mais conhecidas säo a do filho pródigo e a do joio e do trigo. ■■I yĚĚĚĚĚm wĚĚBĚĚ MĚĚĚ ■■■■■■I mSi m \ 1 im íiäIp I mĚWĚ gflEraE WĚĚĚ mwm WĚBBĚĚm WĚĚaĚm ■f sxto histonco No século XVI o hörnern europeu ampliou os limites geográficos do mundo conheciďo, acreditou cm sua capacidade de dominar e_transformar a natureza por meio da razäo, empenhou-se na descoberta de novos conhecimentos cientificos e resgatou a cultura clássica, modelo de inspiracao. Essa euforia anjxopocěntrica,j;ontudo, sofreu fortes abalos no século XVII, o século barroco, em virtuďe das alteracöes do quadro politico, econömico, social e religioso. Politica, economia e sociedade Do ponto de vista politico, consolidou-se o Absolutismo, sistema politico baseado na centralizagao absoluta do poder nas mäos do rei, o qual se considerava representante deDeus na Terra. Esse sistema atendia á necessidade dc superar a crisc da _ldade Média c äs necessidades da burguesia (classe de comerciantes em ascensäo) de ter um governo centralizador, que unificasse e ampliasse as condicpes do mercado nacionál. Do ponto de vista econdmico, vivia-se a Revolucao Comercial, cuja politica economica, o mercantilismo,._se baseava no metalismo, na baianca de comcrcio favoravcl c no aciimulo de capitals. A sociedade estava organizada em tres camadas sqciais impermeaveis: o clero, a nqbreza c o Tcrcciro Bslado - este formado pela burguesia, pelos artesaos e pelos camponeses. A burguesia, por deter forte poder econdmico, pressionava politicamente a nobreza e o rei, a fim de participar das decisoes politicas do Estado absolutista. A Contra-Reforma Do ponto de vista espiri-tual, o século XVII foi íl .i J-\ i marcado pelos reflexos das crises religiosas ocorridas no século anterior: a Reforma (1517) e a Contra-Reforma, (1563). A Reforma represen-tou a cisaq da Igreja^cnsta e que deu origem ao protes-tantismo e a uma verdadeira revolucao religiosa na Euro-pa. A Contra-Reforma foi jmra^eacao da^Igreja Cató-Jica,_que visava combater a expanšao do protestantismo e recuperar as areas de domínio protestante. Trata-va-se, portanto, de uma época em que fermentavam novas teorias religiosas e rcviam-sc dogmas e valores antes inquestionáveis. A arte barroca e o contexto Foi nesse contexto de autoritarismq poMco, de expansäo coniercial e economica, de luta de classes e de crises religiosas que nasceu a arte barroca. Um dos tracos mais importantcs que caractcrizam o Barroco_c_qjjqstg pela aproximaeäo de realidades opostas, pelo conflito e pelas contradicöes violentas. Tal principio pode ser relacionado com a realidade do hörnern barroco, contraditöria e em transformaeäo. JPolilicamcntc, o hörnern da cpoca sentia-se oprimido; economicamente, contudo, sentia-se livre para enriquecer, Apesar da possibilidade de ascensäo economica, a estrutura social do Antigo Regime näo Ihe permitia a ascensäo social. NojTJiUTq espiritual, igualmente se verificavam contradicöes: ao lado das conquistas e dos valores' do Renascimento e do mercantilismo - que possibilitou a aquisicäo de bens e prazeres materials -, a Contra-Reforma procurava restaurar a fe crista medieval c cstimular a vida e os valores espirituais. Por esse conjunto de razôes é que na linguagem barroca, tanto na forma quanto no conteúdo, se verifica uma rejeicäo constante da visäo ordenada das coisas. Os tenuis säo aqueles que reflelem os estados de tensao da alma humana, tais como vida e morte, materia e espirito, amor platonico e amor carnal, pecado e perdao. A construpao da linguagem barroca acentua e amplia o sentido tragico desses temas, ao fazcr uso de uma linguagem de dificil acesso, rebuscada, chcia de inversoes e de figuras de linguagem. Fruto da sintese entre dims mentalidades, a medieval e a renascentista, o homem do seculo XVII era urn ser contraditorio, tal qual a arte pela qual se expressou. mm Barroco: uma arte de mau-gosto? A origem da pala vra barroco tem suscilado muitas discussöes. Dentre as várias posicöe^, a mais aceita é a de ^ que a palavra se teria originado „ [,,.] do vocábulo espanhol barrueco, vindo do portuguěs arcaico e usado peios joalheiros desdc i- seculo XVÍ, para designar um tipo de pérola irregulur e de l'.n i-.iu\-iio defeituosa, alias atc hoje conhecida por esta mesma denominacao, Assim, como termo técnico, estabeleceria, desde seu início, uma comparacao fmidamental para a arle: eni oposiciio á disciplina das obras do Renascimento, caracterizaría as producocs de uma época na qual os trabalhos artísticos mais diversos se apresentariam de mancira livre e até mesmo sob formas anárqiricas, de grande irnperfeicao e mau gosto. (Suzy Melto. Bsrraco. Sáo Paulo, Btasiflense, 1983. p.7-8.) Portanto, jvjsto iniciaimente näo como um movimento autônomo, com leis próprias, mas como degcneracäo do Renascimento, o Barroco encontrou o desprezo da maior parte dos historiaďores e crítícos cle arte até o final do século XIX, quando o suíco Hemrieh Wôlfílin, por meio de estudos c publicacôes, atribuiu-lhe o devido valor e autonómia como movimento artístico. Wôlfflin estabeleceu cinco princípios fundamentais que permitem diferenciar a arte barroca da arte renascentista. Confrontando esses princípios no quadro que segue, é possível identificá-los nas pinturas reproduzidas. A primeira reprodu-cäo é do quadro A Virgem com o Menino Jesus, de Ghirlandaio, pintor renascentista italiano do século XVI; a segunda é do quadro O enterro do Conde de Orgaz, do pintor pré-barroco espanhol El Grcco. RENASCIMENTO BARROCO 1) Linear, sentida pela mäo 2) Composta em piano, de jeito a ser sentida 3) Partes coordenadas de igual valor 4) Fechada, deixando fora o observa-dor 5) Claridade absoluta 1) Pictórica, seguida pela vista 2) Composta em profundidade, de jeito a ser seguida 3) Partes subordinadas a um conjunto 4) Aberta, colocando dentro o obser-vador 5) Claridade relativa iL íl* ä-*4.' ^ j,*, ^fc ■K -'k - šsiK, i ' ■f t f '-v 1 Os primeiros textos literários escritos por brasilviros. nu Brasil-Colôuia surgem nuiii momento em que o Barroco europeu se dcscnvolve e se expande. Contudo as condicôes da colônia diferem bastante das cortes luxuosas européias e, por isso, o Barroco adquire, entre nos, feicôes especíiicas. Gregório de Matos, por exemplo, o maior nome do Barroco brasileiro, divide suas atencôes entre os modelos do Barroco europeu e a crítica e a satira da realidade baiana na qual viveu. i éculo^XXIL. O Brasil presenciava o nascer de uma literatura em suas terras. Ainda uma literatura frágfl e presa aos modelos lusitanos, como durante todo o periodo colonial; ainda restrita a uma elite muito pequena e culta; e sem um publico consumidor ativo e influente. Mas os primeiros escriloresnascidos na coldnia comecavam a despontar e, com eles, surgiam as primeiras manifestacoes do sentimente nativista - isto é, de valorizacao da terra onde hayiam nascido. O Barroco brasileiro surgiu nesse contexto. Nao se via aqui o luxo e a pompa da aristoeracia européia, que, como publico consumidor, apreciava e estimulava o refinamento da arte barroca. A realidade brasileira era diferente: tratava-se de um centro de comérciojjde explora9ao de cana; de umarealidade de violencia, em que se eseravizava a máo-dc-obra dos negros e se perseguia o índio. Apesar disso, os modelos literários Portugueses chegaram ao Brasil, e o Barroco, cujas origens se confundem com as da nossa propria literatura, dcu seus primeiros passos. Nao havia sentimento de grupo ou de coletividade: a literatura produzida "em" rneio ao espírito de ganáncia e aventura da mentalidadc colonialista foi fruto de esfoi'9os individuals. Aqueles que esereviam encontraram na literatura um instruniento para eriticar e combater essa mentalidadc, ou para moralizar a populacao com os ■BíéIi *-* ~» IL 1! --'iľ^-liii .1 i. r t'A ■Ir í.l i I ' i i lí.m.i ■• ! ,l| II • .1 í l"-í i princípios da religiäo ou ainda para dar vazäo aos seus sentimentos pessoais mais profundos. O Barroco no Brasil só foi mais praticado e reconhecido em seu final (entre 1720 e 1750), quando foram fundadas várias academias literárias por todo o pais. A descoberta do ouro, cm Minas Gerais, possibilitou o desenvolvimento de um Barroco tardio nas artes plásticas, que resultou na constru9äo de igrejas de estilo barroco durante todo o século XVIII. A obra considerada tradicionalmente o_marco iniciál do Barroco brasileiro hProsopopéia [\6(í\), de Bento Teixcira, um poema feito á cópia jle Os lusiadas. Os eseritores barrocos brasileiros que mais se destacaram säo: na poesia: Gregório de Matos, Bento Teixcira, Botelho de Oliveira c Frci Itaparica; na prosa: Pe. Antonio Vieira, Sebastiáo da Rochá Pita e Nuno Marques Pereira. Gregório de Matos (16337-1696) é o maior poeta barroco brasileiro e um dos fundadores da poesia lírica e satírica em nosso pais. Nasceu cm Salvador, estudou no Čolégio dos Jesuítas e depois se dirigiu a Coimbra, onde estudou Direito, tornou-se juizjä ensaiou seus primeiros poemas satíricos. Retornando ao Brasil, exerceu os cargos de vigário-geral e tesoureiro-mor, sem usar roupagens ecle-siásticas, como era obrigado. Dcvido ás suas sátiras, joi perseguido pelo gpvernadpr baiano Antonio de Souza Menezes, o Braco de Prata. Depois de se casar com Maria dos Povos e exercer a funcäo dc jyJTOgadp, abandonou tudo c saiu pelo Reconcavo í \ r J. baiano como cantador itinerante, dedican-do-se ás sátiras e aos poemas erótico-irôni-cqs, o que ihe custou alguns anos de exílio em Angola. Voltou ao Brasil, doente, e, impedido decntrar na Bahia, niorreu em Recife. Irreverěncia e esquecimento Gregório de Matos foi irreverente. Irre-verente como pessoa, ao chocar os valores e a falsa moral da sociedade baiana de seu tempo, com seus comportamentos considera-dos indecorosos; irreverente 4 como poeta líricq, porque seguia c, ao mesmo tempo, quebrava os modelos barrocos europeus; irreverente como poeta satírico, pois, empre-gando um vocabulário de baixo caläo, denunciou__as contradicôes e falsidades daquela sociedade, ignorando o poder das autoridades políticas e religiosas. Talvez em razäo da própria irreverěncia, o autor näo fez nem publicou em vida uma ] coletänea de seus textos - o que ocasionou ; im'nneros problcmas de autoria. Isso tudo, aliado ao fato de ele ter píagiado alguns eseritores famosos da época, como o espanbol Gôngora, fez com que sua obra ficasse quase inteiramente desconhecida até as primeiras décadas do sčeulo XX. Hoje, entretanto, a obra de Gregório de Matos é reconhecida como um projeto literárío que näo só abriu uma tradicäo entre nós, mas também superou os limites do movimento a que estava filiado - o Barroco ~~- 'e~ô"póeíF oHegoii'a "ser, em pleno século XVII, um dos preeursores da poesia moderna brasileíŕä"'3o~ século XX. A lírica Gregório de Matos cultivou a poesiajirica religiosa, amqrosa e filosófica. Como poeta íírico, adequou-se aos temas c aos procedi-mentos de linguagem freqüentes no Barroco europeu. A Urica amorosa, por exemplo, é forte-mente marcada pelo dualismo amoroso carne/ espirito, que leva normalmente a um senti-mento de culpa no piano espiritual. A mulher, muitas vezeš, é a personificaeäo do proprio pecädö, da perdicäo espiritual. ^ Observe este soneto: Sonetos a D. Angela de Sousa Paredcs Näo vira em minha vida a formosura, Ouvia falar nela cada dia, E ouvida me incitava, e me movia A querer ver täo bela arquitetura: Ontem a vi por minha desventura Na cara, no bom ar, na galhardia De uma mulher, que em Anjo se mentia; De um Sol, que se trajava em eriatura: Matem-me, disse eu, vendo abrasar-me, Se esta a cousa näo é, que encarccer-me Sabia o mundo, e tanto exagerar-me: Olhos meus, disse entäo por defender-me, Se a beleza heis de ver para matar-me, Antes olhos cegueis, do que eu perder-me. (Em Antonio Candido e J. A. Castello. Op. cit., p. 61.} Na Urica filosófica, destacam-se os textos dc referencia ao desconcertq do niundo (que lembram diretamente Čamôes) e ásfrustrapôes humanas díante da. re^Hdade, Também há os poemas em que predomina a consciéncia da transitoriedade da vida e do tempo, marcados pelo carpe diem. Observe como o terna da efemeridade do / tempo é trabalhado neste soneto: Desenganos da vida humana metaforicamente E a vaidade, Fábio, nesta vida, Rosa, que da manhä lisonjeada, Purpuras mil, com ambifäo dourada, Airosa rompe, arrasta presumida. E planta, que dc abril favorecida, Por mares de sobcrba desatada, Florida galeota empavesada, Sulca ufana, navega destemida. É nau enfim, que em breve ligeireza, Com presuncäo de Fénix generosa, Galhardias apresta, alentos preza: Mas ser planta, ser rosa, nau vistosa De que importa, se aguarda sem defesa Penha a nau, ferro a planta, tarde a rosa? (Em Antonio Candido o J. A. Castollo. Op. cit., p. 61.) _A lírica religiosa de Gregório de Matos obedece aos princípios fundamentals do Barroco europeu, fazendo uso de temas como o amor a Deus, a culpa, o arrependimento, o pecado e o perdäo, além de constantes referéncias bíblicas. A lingua empregada é culta e apresenta inversôes e figuras de linguagem abundantes. A satira A Jesus Crista Nosso Senhor IVquei, Senhor; mas näo porque hei pecado, Da vossa alta clemencia me despido; ľľrque quanta mais tenho delinqiiido, \ . s tenho a perdoar mais empenhado. So basta a vos irar tanto pecado, A abrandar-vos sobeja um só gcmido: Que a mesma culpa, que vos há ofendido, Vos lem para o perdäo lisonjeado. Se uma ovelha perdida e já cobrada Glória tal e prazer täo repentino Vos den, como afirmais na sacra história, Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada, Cobrai-a; e näo queirais, pastor divino, Herder na vossu ovelha a vossa glória. (Em Antonio Candido e J. A. Castello. Op. cit., p. 60.) 1. Identifique o terna do poema lido. 2. O poema é organizado a partir das oposicôes entre Deus e o pecador. ťaca um pequeno quadro das antíteses das duas primeiras estrofes, extraindo delas as palavras ou cxpressôes que caracterizam o eu lírico e opondo-as äs que caracterizam a Deus. 3. É comum, no conceptismo, o emprego de parabolas que servem de exemplo ou de argumenta para fundamentar um princípio. Parabola é uma narrativa curta que transmite um conteúdo moral, sendo, normalmente, construída a partir de um encadeamento de metáforas. Tdentifique e explique a parabola existente nos dois Ultimos tercetos do poema. 4. Aos poucos se percebe urna mudanc.a de tom na linguagem do poema, que se inicia respeitosa, mas, gradativamente, vai se tornando mais direta e menos cerimoniosa. Ao mesmo tempo, o eu lírico aprescnta uma série de argumentos, procurando chantagcar a Deus e inverter a posic;äo de ambos. a) Destaque da primeira e da segunda estrofes os versos-argumento que comprovam o esforío do eu lirico em ser perdoado. b) Identifique no texto os versos cm quo Deus é chantagcado. Tambem conhecido como "O Boca do Inferno", devido a suas satiras, Gregorio de Matos representauma dasyeias mais ricas e ferinas.de toda a hteratura satirica cm lingua portuguesa. A exemplo de certos trovadores da Idadc Media, o poeta nfto poupou palavroes em sua linguagem nem criticas a todas as classes da sociedade baiana de seu tempo. Criticava o governador, o ciero, os comerciantes, os negros, os mulatos... e amava as mulalas... Observe estes fragmentos de um poema satirico: Que falta nesta ridude?.........Verdade Que mais por sua desonra....... Honra Falta mais que se lhe ponha......Vcrgonha. O demo a viver se exponha, por mais que a fama a cxalta, numa cidade, onde falta simoiiia: venda ilicita de Verdade, Honra, Vergonha. eoisas sagradas. Que vai pela clerezia?.......... i"u E pelos membros da Igreja?......Inveja Cuidei, que mais se lhe punha .... Unha. Sazonada caramunha! eiifim que na Santa Sé o que se pratica, é Simonia, Inveja, Unha. A satira de Gregório constitui a parte mais original de sua poesia, pois foge plenamente dos padroes prccstabclccidos pelo Barroco vigente e se volta para a realiďade baiana do século XYJI. Por isso, pode-se chamá-la de uma_pocsia realista e brasileira. náo somente pelos temas escojhidos, mas tambem pela percepcao crííica da exploj-ajao jcolonialista empreendida pelos Portugueses na coló-nia. Álém disso, Gregório emprega na satira uma lingua portuguesa diversificada, cheia de termos i. indígenas e afneanos (que reflete o bilingiiismo ou || tnlinguismo da época), de palavroes, girias e expressoes locals. Por essas razoes é que a poesia dc Gregório de Matos - ao abrir espaco para a paisagem local e a lingua do povo - talvez seja a primeira manifestacao * 'ňathnita de nossa litaraUira e o início de um longo despertar da consciéncia crítica nacionál, que levaria ainda um século para abrir os olhos. 5. Com base no que aprendeu até aqui acerca da linguagem barroca, voce diria que o texto é cultista ou conceptista? Justiflque. Í'"M1'\M O hörnern de acäo Soneto Neste mundo é mais rico, o que mais rapa: Quem mais limpo se faz, tem mais catf^a: Com sua língua ao nobre o vil decepa: O Velhaco maior sempře tem capa. Mostra o patife da nobreza o mapa: Quem tem mäo de agarrar, ligeiro třepa; Quem menos falar pode, mais jucrcp;-: Quem dinheiro tiver, pode ser Papa. A flor baixa se inculca por Tulipa; Bengala hoje na mäo, ontem garlopa: Mais isento se mostra, o que mais chupa. Para a tropa do trapo vazo a tripa, E mais näo digo, porque a Musa topa. Em apa, epa, ipa, opa, upa. (Em Antonio Dimas, org. Op, cit., p. 37.) carepa: caspa. sujcira. vil: ordmário. inerepa: censuia. :eprecnde. garlopa: ťcrramenla de marcenaiia; termo usado como sinönimo de Iraballio brával. 1. O poema lido visa criticar certos comportamentos da socicdadc baiana do seculo XVTT. a) Que classes sociais sao alvo da critica? b) Que comportamentos dessas pessoas sao criticados? 2. Até a terceira estrofe, o poema mantém um tom sčrio, de crítica moralizante. ConUtdo, na ultima estrofe esse tom assume feicao engra9ada, sem perder, entretanto, a postura crítica. a) Dc um sentido possível ao verso: "Para a tropa do trapo vazo a tripa". b) Explique, dc acordo com a ultima estrofe, por que o autor encerra o poema. c) Destaque o verso responsável pelo aspecto cómico do toxto. I iřntönio ViVjra: •h 131- .ratura o-n-i missäo Antonio Vieira (1608-1697) é a principál expressäo do _Barrooo em Portugal. _ Sua obra pertence tanto á literatura portuguesa quanto á brasileira. Portugués de origem, Vieira_tinha^_anps quando veio com a família para o Brasil. Na Bahia estudou com os jesuítas e espontaneamente ingressou na ordern da Companhia de Jesus, iniciando seu noviciado com apenas 15 anos. A maior parte de sua obrafqi escrita no Brasil e está relacionada com as inúmcras atividades quc o autor dcsempenhou como religioso, como conselheiro de D. Joäo IV, rei de Portugal, ou como mediador e representante de Portugal em relacöes economicas c políticas com outros paises. Embora religioso, Vieira nunca ficou restrito á pregacäo religiosa. Sempře pös seus sermöes a servico das causas políticas que abrafava e defendia, e por isso se indispös com muita gente: com os pequenos comerciantes, com os colonos que eseravizavam índios e até com a Inquisicäo. 111 oí n ^ äff SB?1 Valcndo-se do pulpito unico meio de propagacao de ideias as massas no Nordeste brasileiro do seculo XVII -, Vieira pregou a indios, bran-cos e negros, a brasileiros. africanos e Portugueses, a dominadores e dominados. pondo em pratica suas ideias politicas, tanto na catequese e na defesa do indio como na defesa da colonia em favor de Portugal, contra a invasao holandesa. f O \ isiiiii.ii'io k Vieira tambem teve um pouco de sonhador e profeta, chegando a escrever tres obras com esse conteüdo: Histöria do fuiiiro, Kspetanpas de Portugal e Clavis prophetarum. Baseado em textos bibjicose nos textos e profecias do poeta portugues Bandarra, Vieira acreditava tia ressurreigäo do rei D.Joäo TV, seu protetor, morto em 1656. Essas ideias eslao em sua obra Esperanpas de Portugal, motivo por que foi processado e preso, entre 1665 e 1.667, pela Inquisifäo, que também lhc cassou q direitpde; palayra cm Portugal Nesse processo também pesaram as acusacoes sobre scu cnvolvimento com os cristäos-novos (judeus convertidos ao cristianismo por medo de perseguicöes). Em vcz de atacar os judeus, como sc fazia em vários países católicos, por influéncia da Inquisieäo, Vieira defendia a permanénoia e a entrada de judeus em Portugal, como Jorma de estimular o comercio _naquele pais. Por outro lado, tinha interesse em fazer, seciěťamente, um acordo teológico com os judeus, prevendo um "Tercciro Estado" da Tgreja. O orador As qualidades de Vieira como orador säo incomparáveis. Aliando sua formaeäo jesuitica á estética barroca em voga, pronunciou sermöes que se tornaram ao mesmo tempo a expressäo maxima do Barroco em prosa sacra e uma das prineipais expressöes ideológicas e literárias da Contra-^Reforma. Pregou no Brasil, em Portugal c na I talia, sempře com grande repercussäo. Dentre a vasta produeäo do autor, que conta com niais de duzentos sermöes e quinhentas cartas, destacam-sc: « 'Sermäo da sexagésima': proferido na Capela Real de Lisboa em 1653, tematiza a arte de pregar. <• 'Sermäo pelo bom sucesso das armas de Portugal _contra as de Holanda': proferido na Bahia em 1640, coloca-se contrario á invasao holandesa. > 'Sermäo de Santo Antonio (aos peixes)': proferido no Maranhao em 1654, ataca a escravizaeäo de índios. 'Sermäo do mandato': pronunciado na Capela Real de Lisboa em 1645, desenvolve o tema do amor místico. Há, a seguir, um trecho do 'Sermäo da sexagésima', um dos mais importantes de Vieira, porque nele, alem de desenvolver a temática religiosa de costume, o autordefincos principios fundamentals da parenética jesuítica, íslo ét a arte de pregar pgr sermójs. Ě interessante a situacflo eriaďa por esse sermäo, que, ao discorrer sobre os pregadores e os ouvintes em geral, acaba por questionar até o pregador e os ouvintes. Esse refmado exercício de metalinguagem, alem de eriar o efeito de tensäo e impacto entre pregador e ouvintes, permite avaliar a grande habilidade téenica do sermonista, nunca superado. Fazer poueo fruto a palavra de Dens no Mundo, pode proceder de um de trés principios: ou da parte do pregador, ou da parte do ouvinte, ou da parte de Deus. Para uma alma se converter pot meio.de um sermäo, bá de haver trés concursos: há de concorrer o pregador com a doutrma,.persuadindo; há de concorrer o ouvinte com o entendimento, percebendo; há de concorrer Deus>cbm a graca, alumiando. Para um horném se ver a si mesmo, säo necessárias tres coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, näo se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de noite, näo se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister olhos. Que coisa é a conversäo de uma alma, senäo entrar um horném dentro em si e ver-se a si mesmo? Para esta vista säo necessários olhos, e necessária luz e é necessário espelho. O pregador concorre com o espelho, que 6 a doutrina; Deus concorre com a luz, que é a gráfa; o horném concorre com os olhos, que é o conhecimento. Ora supošto que a conversäo das almas por meio da pregaeäo depende destes trés concursos: de Deus, do pregador c do ouvinte, por qual deles havemos de entender que falta? Por parte do ouvinte, ou por parte do pregador, ou por parte de Deus? Primeiramerite, por parte de Deus, näo falta nem pode faltar. Esta proposieäo é de fé, defmida ne Coricilíó Ťridentino, e no nosso Evangelho a temos. [...] Senddjpbis, certö que a palavra divina näo deixa de frutiftear por parte de Deus, seguc-se que ou é por fälta dp pregador ou por falta dos ouvintes. Por qual será? Os pregadores deitam a culpa aos quvititcs, mas näo é assim. Se fora por parte dos ouvintes, näo fizera a palavra de Deus niuito grande I'rulo. mas näo fazer nenhum fruto e nenhum ereito, näo é por parte dos ouvintes. Provo. Os ouvintes, ou säo maus ou säo bons; se säo bons, la z ncles grande frulo a palavra de Deus; se sSo ;hiaus, amda que näo faca neles fruto, faz efeito. [...] a palavra de Deus é täo fecunda, (jue nos bons faz tnuito Truto e é täo eficaz que nos maus, ainda que näo fa?a fruto, faz efeito; lanfada nög;eapinhos näo frutificou, mas nasceu até nos espinhos; lan«ada nas pedras näo frutificou, mas nasceu até nas pédras. Os piores ouvintes que há na Tgreja de Dens säo as pedras e os espinhos. K por que? - Os espinhos por agudos, as pedras por duras. Ouvintes dc entendimefitos ägudöt« ouvintes de vontades endurecidas säo os piores que há. Os ouvintes de entendinie9tQSo.a|jKÍ$Si..:i$|o ;:maM ouvintes, porque věm só a ouvir sutilezas, a esperar galantarias, a avaliar pensamentos, e ás vczes também a picar a quem os näo pica. [...] Mas os de vonlades endurecidas ainda säo piores, porque um entendimento agudo pode^se ferir pelos mesmos líos, e vencer-sc uma agudeza com outra maior; mas contra vontades endurecidas nenhiimacoisasaproveita a agudeza, antes dana mais, porque quanta as setas säo mais agudas, tantp mais faeilmeiite se despontam na pedra. [...] [...] li com os ouvintes de entendimcntos agudos e os ouvintes de vontades endurecidas serem os mais rebeldcs. é tanta a forca da dtvina palavra, que, apesar da agudeza, nasce nos espinhos, e apesar tla duav.a, nasce nas pedras. Pudérainos ařgtiir aolavrador do Evangelho de näo cortar os espinhos e de näo arranear as pedras antes de semear. mas de úidůstria deixou no campo as pedras e os espinhos, para que se Visse a forgä que semeäva. É tanta a for?a da divina palavra, que, sem cottar nem despontar espinhos, nasce éntre espinhos. É tanta a for?a da divina palavra, que, scm arranear nem abrandar pedras, nasce has pedras. [...] Tomai exemplo nessas mesmas pedras e nesses espinhos! Esses espinhos ecssas pedras agora resistem ao semeador do Géu; mas virá tempo em que essas mesmas pedras o aclameme essesmesmos espinhos o coroem. i Quando o scmeador do Ceu deixou o carnpo, saindo deste Mundo, as pedras se quebraram pära lhe fazerem aclamacoes, e os espinhos se teceram para lhe fazerem coroa. E se a palavra de Deus ate dos espinhos e das pedras triunfa; se a palavra de Deus ate nas pedrasy ate: nos: espinhos nasce; two triunfar dos alvedrios hoje a palavra de Dens, nein nasccr nos coracöcs, näo e por culpa, nem por indisposicäo dos ouvintes. Supostas estas duas demonstracöcs; suposto que o fruto e efeito da palavra de Deus, näo flea, nem por parte de Deus, nem por parte dos ouvintes, segue-se por conseqüSncia clara,quer; fica por parte do prcgador. E assim e. Sabeis, cristäos, por que nao faz fruto a palavra dc Deus? - For culpa dos pregadores. Sabeis, pregadores, por que näo faz fruto a palavrade Deus?* Sm > culpa nossa. (Em Eugenio Gomes, org. Vieira-Sermöas. 6a ed,Rio de Janeiro, Agtr, 1872. p. 94-9.): Ll^i. 1!.! pi imeira linha do sermäo, Vieira expöe o tema a partir do qual discorreni: Por que a palavra de Deus faz poueo fruto. O orador faz inümeras perguntas ao longo do sermäo e ele proprio as responde, como forma de conduzir o raciocinio de seu ouvinte. Que causas Vieira atribui ao poueo fruto da palavra de Deus? 2. As causas apontadas na questäo anterior desdobram-se em duas correspondôncias alegóricas -sinal um dos prineipios fundamentals da pregaeäo de Vieira. Observe esses desdobramentos. Há sempře a necessidade de Irés coisas: por para converter uma alma para um hörnern se ver prcgador com a doutrina, persuadindo ouvinte , com o entendimento, percebendo - Deus.......„ com a graca, iluminando , olhos _ espelho -„ luz Rcleia o primeiro parágrafo do texto e estabeleca as relacöes: a quem correspondem, respectivamente, os elementos olhos, espelho e luzl 3. O autor inocenla Deus da responsabilidade do problema em questäo: o poueo fruto da palavra divina. Que argumenta utiliza para isso? 4. Inocentando-se Deus, restam duas partes: a culpa ou é do pregador ou dos ouvintes. Valendo-se da alegória do trigo, Vieira lan$a mäo de outros simbolos para chegar á conclusäo do texto. Afirma que, se a semeňte näo vinga, quando semeada, tal fato näo advém da qualidade da semeňte, mas dos espinhos e das pedras do solo. Traduza os novos simbolos empregados. A que ou a quem correspondem a semeňte, os espinhos e as pedras? 5. A que conclusäo sc chega, no final do texto, sobre a pergunta iniciál do sermäo? 1. Leia a seguir um soneto de teor fílosófico do poeta Gregório de Matos. Após a leitura, responda ás quesloes propostas. Nasce o Sol, e näo dura mais que um dia, Depois da Luz se segue a noite escura, Em tristes sombras morrc a formosura, Em continuas tristezas a alegria. Porém, sc acaba o Sol, por que nascia? Se é täo formosa a Luz, por que näo dura? Como a beleza assim sc transfigura? Como o gosto da pena assim se fia? Mas no Sol, e na Luz falte a firmeza, Na formosura näo se dé constäncia, E na alegria sinta-se tristeza. Comeca o mundo enfim pela ignorancia, E tem qualquer dos bens por natureza A firmeza somente na inconstäncia. a) De que se queixa o cu lirico do soneto? b) Que atitude tipicamente barroca se verifica nessa queixa? c) Como voce sabe, a antítese e as inversöes säo procedimentos freqüentemente empregados na linguagem barroca. Destaque do texto dois exemplos de cada uma dessas figuras. d) A ultima estrofe do poema lembra o soneto 'Mudam-se os tempos, mudam-sc as vontades', de Camôes, sobretudo por sua visäo acerca da transitoricdade das coisas do mundo e da marcha do tempo. De acordo com a ultima estrofe do soneto, em que reside a firmeza das coisas? 2. (Fuvest-SP) A respcito do Padre Antonio Vieira, pode-se afirmar: a) Embora vivesse no Brasil, por sua formaeäo lusitana, näo se ocupou de problcmas locais. b) Procurava adequar os textos bíblicos ás realidades dc que tratava. c) Dada sua espiritualidade, demonstrava desinteresse por assuntos mundanos. d) Em funcäo de seu zelo para com Deus, utilizava-o para justiflcar todos os acontecimentos políticos e sociais. e) Mostrou-se timido diante dos interesses dos poderosos. 3. (Febasp) "Basta, senhor, que eu, porque roubo em urna barca, sou ladräo, c vós, porque roubais em uma armada, sois imperador? Assim é. O roubar pouco é culpa, o roubar muito 6 grandeza: o roubar com pouco poder faz os piratas, o roubar com muito, os Alexandres... O ladräo que furta para comer, näo vai nem leva ao inferno: os que näo só väo, mas que levam, de que eu trato, säo os outros - ladröes dc maior calibre e de mais alta esfera... Os outros ladröcs roubám um hörnern, estes roubám cidades e rcinos; os outros furtam debaixo de seu risco, estes, sem temor nem perigo; os outros se furtam, säo enforcados, estes furtam e enforcam." (Sermäo do bom ladräo - Vieira) Em relacäo ao estilo empregado por Vieira neste trecho, pode-se afirmar: a) O autor recorre ao Cultismo da linguagem com o intuito de convencer o ouvinte e por isto cria um jogo de imagens. b) Vieira recorre ao preciosismo da linguagem, isto é, através de fatos corriqueiros, cotidianos, procura converter o ouvinte. c) Padre Vieira emprega, principalmente, o Conceptismo, ou seja, o predomínio das idéias, da Iógica, do raciocinio. d) O pregador procura ensinar prcceitos religiosos ao ouvinte, o que era prática comum entre os eseritores gongóricos. 4. (F. Objetivo-SP) Sobre cultismo e conceptismo, os dois aspectos construtivos do Barroco, assinale a única alternativa inconeta: a) O cultismo opera através de analogias sensoriais, valorizando a identifícacäo dos seres por metáforas. O conceptismo valoriza a atitude intelectual, a argumentacäo. b) Cultismo e conceptismo säo partes construtivas do Barroco que näo se exeluem, E possível localizar no mesmo autor e até no mesmo texto os dois elementos. c) O cultismo é perceptível no rebuscamento da linguagem, pelo abuso no emprego de figuras semänticas, sintáticas e sonoras. O conceptismo valoriza a atitude intelectual, o que se coneretiza no diseurso pelo emprego de sofismas, silogismos, paradoxos, etc. d) O cultismo na Espanha, Portugal c Brasil é também conhecido como gongorismo e seu mais ardente defensor, entre nós, foi o Pe. Antônio Vieira, que, no Sermäo da sexagésima, propöe a primazia da palavra sobre a idéia. e) Os métodos cultistas mais seguidos por nossos poetas foram os de Gôngora e Marini e o conceptismo de Quevedo foi o que maiores influéncias deixou em Gregório de Matos. No capítulo seguinte e nos próximos, voce estará estudan-do o Arcadismo e suas rela-cöes com a vida sociopolitica eiiropéia e brasileira do século XVIII. Para sabor mais, sugeri-mos: • : aos filmes Danton -O processo da Revolucäo (1982), do Andrzej Wajda; Liga-CÖ8S perigosas (1988), de Ste- Iphen Frears; Casanova e a fíevolugáo (1982), de Ettore Scola; Amadous (1984), de Miloš Forman - todos relacio-_ nados com o contexto politico e cultural europeu da época. Veja também A Missao (1986), de Roland Joffé, cujo tema também foi tratado pelo poeta arcade brasileira Basilio da Gama, em seu poema épico O Uraguai. : sobre as idéias e as obras dos filósofos ilumi-nistas Voltaire, Montesquieu, Rousseau, Diderot e d'Alem- bert. Procure saber tambem sobre a Enciclopedia, escrita por eles, e sobre o despotis-mo esclarecido. : os piincipios que regem a Constituipao brasileira e as ideias politicas dos iluministas do seculo XVIII. : a pintura da epo-ca, especialmente a do pintor trances Antoine Watteau. : os compositores de destaque da epoca, como Johan Sebastian Bach e Wolfgang Amadeus Mozart. No seculo XVIII, as formas artisticas do Barroco ja se encontram desgastadas e decadentes. 0 fortalecimento politico da burguesia e o aparecimento dos filosofos ilurainistas formam urn novo quadro sociopolitico-cultural, que necessita de outras formulas de expressao. Combate-se a mentalidade religiosa criada pela Contra-Reforma, nega-se a educacao jesuitica praticada nas escolas, valoriza-se o estudo cientifico e as atividades humanas, num verdadciro retomo a cultura renascentista. A literature que surge para combater a arte barroca e sua mentalidade religiosa e contraditoria e o Neoclassicismo, que objetiva restaurar o equilibrio por meio da razao. BxiilllSlIcl influéncia neoclássica penetrou em todos os setores da vida artística européia, no século XVI11. Os artistas desse periodo compreendiam que o Barroco liavia ultrapassado os limites do que se considerava arte de qualidade e procuravam recuperar e imitar os padroes artisticos do Renascimento, tornados entäo como modelo. (src. XII ii.C.-V (l.C.) 1* época (see. XII-XIV) 2s época (see. XV-XVI) Classicismo (see. XVI) Barroco (sec. XYII) Neoclassicismo ou Arcadismo (see. XVIII) a^^SSíiSíSiIiiIIakMI IBIflBISf Na Italia essa influéncia assumiu feicao particular, Conhecida como Arcadismo, inspirava-sc na lendária regiáo da Grécia antiga. Scgundo a lenda, a Arcadia era dominada pelo deus Pan e habitada por pastores que, vivendo de modo simples e espontá-neo, se divertiam cantando, fazendo disputas poéticas e celebrando o amor e o prazer, Os italianos, procurando imitar a lenda grega, criaram a Arcadia em 1690 - uma academia literária que reunia os escritores com a finalidade de combater o Barroco e difundir os ideais neoclássicos. Para serem cocrcntes com certos principios, como simplicidade e igualdade, os cultos literatos arcades usavam roupas e pseudó-nimos de pastores gregos e reuniam-se em parques e jardins para gozar a vida natural. No Brasil e em Portugal, a experiencia neoclássica na literatura se deu em torno dos modelos do Arcadismo italiano, com a fundacao de academias literárias, simulacáo pastoral, ambiente campestre, etc. Esses ideais de vida simples e natural vém ao encontro dos anseios de um novo publico consumidor em formacáo, a burguesia, que historicamente lutava pcío poder e denunciava a vida luxuosa da nobreza nas cortes. A linguagem arcade A linguagem árcade é a expressao das idéias e dos sentimentos do artista do século XVIII. Sens temas e sua construcao procuram adequar-se á nova realidade social vivida pela classe que a produzia e a consumia: a burguesia. O poema abaixo pertence a Claudio Manuel da Costa, o introdutor do Arcadismo no Bi Loia-o obscrvando o assunto e os aspectos formais do texlo: vocabulário, construeoes sintat figuras de linguagem, etc. 1 MI Torno a ver-vos, 6 moriles; o destino Aqui ine lonia u pör nestes oiteiros; Ondc um tempo os gaböcs deixei grossciros Pelo traje da Corte rico, e fino. Aqui eslou eiilre Almcndro, ende Corino, Os meus ficis, mens doces companheiros, Vendo correr os miseros vaqueiros Ann-, ile ■■• a c:i:.>.'d.) dcMi'.i.k-. Se o bem desta choupana pode tanto, Que chega a ter mais pre90, e mais valia. Que da cidade o lisonjeiro encanto; Aqui descanse a louca fantasia; E o que te agora se tornava cm pranto, Se converta em afetos de alegria. (Em Pericles Eugenio da Silva Ramos, org. Poemas de Claudio Manuel da Costa. Säo Paulo, Cultrix, 1976. p. 63.) 1. O eu lirico afiraia: "Torno a vcr-vos, 6 montes". a) Quem e o eu lirico? b) Dc onde vem e como se sentia nesse local? Justifique sua resposta com palavras ou expressoes do texto. c) Aonde chegou e como sc sente agora? Justifique da mesma forma. 2. Faca uma oposicao entre os dois espa90s presentes no poema, apontando em que difcrem: a) quanto ao aspecto material; b) quanto ao aspecto espiritual, na visao do eu lirico. 3. Uma das alitudes comuns na linguagem arcade e a referenda a elementos da cultura classica, gregos ou latinos. Veririque a exislencia dessa atitude no texto. 4. Com base no poema em estudo, compare a linguagem arcade a linguagem barroca e aponte diferengas quanto: a) ao vocabulario, as estrnturas sintaticas, as figuras de linguagem, etc.; b) a exposigao dc scntimcntos; c) ao tenia; d) a visao de mundo. Caracteristicas da linguagem arcade Alem das caracteristicas da linguagem arcade estudadas no texto anterior, outras merecem destaque: • fugere urbern (fuga da cidade): influenciados pe-lo poeta latino Horäcio, os arcades defendiam o buco-lisinu como ideal de vida, isto e, uma vida simples e natural, junto ao campo, distante dos centres urba-nos. Tal principio era reforpado pelo pensamen-to do filösofo frances Jean-Jacques Rousseau, segundo o qual a civilizagäo cor-rompe os costumes do hörnern, que nasce natural-mente bom. Observe como nestes versos de Claudio Manuel da Costa, ja no seculo XVIII, e ressaltada a violcncia da cidade, em oposigäo ä paz do campo: Quern dcixa o halo pastori! amado Pela ingrata, bivU comjspomtenoisi 0\X\desconhece o rosto da violěncia, On do retire a paz näo tem provado Ml trato: Iugar ou tipo de vida. civil coii■[< ..1 ' Ii liefe" d ■(■.!• i-v.-f'-'uriri'i WBEmBBSESmmm IflS? I( IJfl-'l . ' 1 ., II K I'l úľ.'r I I 'I .-V'i.i I I Ah! queira Deus que minta a sorte irada: Mas de täo agouro cuidadoso Só me lembro de Nise, e de mais nada cai-pe diem: o descjo de aproveitar o dia e a vida enquanto e possivel -tema ja bastante explorado pelo Barroco - e retomado pelos arcades e faz parte do convite amoroso, como nestes versos de Tomas Antonio Gonzaga: Ah! nao, minha Marilia,. aproveite-se o tempo, antes que faca o estrago de roubar ao corpd as forcas, : e ao semblante a graya! Como sintese do que foi cstudado até aqui, podemos esquematizar as principals caracteristicas da linguagem árcade deste modo: tBil QUANTO Ä FORMA QUANTO AO CONTĽÚDO e Vocabulário simples » Pastoralismo « Frascs na ordern direta t? Bucolismo AusGncia quase total de figuras de c Fugere urbem linguagem et Aurea medioctilas o Manutencäo do verso decassilabo, do soneto e de outras formas clássicas - Elemcntos da cultiira greco-latina » Convencionalismo amoroso o Idealizaeäo amorosa a Raoionalismo >3 Idéias iluministas 9 Carpe diem Do texto ao context:© histórico Os séculos XV e XVI represcntaram para a história do Ocidente urna de suas etapas mais importantes: a transicäo da Idade Média para a Idade Moderna. Nesse período, houve acontecimentos significativos, tais como o Renascimento, a Revolucäo Comercial, a ascensäo da burguesia, a formacäo dos Estados nationals e o Absolutismo. Contudo, as ultimas amarras com o mundo medieval foram cortadas somente no século XVIII, pois, embora o mercantilismo tivesse alterado as rclacôes econômicas daquela sociedade, as estruturas social e politica ainda eram praticamente as mesmas. O século XVIII foi decisivo para a dišputa politica entre a burguesia e a nobreza. A burguesia controlava a economia do pais, enquanto se veriftcava a decadéncia da nobreza e o deserédito de toda a aristoeracia junto á populaeäo. Fortalccida, a burguesia impunha-se como classe de prestígio e exigia partieipaeäo nas decisoes politicas. Os iluministas c as idéias de Ii bei dado Fala-*sé muitonösdias de hoje em direitos do hörnern. Pois bem: foi no século XVTII - em 1789, precisamente - que uma Assembléia Constituinte [...] produziu e proclamou em Paris, solenemente, a primcira "Declaiacäo dos Direitos do Hörnern c do Cidadäo" de que se tern noticia. Até entäo era como se o hörnern näo existisse. É claro que [...] isso näo significa que estes direitos sejam respeitadas, Asvezesf:eomo ocorre hoje cm dia, é sintoma justamente do contrario. [...] Se uma "Declaracäo" como aquela que se produziu durante a grsnde revolucäo francesa do século foi possivel c se impôs como necessária para um grupo de entusiasmados revolucionários, foi por ter sido preparada por uma mutaeäo no piano das idéias e das mcntalidades. ■.: (Luiz R. Snlirma Portas. O lluminlsnio u os teis //Yúsofos. Sno ťru.lo, Brasiliense, 1981. p. 7-8.) As idéias iluministas, na verdade, vinham sendo preparadas desde o Renaseimento. Apesar da onda de religiosidade que envolveu o século XVII, muitos estudos continuaram sendo feitos nos campos da ciencia e da filosofia. Pensadorcs e filósofos como Francis Bacon (1561-1627), Descartes (1596-1650), Locke (1632-1704) e Isaac Newton (1642-1727) continuam, de alguma forma, o racionalismo da Rcnascenca e os estudos científicos de Copérnico e Galileu. O conjunto de idéias do Uuminismo no século XVIII chocava-se frontalmente contra duas institui-gôes poderosas da estrutura social de entäo: o Estado absolutista e a Igreja. No piano politico, os iluministas rejeitaram o autoritarismo dos reis absolutistas que detinham o poder absolute nas mäos —, argumentando que todos os homens säo igualmente dotados da razäo e só a ela devem obedecer. Negavam, assim, os privilégios da nobre-za, herdados pelo nascimento, e propunham igual-dade de direitos e deveres entre os homens. Era o início das idéias de demoeracia e- igualdade social que envolvem todo o mundo contemporäneo. No piano religioso, os iluministas acabaram por cliocar-sc contra as idéias dogmátieas da Igreja, que se sustentavam no principio da fé. A fé pressupöe crer sem examinar, e os iluministas queriam submeter todas as questöes que envolvem a realidade á análise da razäo. A Enciclopédia e as novas idéias J /. n u CONTRACT SOCIAL; o u, ľ R IN C l ľ Ä S r> u DROIT POLITIQUE. I. n o u s s r. A u, r r.:.' i> r (; c .v c c r.. í-íl A principal expressäo do pensamento iluininista foi a Enciclopédia, obra publieada na Franca entre 1750 e 1780, coordenada por Diderot e d'Alembert. Dela participaram 130 cola-boradores, na maioria burgueses. Escre-veram sobre verbetes que traduziam urna nova concepcäo de organizacäo social e política. Dentre os principals filósofos iluministas destacam-sc: Voltaire, um dos ideólogos do despotismo esclarecido, isto č, um absotutismo ilustrado voltado aos interesses da burguesia; Montesquieu, autor de O espirito das leis, em que defende a doutrina dos tres podereš -exeeutivo, legislativo e judiciário -, que dariam equilíbrio politico ao Estado; e Rousseau, autor de Discurso sobre a origem e a desigualdade entre os homens, em que defende ä tese da bondade natural dos homens, pervertidos poste-riormente pela sociedade. Dessa tese do hörnern natural nasceria a teória do "bom seivagem", com amplos reflexos na literatura indianista do Brasil. Arcadismo: expressäo artística da burguesia Foi nesse contexto de fcrmentacäo filosófica e lutas políticas que surgiu o Arcadismo, voltado para um ni^i publico consumidor, formado pela burguesia e pela classe média. Como expressäo artística dessas camadas sociaK i Arcadismo identifica-se com as idéias da Ilustracäo e veu .i-la-as sob a forma de valores que se opôem ao tipo de vida levado pelas cortes aristoerátieas e á arte que consumiam, o Barroco. Dai a idealtzacäo da vida natural, em oposicäo á vida urbana; a humildade, em oposicäo aos gastos exorbitantes -.11 nobreza; o racionalismo, em oposigäo á fé; a linguagem simples e dire ta, em oposigäo á linguagem prolixa e elitizante do Barroco. Esses valores artísticos e culturais assumiram. i.u contexto da sociedade europčia do século XVIII, um signifieado de clara contestacäo política, já que flagravam os privilégios da nobreza e do clero e propunham urna sociedade mais justa, racional e livre. Engajado no processo de luta ideológica e política qi:.-levaria a burguesia ao poder em 1789, o Arcadismo pode ser visto, sob o ponto de vista ideológico, como urna arte revolucionária. Contudo, do ponto de vista estčtico, é urna arte conservadora, pois ainda se liga á tradicäo clássica, tai'.n tempo cultivada pelas cortes aristoerátieas. IMíuiio O^unlc iskltlor UiK'lut V. Pirmin LouisDclluŕ - V''- DANTON V ~+ fl« f " - - N***- . ••>*♦•♦ .' • ''.-4^4.4 -ríf ~'&KK(tß^^ Hy'i. 1' m ■ V- , ■ - -xf- 7«-' , i. f ' j ." 'i ,ii--i ; ■.- i -i i- i '- # ť-i I " •■:<■'<<::.' . i-iií . 1 ,11 ■ [ ľi.H ,:-hl."|-l..., ■ -v>n . Somente no século XIX, após a Revolugäo Francesa. v1 que sc vera a verdadeira revolucäo burguesa na literatúra, com o surgimento do Romantismo. > I O Arcadismo no Brasil tem seu surgimento marcado por dois aspectos centrais. De um lado, o dualismo dosescritores brasileiros do século XVIII, que, ao mesmo tempo, seguiam os modelos culturais europeus e se interessavam pela natureza e pelos problemas específicos da coíonia brasileira; de outro, ajnfluéntiadas idéiasi iluministas sobre nossos escritores e iiitelectuais, que acarreíou o movimento da Inconfidencia Mineira e suas trágicas implicacóes: prisao, mořte, exílio, enforcamento. «■V í Arcadismo brasileiro originou-se e concentrou-se principalmente em Vila Rica (hoje Ouro Preto), Minas Gerais, e seu aparecimento teve relafao direta com o grande crescimento urbano verificado nas cidades mineiras do século XVIII, cuja base ecbriomica era a extrayao de ouro. O crescimento espantoso dessas cidades favorecia tanto a divulga9áo de idéias políticas quanto o florescimento de uma literatura cujos modelos os jovens brasileiros - provinďos das camadas privilegiadas daqucla socic-dade - foram buscar em Coimbra, jáljue a colónia nao lhes oferecia cursos superiores. E, ao retornarem de Portugal, traziam consigo as idéias iluministas que faziam fermentar a vida cultural portuguesa á época das inovacoes políticas e culturais do ministro Marqués de Pombal, adepto de algumas idéias da Ilustracao. FIQUE I PESOUP O século XVIII Fol miíitn importante para a liislňrin o para a literatura de iujssu pais. Neste capítulo voce uohIkkxir'i os autores Claudio Manuel da Costa e Tomas Antonio Gonza- ga, ambos envolvidos na Inconfidéncia Mineira, movimento de rebeliao politica que culminou com a mořte do primeiro, o exílio do segundo e o enforca-niuiilo clu Tiradentes. Para sabei mais sobre o assunto, siiqoniiios: : ao filme Os inconfi-üuiilvs (1972), de Jóaquim Pedro de Andrade. LER E fiFPKt (T/. *: frag-mentos da obra Ramanceiro da ínnonfidixinin, di: C<:t;ili;j Meimlfis, r(ii(! rolraUiu puolica-mento iik f.ilo-; Un Irnjoiifidän-cia n simis unvulvidos; uu da peca Aiona cu/iía Tiradentes. eriadn polos atces do Teatio de Arena, na década do (30. Essas ideias, em Vila Rica, levaram värios intelectuais e escritores a .sonhareni com a independencia do Brasil, principalmente apos a -lepercussao-da independencia dos Estadps Unidos da America (1776). Tais sonhos culminaram na frustrada Inconfidencia Mineira (1789). Cecilia Meireles, em seu Ronumceiro da Inconfidencia, registra o espirito febril provocado pelo ouro: ■ Mil galerias desabam; mil homens ficam sepultos; mil intrigas, mil enredos prendem culpados c justos; ja ninguem dorme tranqiiilo, que a noite e um mundo de sustos. Os árca«>n o £> t comic icjrtoa Os esciitores arcades mineiros tiveram participa9äo direta no movimento da Inconfidencia Mineira. Xhegados de Cöimbra com ideias .raicicjopcdistas pcla independencia^ dos EUÄ, provavel- mente näo apenas engrossaram as fdeiras dos revoitosos contra o erärio regio, que confiseava a maior parte do ouro extraido na colönia, mas tambem divulgaram os sonhos de um Brasil independente e contribuiram para a organizafäo do grupo inconfidente. Esses escritores eram Tomas Antonio Gonzaga, Alvarenga Peixoto e Claudio Manuel da Costa. Do grupo, apenas um hörnern näo tinha a mesma fprmagäo.intelectual dos demais nem era escritor: o alferes Tiradentes (dentista pratico), ma9om e.simpatizante dos ideais iluministas. Com a trai9Üo de Joaquim Silverio dos Reis, que devia vultosas somas ao governo portugues, o grupo foi preso. Todos, com exce9äo de Tiradentes, negaram sua participa9äo no movimento. Claudio Manuel da Costa, segundo versäo oficial, suicidou-se na prisäo antes do julgamento. Iii li i i ms lala 9 No julgamento, vários inconfidenles foram condenados á morte por enforcamento, dentre eles Tiradentes e Alvarenga Peixqfp,.Tomáš Antonio Gonzaga e outros foram condenados ao exílio tcmporário on perpétuo. T^räH^tój^úmiu para si a responsabilidade da lideranca.do grupo. No dia 20 de abril de 1792, foi comutada a pena de todos os participantes, excluindo Tiradentes, enforcado no dia scguinte. Seu corpo foi esquartejado c exposto por Vila Rica; seus bens, confiscados; sua família, amaldicoada por quatro geracôes; e o chäo de sua casa foi salgado, para que dele nada mais brotasse. Os eseritores brasileiros do século XVIII comportaram-se ein relacäo ao Arcadismo importado de um modo peculiar. Por um lado, procurayam obedecer aos princípios estabelecidos pelas academias literárias ou se inspiravam em certos eseritores clássicos consagrados, como Camöes, Petrarca, Horácio e outros. Alem disso, visando elevar a literatura da coiónia ao riívcl das literaturas européias c conferir a ela maior universalidade, tentavam eliminař os vestígios pessoais ou locais. Mas, por outro lado, todos os arcades nacionais acabaram por apresentar em suas obras alguns aspcctc^jliferentes daquilo que preserevia o modelo importado. Nossa natureza, na poesia de Claudio Manuel da Costa, aparece mais bruta e selvagem do que a européia; o mito do "hörnern natural" :i • ■ ■ culminou, entrc nós, no índio brasileiro, presente nas obras de Basílio da Gama e Santa Rita Duräo; a expressäo dos sentimentos é mais espontänea c menos convencional cm Tomas Antonio Gonzaga c Silva Alvarenga. Todos esses aspectos, caracteristicos da poesia árcade nacionál, serao mais tarde recuperados e aprofundados pelo Romantismo, movimento que buscou definir uma identidade nacionál em nossa literatura. Alem dessa espécie de adaptaeäo do modelo europeu a peculiaridades locais, näo se pode esquecer a forte influéncia exercida pelo Barroco, ainda durantc o século XVIII. Ouro Prcto, por exemplo, teve imiitas de suas igrejas concluidas somente quando o Arcadismo já vigorava na literatura. Dentre os autores árcades brasileiros, destacam-se: na lirica: Claudio Manuel da Costa, Tomas Antonio Gonzaga e Silva Alvarenga; na épicii: Busílio da Gama, Santa Rita Duräo e Claudio Manuel da Costa; na satira: Tomas Antonio Gonzaga; na encomiástica: Silva Alvarenga e Alvarenga Peixoto. O Arcadismo no Brasil iniciou-se oficialmente com a publicaeäo das Obras poéticas, de Claudio Manuel da Costa, em 1768. 4 ,'i i ' í i ! 1 ,;■> L < ii. j ' . í' > ' , i ŕ ' •( 1 'i. í i í i i ' f _ -i Claudio Manuel da Costa (1729-1789), tambem conhecido pelo pseudônimo pastoral de Glauceste Satúrnio, nasceu em Mariana, Minas Gerais, e, depois de estudar no Brasil com os jesuitas, completou seus estudos em Coimbra, onde se formou advogado. Em Portugal, tomou contato com as renovacöes da cultura portuguesa empreendidas por Pom bal e Verney. Ali também conheceu as novidades literárias trazidas pela Arcadia Lusitana. illll®ttfli=u : Ii ( ■ :■■ !)■■! ; i K -.I'lr.!.'..; !>>'i. • >::|. |-i. J .-1». It I ■, i i !■ í i. ,. • í I .| 1,1 ..!',.■'!.••'■ Jn'i I: :l- i.-.:.ľl , -, ■ • ■■ ! ■ ;;,;■[ . \ ; i.r i i ■( líi-. . r ■- i ' '. 1i =. , ■ J . i. '.'[ ■ ■ .i . . > l^lllljIgiSjSiißlij I i. , J,)n ; \ - n/ -v ; i ľ. .. ,.„. i , n , atilho: aquilo com que se ata ou anwrn, (io, uukIuI, , ■, , ' ■ , corda. I- .-.i i.i u HHHRH De volta ao Brasil, Claudio Manuel da Costa exerccu em Vila Rica a carreira de advogado e administrador. Sua carreira de escritor teve inicio com a publicacäo de Obras poeticas. Em 1789, foi acusado de envolvimento na Inconfidencia Mineira. Encontrado morto na prisäo, a alegacäo oficial para sua morte foi de suicidio. Com ampla formacäo cultural, Claudio liderou o grupo de escritores arcades mineiros e soube dar continuidade, apesar das limitacöes da colönia, ä tradi9äo de poetas clässicos. Seus sonetos apresentam notävel afinidade com a Urica de Camöes. Em virtude dessas ligacoes com a tradicäo clässica, sua obra e a que mellior se ajustou aos padröes do Arcadismo europeu. Porem, ainda e possivel notar influencias do Barroco em alguns de seus textos. Observe: Ja rompe, Nise, a matutina aurora , O negro manto, com que a noite escura, : Sufocandp do Sol a face purä, ■ Tiiiha c-cop.dido a ehama brilhadora Tambem encontram espa9o na poesia de Claudio Manuel da Costa as influencias da paisagem local: o ribeiräo do Carmo, rio que corta a regiäo; os vaqueiros, em lugar de pastores gregos; as montanhas e os vales; e as constantes referencias as penhas (pedras), que sugerem o ambiente agreste e rüstico de Minas Gerais: ; Destes penhascos fez a natiireza O berfo, em que nasci: oh quem cuidara, Que entre penhas täo duras se criara Uma alma terna, um peito sem dureza. O poeta cultivou a poesia lírica e a épica. Na lirica, tem destaquc o terna da desilusäo amorosa. A situa9äo mais comum em seus sonetos é Glauceste, o eu lírico pastor, lamentar-se por näo ser correspondido por sua musa inspiradora, Nise. On, entäo, lastima-sc por se enconlrar num lugar de grande beleza natural, mas näo estar acompa-nhado pela mulher amada. Nise é uma personagem fictícia, incorpórea, presente apenas pela cita9äo nominal. Näo se manifesta na rela9äo amorosa, näo é deserita físicamente, nem dá qualquer mostra de corresponder a alguém de verdade. Apenas representa o ideal da mulher amada inalcangável - nítido tra90 de reaproveitamento do neoplatonismo renascentista. Na épica, Cláudio esereveu Vila Rica, poema inspirado nas epopéias clássicas, que trata da penetra9äo bandeirante, da descoberta das minas, da funda9äo de Vila Rica e de revoltas locais. Esse poema possui, hoje, no conjunto da obra do autor, um valor menor do que a lírica, apesar de sua importäncia histórica. Eis alguns de seus versos: Enfím serás cantada, Vila Rica, Teu nome alegre notícia, e já clamava; Viva o senado! viva! repetia Itamontc, que ao longe o eco ouvia. Quando cheios de gosto. e de alegria Estes campos div.so floreseentes, Entao me vem as lagrimas ardentes Com mais ansia, mais dor, mais agonia. Aquclo mesmo objeto, que desvia Do humano peito as magoas iaclcmeales, Esse mesmo em imagens diferentes Toda a minha tristeza desafia. Se das flores a bela cotiiextura Esmalta o campo na melhor fragrancia, Para dar uma ideia da vcnuira; Como, 6 Ceus, para os ver terei consiaitcta, Se eada flor me lembra a formosura Da bela eausadora de minha ansia? (Em Pericles Eugenic- da Silva Ramos, org. Op. cit., p. 72.) di\ii(i: av:>lf. iiieleineiilcs: se*, en.-.. . igorosas. ťoiitcxturii: ligneii.i. I.rme/.a. i en tin a: sorte, felicidadc. ťonstäncia: firmeza, iinimo. ■BE 1. O soneto e construido apartir de relates de oposi9ao: de lira lado, as condicoes do eu lirico, e, de outro, as condi9des da paisagem bucolica. De acordo com as duas quadras do tcxto: a) Como se mostra a natureza? b) Como se sente o eu lirico diante desse quadro? c) Como, supostamente, deveria sentir-se? 2. Nos dois tercetos, d eu lirico diz estar "sem eonstancia" para continuar olhando a natureza. Por que? Qual e a causa do estado emocional em que se encontra? Tomas Antonio Gonzaga: a fenovagäo arcade O mais popular dos poetas arcades mineiros é Tomas Antonio Gonzaga (1744-1810). Sua obra ainda hojc é lida com intcrcssc pclo publico. Nascido no Porto, em Portugal, veio ainda menino com a família para a Bahia. onde viveu c cstudou ate a juventude. Posteriormente, fez o curso de Dircito cm Coimbra c. como Cláudio Manuel da Costa, lá teve contato com as idéias iluministas e arcades, chegando a escrever uma obra filosófica, em homenagem ao Marques de Pombai: Tratado de Direito Natural. Voltando ao Brasil, passou a viver em Vila Rica, onde exerceu a fun9áo de ouvidor da eidade. lniciou ali sua atividade literária e suas relagöes amorosas com Maria Dorotéia de Seixas, uma jovem de 16 anos que será cantada em sous versos com o pseudônimo de Marilia. Em 1789 Gonzaga foi preso, acusado de partieipar da Inconfidencia, e mandado ao Rio de Janeiro, onde ficou encarcerado até 1792, quando foi exilado para Mo9ambique. Apesar dos sofrimentos passados na prisäo - conforme os tristes versos escritos no cárcerc -, Gonzaga levou na Africa uma vida quase normal, casando-se, enriquecendo e envolvendo-se na política local. Quando a vida vira arte A poesia de Tomáš Antonio Gonzaga, se comparada á dos demais arcades brasileiros, apresenta algumas inovacoes que apontam para uma transicäo entre Arcadismo e Romantisme Incorporando muito de sua experičncia pessoal á poesia, eserita antes e durante a prisäo, Gonzaga conseguiu quebrar em grande parte a rigidez dos princípios arcades. Por exemplo, em contraposicäo á contencäo dos sentimentos, sua poesia é mais emotiva e mais espontänea. Em vez de uma mulher irreal, como a Nise de Claudio Manuel da Costa, a Marília de Gonzaga mostra-se mais humana, próxima e real. Observe esta descricäo do rosto de Marília: Na sua face mimosa, Marília, estäo misturadas purpureas folhas de rosa, brancas folhas de jasmim. Dos rubins mais preciosos os seus beicos säo formados; os seus dentes delicados säo pedaijos de marfim. Os temas arcades tradicionais do dis-tanciamento da mulher amada e do sofri-mento dele decorrente näo säo, no caso de Gonzaga, meros temas clássicos convencio-nais, mas assumem feigäo de pura verdade, considerando-sc o periodo em que o poeta esteve preso. Estou no inferno, estou, Marília bela; e numa coisa só é mais humana a minha dura estrela; : uns näo podem mover do inferno os passes; eu pretendo voar e voar cedo á gloria dos teus bracos. Essas experiéncias däo á obra de Gonzaga maior subjetividade, espontanei-dade e emotividade - tracos que seräo mais tarde aprofundados pelo movimentó titerá-rio subseqüentc, o Romantismo. Gonzaga cultivou a poesia lirica, reuni-da na obra Marília de Dirceu, e a poesia satirica, reunida nas Cartas chilenas, poema anönimo e incompleto cuja autoria lhe foi atribuida. A poesia lirica: Mmilia de Dirceu A poesia lirica e a parte mais conhecida da produeäo literäria de Tomas Antonio Gonzaga. Säo popularmente conhecidos, principalmente na regiäo de Minas Gerais, os amores entre Dirceu (pseudonimo pastoral de Gonzaga) e Marilia. Ale mesmo na literatura de cordel esse tema ja foi cantado pelos poetas populäres. Lira 77 Eu, Marilia, nao fui nenhum vaqueiro, fui honrado pastor da tua aldeia; vestia fmas líis e tinha sempre a minha choca do preciso cheia. Tiraram-me o casal e o manso gado, nem tenho a que me encoste um só cajado. Para ter que le dar, é que eu queria dc mor rebanho ainda ser o dono; prezava o teu semblanle, os teus cabelos ainda muito mais que um grande trono. Agora que te oferte já nao vejo, alem de um puro amor, de um sao desejo. Se o rio levantado me causava, levando a scmcntcira, prejuizo, eu aiegre flcava, apenas via na tua breve boca um ar de riso. Tudo agora perdi; nem tenho o gosto de ver-te ao menos compassivo o rosto. Ah! minha bela, se a fortuna volta, Se o bem, que já perdi, alcanco e provo por essas brancas máos, por essas faces te juro renascer um homem novo, romper a nuvem que os meus olhos cerra, amar no céu a Jove e a ti na terra! Se náo tivermos las e peleš finas, podem mui bem cobrir as carnes nossas as pclcs dos cordeiros mal curtidas, e os panoš feitos com as las mais grossas. Mas ao menos será o tcu vestido por maos de amor, por minhas máos cosído. Nas noites de seráo nos sentaremos cos filhos, se os tivermos, á fogueira: entre as falsas histórias, que contares, lhes contarás a minha, verdadeira. Pasinados te ouvirao; eu, entretanto, ainda o rosto banharei de pranto. cluiva: !iani:ac.'.o h.imilde. ťsisal: ^il v. pequeaa p.opik-daCL* ilove: pai dos deuses na milologia riiriaau cmiliei-idc limlxm ivivm cusidii: svislu ado. Quando passarmos juntos pela rua, nos mostrarao co dedo os mais pastorcs, dizendo uns para os outros: - Olha os nossos exemplos da desgraga e saos amores. Contentcs viveremos desta sorte, ate que cheguc a nm dos dois a morte. (Em Antonio Candido e J. A. Gastello. Op. cit., v. 1, p. 165-6.) 1. O poema pode ser dividido em duas partes: a primeira, que trata de uma experiéncia real, vivida no passado ou no presentc; c a scgunda, que envolve us pianos para o futuro. a) Idenlifique as estrofes que compôem cada uma das partes. b) Que tipo de vida levava o eu lirico, na primeira parte? Como se sentia? c) Que tipo de vida idealiza, na segunda parte? 2. O poema, apesar de apresentar tragos diferentes da orientagäo arcade, está ligado a essa tradigao. Retire do texto exemplos de bucolismo, pasloralismo, aurea mediocritas e elementos da cultura greco-latina. 3. O Arcadismo veicula valores e idéias da classe que o produz e o consome: a burguesia. a) Destaque do poema os versos relativos a dims situagöes em que fica clara a preocupagäo econômica e material do pastor Dirceu, indicio da ideológia burguesa. b) Destaque das duas ultimas estrofes valores próprios da moral burguesa da época. 4. Gonzaga é considerado um poeta inovador pelo fato de näo se premier tanto as regras do Arcadismo, a que estava filiado. Um exemplo disso é a introdugäo de experiencias pessoais em sua poesia. Supondo que o pastor Dirceu seja o proprio Gonzaga: a) O que lhe teria ocorrido, a ponto de fazc-lo pcrdcr os bens e a felicidade de viver? b) O ideal clássico de aurea mediocritas, no caso, é para ele apenas um tema literário (radicional? Por que? A poesia satirica: Cartas chilenas As Cartas chilenas säo um poema satirico, incomplete, que circulou em partes pela cidade de Vila Rica, cntre 1787-1788. Depois da Inconfidencia Mineira, essas cartas nunca mais apareceram pela cidade, o que fez supor que os seus autores ou o seu autor fosse urn dos poetas arcades presos: Claudio Manuel da Costa, Tomas Antonio Gonzaga c Alvarenga Peixoto. Estudos estilisticos feitos no seculo XX pclo especialista portugues Rodrigues Lapa atribuiram definitivamente a autoria a Tomas Antonio Gonzaga. A omissäo da autoria nas Cartas chilenas decorre do risco rcsultante de seu conteüdo: satirizavam os desmandos administratives e morais de Luis da Cunha Menescs, que governou a capitania de Minas entre 1783 e 1788. A obra é toda ini jogo de disfarces: Fanjar-rao Minésio é o pseudóiii-mo do governador; chilenas cquivale a minei-ras; Santiago, dc onde siio assinadas, equivale a I .'. Rica. O autor das cartas é identificado como Crit h>. e seu destinatário, como Doroteu. As Cartas chilenas säo a principal expressäo satirica da literatúra colonial do século XVIII. Trilhando os caminlios abertos por Gregório de Matos, Gonzaga dá continuidade á irregular tradigao satirica de nossa literatúra, ao mesmo tempo que oferece á historiografia um rico painel social e politico daqueles dois anos que prccederam a Inconfidencia Mineira. Embora a critica do poema tenha como alvo apenas o governador e seus asscssores, e näo o colonialismo portugues, fica clara a fragilidade da estrutura politica colonial e os abusos de poder praticados pela Coroa. Apesar de se supor que o poema tenha sido eserito para ser distribuído por Vila Rica em forma de panflcto, sua qualidade apresenta certa regularidade, só raramente caindo no panfletário. E, como se constatou, o poema ainda mantém alguma atualidade, acostumados que estamos a muitos fanfarrôes. O texto a seguir säo alguns fragmentos da 'Carta 7- , em que Critilo narra a seu amigo Doroteu o comportamento de Fanfarräo Minésio na cidade de Santiago. Näo cuides, Doroteu, que brandas penas me formám o colchäo macio e foto; näo cuides que é de paina a minha fronha e que tenho lengóis de fina holanda, com largas rendas sobre os orespos foJlios; custosos pavilhôes, dourados leitos e colchas matizadas näo se encontram na casa mal provida de um poeta, aonde há dias que o rapaz que serve nem na suja cozinha acende o íbgo. Mas nesta mesma cama tosca e dura, descanso mais contente do que dorme aquele que só pôe o seu cuidado em deixar a seus filhos o tesouro que ajunta, Doroteu, com mäo avara, furtando ao rico e näo pagando ao pobre. ľľts|)OS ľllIllllV .Ifil'ilfS Ľ.11 tll.l). IIlllli/iKl.ls: C'M'M Vit lil- COlt . tu-vii: ľim-'-ci... Aqiú... mas onde von, prezado amigo? Deixcmos episódios que näo servem, e vamos prosseguindo a nossa história. Apenas, Doroteu, o nosso chefe as rédeas manejou do seu governo, fingir nos intentou que tinha uma alma amantc da virtude. Assim foi Nero. Governou aos Romanos pelas regras da formosa justiga, porém logo trocou o cetro de ouro em mäo de ferro. Manda, pois, aos ministros lhe déem listas de quantos presos as cadeias guardam: faz a muitos soltar e aos mais alenía de vivas, bem fundadas esperangas. Estranha ao subalterno, que se arroga o poder castigar ao delinqíiente com troncos e galés; enfim, ordena que aos presos, que em trěs dias näo tiverem assentos declarados, se abram logo cm notné dele, chefe, os seus assentos. Aquele, Doroteu, que näo é santo, mas quer fmgir-se santo aos outros homens, pratica muito mais do que pratica quem scgue os säos caminhos da verdade. Mal se pöe nas igrejas, de joelhos, ahre os bracos em cruz, a terra beija, entorla o seu pescoco, fecha os olhos, faz que chorá, suspira, fere o peito e executa outras muitas macaquices, estando em parte onde o mundo as veja. Assim o nosso chefe, que procura mostrar-se compassivo, niio descansa com estas poucas obras: passa a dar-nos da sua compaixäo maiores provas. O povo, Doroteu, é como as moscas que correm ao lugar, aonde sentem o derramado mel; é semelhante aos corvos e aos abutres, que se ajuntam nos error«, onde fede a carne podře. A vista, pois, dos fatos, que executa o nosso grande chefe, decisivos da piedade que finge, a louca gente de toda a parte corre a ver se encontra algum pequeno alivio á sombra dele. (Em Samira Campedelli. org. Tomáš Antonio Gonzaga. Säo Paulo, Abril Educacäo, 1980. p. 66-70.) i;alé: .ui'isi.i cmb.ircav-10- fompii-da, movida a dezenas de ermo: lugar deserlo. 1. Na primeira estrofe do poema, antes de passar propriamente ao relato critico c politico, Critilo reflete sobre sua condicao e compara-a a do rico. a) Qual e a condigao social do poeta? b) Comparada sua condicao a do rico, a qual preferc? Por que? 2. E proprio da satira nao apenas ridicularizar algo ou alguem, mas tambem ccnsurar-lhc os crros. Que comportamentos de Eanfarrao Minesio sao criticados? 3. A pratica politica do governador chileno (ou mineiro) e muito conhecida da politica brasileira. Seu principio fundamental e ganhar o apoio do povo por mcio dc algumas concessoes de interesse popular e, com base nesse apoio, obter regalias no poder. A esse tipo de politica se da o nome de populismo. De acordo com a ultima estrofe do texto, que tipo de relagao o povo muntem com seu governante? Silva Alvarenga Deixo, 6 Glaura, a triste lida Submergida em doce calma; E a minha alma ao bem se [entrega, Que Ihe nega o teu rigor. Neste bosque alegre e rindo Sou amante afortunado, E desejo ser mudado No mais lindo Beija-flor. O Beija-flor Toco o néctar precio , Que a moitais näo si >ermite; E o insulto sem limit Mas ditoso o meu ai )r; .74 me chamas atrevido, Já me prendes no regaco; Näo me assusta o terno laco, É fingido o meu temor. Todo o corpo num instante Se atenua, exala e perde: É já de oiro, prata e verde A brilhante e nova cor. Deixo, ó Glaura, a triste lida Submergida em doce calma; E a minha alma ao bem se [entrega, Que lhe nega a teu rigor. Vejo as penas e a figura, Provo as asas, dando giros; Acompanham-me os suspiros, e a ternura do Pastor. E num v.öo feliz ave Chego intrópido ató onde Riso e pérolas esconde O suave e puro Amor. Deixo, ó Glaura, a triste lida Submergida cm doce calma; E a minha alma ao bem se [entrega, Que lhe nega o teu rigor. Deixo, ó Glaura, a triste lida Submergida em cloce calma; E a minha alma ao bem se [entrega, Que lhe nega o teu rigor, Se disfarcas os mens erros, E me soltas por piedade; Náo estimo a liberdade, Busco os ferros por favor. Nao me julgues inocente, Nem abrandes meu castigo; Que sou barbaro inimigo, Insolente e roubador. Deixo, ó Glaura, a triste lida Submergida em doce calma; E a minha alma ao bem se [entrega, Que lhe nega o teu rigor. (Em Antonio Candido e J. A. Casleiio. Op. cil., v. 1, p. 179-80.) II Ii I , . i> i- l.ii ,'| ... i i i l!' , *lr I ■HHHHHHflHi WĚm v. i A literatura colonial do séeulo XVIII, tomando como modelo o Classicismo do século XVI, traz a tona novamente o gosto pělo poema épico. A gi^ándTnovld^TcoM^ encontra-se no terna: o índio brasileiro e seu ambiente natural. O indianismo árcade, ao mesmo tempo que desperta a consciéncia nalivisla na cultura colonial brasileira, \ lanca também as bases de uma ťértil tradicao em toda a nossa literatura. ' > épica arcade é representada principalmente pelas obras O Uraguai, de Basílio da Gama, e GciramurLi, de Santa Kila Duräo. Esses poemas, alem de conferem idéias iluministas, apresentam também certos aspectos inexistentes na épica européia: o indianismo e o exotismo da paisagem colonial. Embora semelhantes no tenia, esses dois poemas apresentam entre si diferencas profundas quanto a enfoque, técnicas e ideológia. Basílio da Gama: O Uraguai Basílio da Gama (1741-1795) nasceu em Minas Gerais, na cidade hoje chamada Tiradentcs. Estudou em colégío jesuita, no Rio de Janeiro, e tinlia intencäo de ingressar na carreira eclesiástica. Completou seus estudos em Portugal e na Itália, no periodo em que os jesuítas foram expulsos dos domínios Portugueses. Na Itália, Basílio construiu uma carreira literária, _ tendo conseguido uma faganha única entre os brasilciros da época: ingressar na Arcádia Romana, na qual assumiu o pseudônimo de Terinindo Sipílio. Em 1767 voitou ao Rio de. Janeiro, onde foi preso no ano seguinte, acusado de ler amizade com os jesuitas. De acordo com um j decreto recentc, qualquer pessoa que tiyesse mantido comunicacao com os jesuitas, oral ou escrila, deveria i fi'car exilada durante oilo anos, em Angola. | Preso, Basilio da Gama foi levado a Lisboa. La, livra-se da j prisäo por fazer um poema em homenagem ä filha do Conde de Oeiras, futuro Marques de Pombai. Essa amizade lhe abriujiqyos conta-tos com os arcades Portugueses e lhe XiermitiiL escrever sua obra maxima, O Uraguai. Publicado em 1769) O Uraguai e considerado a melhor realizaeäo no genero epico no Arcadismo brasilei-ro. Sen tenia c a luta de Portugueses e espanhöis contra indipse jesuitas, instalados nas missöes jesuiticas do atual Rio Grande do Stil, que näo quenam aeeitar as decisöes do Tratado de Madri. i A quebra do modelo clássico O poema narra todo o processo da luta, desde os preparativos até a conclusáo. Os cantos apresentam esta seqůéncia de fatos: • Canto I: a juncao das tropas aliadas para combater os índios e jesuítas. • Canto II: o exército avanga e há uma tentativa de negociagao com os ehefes indígenas Cepe e Cacambo. Sem acordo, trava-se a luta, que termina com a derrota e a retirada dos índios. • Canto III: Cacambo aleia fogo á vegetagao em volta do acampamento aliado e foge para a sua aldeia. O padre Balda, vilao da história, faz prender e matar Cacambo para que seu filho sacrílego Baldeta possa casar-se com Lindóia, a esposá de Cacambo, e tomar a posicao do chefe indígena morto. Lindóia tem uma visao que prevé o terremoto de Lisboa e a expulsáo dos jesuítas por Pombal. • Canto IV: o mais bonito dos cinco cantos, retrata os preparativos do casamento de Baldeta (filho do jesuita Balda) com Lindóia. Esta, chorando a mořte do marido e nao desejando casar-se, entra num bosque e deixa-se picar por uma cobra venenosa. Ao mesmo tempo chegam os brancos, que cercam a aldeia. Todos fogem; antes, porém, os padres mandám queimar as casas e a igreja. • Canto V: o lider portuguěs Gomes Freire de Andrade prende os inimigos na aldeia próxima e há referéncias ao domínio universal da Companhia de Jesus e a seus crimes. "ľ ľi ľ <•< inj fi > ; u-1 n • - 'I > i i i' i ľ '<■- :\ 'I l"í [.'• .1 >''i i ľ.'.í .1.1 ..| i I v ■ r 'hi )•.' • >i, • i- >y i i l.i i, .ti: i |i, i i 'i i ;').IH 1,1 I UM-i- -.1' >'lt ľľ.l t 1 H . U 1 |..'l-,'!„ 1 ■ ' IjVli'll. * líi- !>>' I ll I.'!) ' . í ' ilľ-i-: , " i !•)/ • ''>i"i - i.i Ii i-'.i : i 'ii. m' l,'ľl i f''1 •! f''' 'I' 1 '■ í H í ,11 iJ|(;.S . 1,1 1 ,H l,'l Iľi , >-( i i i-:i.-f.i-'|'.i ' i. Ii Vi».. ■ « '' i, r.'l ' , i . , i-M"'i':l.i • ; >.l i i"iíľiŕ l.lii' í -i ■ . . i>i1i;.^h," '-u -i , mi......ii.ii- i-' • I, •■'-! lil-'I I l.ľ <1'( ilkl 1 '.,l..|| , , 1.1 , .-; ' i 1 1 ■ i ■ . ! í .... 1.1 ' ! ■■ i ' ■ i ' !l i- ľi :|ln r' i -. ■ ■ : i. r ',).. Escrito em apcnas cinco cantos, com a utilizacäo de versos brancos (sem_. rima) c sem estrofacäo, O Uraguai näo segue a estrutura camoniana de Os lusíados. Além disso, embora apresente as cinco partes tradicionais das epopéias - proposicäo, invocacäo, dedicatória, narrajao e epílogo -, o poéma já se inicia em plena acäo: Fumam ainda nas desertas praias Lagos de sangue tépidos e impuros Em que ondeiam cadáveres despidos, Pasto de eorvos. Dura inda nos vales O rouco som da irada artilhería. O fato de o autor tratar de um episódio histórico mais ou menos recente (na época, ocorrido há pouco mais de dez anos) c outro aspecto que diferencia O Uraguai de outros poemas ópicos tradicionais. Quem é o herói da história? Como obra de inten-côes épicas, é de esperar que o destaque seja dado aos movimcntos de guer-ra e aos atos de heroísmo. Contudo, näo é exata-mente o que se verifica. Ao contrario, a propria guerra chega a ser ques-tionada como meio de atuacäo política, o que revela urna postura tipi-camcntc iluminista da parte do autor, cujas idéias coincidem com as de seu amigo Marques de Pombai. Observe: Vinha logo de guardas rodeado, Fönte de crimes, militar tesouro, Por quem deixa no rego o curto arado O lavrador, que näo conheee a gloria; :. E vendendo a vil preco o sangue e a vida Move, e nem sabe por que move a gueira. O lieröi portugues Gomes Frcire de Andrade, que liderou as tropas luso--espanholas, tambem näo possui o entusiasmo dos heröis epicos tradicionais: : ... Descontente e triste : Marchava o General: näo softe o peito ; Compadecido e generosa a vista '; Daqueles friös e sangrados corpus, \ Vitimas da ambicäö de injusto imperio ;: Apesar dessa atitude, o fato historico nao e alterado, e espanhois e Portugueses saem vencedores da batalha. Do lado inimigo, apenas os jesuitas sao verdadeira-mente Iratados pelo texto como viloes - outro traco da obra que atende aos intercsses do Marques de Pombal, entao amigo do autor. Por fim, restam os indios, os derrotados, tratados com simpatia. Talvez ate se possa dizer que, pclo enfoque do autor, os indios sejam vitimas da acao jesuitica na regiao e dos conflitos que dela resultaram. Destacadas a forca e a coragem do indigena, fica claro que a derrota se da apenas em virtude da desigualdade de armas. O indio seria uma especie de hcroi moral da luta, dadas suas qualidades morais: Fez proezas Sepe naquele dia. : "Conhecido de todos, no perigo Moslrava descoberto o rosto co peito Forgando os seus co exemplos e coas palavras. Illlll? EM8Ü ■i.l:f-I-l;r.. . t IcliiĎVlľ. Nativismo em O Uraguai O poema näo enfatiza a gueria em si, nem as aeöes dos vencedores, nem os viloes jesuítas -tratádoš čaricaturalmente. Ganham destaque, de fato, a descrijäo fisica e moral do índio, o choque de culturas e a paisagem nacionál. Além disso, o 'autor eria passagens de forte lirismo, como o episódio da mořte de Lindóía, a ser estudado. Observe a valorizaeäo da paisagem brasileira nestes versos:" Que alegre cena para os olhas! Podem Daquela altura, por espafo imenso, Ver as longas campinas retalhadas De trémulosiribeiros, claras fontes, E lagos eristalinos, onde molha : As leves asas o lascivo vento. Engragados outeiros, fundos vales, Verde tealro, onde se admira quanto Produziu a supérflua Natureza. A valorizaeäo do índio e da natureza sel vagem do Brasil, por um lado, corresponde aos ideais iluministas e árcades da vida primitiva e natural, que o índio nacionál encarna de forma absoluta. Mas, por outro lado, esses aspectos, que podemos chamar de nativistas, prenuticiam as tendéncias da nova literatura que surgirá no século XIX: o Romantismo. O grande massacre da selva amazônica Numa sucessäo de trés ataques, garimpeiros clandestinos da Amazonia massaeram uma aldaia ianomámi. Os homens foram mortos a tiros, as mulheres esfaqueadas e as erianjas degoladas. (Ve/a, 25/8/93.) i : :í 9. %4 i ímliiis iiiiiiniiriniis, nlvos de ^tirinipĽinis. O feci Santa Rita Duiäo (17227-1784) nasceu em Minas Gerais, na cidadc de Mariana. Como Basílio da Gama, também estudou no Colégio dos Jcsuítas e completou seus estudos em Portugal. Lá ingressou na vida rcligiosa e tornou-se professor de Teológia. Afirmando que a razäo de seu poema Caramuru era "o amor á patria", embora tivesse vivido quase todo o tempo em Portugal, Saiífa Rita confirma a tendencia nativista de seu poema. Caramuru: um retrocesso? O poema de Santa Rita Duräo foi publicado cm 1781, doze anos depois da publicajäo de O Uraguai. E provävcl ate que Santa Rita tenha sido ( estimulado pela publicaeäo de Basilio da Gama. Contudo, hä diferencas fundamentals entre os dois poemas. Santa Rita, na eondicäo de religioso, näo apresenta naturalmente o anti-jesxütismo de seu colega. Ao contrario, valoriza a aeäo catequetica dos jesuitas com os indios, num enfoque inteiramente cristäo. Do ponto de vista literärio, as liberdades formais e liricas alcancadas por Basilio da Gama säo ignoradas por Santa Rita, que em seu Caramuru , segue rigidamente o modelo camoniano: poema com dez cantos, cm oitava-' rima, com versos decassilabos e estrutura convencional. Como em Camöes, ha tambem a presenca' dos maravilhosos cristäo e pagäo (no caso, deuses indigenas, em vez da mitologia greco-latina). Santa Rita, apesar de distante do Brasil desde os nove anos, procura ressaltar a natureza brasileira, descrevendo o clima, a fertilidade da terra, as riquezas naturais, aliando-sc assim ä tradicäo dos cronistas e viajantes que descreveram a colönia no seculo XVI. Alem disso, intcressa-se particular-mente pelo indigena, descreve seus costumes e instituiföes e ressalta sua catequese. Contudo, percebe-se em seu poema certo artificialismo proprio de quem leu sobre o pais, mas näo o vivenciou de perto. Por isso, Caramuru e eonsiderado poema inferior a 0 Uraguai e, de certa forma, um retrocesso . do ponto de vista temätico e estilistico. ou dos costumes indigenas, pela otica crista: - -, ■ n ■ .Que horror da humanidade! ver tragada Da propria especie a earne ja corruta! Quanto nao deve a Europa abencoada A fe do Redcntor, que humilde escuta! A morte pnr amnr: uma pausa lírica '! Tanto O Uraguai quanto Caramuru apresentam, em meio á especificidade da matéria épica, momentos líricos de significativa beleza. Esses episódios despertam interesse, pois ao lado dos aspectos próprios da cultura indígena está o tema universal da morte por amor. O tema de Caramuru O poema nana as aventuras, em parte histöricas, em parte lendärias, do näufrago portugues Diogo Alvares Correia, o Caramuru. Em meio äs aventuras do protagonista, o autor aproveita para fazer longa descricäo das qualidades da terra, como nestes versos: Näo säo menos que as outras saborosas As värias frutas do Brasil campestres; Com gala de ouro e purpura vistosas i Brilha a mangaba e osmoeuj6s silvestres. Os textos que seguem sao, respectivamente, de O Uraguai e Caramuru. Leia-os com atencao. Tcxto I Os indios já haviam perdido a guerra e, reunidos na tribo, enquanto csta nao era atacada por espanhóis e Portugueses, preparam-se para a cerimónia de casamento de Lindóia com Baldcta, que. sendo fllho sacrilege do jesuita Balda, tem ga ran lido o papel de chefe da tribo. Lindóia, contudo, náo está interessada na ccrimdnia. Sabendo da morte de seu marido Cacambo na guerra, retira-se desgostosa e entra em uma floresta. Caitutu, seu irmao, e outros indios váo procurá-la. J Entatm enfímna mais remota e interna Parte de antigo bosque, escuro e negro, Onde ao pé deuma lapa cavernosa Gobre uma rouca fonte, que miirmura, Curva latada de jasmins e rosas. Este lugar delicioso e triste, Gansada de viver, tinha escolhido Para morrer a mísera Lindóia. Lá reclinada, como que dormia, Nabrandarelva e nas mimosas flores, Tinha a lace ua mao, e a mao no tronco De um funcbre cipreste, que espalhava Melancólica sombra. Mais de perto Descobiem que se enrola no scu corpo Verde serpente, e lhe passeia, e tinge r Pescoyo e bracos, e lhe lambe o seio. > ; Porém o dcstro Caitulu, que treme Do perigo da irma, sem mais demora ; Dobrou as pontas do areo, e quís trés vezes Soltar o tiro, e vacilou trés vezes Entre a ira e o temor. Enfim sacode O areo e faz voar a aguda seta, Que toca o peito de Lindóia, e fere A serpente na testa, e a bocae os dentes Deixoxt cravados no vizinho tronco, Aeouta o campo coa:ligeira Cauda O irado monstro, e em lorruosos giros Se enrosca no cipreste, e verte envolto Em negro sangue o lívido veneno. Leva nos bracos ainfeliz Lindóia O desgracado irmäo, que ao despertMa Conhece, com que dor! no trio rosto Os sinais do veneno, e vé" ferido Pelo dente sutil o brando peito. Os olhos, em que Amor reinava, um dia, Cheios de morte; e tnuda aquela lingua ä Que ao surdo vento e aos ecostantas vezes Contou a larga história de seus males. Nos olhos Caitutu näo sofre o pranto, Ii rompe cm proftindissimos suspires, Lendo na testa da fronteira gruta De sua mäo já tréimila gravado O alheio crime e a voluntária morte. E por lodas as partes repetido O suspirado nome de Cacambo. Inda eonserva o pálido semblante * Um näo sei qué de magoadoe triste; Que os coracöes mais duros enternece. Tanto era bela no seu rosto a morte! s(Basílio da Gama. Em Antonio Gandido J o .1. A. Oar,tol!o. Op. cit., v. I, p. 150-1.) Texto n Os chefes iridigenas oferecem as fllhas a Diogo Alvares, para se honrar com seu parentesco. O lusitano aeeita o parentesco, mas näo as donzelas, por casta fidelidade a Paraguacu. Tomado por saudades da Europa, embarca numa nau francesa com Paraguacu. Moema, uma india, desesperada de o ver partir com outra, tenta acompanhä-lo, nadando, e diz estas palavras: - "Barbaro (a bela diz:) tigre e näo homem... Porém o tigre, por cmel que brame, Acha foreas amor, que enfim o domem; :Sóa ti näo domou, por mais que eu te ame. OPôrias, raios, coriscos, que o ar consomem, Gomo näoconsumis aquele ŕnfame? ■ Mas-pagar tanto amor com tédio e asco.:. Ah! que corisco és tu... raio... penhasco! Täo dura ingratidáo menos sentira B esse fado cruel doce me fora, Se o. meu despeito triünfar näo vira j-Esaa: indígna, essa infame, essa traidora. Por serva, por eserava, le seguira. Se näo temera, de chamar senhora A vil Paraguacu, que, sem que o cicia. Sobre ser-mc inferior, é néscia e feia. Enfim, tens coraeäo de ver-me aflita, KluUiar, moi'ibunda, entre cstas ondas: Nem o passado amor teu peito incita A um ai somente, com que aos meus respondas. Barbaro, se esta fé teu peito irrita, (Disse, vendo-o fugir) ah! näo te escondas Dispara sobre mim leu cruel raio..." E indo a dizer o mais, cai num desmaio. : Perde o lume dos olhos, pasma e trcme, Pálida a cor, oaspecto moribundo;; Com mäo já sem vigor, soltando o leme, Entre as salsas escumas desce ao fundo. Mas na onda do mar, que, irado, fremc, Tornando a aparecer desde o profundo, - Ah! Diogo cruel! - disse com mágoa, -E sem mais vista ser, sorveu-se na água. (riei Joséde Santa Rita Duräo. Em Hemani Cldade. Santa Rita Duräo. Rio de Janeiro, Aglr, 1957. p. 8?-8.) 1. Estabeleca diferen$as entre os textos, quanto ao seu aspecto formal. 2. Que semelhanca apresentam os textos quanto ao assunto? 3. Em relaciio ao texto I: a) Dcscrcva o lugar que Lindoia escolheu para morrer. b) A paisagem descrita e arcade? .lustifique. 4. Em relacilo ao texto II: a) Como Moema descreve Diogo Alvares e Paraguacu? b) Entre a fala do narrador e ii fala de Moema nao ha difcrencas hngiiisticas. A que conclusao sc pode chegar a partir dessa constatacao? 5. Compare os dois episodios e indique: a) o mais dramatico; justifique; b) aquele que mais enaltece o indigena, mostiando-o integrado a natureza. Justifique. (Fatec-SP) Sobre o Arcadismo brasileiro só näo se pode afirmar que: a) tem suas fontes nos antigos autores gregos c latinos, dos quais imita os motivos e as formas. b) teve em Cláudio Manuel da Costa o representante que, de Torma original, recusou a motivacäo bucólica e os modclos camonianos da lírica amorosa. c) nos légou os poemas de feÍ9äo épica Caramum (de Frei José de Santa Rita Duräo) e O Uraguai (de Basílio da Gama), no qual sc reconhece qualidade literária destacada cm relacflo ao primeiro. d) norteou, em termos dos valores estéticos básicos, a producäo dos versos de Marilia de Dirceu, obra que uelebrizou Tomáš Antônio Gonzaga e que destaca a originalidade de estilo e de tratamento local dos temas pelo autor. e) apresentou uma corrente de conotacäo ideológica, envolvidii com as questôes sociais do scu tempo, com a erítica aos abusos do poder da Coroa Portugucsa. Texto para as questöes 2 e 3: Eu, Marilia, näo sou algum vaqueiro, Que viva de guardar alheio gado, De tosco trato, de expressöes grosseiro, Dos Trios gelos e dos sóis queimado. Tenho proprio casal, e nele assisto: Dá-me vinho, legume, fruta, azeite, Das brancas ovelhinfias liro o leite, E mais as finas las, de que me visto. Gracas, Marilia Bela, Gracas á minha Estrela! 2. (Fuvest-SP) Escreva os termos que preenchem corretamente as lacunas do texto abaixo: A estrofe aeima foi extraida de Marilia de Dirceu (Liras), do poeta A, representante da estética A _____ ■_____ _ _t - A t—J„ _____(-.* :---!~ An A A, que viveu no século A, tendo participado da A. (Fuvest-SP) Os dois versos curtos que fmalizam o'fragmente säo repetidos em todas as estrofes da composicäo.' a) Que nome recebem? b) Qual a sua funcäo? II JOT O ill A ^DCIAI.ÜD iÍDl>JAl'í'IJ-£ií>JD Neste capítulo e nos próxi-mos, vocě estudará a literatura roinäntica e suas relacöes com os contextos europeu e brasileiro. Para saber mais sobre o assunto, ü'.irjerimos; - ■ ii i '.: aos Almes Danton - O processo da revokiqáo (1982), de Andrzej Wajda; O retrato de Goya (1971) , de Konrád Wolf; Os mi-seráveis (1982), de Robert Hos-sein, baseado na obra de Victor Hugo; Independéncia ou mořte (1972) , de Cartos Coimbra. ','< il sobre as idéias do pensador iluminlsta Jean-Jacques Rousseau, que também foi oscritor romantice e verificar em que medida as idéias expostas em suas obras, principalmente em Contrato social e Emílio, inťluen-ciaram a ideologia romántica, (.'./•"'■ i: a pintura romántica de Goya, Delacroix, Gros e outros. '...ai / i": a música dos compo-sitores romantioos Schubert, Schumann, Mendelssohn, Chopin, Berlioz e Liszt. in'!. Ji.'Mi-l >íj'.. 1 ,.....].'( ;. -i :1( i«/.jnf.; r'/flv ,,i ií|i,miih , No contexto do Renascimento, no século XVI, o interesse pela cultura clássica representava o gosto pclo novo e pela cultura leiga. Contudo, nos séculos seguintes, cada vez mais essa cultura clássica identificou-se com a aristocracia, formada pela nobreza e pelo clero. O Romantismo, como expressáo artistka da burguesia, que chega ao poder em 1789, näo se identiíica com esses padrôes artísticos e busca novas formas de expressäo, mais adequadas a seu publico consumidor. Daí seu interesse pela espontaneidade, pelos sentimentos e pela simplicidade. Uma revulucäo na arte O Arcadismo foi mna arte revolucionária, do ponto de vista ideológico, porque expressava os interesses da burguesia, classe social que iria promover a Revolucäo Francesa. Porém o mesmo näo se pode dizer quanto ao aspecto estético, uma vez que, fundamentalmente, o Arcadismo se limitou a eliminar os exageros do Barroco e a retomar os modclos do Classicismo do século XVI. A tarefa de criar uma linguagem nova, identifieada com os padrôes mais simples de vida da classe média e da burguesia, caberia ao Romantisme Assim, a arte ro-mäntica pôe f im a uma tradicäo clássica dc trés séculos e dá ínício a uma nova etapa na literatura, agora voltada aos as-suntos de seu tempo -efervescéncia social e política, esperanta e paixäo, luta e revolu- i / cäo e ao cotidiano do homem burgués do século XIX. A linguagem utilizada para atingir o seu publico é mais direta e simples. 'ivemos numa sociedade burguesa moderna ou pós-moderna, segundo alguns. Vemos e sentimos o mundo de acordo com as transformacöes ocorridas no século XX. No século XIX ainda näo havia computador, aviäo, automóvel nem televisäo. As notícias éram levadas a cavalo, e o mundo mudava lentamente. Apesar disso, o homem atual guarda muitas semelhancas com o homem romäntico do século XIX: ambos originam-se de uma sociedade burguesa, que pôs fim ao Antigo Regime; ambos sonham com idéias de igualdade e justica social; ambos apresentam tratjos individualistas ou narcisistas. Ainda hoje muito da cultura romäntica, que marcou o início do século XIX, está presente nas músicas de rádio, nas novelas da tevé, nos eomportamentos sociais. Isso se deve ao fato de o Romantismo ser a expressäo artística de um periodo histórico que ainda perdura, a Idade Gontemporänea, introduzida pela Revolucäo Francesa (1789) e pela asccnsäo da huniuev.u ao ■lodě:1. ! in -3- Sali i n • 1 l'HI i 21 época ( !.I',-.I.-1MIU j li.lll.lLľ Arcadismo Se o artista arcade centrava sua arte na razäo, o artista romäntico a centra no corapäo. Por isso a fantasia, o sentimentalismo, a impulsividade e o exotismo romänticos näo tém limites e quebram os padrôes da heranca clássica. Trala-se, portanto, de uma arte com valores diferentes, mais espiritualistas, contrários ao cientificismo e ao materialismo iluminista do século anterior. A arte clássica apreciava a clareza e a razäo; por isso, podemos chamá-la de "diurna". O Romantismo, ao contrário, aprecia o mistério, a solidäo, o eseuro, o conflito, a morte; por isso, podemos chamá-lo de arte "noturna". ■ mmm WSBSSm mm O encontro da vida e da arte Os artistas da tradicäo clássica achavam que uma obra de arte era boa quando se aproximava dos modelos greco-latinos. Já para o artista romántico, a arte näo deve ser imitagäo, mas expressäo direta da emocäo, da intuicäo, da inspiracäo e da espontaneidade vividas por ele na hora da criacäo. Por isso a obra romäntica, a seu ver, näo pode ser retooada após a concepcäo, pois isso pode comprometer a autenticidade e a qualidade do trabalho. Crendo nisso, os artistas romänticos vivem em busca de fortes emocôes e aventuras para que possam colher experién-cias criadoras. Nessa busca, alguns chegaram até a se envolver com o alcoolismo e drogas ou com um sentimento de pessimismo quase suicida; outros, ao contrário, participaram de lutas sociais, colocando-se como líderes da humanidade. O antigo conceito grego de beh na arte é abandonado pelos romänticos, que defendem a uniäo do grotesco e do sublime, isto é, do feio e do bonito, assim como säo as coisas na vida real. De modo geral, pode-se dizer que o Romantismo marca urna importante mudanga de postura na arte: a proximidade maior entre vida e obra, e entre obra e realidade circundante. M :ífK"f ä. liiBii Ä linguagem cla poesla romäntica O estudo do texto a seguir leva a identificar algumas características da linguagcm da poesia romäntica; na sequéncia säo destacados outros aspectos que marcam o conjunto da producäo poética do Romantismo. O texlo a ser lido e o conhccido poema de Gon9alves Dias, a 'Cancao do exilio', escrito pelo poeta em 1843, quando se encontrava em Coimbra realizando seus estudos universitarios. Trata-se, portanto, de um exilio voluntario, e nao politico. Cancäo du cxiliii Keimst du das Land, wo dk Cilrunen blitfin, Im dunkeln Laub die Gold-Orangen Gliihn, Kennst du es wohl? - Dahin, dahin! Mächt ich... zieht.* (Goethe) Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiä; As aves, que aqui gorjeiam, Näo gorjeiam como lä. Nosso Ceu tem mais estrelas, Nossas värzeas tem mais flores, Nossos bosques tem mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, ä noite, Mais prazer encontro eu lä; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiä. Minha terra tem primores, Que tais näo encontro eu cä; Em cismar - sozinho, ä noite Miiis prazer encontro cu lä; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiä, Näo permita Deus que eu morra Sem que eu voltc para lä; Sem que desfrute os primores Que näo encontro por cä; Sem qu'inda aviste as palmeiras, Onde canta q Sabiä. (Em Beth Brait, org. Goncalves Dias. '."••': Säo Paulo, Abril Educagäo, 1982. p. 11-2.) "Conheces o pais onde florescem as laranjeiras? Ardem na escura fronde os frutos de ouro. Conhecě-lo? - Para lá quisera eu ir!" (Tradncäo de Manuel Bandeira.) SEE WĚĚĚ. liTillj < 'i "i. WS V fflHS mm Voce sabe que, durante a Era Classica, o verso decassilabo e o soneto foram bastante utilizados. Observe a estrutura formal do poema dc Gongalves Dias e responda: a) Como se caracteriza seu vocabulario e suas constructs frasais? b) Que tipo de verso foi empregado? O numero de versos por estrofe e semprc o mcsmo? c) Observe que a mctrica destes versos populares, de cantigas de roda e de autoria desconhecida, e ii mesma do poema lido: Teresinha de Jesus De uma queda foi ao.chäo... Batatinha quando nasce Se esparrama pelo chao... Que inten9äo pode ter tido o poeta ao empregar essa métrica? d) Conclua: Comparando-se a linguagem romäntica á linguagem clássica, o que essas novidades rcpresentam? Qual delas se encaminha no sentido de maior liberdade de cxpressäo? 2. O poema está organizado a partir da oposifäo entre dois espagos: a patria - com os elementos que n caracterizam- e o exilio (Coimbra). a) Que palavnis do (exlo evidenciám essa antitese? b) Como é cada um desses espagos para a eu lirico? c) Que sentimentos ele manifesta em relagäo a patria? d) Esses sentimentos säo expressos sobretudo em relagäo á natureza brasileira: palmeiras, sabiá, bosques, etc. O eu lirico é objetivo e imparcial ao descrever essa natureza? Por que? 3. O nativismo, conforme voce já cstudou na obra de poetas arcades, signifies a presenca, nos textos lilerários, de alguns vestigios da natureza ou da vida social do Brasil. Naeionalismo, por sua vez, é um conceito mais amplo, porque envolve a idéia de nagäo, povo e de uma identidade cultural que os represcntc. Voce acba que o poema de Gongalves Dias é nativista ou nacionalista? Justifique. WIĚLsmmtĚ uf i i i 11- '>(»<-[• i "-.'Ii .lrt.|^?H ii li'l .»l-t ii 1 mi I a; i j "V[-"íi i ' i i !■ ii i.I L.0'fl't> 1 I i I .-'I" vji AmpĽando o estudo do texto No poema dc Gonyalves Dias há uma exaltacäo da natureza, o que pode remeter ao bucolismo árcade. Porém, enquanto no Arcadismo a natureza se configura como tim quadro idealizado e passivo no qual sc desemolam as acôes dos pastores ficticios, no Romantismo ela interage com o cu lirico; é um espa90 de redeii9ao, em que o poeta se purifica dos males contraidos da civiliza9äo. Em 'Can9äo do exilio', a natureza se confunde com primitivismo, com americanismo, em contraste com Coimbra, metropole civilizada, centro da cultura portuguesa nos séculos XVIII e XTX. No rundo, é uma postura que cvoca as idéias de Rousseau; a civiliza9äo, corruptora do homem, em oposÍ9äo á sclva, genitora do "bom selvagem". O emprego de palavras indígenas como pahneira e sabiá refor9a seu caráter primitivista e indianista, näo explícito no poema. Por meio de uma rela9äo metonímica, o autor sugere pela parte - palmeiras c sabiá - o todo, o Brasil. O sabiá, personifieado pela letra iniciál maiúscula, aparece quatro vezes no poema e, ao rimar com os monossílabos cá e lá, cria uma sonoridade muito brasileira, nunca antes vista cm nossa poesia colonial ou na poesia portuguesa. A reitera9äo sonora da palavra sabiá forma uma espécie de gorjeio no interior do proprio poema: é o canto do pássaro se confundindo com o canto do homem. Assim como o canto do pássaro é monótono e triste, igualmente o canto do homem é uma nostálgica can9äo de saudade da pátria. A sele9§o vocabular, a utiliza9äo de ritmos e sonoridades ao gosto da sensibilidade brasileira, a idealiza9äo da natureza e da pátria fazem da 'Can9äo do exilio' o nosso primeiro canto autenticamente brasileiro, o melhor exemplo do projeto poético romäntico de construgäo de uma identidade nacionál. Caraeterísticas da linguagem romäntica Alem das caraeterísticas da linguagem romäntica observadas no estudo aeima, outras merecem destaque: • snhjetivismo: o artista romäntico trata dos assuntqs de uma forma pessoal, de acordo com o que sente. Dizemos que, nesse caso, ele é subjetivo, porque retrata a realidade parcialmente. No poema de Gomjalves Dias, por exemplo, por melhor que fosse o Brasil do século XIX, certamente nem tudo era perfeito. Note que o poeta näo fala dos problemas políticos vividos pelo pais naquele momento, poucos anos depois da Independéncia; näo fala da escravidäo nem de outros problemas sociais. Portanto, faz um recorte subjetivo e idealizado da realidade brasileira. • idealizafäo: a extrema valoriza9äo da subjetividade, como fez o Romantismo, leva muitas vezes á dcforma9äo. O artista romäntico, motivado pcla fantasia c pela imagina9äo, tende a idealizar váriós temas, isto é, trata-os näo da maneira como säo, mas como deveriam ser segundo sua ótica pessoal. Assim, a pátria é sempře perfeita; a mulher é^vista como virgem delieada, frágil, submissa e inatingível; o amor, em grande parte, é cspirilual c inalcan9ável; o índio c tratado como herói nacionál, cheio de boas virtudes, e assim por diante. Para compor essa idealiza9äo, a linguagem faz uso de descripôes minuciosas, com constantes comparapöes e ampla metaforizapäo. Observe, nestes versos, um exemplo da idealiza9äo da mulher: O minha amante, minha doce virgem, Eu näoteprofanei^eidormes pura: No sono: do mistério, qual na vida, Podes sonhar apenas na Ventura. (Alvares de Azevedo) : sentimentalismo: a rela9äo entre o artista romäntico e o mundo é sempře mediada pela emo9äo. Diante de um terna amoroso, politico, social ou indianista, o tratamento literário revela grande envolvimento emocional do artista em rela9äo ao assunto tratado. Certos sentimentos, como saudade, irisleza e desilusäo, säo constantes nos textos románticos. Perceba com que sentimentalismo Casimiro de Abreu trata de seu exilio: Meu Deus! eu chorel tanto no exílio! Ťanta dor me coftou a voz sentida, Que agora neste gozq de proscrito Ghora minh'alma e me sucumbe a vida! proscrito: desterrado. egocentrismo: a maior parte dos poetas romanticos 6 voltada predomi-nantemente para o proprio eu, numa atitude tipicamente narcisista. Estes versos de Alvares de Azevedo ilustram essa atitude: Era uma noite - eu dormia E nos meus sonhos revia As ilusoes que sonhei! E no meu lado senti... Meu Deus por que nao inorri? Por que no sono acordei? ■> ''«' v." • r medievalismo: em toda a cultura ocidental, verifica-se o interesse dos romanticos pelas origens dc seu proprio pais, de seu povo e de sua lingua. Na Europa, hä uma busca do mundo medieval e de seus valores; no Brasil, o indio cumpre o papel de nosso passado medieval vivo. Vcja como o escritor portugues Alexandre Herculano narra a invasäo drabe na peninsula Iberica, no seculo VIII: Por ondc quer que os muculmanos tinham atravessado ficavam assentados o siléncio do sepulcro e a assolacäo do aniquilamento. Tárique era o anjo exterminador mandado por Deus as Espanhas, c sua espada o raio despedido do ecu para fulmínar o impéŕio dos godos. religiosidade: mais comum entre os primeiros romanticos, a tendéncia espiritualizante do Romantismo, cmbasada no cristianismo, signitica uma nitida reaeäo ao racionalismo materialista do seculo anterior. A vida espiritual é enfocada como ponto de apoio ou válvula de escape diante das frustrates do mundo real. Por vezes os temas da vida clerical e do celibato säo abordados pelo Romantismo, que procura refletir sobre até que ponto as leis da Igreja (portanto dos homens) podem se contrapor as leis do coraeäo. Veja o que comenta sobre o assunto o escritor portugues Alexandre Herculano, na primeira página de seu romance Eurico, o presbítero: Eu, por minha parte, fraco argumentador, só tenho pensado no celibato á luz do sentimentu e sob a influencia da impressäo singular que desde verdes anos fez em mim a idéia da irremediável solidäo da alma a que a igreja condenou os seus ministros, espécie de amputacao espiritual [...]. byronismo: essa atitude, relacionada ao poeta ingles Lord Byron, foi amplamente cultivada entre os poetas romanticos brasileiros da segunda geraeäo, isto e, entre os anos 50 e 60 do seculo passado. Traduz-se num estilo de vida e numa forma particular de ver o mundo; no caso, urn estilo de vida boemia, noturna, voltada para o vicio, para os prazeres da bebida, do fumo e do sexo. Sua forma de ver o mundo e egocentrica, narcisista, pessimista, angustiada e por vezes satänica. Observe algumas dessas caracteristicas nestes versos, de Alvares de Azevedo: Oh! näo maldigam o mancebo exausto Que no vicio embalou, a rir, os sonhos, Que lhe manchou as perfumadas trancas Nos travesseiros da mulher sem brio! • indianismo: o interesse pelo indio e sua idealizacao na literatura brasileira estáo relacionados com o projeto nacionalista do Romantismo. O indio, contrapondo-se ao portugues colonizador e á sua cultura, representa o elemento nativo, as próprias origens do pais. Ao mesmo tempo, encarna o ideal do "bom selvagem" de Rousseau, que exerceu grande influéncia sobre o Romantismo brasileiro. O indianismo teve sua maior expressáo em nossa literatura entre os primeiros romanticos, como Goncalves Dias e José de Alencar. Observe como este ultimo descreve o indio Peri, herói de O Guarani: Uma simples túnica de algodáo, a que os indígcnas chamavam aimará, apertada á cintura por uma faixa de penas escarlates, caia-lhe dos ombros até o meio da perná, e desenhava o talhe delgado e esbelto como um junco selvagem. • condoreirismo: trata-se de uma corrcntc dc pocsia politico-social, que ganhou repercussäo entre os poetas da terceira e ultima geraeäo romäntica no Brasil (anos 70 do século passado). Tnfluenciados pelo escritor francés Victor Hugo, os poetas condoreiros defendem a justi$a social e a liberdade. Na Europa, defendem a classe operária da explora^äo; no Brasil, luta-se pelo fim da escravidäo e pela republica. Castro Alves, o maior poeta social do Romantismo brasileiro, define nestes versos a missäo do poeta: i: Oh! bendito o que semeia Livros... livros á mäo chela... E manda o povo pensar! i O livro caindo n'alma , E germe - que faz a palma, E chuva - que faz o mar. Com base no que foi estudado até aqui, podemos sintetizar deste modo as principals caracteristicas da linguagem romäntica: • Vocabulário e sintaxe mais simples Subjetivismo • Gosto por métricas populäres Egoccntrismo e Irregularidade estrófica r« Sentimentalismo a Maior liberdade formal 0 Saudosismo • Descricöes miniiciosas, com em- Naoionalismo prego constantc de comparacôes e Idcalizacäo da mulbcrc do amor metáforas, com a intencäo de dar Medievalismo vazäo á fantasia, á imaginacäo e á Indianismo idealizucäo « Religiosidade Byronismo O Condoreirismo Do texto ao contexto hislórico A época representada culturalmente pelo Romantismo das duas ultimas décadas do século XVIII até a metade do séetilo XIX é o rcsultado das transformacöcs que já vinham ocorrendo dcsdc o início do século XVIII em vários pianos: politico, social e ideológico. Ecanomicamente, a Europa presencia a euforia e as conseqiiéncias trazidas pela Revolucäo Industrial na Inglaterra: novos inventos para a indústria, divisäo de trabalho e maior produtividade, formaeäo de centros fabris e urbanos, formacäo de um operariado, revoltas sociais e nascimento de sindicatos, associates de trabalhadores e de patroes. Social e politicamente, a burguesia alcanga o poder na Franca, com a Revolugäo Francesa (1789). lnicia-se naquelc pais um longo periodo de luta pela solidificaeäo do poder burguěs que tem á frenle Napoleáo Bonaparte - e de combate ao movimento contra-revolucionário e conservador conduzido pelas principals monarquias européias: as da Austria, Russia c Prussia. Ideologicamente, o celeiro de idéias que impulsiona a burguesia e o povo em sua causa histórica é o Iluminismo, com suas propostas de um governo demoerático, eleito pelo povo, de igualdade e justica social, de direitos humanos, de liberdade. Revolucäo e contradicäo O Romantismo nasceu na Alemanha e na Inglaterra e, depois de chegar á Franca, espalhou-se por toda a Europa. Suas origens estäo, portanto, diretamente relacionadas ás profundas transformacSes políticas e econômi-cas vividas por esses dois Ultimos países. Como expressäo cultural de um período violento da história, näo se pode esperar que o movimento romäntico seja equilibrado e uniforme. Ao contrario, ele traz as contradicöes c as marcas próprias de urna revolucäo: otimisino e reformismo social, decepcäo e pessimismo, saudosismo e contra-revolucäo. Alčm disso, se os románticos serebelam contra as rígidas normas da tradicäo clássica, naturalmente näo estäo propen-sos a seguir regras. O que os une säo certos princípios gerais, como liberdadc de expressäo e anticonvencionalismo. Dessa forma, é natural que existam no interior do movimento romäntico várias tendéncias e grupos de artistas diferentes que äs vezeš chegam até a ser contraditórios entre si. Individualisrao burgués e egocentrismo romäntico O sistema capitalista č competitivo e individualista. O eu normalmente tem maior importáncia do que o outro ou o coletivo. Na arte romäntica, nota-se igualmentc uma forte valori-zaeäo do indivíduo: na prosa, destaca-se a figura idealizada do herói romäntico, cujas qualidades säo incomparáveis; na poesia, o eu lírico volta-se para si mesmo, buscando retratar com profundidade seu mundo interior e suas dificuldades em relacionar-se com o mundo externo. ľ.5-. i ■ l.l,-lir ll! 1>'I ■.'l':j;|V;|ii-i Alienacäo capitalista e universalismo romäntico A Revolugäo Industrial e a solidificagäo do capitalismo trouxcram ao hörnern do século XIX a seiisagäo de alienacäo, de perda do todo. Da mesma forma que, na indústria, o operário faz uma pequena parte do objeto produzido, perdendo a dimensäo total, no ámbito social, igualmente, o indivíduo comcca a sentir-se fragmentado diante da complexidade do mundo. A resposta a essa sensagäo é o desejo de mtegrar-se com o universu, em busca do elo perdido entre o eu e o mundo. O interesse dos románticos pela natureza e pela Idade Média e por outras culturas distant.es, como as do Oriente, pode ter cssa razäo: a de verem nelas uma forma de vida mais integrada do que a oferccida pela sociedade industrial. A tendencia universalizante do Romantismo naturalmentc tem uma dirccäo oposta á da tendencia individualista e cgocéntrica já observada. Porém, ambas conviveram no interior do mesmo movimento, formando apenas uma de suas contradicöes. Fuga da realidade x engajamento politico Os ideais da Rcvolucao Francesa (1789) tomavam por base o trinómio "liberdade, igualdade c fraternidade". Contudo, os jovens europeus de algumas décadas postcriores nao viam enmpridas as promessas feitas pela revolucáo. Como conseqiiencia, ao mesmo tempo que alguns ainda confiam nos destinos da revolucáo burgucsa, outros caem numa forte onda de pessimismo e tédio, desacreditados da política e das lutas sociais. Esse grupo, que no Brasil corresponde á segunda geracao romántica, tem uma postura de fuga da realidade, que pode se manifestar de diferentes modos: fuga para o passado (a Idade Média ou a infáncia); fuga para o futuro; fuga para a natureza; fuga para o sonho ou para a loucura; fuga para o interior do próprio eu; fuga para a vida boémia; fuga para a mořte. Porém, ao lado dessa tendéncia pessimista, surge também a corrente social e politica que visa promover novas mudancas na sociedade, a fini de que a humanidade alcance fmalmente a liberdade e a justica social. Sáo os eseritores chamados condorei-ros, que, no Brasil, correspondem á terceira geracáo romántica, liderada por Castro Alves. IK im u. NHHlMMHÉfltÉtfi lluiiiinisino e Romantismo O Romantismo valoriza o homem cmotivo, intuitivo e psicologico, por isso despreza o raciona-lismo dos iluministas. Apesar disso, o filosofo iluminista Jean-Jacques Rousseau e um dos precur-sores do Romantismo e exerce forte influencia sobre o pensamento da epoca. Em sua "tcoria do bom selvagem", o pensador defendia que o homem e primitivamente puro, mas se perverte no convivio com a sociedade. Estados de pureza e inocencia passam a ser supervalorizados, como a natureza, a infancia, o indio e paises e povos do Oriente, distantes da "vclha e decadente" (assim considera-da) Europa. No Romantismo brasileiro, essas ideias ganham ampla aceitacao, sobretudo porque a America tambem podia ser vista como um continente ainda primitivo e inocente, com uma natureza exuberante e selvagem. O indio brasileiro, igualmente, passa a ser idealizado como o "bom selvagem" de Rousseau, com o particular de nao ser apenas um indio fruto da fantasia literaria, mas um indio que, embora idealizado, estava vivo nas matas brasileiras. Concluindo Enfim, o Romantismo é a expressäo cultural de uma época de transformaeöes e rupturas, de lutas e inccrtezas em que convivem tendéncias ou aspectos variados e contraditórios. Contudo, essa riqueza de formas, temas e atitudes do Romantismo servi rá a movimentos literários pós-románticos, do próprio sčculo XIX e do século XX, como fonte de inspiraeäo e pesquisa, pois na literatura romántica se verificam tracos típicos do gosto e da sensibilidade moderna, introduzidos pela sociedade burguesa, tais como a espontaneidade e a naturalidade dos sentimentos, o interesse pelo mundo concreto que nos cerca, a psicologizaeäo do eu e o respeito ás tradigöes populäres. ilľiľl ' -.''ér ■Bili Hi m ■MI O Roinantismo nasce no Brasil poucos anos depois de nossa independéncia política. Por isso, as primeiras obras e os primeiros artistas romänticos estáo empenhados em defínir um perlil da cultura brasileira em vários aspectos: a lingua, a etnia, as tradiyôcs, o passado histórico, as diferencas regionais, a religiäo, etc. Pode-se dizer que o nacionalismo é o traco essencial que caracteriza a producäo de nossos primeiros escritores romänticos, como é o caso de Goncalves Dias. ». história do Romantismo no Brasil confunde-se com a propria história política brasileira da primcira metade do século passado. Com a invasäo de Portugal por Napoleäo, a Coroa portuguesa muda-se para o Brasil cm 1808 e eléva a colônia á categoria de Reino Unido, ao lado de Portugal e Algarves. As conseqiiéncias desse tato säo inúmeras. A vída brasileira altera-se profundamente, o que de čerta forma contribuí para o processo de indcpcndcncia política da nacäo. Dentre essas consequéncias, lembra o professor Jose Aderaldo Castello: "a protecäo ao comércio, á indúslria, á agricultura; as reformas do ensino, criacöes de escolas de nível superior e até o piano, que se realizou, de criasäo de urna universidade; as missôes culturais estrangeiras, convidadas e aceitas pela hospitalidade oficial, no setor das artes e das ciéncias; as possibilidades para o comércio do livro; a criacäo de tipografias, princípios de atividade editorial e da imprensa periodica; a instalacäo de biblioteca publica, museus, arquivos; o cultivo da oratória rcligiosa c das representacôes cénicas".* * A literatura no Brasil. Rio de Janeiro, Ed. Sul Americana, 1969. p. 38. A dinamizacao da vida cultural da colonia e a criacao de um publico leitor (mesmo que, inicialmente, de jornais) criam algumas das condicoes necessarias para o florescimento dc uma literatura mais consistente e organica do que eram as manifestacoes literarias dos seculos XVII e XVIII. 'iLi f iO í ( í ,tlif ľM »ii i;< Particularidades dc nosso Romantismo A Independéncia política, de 1822, desperta na consciéncia de intelectuais e artistas nacionais a necessidade de eriar uma cultura brasileira identificada com suas próprias raízes históricas, lingůísticas e culturais. O Romantismo, alem de seu significado primciro - o de ser uma reacao á tradiyáo clássica -, assume em nossa literatura a conotacáo de um movimento anticolonialista e antilusitano, ou seja, de rejeijao á literatura produzida na época colonial, em virtude do apego dessa producáo aos modelos culturais Portugueses. Portanto, um dos tracos essenciais de nosso Romantismo é o nacionalismo, que orientará o movimento e lhe abrirá um rico leque de possibilidades a sérem exploradas. Dentre elas se destacam: o indianismo, o regionalismo, a pesquisa histórica, folelórica e lingiiíslica, alem da eritica aos problemas nacionais - todas elas posturas comprometidas com o projeto de construcáo de uma identidade nacionál. Tradicionalmente se tem apontado a publicacao da obra Suspiros poéticos e saudades (1836), de Goncalves de Maga-lhaes, como o marco iniciál do Romantismo no Brasil. A importáncia dessa obra reside muito mais nas novidades teóricas de seu prólogo, em que Magalháes anuncia a revolucao literária romántica, do que propriamente na execucáo dessas teorias. "fir . l-t I ■ .ni " ' -i- As geracöes do Romantismo Tradicionalmente se těm apontado trés geracöes de escritores románticos. Essa divisäo, contudo, engloba principalmente os autores de poesia. Os romancistas näo sc enquadram muito bem nessa divisäo, uma vez que suas o bras podem apresentar tracos de mais de uma geracäo. Assim, as trés geracöes de poetas romänticos brasileiros säo: • primeira gerapäo: nacionalista, indianista e religiosa. Dcstacam-se os poetas Gonealves Dias e Gonealves de Magalhäes. • segunda gerapäo: marcada pelo "mal do século", apresenta egocentrismo exacerbado, pessimismo, satanismo e atracäo pela morte. Destacam-se os poetas Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Fagundes Varela e Junqueira Freire. • terceira gerapäo: formada pelo grupo condoreiro, descnvolve uma poesia de cunho politico e social. A maior expressäo desse grupo é Castro Alves. O Romantismo brasileiro contou com um grande numero de escritores, com uma vasta produeäo, que, em resumo, pode ser assim apresentada: <; im Urica: Gonealves Dias, Gonealves de Magalhäes, Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Fagundes Varela, Junqueira Freire, Castro Alves e Sousändrade, dentre outros. a na épica: Gonealves Dias e Castro Alves. .a no romance: Jose de Alenuar, Manuel Antonio de Almeida, Joaquim Manuel de Macedo, Bernardo Guimaräes, Visconde de Taunay, Franklin Távora c outros. « m conto: Álvares de Azevedo. • no teatro: Martins Pena, Jose de Alencar, Gongalves de Magalhäes, Gonealves Dias, Álvares de Azevedo c outros, Mil I xi'teXo 4^ •••li'mra i>ileira Filho de um portugues com uma cafuza, o maranhensc Gonealves Dias (1823-1864) fez os primeiros estudos em seu Estado natal e comple-tou-os em Coimbra, onde cursou Direito. De volta ao Brasil, em 1845, ja trouxe em sua bagagem boa parte de seus escrilos. Fixa-se no Rio de Janeiro, e ali publica sua primeira obra, Primeiros cantos (1846), seguida por outras publicayöes, como Segundos cantos e Sextühas de Frei Antäo (1848), Ultimos cantos (1851) e Os timbiras (1857). Fez värias viagens pelo pais, incluindo a Amazonia, tendo chegado a escrever um Dicionärio da lingua lupi. Embora Gonealves de Magalhäes seja conside-rado o introdutor do Romantismo no Brasil, foi, na verdade, Gonealves Dias quem implantou e solidi-ftcou a poesia romäntica em nossa literatura. Sua Ii- obra pode ser considerada a realizacäo dc um verdadeiro projeto de construcäo da cultura brasileira. Gonealves Dias, buscando captar a sensibilidade e os sentimentos de nosso povo, criou uma poesia voltada para o indio e para a natureza brasileira, numa linguagem simples e acessível. Seus versos, tais como os de sua 'Cancäo do exílio', säo melódicos c exploram métricas e ritmos variados. Cultivou também poemas rcligiosos, de fundo panteista, em que Deus é associado á natureza. Sua obra počtica apresenta os géneros lírico e épico. Na épica, canta os feitos heróicos de índios valorosos que substituem a figura do herói medieval europeu. Na lírica, os temas mais comuns säo a patria, a natureza, Deus, o indio e o amor näo correspondido - em grande parte, decorrente de sua frustrada paixäo por Ana Amelia F. do Vale. Estes versos do poema 'Ainda urna vez - Adeusľ, por exemplo, originam-se dessa paixäo: F.nfim le vejo! - enfirn posso Curvado a teus pes, dizcr-le Que näo cessei de querer-te Pesar :de quanlo sofri. Muito;pensci! Cruas ansias, Dos teus olhos afastado, Mouveram-me acabrunhado, Anflo lembrar-me de ti! Louco, aflito, a saciar-me D'agravar minha ferida, Tomou-me ledio da vida, Passos da morte send; Mas quase no passo cxtremo. No ultimo arcar. da esperanca, :Tu mevieste a lembranca; Quis viver mais e vi vi! (Em Poemas de Gonealves D!as. Rio de Janeiro, Edlcöes de Ouro, s. d. p. 63-4.) ■ Ii * 1.1 i /j j; j .ft ; " I, v ^ HHHHHHHHi A épica Da producäo épica de Gonealves Dias, destacam-se dois poemas: '1-Juca-Pirama' e 'Os timbiras', este ultimo inacabado. 'T-.Tuca-Pirama' é considera-do o mais perfeito poéma épico-indianis-ta de nossa literatura. O poéma narra a história vivida por um indio tupi que cai prisioneiro de uma nacäo inimiga: os timbiras. O drama do prisioneiro reside nos sentimentos contra-ditórios provocados por sua prisäo: de um lado, deseja morrer lutando, como guerreiro corajoso que sempre fora; e, de outro, deseja viver para cuidar do pai, docnte e cego. '.40 fjrv ' l#» * ^ 11) i -K -.'-i _____ O prisionciro é libertado e afirma que voltará a se cntregar quando seu pai vier a falecer. Os timbiras näo acreditam em seu argumento e acusam-no de eovarde. Posteriormcnte, o índio reencontra o pai, leva-lhe alimento, mas o velho, percebcndo o cheiro das tintas e os ornamentos do ritual, descobre-Ihe o scgredo. O pai nega o próprio filho. Entäo o velho tupi conduz o filho á tribo timbira e pede que elc scja sacrificado. No canto VIII, um momento de rara beleza, o pai amaldicoa o filho (ver 'Antológia'). Em seguida, o índio luta como um hcrói, provando que näo era covarde. No ultimo canto säo afirmadas as qualidades heróicas do guerreiro, que se transfonna em mito nas tradicôes da cultura timbira. O título do poema, extraído originalmente da lingua tupi, já sugere a siná de seu protagonista: "o que há de ser morto". Perseguindo a tradiyäo dos arcades Basílio da Gama e Santa Rita Duräo, Goncalves Dias soube atualizar e dar nova dimcnsäo ao índio como terna literário, a dimensäo de que necessitavam a nacäo recém-independente e a cultura brasileira, em fase dc definicäo e eonsolidacäo. O herói do poema näo é apenas um índio tupi: representa todos os indios brasileiros ou ainda todos os brasileiros, urna vez que o índio foi durante o Romantismo o representante de nossa nacionalidade. Além disso, ao pôr em discussäo profundos valores e sentimentos humanos, como a bondade filial e a honra, o poema súpera os limites da abordagem puramente indianista e ganha universalidade. 'I-Juca-Pirama', bem como os demais poemas indianistas de Goncalves Dias, representa em nossa cultura o passo decisivo para a transformacäo das manifestacôes nativistas da literatura colonial em manifestacôes conscientc-mente nacionalistas. O canto do índio tupi - misto de amor, honra e luta - assemelha-se ao canto do próprio poeta, também descendente dc indios: um canto de amor á patria e á raca ancestral; um canto de luta pela construcäo de urna pocsia genuinamente brasileira. O texto a seguir e o canto IV de 'I-Juca-Pirama'. Con forme as tradicoes indigenas, o prisioneiro e preparado para um cerimonial antropofagico, em que seriio vingados os mortos timbiras. Ao Ihe pedirem, como 6 proprio do ritual, que cante seus feitos dc guerra e que se defenda da morte, o prisioneiro responde aos inimigos: Meu canto de morte, Guerreiros, ouvi: Sou filho das selvas, '•' Nas selvas cresci; Guerreiros, descendo Da tribo tupi. Da tribo pujanle, Que agora anda erraiile Por fado inconstante, s Guerreiros, nasci: V Sou bravo, sou forte, sou filho do Norte; Meu canto dc morte, Guerreiros, ouvi. Ja vi cruas brigas, De tribos imigas, E as duras fadigas Da guerra provei; Nas ondas riiendaces' Senti pelas faces Os silvos fugaces , Dos ventos que amei. Andei longes terras, Lidei cruas guerras,; Vaguei pclas scrras dos vis Aimores; Vi lutas de bravos, Vi fortes escravos! De estranhos ignavos Calcados aos pes. E os campos talados, E os arcos quebrados, E os piagas coitados Ja sem maracas; E os meigos cantores, Servindo a senhorcs, Que vinham traidores, Com mostras de paz. Ao vclho coitado De penas ralado, ' ■• ■ Ja cego e quebrado, Que resta? Morrer. Enquanto desoreve O giro tao breve Da vida que teve, Deixai-me viver! Aos golpes do imigo Meu ultimo amigo, :Semlar, sem abrigo Caiu junto a mi! Com placido rosto, Sereno e composto, O acerbo desgosto : Comigo sofri, ; Meu pai a meu lado Ja cego e quebrado, De penas ralado. Firmava-se em mi: Nos ambos, mesquinhos, Poninvios caminhos, Cdbertos d'espinhos Chegamos aqui! imigas: immigas. mendaces: mcntirosas. traiyoeiras. silvos: assobios. I'ugaei's: que fogem velozes. ignavos: covardes. talados: devastados, arrasados. piagas: pajés. maracas: chocalhos usados pelos indios em solenidades guerreiras ou religiosas. mi: mim. acerbo: doloroso, árduo. quebrado: cansado, frágil. ínvios: intransitáveis. O velho no entanto Sofrendo já tanto De fome e quebranto, Só qu'ria morrer! Näo mais me contcnho, Nas matas me embrenho, Das freohas que tenho Me qucro valer. En täo, forasteiro, Caí prisioneiro De um troco guerreiro Com que me encontrci: O e ni dessossego Do pai fraco e cego, Enquanto näo chego, Qual seja, - dizci! En era o seu guia ■ ; Na noite sombria, A só alegřia Que DeuS lhe deixou: Em mim se apoiava, Em mim se firmava, Em mim descansaya, Que filholhe sou. Näo vil, näo ignavo, Mas forte, mas bravo, : Serei vosso eseravo: Aqtii virei ter. Gucrreiros, näo coro Do pränto que choro; Se a vida depioro, : Também sei morrer. ; (Op. cit., p. 119-122.1 quebranto: abatimento, fraqueza. frcchas: flechas. trogo: corpo de tropas. deploru: lamento, choro. in ye Nesse canto, o indio tupi nana a trajetoria dc sua vida e de sua tribo. a) Como o indio ve a si mesmo, ate o momenta em que foi aprisionado? b) Qual e a atual condicao dc sua tribo? c) Com quern e por que foge o indio tupi? Na peniiltima estrofe do texto, o prisioneiro faz um pedido aos inimigos: "Deixai-me viver!". a) Que motivos alega para necessitar viver? b) Que acordo propoe aos inimigos? Seguindo os modeios do Romantismo europeu e sua atracao pelo medievalismo, nossos escritores encontraram no indio brasileiro o representante mais direto de nosso passado medieval - finico habitante nestas terras antes do Dcscobrimento. Alem disso, nosso indio corrcspondia plenamente a concepcao idealizada do "bom selvagcm", defendida por Rousseau. Observe o comportamento do indio tupi e indique: a) uma caracterislica dele que se assemelhe as do cavaleiro medieval; b) uma atitudc dele que reforce o mito do "bom selvagem". A lírica A poesia lírica de Goncalves Dias é um dos pontos altos de toda a lírica _nacional. Empregando com sabedoria certos tracos de sua formagäo clássica e lusitana, o poeta cultivou uma lírica de rica construeäo formal, equilibrada, sem cair nos exageros romänticos e sem deixar, por isso, dc ser plenamente romäntico. Assim como Claudio Manuel da Costa, no Arcadismo, Goncalves Dias também desejava atualizar a produeäo literária brasileira e colocá-la á altura das grandes nacöes européias, sobretudo por causa da contemporaneidade da Independéncia e da necessidade de definir uma cultura brasileira. Seu cquilibrio de linguagem e seus temas preferidos - natureza^religiäo, amor, solidäo, patria, indio, medicyalismo - serviram de modelo a muitas geraQoes de poetas que o sucederam, tanto no Romantismo quanto em outros movimentos literários subseqüentes. Para alguns, Gongalves Dias é o primeiro grande poeta brasileiro e, dentre os romänticos, o melhor. ■ Olhos verdes Ele.i Verdes sao: E tém por mmifa, Na cor esperanca, E nun obras näo. Carnöes. Rimas Säo uns olhos verdes, Verdes, Uns olhos de verde-mar, Quando o tempo vai bonanca; Uns olhos cor de esperanca, Uns olhos por que morri; Que aide mil Nem ja sei qual fiquei sendo Depots que os vi! Como duas esmeraldas, Iguais na forma e na cor, Tem luz maisbranda e mais forte, Dizuma-vida, outra morte; Uma ä loueura, outra - amor. Mas ai de mi! Nem ja sei qual fiquei sendo Depot-- que os vi! Säo verdes da cor do prado, Exprimem qualquer paixäo, Täo faeihnente seinflamam, Täo meigamente derramam Fogo e luz do coraeäo: Mas ai de mü Nem ja sei qual fiquei sendo Depois que os vi! 11/ Comb se le num espelho, Pude 1er nos olhos seus! Os olhos mostram a alma, Que as ondas postas em calma Tambem refletem os ceus; Mas ai de mi! Ncm ja sei qual fiquei sendo Depois que os vi! Dizei vos, ö meus amigos, Se vos perguntam por mi, Que eu vivo so da Icmhranea De uns olhos cor de esperanca De uns olhos Verdes que vi! Que ai de mi! Nein ja sei qual fiquei sendo Depois que os vi! Dizei vos: Triste do bardo! Deixou-sc de amor finarl Viu uns olhos Verdes, Verdes,: Uns olhos da cor do mar: Eram Verdes sein esp'ranea, Davam amor scm amar! Dizei-o v6s, meus amigos, Que ai de mi! Näo pertenco mais ä vida Depois que os vi! (Op. cit., p. 137-9.) olhos ondas alma i Que: assim como (coiijuníäo comparativa). Iiiinlii: pocl.i. A linguagem poetica do Romantismo recupera alguns dos procedimentos proprios da poesia medieval, como o emprego da redondilha, abandonada pela maior parte dos escritores da Era Classica. Que palavra, usada em portugues arcaico, confirma essa filia9ao? Releia o refrao do poema e responda: a) Qual a condigao do eu lirico, depois que viu os olhos verdes? b) Com base no verso "Que ai dc mi", que julgamento faz o eu poctico sobre si? c) Partindo desse julgamento, qual deve ter sido, entao, a atitude da mulher amada diante dos sentimentos do eu lirico? Os romanticos rejeitam a visao cquilibrada c harmonica da vida que tinham os classicos, e apreciam o emprego dos dualismos. O poema em estudo faz uso de dualismos, no caso, para caracterizar a mulher amada. a) Destaque da segunda estrofe um dos dualismos que cumprem essa funcao. b) Outro dualismo se verifica na quarta estrofe. Introduzindo-a com o verso "Como se le num espelho", o poeta faz um jogo de redoes binarias para comparar a mulher a naturcza. Essas rcla9oes podem scr assim esquematizadas; Com base nessas imagens especulares (de espelho), explique a semelhan9a entre olhos e ondas e cntre alma e ceus. 4. As duas ultimas estrofes apresentam diferen9as em rela9äo äs anteriores. a) A quem se dirige o eu lirico? b) Qual e a sua nova condi9äo, revelada na altcra9äo do refräo "Näo perten90 mais ä vida/ Depois que os vi!"? I-Juca-Pirama viu "Tu choraste em presesa da morte? Na presesa de estranhos choraste? Näo descende o cobarde do forte; Pois choraste, meu lilho näo és! Possas tu, descendente maldito De uma tribo de nobres guerreiros, Tmplorando cruéis forasteiros, Seres presa dc vis Aimorés. "Possas tu, isolado na terra, Sem arrimo e sem pátria vagando, Rejeitado da morte na guerra, Rejeitado dos homens na paz, Ser das gentes o espectro exeerado; Näo cncontres amor nas mulheres, Teus amigos, se amigos tiveres, Tenham alma inconslante e fala/.! "Näo encontres do9ura no dia, Nem as cores da aurora te ameiguem, E entre as larvas da noite sombria Nunca possas descanso gozar: Näo encontres um tronco, uma pedra, Posta ao sol, posta ás chuvas e aos ventos, Padecendo os maiores tormentos, Onde possas a fronte pousar. "Que a teus passos a relva se torre; Murchem prados, a flor desfale9a, E o regato que límpido corre, Mais te acenda o vesano furor; Suas águas depressa se torném, Ao contacto dos lábios sedentos, Lago impuro de vermes nojentos, Donde fujas com asco e terror! (Em Beth Brait, org. Gont;aives Dias. Säo Paulo, Abril Educacao, 1982. p. 53-4.) Leito de folhas verdes Por que tardas, Jatir, que tanto a custo A voz do meu amor moves teus passos? Da noite a vira9ao, movendo as folhas, já nos cimos do bosque rumoreja. Eu sob a copa da mangueira altiva Nosso leito gentil cobri zelosa Com mimoso tapiz de folhas brandas, Onde o frouxo luar brinca entre flores. Do tamarindo a flor abriu-se, há pouco, já solta o bogari mais doce aroma! Como prece de amor, como estas prcces, No silencio da noite o bosque cxala. Brilha a lua no céu, brilham estrelas, Correm perfumes no correr da brisa, A eujo influxo mágieo respira-se Um quebranto de amor, melhor que a vida! A flor que desabrocha ao romper d'alva Um só giro do sol, nao mais, vegeta: Eu sou aquela flor que espero ainda Doce raio do sol que me dě vida. Sejam vales ou montes, lago ou terra, Ondo quer que tu vás, ou dia ou noite, Vai seguindo após ti meu pensamento; Outro amor nunca tivc: 6 meu, sou tua! Meus olhos outros olhos nunca viram, Nao sentiram meus lábios outros lábios, Nem outras maos, Jatir, que nao as tuas A arasóia na cinta me apertaram. Do tamarindo a flor jaz entreaberta, Já solta o bogari mais doce aroma; Também meu cora9ao, como estas flores, Melhor perfume ao pé da noite exala! Nao me escutas, Jatir! nem tardo acodcs A voz do meu amor, que em váo te chama! Tupa! lá rompe o sol! do leito inútil A brisa da manha sacuda as folhas! (Idem, p. 103-4.) ■ riíiiiiityBiJt IíhÍÍÉ Alguns anos depois da introducäo do Roraantismo »o Brasil, a poesia ganha novos rumos com o aparecimento dos ultra-romäuticos. Esses poetas, desinteressados pcla vida politico-social, voltam-se para si mesmos, com urna atitude profundamente pessimista diante da vida. Vivem entediados, sem perspectivas, sonhando com amores impossiveis e esperando a morte chegar. ■■i HIS XI as décadas dc 50 e 60 do século passado, forma-se nos meios universitários de Säo Paulo c Rio de Janeiro um novo grupo de poetas, que vai dar origem á segunda geracäo da poesia romäntica brasileira. Esses poetas, na maioria, eram jovens que levavam urna vida dcsregrada, dividida entre os estudos acaděmicos, o ócio, os casos amorosos e a leitura de obras literárias européias. A maioria deles morreu com pouco mais de 20 anos de idade. Copiando o estilo dc vida dos escritores romänti-cos europeus Byron e Musset, essa geracäo caracte-rizava-sc pelo espírito do "mal do século", isto é, por uma onda de pessimismo doentio diante do mundo, que se traduzia no apego a certos valores decadentes, tais como a bebida, o vício, e na atracäo pela noite c pela morte. No caso de Alvares de Azevedo, o principal poeta do grupo, esses tracos ainda säo acrescidos de temas macabros e satfinicos. Os ultra-romänticos desprezam certos temas e posturas da primeira geracäo, como o nacionalismo e o indianismo; contudo acentuam tracos como o sLibjetivismo, o egocentrismo e o sentimentalismo, ampliando a experiéncia da sondagem interior e preparando o terreno para a investigacäo psicoló-gica que caracterizará o Realismo, trés décadas mais tarde. O medo de amar Quanto ao amor, os ultra-romänticos possuem uma visäo dualista, que envolve atracäo e medo, desejo e culpa. Segundo Mário de Andrade, escritor e crítico modernista, os románticos, e principal-mente os ultra-romänticos, ternem a realizacäo amorosa. O ideál feminino é normalmente asso-ciado a figuras incorpóreas ou assexuadas, como anjo, crianpa, virgem, etc, e as referéncias ao amor físico se däo apenas de modo indireto, sugestivo ou superficialmente. O ultra-romántico Casimiro de Abreu, por exemplo, num poema intitulado 'Amor e medo', evidencia seu medo de amar: No fogo vivo eu me abrasara inteiro! Ebrio e sedento na fugaz vertigem Vil, machueava com meudedo impuro As pobres flores da grinalda virgem! Vampiro infame, en sorveria embeijos Toda a inocencia que: teu läbio encerra,...-. E tu serias no lascivo abraco Anjo enlodado nos p uns da terra. pauis: brejos. Se de ti fujo e que te adoro e muito, Es bela - eu moco; tens amor, eu niedo!...... (Em Antonio Candido e J. A. Castello. Presenga da literatura brasileira. Säo Paulo, Difsl, 1968, V. 2, p. 44.) i Como se observa, o medo de amar, nesse poema, traduz-se no receio de macular a virgem, no tcmor de se entregar ao apelo dos sentidos e ferir a pureza da mulher amada. A imagem de "anjo enlodado" dá a medida exata do ideal feminino para os románticos: mulher virgem, assexuada e incorpórea. 'iXŽJkM Mal IHéIL ..('lí-r »|ot i! i n- WSSěěěěĚě híí l -Jíttľ wlääSEŠiĹMm SIIsKíeIIiIIm JBíSíI i iľ-'i „BER i. 1B11 .1 E •mm mm tM • ■SaMai wěěs 1ŠES|kkEÍ IěěěěěM iäliií 3IIIÍMl Alvares de Azevedo: a antítese personificada Alvares de Azevedo (1831-1852) é a principal expressao da geracao ultra-romántica de nossa poesia. Paulista, fez os estudos básicos no Rio de Janeiro e cursava o quinto ano de Direito em Sao Paulo quando sofreu um acidente (queda de cavalo), cujas complicacoes o levam á morte, aos 21 anos de idade. O escritor cultivou a poesia, a prosa e o teatro. Toda a sua producáo -sete livros, discursos e cartas - foi escrita cm apenas quatro anos, periodo eni que era estudante universitário. Por isso, deixou uma obra de qualidade irregular, se considerada no conjunto, mas de um grande significado na evolucao da poesia nacionál. As faces de Ariel e Caliban IM BS Hol IS8S mm A caracteristica intrigante de sua obra reside na articulagäo consciente de um projeto literário baseado na contradipäo, talvez a contradigäo que ele proprio sentisse como adolescente. Perfeitamcnte enquadrada nos dualismos que caracterizam a linguagem romäntica, essa contra-dicäo é visivel nas partes que formám sua principal obra poética, Lira dos vinte anos. A primeira e a terceira partes mostram urn Alvares de Azevedo adolescente, casto, sentimental e ingénuo. Ele mesmo chama a essas partes de a face de Ariel, isto é, a face do bem, do qual o poema seguinte ó um exemplo: Sonetu Pálida, á luz da lámpada sombria, Sobre o leito de fiores reclinada, Como a lua por noite embalsamada, Entre as nwens do amor ela dormia! Era a virgem do mar! na escuma fria Pela maré das águas embalada! Era um anjo entre nuvens ďalvorada Que em sonhos se banhava e se esquecia! Era mais bela! o seío palpitando... Negros olhos as pálpebras abrinde.. Formas iiiias no leilo resvalando... Näo te rias de mini, meu anjo lindo! Por ti as noites eu velei chorando, Por ti - nos sonhos morrerei sorrindo! (Em Barbara Heller et alii, orgs. Alvares de Azevedo. Sáo Paulo, Abril Educacäo, 1982. p. 22.) Quando sc abre a segunda parte da Lira dos vinte anos, contudo, o leitor depara com um segundo prefäcio da obra, com os seguintes dizeres: Cuidado, leitor, ao voltar esta paginal Aqui dissipa-se o mundo visionario e platonico. Vamos entrar num mundo novo, terra fantastica, verdadeira ilha Barataria de D. Quixote, onde Sancho e rei; [...] Quase que depois de Ariel esbarramos em Caliban. A razao e simples. E que a unidade deste livro e capitulo funda-sc niima binomia. Duas almas que moram nas cavernas de um cerebrq pouco mais ou menos de pocta esereveram este livro, verdadeira medalha dc duas faces. Nos meus labios onde suspirava a monodia amorosa, vem a satira que rnorde. (Em Antonio Candido e J. A. Casteilo. Op. cit., V. 2, p. 14.) Com esse comentário, o poeta introduz o leitor no mundo de Caliban, representado principalmente pelo poema 'Idéias íntimas' c por uma série intitulada 'Spleen e charutos'. Embora näo se inclua cm Lira dos vinte anos, também se aproxima desse grupo de textos a obra de contos Noite na taverna e a peca teatral Macário. Esses eseritos retratam um mundo decadente, povoado de viciados, bébados e prostitutas, de andarilhos solitários, sem vínculos e sem destino. Observe essa atitude nestes versos de Alvares de Azevedo: Vagiilnimlo Eu durmo evivoao sól como um cigano, Eumando meu cigano vaporoso; Nas noites deveräonamoro estrelas; Sou pobre, sou mendigoeusou ditoso! Ando roto, sem bolsos nem dinheiro; Mas tenho na viola uma riqueza: Canto ä lua de noite serenatas, E qucm vivc de amor näo tem pobreza. [...] Tenho por palácio as longas ruas; Passeio a gosto e durmo sem temores; ? Quando bebo, sou rei como um poeta, ;;;h E o vinho faz sonhar com os amores. iB|mHjH|!< í Entre na "terra fantástica" de Caliban por meio da leituta de alguns segmenlos de 'Idéias íntimas'. O arabiente desse poema sugere, o tempo todo, desarranjo e solidäo; é um quarto de estudante no qual seu jovem ocupante se entrega a uma viagem em volta daquele espaco e em volta de si mesmo. Nessa viagem há o reconhecimenlo dos objetos que formám o pequeno mundo do jovem e o reconhccimcnto neles de seu proprio eu, de modo que a solidäo e o desarranjo do quarto silo um prolongamento da condicäo interior do eu. Idéias íntimas Ofisiaii o bardo é triste como a sombra Que seus cantos povoa. O Lamtitiim*. É monótono e belo como a noite, Como a lua no mar e o som das ondas... Parece-me que vou perdendo o gosto, Vou fícando blase, passeio os dias Pelo meu corredor, sem compaiiheiro, Sem ler, nem poetar. Vivo fuinando. Minha casa näo tem menores névoas Que as deste céu ďinverno... Solitário Passo as noites aqui e os dias longos; Dci-me agora ao charuto em corpo e alma; X Meu pobre leito! eu amo-te conludo! Aqui levei sonhando noites belas; As longas horas olvidei libando Ardentes gotas de licor doirado, Esqucci-as no fumo, na leitura Das paginas laseivas do romance... Meu leito juvenil, da minha vida I Es a pagina d'oiro. Em tcu asilo ■/ Eu sonho-me poeta, e sou ditoso, E a mente errante devaneia em mtmdos Que esmalta a fantasia! Oh! Quantas .>■/(.■•. Do levante no sol entre odaliscas Momentos nao.passei que valem vidas! Quanta mtisica ouvi que me encantava! Quantas virgens amei! que Margaridas, Que Elviras saudosas e Clarissas, Mais tremulo que Faust, eu nao beijava, Mais teliz que Don Juan e Lovelace Nao apertei ao peito desmaiando! O meus souhos de amor e mocidadc, ■■/■■ Por que ser tao formosos, se devieis " f:" Mc abandonar tao cedo... e eu acordjlfe Arquejando a beijar meu travesseiro?'f ■ Ossian: pocta medieval escocés. Lamartine: pocta romiintico fiances, blase: entediudo. Ii 124 XII Aqui sobre esla mesa junto ao leito Em caixa negra dois retratos guardo. Näo os profanem indiseretas vistas. Eu beijo-ns cada noite: neste exílío Venero-os juntos e os prefiro unidos - Mcu pai e minha mäe. - Se acaso um dia Na minha solidäo me acharem morto, Näo os abra ninguém. Sobre meu peito Lancem-os cm meu túmulo. Mais doce Será ceito o dormir da noite negra Tendo no peito essas imagens puras. XIV Parece que chorei... Sinto na face Uma perdida lágrima rolando... Satä leve a tristeza! Olá, meu pajem, Derrama no men copo as gotas ultimas Dcssa garrafa negra... Eia! bebamos! És o sangue do génio, o puro néctar Que as almas do poeta diviniza, O condäo que abre o mundo das magias! Vein, fogoso Cogiwd E só contigo Que sinto-me viver. Inda palpito, Quando os eflúvios dessas gotas áurcas Filtram no sangue meu correndo a vida, vibram-me os nervos e as artérias queimam, Os meus olhos ardentes se eseurecem E no cérebro passam delirosos Assomos de poesia... Dentre a sombra Vejo num leito d'oiro a imagem dela Palpitante, que dorme e que suspira, Que seus bracos me estende... Eu me esquecia: Faz-sc noite; traz fogo e dois charutos E na mesa do estudo acende a lämpada... (Em Barbara Heller et alii, orgs. Op. cit., p. 31-8.) Com base na parte I, indique as agöes do eu lirico que confirmem o seu estado blase. A parte X da seqiiencia a viagem pelo interior do quarto e do proprio eu e tematiza o leito do eu lirico, em que ele sonhou noites belas e passou longas horas. a) De que modo o eu lirico tornava as "longas horas" menos dolorosas? b) Que souhos criava quando se encontrava no leito? c) Destaque os versos do pocma que, ironicamente, destroem a idealizacao amorosa. Em meio ao desarranjo do quarto - os quadros, o conhaque, o charuto, os livros, etc. -, o poeta guarda em lugar especial os retratos do pai e da mae. De acordo com os versos da parte XII, o que significant os pais para ele? Observe a parte XIV. Como em todo o poema, os momentos de devaneio - motivados pelo fumo, pelo alcool e pela solidao - sao interrompidos por momentos de lucidez. a) Reconheca as estrofes que revelam lucidez e as que revelam devaneio. b) Como num circulo vicioso e obsessivo, que tipo de visao o eu lirico torna a ter quando sob os efeitos do alcool? c) Pode-se entender, por meio da ultima estrofe do poema, que a viagem foi encerrada? Por que? Ampliando o estudo de texto Fazendo uso de tima linguagem centrada nos pensamentos e nas emocoes do eu lirico, 'Ideias intimas' e uma especie de mergulho do eu em sua propria indfvidualidade. E uma viagem sem porto de chegada, sem rotas a cumprir, sem ninguem a esperar. 115 'AS Uraa viagem de solidäo pelo quarto desarrumado, povoado apenas por objetos do coüdiano, por mulhcres imaginärias e por personagens e cscritores literärios, mim clima nevoento, motivado pelo fumo e pelo älcool e, por isso mesmo, propicio ao sonho e ä fantasia. O quarto, ao se apresentar desordenado, reflete as apöes tambem desordenadas do eu lirico, o agente daqiielc cspa90. b como se o quarto em desarranjo motivasse ainda maior desarranjo no interior do eu, e este, alucinado, tornasse a desarranjar ainda mais o quarto - e assim sucessivatnente, numa progressäo alucinante que os conduzirä. ao caos. Da mesma forma que e possivel estabelecer relacöcs entre o interior do eu lirico e o espaco do quarto, essas relacöes podem ser ampliadas, de modo que o desarranjo do eu represcntc o proprio desarranjo do mundo. Como numa relafäo metonimica, a desordem interior do eu projeta-se para o mundo exterior, ultrapassando os limites do quarto e envolvendo toda a realidade. E um mundo desordenado, inconsistcnte em seus valores. E o mundo burgues do seculo XIX, em que o eu lirico näo acredita, por isso prefere a fuga, refugiando-se no sonho, po vicio e na solidäo. - Como scmprc ocorrc com as grandes obras literärias, o^pocma, mesmo sendo baseado no egocentrismo, supera os limites do eu e consegue ser social e universal. Social r.'.-poKiiic nega a realidade, num desejo latente de trans-ibriffi^la: universal porquc a nega9äo dessa realidade eonWfc a solidäo, uma experiencia essencialmente humana, universal. A irónia ou a terceira face de Álvares de Azevedo A irónia ô um tra90 conslante na obra poética de Alvares de Azevedo. É uma forma näo passiva de ver a realidade, um modo de quebrar a no9äo de ordern e abalar as convemjöes do mundo burguěs. Enquanto o lado Caliban do poeta situa-se em uma das linhas que integrant o Romantisme- 7 a linha orgiaca e satänica -, a ironia levada äs ultimas conseqiiéncias abre ao poeta um veio novo: o veiq anti-romäntico. Constituindo outro paradoxo, o mais romäntico dos nossos romänticos .Jancao germe da propria supcracao do Rómanťismo, ao ironizar algumas das atitudes mais caras á sua gera9äo: a pieguice amorosa e a idealiza9äo do amor e da mulher, como se observa nestes versos: ŕ. 1 .In ! i: lilu! É Ela! Ii Ela! É ela! é ela! - murmurou tremendo; 'E o eco ao longe murmurou - é ela! Eu a vi minha/ada aérea e pura ,^ A minha lav|deira na janela! s Dessas ájpläs-ŕurtadas onde eu moro Eu a vejfi estendendo no tejjiado Os vaitidos de chita, as saiés brancas; Eu a vejo e suspiro enatríorado! "f /•Esta noite eu ousei mais atr«vid< > Nas telhas queestalavam nos -.leus ji.issus Tr espiaiKseu venturaso sono, .. \c-la n ,ns hcLi de M.irh-i tins lir.Lvo>! tiimii dormia! que ptoľundo sono!... Ii".h.! na mäo o ferro do engomado... -Como roncava maviosa e pura!... k Quase caí na rua desmaiado! .....£,,,,, ' (Em Barbara Heller et alii, orgs. Óp. cit, p. 44.) Certos aspectos da poesia de Álvares de Azevedo säo encontrados na obra de alguns dos melhores poetas do século XX:_aj>o«w, na poesia de Carlos Drummond de Andrade, e a forte presesa óo~cotidiano, na de Manuel Bandeira. Isso assegura a importäncia e a atualidáde de^lvlres de Azevedo em nossa literatura. Casimire de Abreu: a poesia bern-comportada Quem ainda näo ouviu estes versos? Meus oito anos Oh! souvenirs! printemps! nurnres! V. Hugo Oh! que saudades que tenho Da aurora da minha vida, Da minha infancia querida Que os anos nao trazem mais! Que amor, que sonhos, que flores, Naquelas tardes fagueiras A sombra das bananeiras, Debaixo dos laranjais! w m ■ (jjiif.i ifiiji'' ;;;;;;;; !!!!!!!! .Iii i lliii'.ä^el Como sao belos os dias Do despontar da existencia! - Respira a alma inocencia Como perfumes a flor; O mar e - lago sereno, O ceu - um manto azulado, O mundo - um sonho dourado, A vida - um hino d'amor! Que auroras, que sol, que vida, Que noites dc mclodia Naquela doce alegria, Naquele ingenuo folgai! O ceu bordado d'estrelas, A terra de aromas cheia, As ondas bcijando a areia E a lua beijando o marl Oh! dias da minha infancia! Oh! meu ceu de primavera! Que doce a vida nao era Ncssa risonha manha! Em vez das magoas de agora, Eu tinha nessas delicias Dc minha mae as caricias E beijos de minha irma! Livre filho das monlanlias, Eu ia bem satisfeito, Da camisa aberto o peito, - Pes descalcos, bracos nus -Corrcndo pelas campinas A roda das cachoeiras, Atras das asas ligeiras Das borboletas azuis! (Em Antonio Candido e J. A. Castello. Op. cit., p. 41.) Esse conhecido poema pertence a Casimiro de Abreu (1R39-1860), um dos mais populäres poetas brasileiros. Nasceu em Barra de Säo Joäo (RJ) e näo chegou a concluir seus estudos, por ter de trabalhar no comercio por imposicäo do pai. Foi em Portugal que escreveu a maior parle dos poemas de Prima veras. Apesar de estar ligado ä segunda geraeäo da poesia romäntica, Casimiro surge no cenärio literärio carioca, desanuviando o ambiente carregado c noturno que Alvares dc Azevedo deixara, ao morrer, sete anos antes. Diferentemente da obra de Azevedo, em que amor se confunde com morte, o amor na poesia de Casimiro, apesar do medo, associa-se sempre ä vida e ä sensualidade - e este e um dos pontos altos de sua poesia. Conludo essa sensualidade de Casimiro - mais natural que a de Alvares de Azevedo, porque mais concreta - ainda näo atinge sua plena maturagäo. E uma sensualidade sempre disfarcada, fruto de insinuacöes e do jogo de mostrar e esconder. Ao lado desse tratamento brando que deu ao tenia amoroso, Casimiro de Abreu abordou de forma graciosa certos temas, como a infancia, a patria, a saudade, a solidao, a natureza, o amor - temas que agradavam ao publico, ja acostumado a eles. Aproveitando-se de certas novidades trazidas pela primeira geracao, como as variacoes metricas e ritmicas, a forte musicalidade c o cmprcgo de uma lingua brasileira, Casimiro as utiliza ate o esgotamento, numa epoca em que essas inovacoes ja nao cram ruptura, por estarem incorporadas ao gosto do publico. Com esse abrandaniento, Casimiro de Abreu nao ampliou nem modificou os horizontes do Romantismo brasilciro - salvo a novidade de uma sensualidade mais natural. Entretanto sua poesia contribuiu para a consolidacao e para a populurizacao definitiva do Romantismo entre nos. Segredos Eu tenho;uns amores - quern e que os nao tinha Nos tempos antigos? - Amar nao faz mal; As almas que sentem paixao como a minha, Que digam, que falem.em regra geral. - A flor dos meus sonhos e moca bonita Qual flor entr'aberta do dia ao raiar; Mas onde ela mora, que casa ela habila, Nao quero, nao posso^nao devo contar! Oh! ontem no baile com ela valsando Senti as delicias dos anjos do ceu! Na danca ligeira quaisilio voando Caiu-lhe do rosto seu:eandido veu! - Que noite e que baile! '-'Seu halito virgem Queimava-me as faces no louco valsar, As falas sentidas, que osolhos falavam, Nao quero. nao posso, nao devo contar! Depois imieicntc firmou-se era meu braco, Fugimos das salas, do mundo talvez! fnda era mais bcla rendida ao cansaco, Morrendo de amoresem:tatlanguidez! - Que noite e que festal e que languido rosto Banhado ao rcflexo do bianco luar! A neve do cole e as ondas: dos seios : Nao quero, nao posso, nao.devo contar! - Agora eu vos juro... Palavra!! - nao minto! Ouvi a formosa lambem suspirar; Os doccs suspiros, que os ecos ouviram, Nao quero, nao posso, nao devo contar! silfo: genta do ar, na nütologia celtica. cämlnlo: imaculado. pnro. indolente: preguicosa. länguido: abatido, sensual, colo: parte do corpo formada pelo pescoco e pelos rati bros. Entao nesse instante tias aguas do rio Passava uma baroa, e o bom remador Cantava na flauta: - "Nas noites d'estio () ceu lein estrelas, o mar torn amor!" E a voz maviosa do bom gondoleiro Repete cantando: - "viver e amar!" Se os peitos respondem a voz do barqueiro... Nao quero, nao posso, nao devo contar! Trememos de mcdo... a boca emudece Mas sentem-se os pulos do mcu cora?ao! Seu seio nevado de amor se intumescc E os labios se tocam no ardor da paixao! *- Depots... mas ja vejo que vos, mcus senhores, Com fma malicia quereis me enganar; Aqui faco ponto; - segredos de amores Nao quero, nao posso, nao devo contar! (Paesias completes de Casimito de Abreu. Rio de Janeiro, Ediouro, s. d. p. 61-3.) maviosa: suave, harmoniosa, inturnesce: incha, torna-sc tútnido. i, ľ snu 1. O poema apresenta forte musicalidade, atitude cornum a poesia romantica em geral, mas f. principalmente a de Casimiro de Abreu. \ Fa9a urn levantamento ritmico dos versos da primeira estrofe e indique a relar;ao que mantem o \ritrno do poema com o ritmo da valsa e com a dan9a da valsa. \ heritor romäntico Jose de Alencar, em sua obra Senhora, também descrevc urn bade em que se a valsa. Afirma o cscritor: "Há uma delícia, uma voluptuosidade pura e inocente ncsta Najez da velocidade. Aos volteios rápidos, a mulher sente nascer-lhe as asas e pensa que voa; \o casulo da seda, esfralda-se a borboleta". Ms do poema de Casimiro de Abreu um trecho que confirme a sensa9äo de vóo '<\ peia valsa, nos dizeres de Alencar, Sestrofc, a virgem deixa cair o véu de seu rosto durante a dan9a. O que sugere esse ""«ndo os diversos signiflcados culturais relacionados ao véu? %> texto de José de Alencar, conftrma sua resposta á pergunta anterior? 1e entre os amantes aumenta gradativamente. Na décima estrofe, o erolismo i. vez que é revelado o desejo da virgem. Destaque dessa estrofe a imagem 'vjista da linguagem, o erótico afigura-se mais forte quando fruto do \que na sua demonstra9äo explícita. Esse procedimento pode ser ^ientifique-o e explique de que modo o pocta constrói esse jogo, \socs do texto. ..sa dos poetas da scgunda gera9äo romäntiea, explique a estrofe: 'Trememos de medo...". Facpiíidí s Varela: uma poesia e m trans i ca o Fagundes Varela (1841-1875) nasceu em Rio Claro, Estado do Rio de Janeiro. Estudou Direito em Säo Paulo, onde se casou com uma prostituta. Dessa uniäo, nasceu o filho primogěnito, que veio a falecer com apenas tres meses de vida. Amargurado, o poeta entregou-se totalmente á vida boémia e ao álcool. Seus últimos anos de vida, passou-os longe das grandes cidades, buscando refúgio na religiäo e no contato direto com a natureza e com pessoas simples da vida rural. A poesia que produziu nessa fase reveste-se de preocupa9äo espiritual, apresentando caráter pante/sta. Sua obra poética, embora ainda presa a certas | atitudes ultra-románticas, como o pessimismo, a solidäo e a morte, aponta rumos novos, que conduzem ä gera9äo seguinte. Por exemplo, ao invés de egocéntrica, sua poesia já se volta para os problemas sociais e políticos do Brasil; em alguns poemas faz a defesa da pátria, do índio c da nacionalidadc c eritica a escravidäo. Qttanto á forma, Varela introduz o lom grandiloqůente da oratória e a abundáncia de imagens. Tanto essas inova9ôes de conteúdo quanto as de forma seräo mais tarde retomadas c ampliadas por Castro Alves, poeta da terceira gera9äo. Wm tli A seguir säo apresentados alguns fragmentos do poema 'Cäntico do calvário', considerado a obra-prima de Fagundes Varela. O poeta dedicou-o á memoria do filho, morto com apenas trés meses de vida. Cäntico do calvário A memoria de men filho morto a 11 de dezemhro de 1863 Eras na vida a pomba predileta O ramo da esperaii9a. Eras a estrela Que entre as névoas do inverno cintilava Apontando o caminho ao pegureiro. Eras a messe de um dourado estio. Eras o idílio de um amor sublime. Eras a gloria, a inspira9äo, a pátria, O porvi r de teu pai! - Ah! no entanto, Pomba, - varou-te a flecha do destino! Astro, - engoliu-te o temporal do nořte! Teto, - caíste! - Cren9a, já näo vives! pegureiro: girardudor de galiu, pastor messe: colhcita. islio: ".„-r.".!!. purvir: luluu-. no \10 Mas näo! tu dormes no infinite seio Do Criador dos seres! Tu me ľalas Na voz dos ventos, no chorar das aves, Talvez das ondas no respiro ílébil! Tu me conlemplas lá do céu, quem sabe? No vulto solitário de urna estrela. E säo teus raios que meu estro aquecem! Pois bem! Mostra-me as voltas do caminho! Brilha e fulgura no azulado rnanto, Mas näo te arrojes, lágrima da noite, Nas ondas nebulosas do ocidente! Brilha e fulgura! Quando a morte fria Sobre mim sacudir o pó das asas, Escada de Jacó seräo teus raios Por onde asinha subirá minh'alma. (Em Antonio Candido e J. A. Castelio. Op. cit., p. 53-3.) ľlénil: lastimoso, choroso liil;:iira: ivliimnej.-. brilha abulia: dcpivvs . wĚĚĚĚISSmBĚĚ 1. Na primeira estrofe do texto, o eu lirico faz diversas referencias ao filho morto e a si mesmo, por mcio de abundante metaforizacao. a) Destaque algumas das metaforas emprcgadas cm referenda ao filho e ao cu lirico. b) Explique o que representava o filho para o eu lirico. 2. Outro trajo comum a linguagem de alguns poelas romanticos — dentre os quais Gon^alves Dias e Fagundcs Varela -co pemteismo, isto c, a conccpcao de que Deus e a propria natureza e emana de todos os seres vivos do universe A proposito da ultima estrofe: a) Pode-se afirmar que o filho esta morto? b) Identifique trayos panteistas. Alvares de Azevedo I .einbraiica de morrcr Quando em meu peito rebentar-sc a fibra, Que o espirito ehlaea á dor vivente, Näo derramem por mim nem uma lágrima Ém pálpebra demente. : E nein desfolhem na matěria impura A. flor do vale, que adormece ao vento: ; Näo quero que uma nota de alegria ;^ Sé cále por meu triste passamento. Eu deixo a vida conio deixa o tédio Do deserto. o poento caminheiro : -Como as höras de um longo pesadelo Que se desfaz ao dobré de um sineiro; Descansem o mcu leito solitario Na floresta dos homens esquecida, A sombra dc uma cruz, e escrevam nela: - Foi poeta — sonhou - e amou na vida. Sombras do vale, noites da montanha, Que minh'alma cantou e amava tanto, Protegei o meu corpo abandonado, E no silencio derramai-lhe canto! > Mas qliando preludia ave d'aurora E quando a meia-noite o ceurepousa, Arvoredos do bosque, abri os ramos... Deixai a lua prantear-me a lousa! (Em Barbara Heller et alii, orgs. Op. cit., p. 28-9.) Como o desterro de minh'alma errante, Onde fogo insensate a consumia: Só levo uma saudade - é desses tempos Que amorosa ilusäo cmbeleeia. Só levo uma saudade - é dessas sombras Que eu sentia velar nas noites mirihas... De ti, ó minha mäe! pobre coitada .; Que por minha tristeza te definhas! ; De men pai... de incus unicos amigos, ; Pmicos iiL-m poiicus-equehao zombavam tiuando, em noites dc febre cttdoidecido, Minhas pálidas crencas duvidavam., ; Se uma lágrima as pálpehrits me inunda,: ; Se um suspiro nos seios treme ainda, Ě pela virgem que sonhei... que ntinca Aos hi bios, me encostou a face linda! Só (u á mocidadc sonhadoia Do pálido poeta deslc llores... Se vivcu, foi por ti! e dc esperanta De na vida gozar de leus amorcs. Heijarei a verdade ssinla e mia, Vcrei cristalizar-se o sonho amigo... O minha virgem dos errantes sonhos, Filha do céu, eu vou amar coiuigo! Snnetii I im manecbo no jogo se descora, Outro bebedopassa noitee dia, tJttttolopela yalsa viveria, Urn passěia a cavalo, outro namora. Urn outro que uma sinu tná devora Faz das vidas alhcias zombaria, Outro toMa rape, urn outro espia... Quantos mofos perdiďos vejo agora! Oh! näoproibam, pois, no meu retiro Do peiisameiito ao mereneório luto A fumaca gentil por que suspiro. Nimui fuma9ä o canto dalma escuto... Um aroma balsämico respiro, Oh! deixai-mě funíar o meu charuto! (Em Poesias completes de Álvares de Azevedo. Rio de Janeiro, Ediouro, s. d. p. 60.) ■ lir n m 1st HH * Junqueira Frcirc Morte (horu de delirio) Pensamento gentil de paz eterna, Amiga morte, vem, Tu és o termo De dous fanlasmas que a existencia formám, - Dessa alma vä e desse corpo enfeŕmo. Pensamento gentil de paz eterna, Amiga morte, vem. Tu és o nada, Tu és a auséncia das nocôes da vida, Do Prazer que nos custa a dor passada. Pensamento gentil de paz eterna, Amiga morte, vem. Tu és apenas A visäo mais real das que nos ccrcam, Que nos extingues as visôes terrenas. ; í mé-1 BPis ' bi- . 1- 'lTfi \ U I lll| li i I i i I I I i|l > ľ 1 i < ,11 M- M ilh m I iľ i ,ll"lh Diku i U i" -pul i i l i i .Ln ;nto Que näo se sente dos vaivéns da sorte. lil i lil li i nrli I I A l i II i Jl it |» 33-4.) " ■!(■! i'' rl ("l-V1' i, > li ť'Wliii! tt ii 'n' ilt ii i 1-JgBjgHySr ■ i n ii ili- • 1'l>jVtí[i «- BBSc As decadas de 60 e 70 do seculo passado representam para a poesia brasileira urn periodo de transicao. Ao mesmo tempo que muitos dos proccdimentos da primeira e da segunda gcracfies sao inantidos, novidades de forma e de conteudo dao origem a terceira geracao da poesia roinantica, mais voltada para os problemas sociais e com tima nova forma de tratar o tenia amoroso. 11 ' ^e que tratam estes versos de Caetano Veloso, da composicao 'Haiti', musicada por elc proprio e por Gilberto Gil? Quando voce for convidado para subir no adro da fundajao Casa de Jorge Amado pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos dando porrada na mica de malandros pretos de ladroes mulatos e outros quase pretos (e sao quase todos pretos) e os quase brancos pobres eomo pretos como e que pretos, pobres e mulatos e quase brancos quase pretos de tao pobres sao tratados e quando ouvir o silencio sorridente de Silo Paulo diante da chacina 111 presos indefesos, mas presos sao quase todos pretos ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tao pobres e pobres sao como podres e todos sabcm como se tratam os pretos Pensc no Haiti, reze pelo Haiti O Haiti é aqui, o Haiti näo é aqui. 113 BIS ■11 i ii 'IfflBft ÍBS1S8 ESlililll •n "i' r ",i:i,l I BSII TÍM WEB 'mKěĚ iBSIII (Em Tropicália 2, Polygram, 1993.) Partindo de uma reflexäo sobre a condigäo social do negro no Brasil, hoje, Caetano e Gil questio-nam os limites do preconceito social: até que ponto neste pais há apenas o preconceito racial, quando vemos negros batendo em negros e em brancos pobres? Alias, negros e brancos se identificam neste trecho: "säo quase todos pretos/ ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de täo pobres". Será que a sociedade brasileira näo estaria, entäo, dividida em dois grandes grupos: os ricos e os pobres, em vez de brancos e negros? O refräo da música, "O Haiti é aqui, o Haiti näo é aqui", com mais um dualismo - ser ou näo ser o Haiti, ao lado de outros dualismos, como branco/preto, rico/pobre -, dá uma dimensäo mais ampla ao problcma dos negros ou dos pobres: uma dimensäo latino-americana ou universal. Esse tipo de preooupugäo social existente na música de Caetano e Gil näo é novidade em nossa cultura. Já desde o Romanlismo a literatura brasileira tem apresentado muitos escritores preocupados em denunciar os problemas de nossa realidade social, como é o caso dos escritores do condoreirismo, ou tereeira geraeäo da poesia romäntica. Castro Alves, por exemplo, o expoente desse grupo, é também conhecido como "o poeta dos escravos", por ter escrito poemas em defesa da causa do negro escravo, em sua época. A poesia condoreira A corrente condoreira ou Imgoana, como também é chamada por influéncia do escrilor trances Victor Hugo, encontrou no Brasil vários adeptos, como Castro Alves, Pedro Luis, Pedro Calasäs e, até certo ponto, Sousändrade. Ampliando as experiéncias de P'agundes Varela -que por vezeš conseguiu superar o egocentrismo e voltar-se para o mundo exterior -, os condoreiros desenvolveram a poesia social, comprometidos com a causa abolicionista e republicana. Em geral säo poemas de tom grandiloqüente, proximo da oratoria, cuja finalidade é convencer o leitor-ouvinte e conquistá-lo para a causa defendida. O centro da preocupagäo da linguagem desloca-se do cu (o emissor) para o assunto (no caso, a Abolicäo e a República), o que representa uma mudanga profunda, dado que o Romantisnio é por natureza egocéntrico. O nome da corrente, condoreirismo, associa-se ao condor ou a outras aves, como a águia, o falcäo e o albatroz, que foram tomadas como símbolo dessa geragäo de poetas com preocupacöes sociais. Idcntiíi-cando-se com o condor - ave de voo alto e solitário, com capacidade de enxergar a grande distáncia os NOTRE-DÄ.ME DE PARIS. MH VICTOR HOfflO, poetas condoreiros supunham ser eles também dotados dessa capacidade e, por isso, tinham o compromisso, como poetas-génios iluminados por Deus, de orientar os homens comuns para os caminhos da justiga e da liberdade. No contexto europeu do século passado, o alvo preferido dos condoreiros era a causa dos oprimidos socialmente, isto é, dos operários da indústria e dos camponeses. No Brasil, cuja forga de trabalho era predominantemente eserava, o condoreirismo assume feigöes abolicionistas e republicanas. Estcs versos do poema 'O vidente', de Castro Alvcs, demonstram o pensamento liberal-crislao do poeta: Quebraram-sc as cadcias, é livre a terra inteira, A humanidade marcha com a Biblia por bandeira; Säo livres os escravos... quero euipunhar a lira, Quero que esťatma ardente um canto audaz desfira, Quero enlacar meu hino aos murmúrios dos ventos, As harpas das estrelas, ao mar, aos elementos! Castro Alves: a linguagem da paixao O poeta dos escravos, Castro Alves (1847-1871), é considerado a principal expressäo condoreira da poesia brasileira. Nasceu na Bahia e fez estudos de Dircito cm Recife e cm Säo Paulo. Sua obra representa, na evolugäo da poesia romäntica brasileira, um momento de maturidade e de transigäo. Maturidade, em relagäo a certas atitudes ingénuas das geragöes anteriores, como a idealizagäo amorosa e o nacionalismo ufanista, äs quais "Castro Älves därá um outro trafämentö, mais critico e realista^ Transigäo, porque sua perspectiva mais objetiva e crítica diante da realidade aponta para o movimento literário subseqüente, o Realismo, que, alias, já havia muito predominava n a Europa. • í; . ^ Castro Alves cultivou a • " poesia urica e social, de que säo exemplos as obras Espu-mas fluiuantes e A cachoeira de Paulo Afonso; a poesia 8 . spica, em Os escravos) e o tcatro, cm Gonzaga e a Revo-V ' ' lucäo de Minus. ^ poesia social JTalvez seja Castro Alves o primeiro grande poeta social jrasileirpjComo poucos, soube conciliar as Idéias de reforma" locial com os procedimentos especificos da poesia, sem permitir que sua obra caisse no mero panfleto politico -iliás, o grande risco para quem pretende fazer arte engajada, isto é, arte com o compromisso de interferir politicamente no proccsso social. Se compararmos Alvares de Azevedo principal poeta da segunda gcracäo - a Castro Alves, perceberemos que Azevedo, ao tratar do desequilibrio entre oeiieo mundo, revela um desejo latente de transformacäo da rcalidadc, com a qual näo consegue integrar-se. Jauern "Castro Alves há uma tornáda de posicäo: tanto em sua poesia urica quanto na social, há a consciencia dos problemas humanos e a busca de formulas para solucioná-los. Desse modo, em vez de uma visäo idealizada e ufanista da patria, Castro Alves retrata o lado feio e esquecido pelos primeiros romänticos: a escravidäo dos negros e a opressäo e a ignoräncmjfojsoyq brasileiro. A linguagem usadá par Castro Alves para defender seus ideais liberais é grandiosa, com gosto acentuado pelas hipérboles e por espácos amplos como o mar, o céu, o infinito, o deserto, etc. Tudo nela súpera a atitude bem-com-portada e rasteira de um Casimiro de Abreu e busca o vôo alto ou o mergulho profundo. Trazendo inovacôes de forma e de conteúdo, a linguagem poética de Castro Alves prenuncia a perspecťiva erítica e a objetividade do Realismo, movimento literário da década seguinte. Apesar dísso, c urna linguagem essencialmente romäntica, porque afim com o projeto liberal do Romantismo brasileiro e bastante carregada emocionalmente, beirando os limites da paixäo. 'O navio negreiro' 'O navio negreiro' é um poema épico-dramático que integra^a obra Os eseravos e, ao lado de 'Vozes d'Africa', da mesma obra, vem a sér uma das principais reaíizacoes épicas de Castro Alves. O terna de 'O navio negreiro' é a denúncia da eseravizacáo c do transporte dc negros para o Brasil. Quando o poema foi eserito, em 1868, já fazia dezoito anos que a Lei Eusébio de Queirós proibira o tráfico de eseravos, embora ainda nao tivesse sido climinada a eseravidáo em nosso pais. Portanto, sem o interesse de eserever sobre sua realidade imediata, Castro Alves faz uma reeriacao poética das cenas dramáticas do transporte de eseravos no porao dos navios negreiros, valendo-se em grande parte dos relatos de eseravos com quem convivcu, na Bahia, quando menino. . j. * .i fwIlMnFn iliiiTSfľíHV'l MMMMfc i i '.i • hhhi ,. . -ij.... HHHI 'vi?«- ■Blil O texto que segue, a parte IV de 'O navio negreiro', 6 a desericáo do que se vé no interior de um navio negreiro. Perceba a capacidade de Castro Alves em nos fazer "ver" a cena, como se cstivósscmos num teatro. Era um sonho dantesco!... o tombadilho, Que das luzernas avermelha o brilho, Em sangue a se banhar. Tinir de ferros... eslalar de acoile... Legioes do homens negros como a noite, Horrendos a dancar... Negras mulheres, suspendendo as tetas Magras eriangas, cujas bocas pretas Rega o sangue das macs: Outras, mocas, mas nuas e espantadas, No ititbílliíío de especiros arrastadas, Em ánsia e mágoa vás! E ri-se a orquestra, irónica, estridente... E da ronda fantástica a serpente Faz doudas espirais... Se o velho arqucja, se no chao resvala, Ouvem-se gritos... o chicote estala. E voam mais e mais... Presa nos elos de uma só cadcia, A multidáo faminta cambaleia, E chorá e danga ali! Um de raiva delira, outro enlouquece, Outro, que de martírios embrutece, Cantando, geme e ri! No entanto o capitao manda a manobra. E após fltando o cóu que se desdobra Tao puro sobre o mar, Diz do fumo entre os densos nevoeiros; "Vibrai rijo o chicote, marinheiros! Fazei-os mais danijar!..." E ri-se a orquestra irónica, estridente... E da ronda fantástica a serpente Faz doudas espirais... Qu.il mim sonho darresco as sombras voam!... Gritos, áis, maldigoes, preces ressoam! E ri-se Satanáš!... (Em Espumas flutuantes. Rio de Janeiro. Edi^óes de Ouro, s. d. p. 184-5.) tombadilho: alojnmenio do niivii). luzenias: claröes. afoitc: chicote. turliilliilo: ledeinoinho. espectros: liinlasmas. väs: inúlcis. sem valor, arqucja: está ofegante. dantesco: relativo ás cenas horríveis narradas por Dante Alighieri, em sua obra Divina comédia,nk parte cm que desereve q inferno. 1. O texto revela grande forca expressiva em virtude de sua plaxticidade, criada a partir das fortes imagens e das sugestoes de cor, som e movimento que envolvem a cena. A fini dc constatar esses recursos, responda: a) A que se referem as metáforas "a orquestra" e "a serpente"? b) Duas cores sao postas cm contraste na primeira e na segunda estrofes. Quais sao elas e o que representam? c) Observe a primeira, terceira, quarta e quinta estrofes c destaque delas palavras ou expressoes que sugiram movimento. d) Observe a primeira e a terceira estrofes e destaque delas palavras ou expressoes que se associem a smwridade. 2. Accntuando a plasticidadc do texto, por duas vezeš o poeta aproxima as idéias de som e movimento, empregando as palavras orquestra e danfu, como se houvesse uma danca dos eseravos ao som da orquestra. De acordo com o texto, explique que tipo dc danca rcalizam os eseravos. 3. Alem da antítese, a Iripérbole também foi empregada nessa poesia social de Castro Alves. A hipérbole é uma figura de linguagem que se caracteriza pelo exagero na expressao. Destaque da primeira estiofe tiés hipérboles e indique que ťuncao emocional ou psicológica těm no texto, 4. O poema 'O navio negreiro' tem uma fmalidade política e social evidente: a enadicacao da eseravidáo no Brasil. De que modo o poeta procura atingir o publico e convencé-lo de sua idéias: com argumentos racionais ou com a exploracao das emocoes? Justifique. A poesia lírica Embora a lírica amorosa de Castro Alvcs ainda contenha um ou outro vestígio doamor platónico e da^ idealizacáo da mulher, de modo geral ela representa um avanco decisivo na tradigao poética brasileira, por ter abandonado tanto o amor convencional e abstrato dos clássicos quanto o amor cheio de medo e culpa dos primeiros romänticos. Em vez de "virgem pálida", a mulher de boa parte dos poemas dc Castro Alves é um ser corporificado e, mais que isso, partieipa ativamente do envolvimento amoroso. E o amor é uma experiéncia viável, conereta, capaz de trazer Janto a felicidade e o prazer quanto a dor. Portanto o conteúdo de sua lírica é uma espécie de superagäo da fasc adolescente do amor e o início de uma fase adulta, mais natural, que aponta para uma objetividadc maior, prenunciando o Realismo. i tJĚ Boa nuite Boa noite, Maria! Eu vou-me embora. A lua nas janelns bate em chcio. Boa noite, Maria! É tardc... é tarde... Näo me apertes assim contra teu seio. Boa noite!... E tu dizes - Boa noite, Mas náo mo digas assim por entre beijos... Mas nao mo digas descobrindo o peito, Mar de amor onde vagam meus desejos. Julieta do céu! Ouve... a caíhandra Já rutnoreja o canto da matina, Tu dizcs que eu menti?... Pois foi mentira.. ... Quem cantou foi teu hálito, divina! Se a estrela ďalva os derradeiros raios Derrama nos jardins do Capuleto, Eu direi, me esquecendo ďalvorada: "Ľ noite ainda em teu cabelo preto..." É noite ainda! Brilha na canibraia - Desmanchado o roupäo, a espádua nua -O globo de teu peito entre os arminhos Como entre as névoas se balouca a lua... E noite, pois! Durmamos, Julieta! Rescende a alcova ao trescalar das flores, Fechcmos sobre nós estas cortinas... - Säo as asas do arcanjo dos amores. Ms/: caíhandra: espécie de cotovia. canibraia: tecido fino dc linho ou algodäo. arminhos: brancuras. alcovu: quarto dc casal. A frouxa luz da alabastrma lämpada Lambc voluptuosa os teus contornos... Oh! Deixa-me aquecer teus pés divinos Ao doudo afago de meus lábios mornos. Mulher do meu amor! Quando aos meus beijos Třeme tua alma, como a lira ao vento, Das teclas de leu seio que haimonias, Que escalas de suspiros, bebo atento! Ai! Canta a uavatina do delírio, Ri, suspira, soluca, anseia e chorá... Marion! Marion!... É noite ainda. Que importa os raios de uma nova aurora?!.., Como um negro e sombrio firmamento, Sobre mim desenrola teu cabelo,.. E deixa-me dormir balbuciando: - Boa noite! - formosa Consuelo!.., (Op. cit., p. 67-8.) 5 '" .'K tiescalar: exalar cheiro. alabastrina: coi de alahastro (branca). voluptuosa: sensual. cavatina: pequena ária (peca musical). -A---- 1. A propósito da rclacäo amorosa presente no texto, rcsponda: a) Que reaeäo tern a mulher amada diante da afirmacäo de seu amante de que vai embora? b) O que essa reaeäo da amanle difere da de oulras mulheres das gcracöcs romänticas anteriores? 2. Da quinta estrofe em diante, a sensualidade da cena amorosa aumenla. a) Retire dessa estrofe as expressoes que caracterizam eroticamente a mulher amada. b) Indique, na quinta, sexta e sétima estrofes, o tipo de percepgäo sensorial que predomina em cada uma delas. 3. Na nona estrofe, ocorre uma espécie dc climax da relagäo entre os amantes, sugerida pela palavra dehrio, É um estado de embriaguez amorosa, em que predominam as sensacöes; um momento mágico que, na concepcäo romäntica, deveria ser paralisado para que o casal o vivesse eternamente, enquanto o tempo corresse lá fora. Releia essa estrofe e destaque dela: a) um verso que confinna as sensacöes ou sentimentos contraditórios durante o estado dc delirio; b) as expressoes que confirmam o desejo romäntico de perpetuar o instante de gozo. 4. Observe o emprego da expressäo "boa noite" na primeira e décima estrofes c indique a alteracäo de sentido que sofreu a expressäo de uma estrofe para a outra. 5. Ao longo do poema, o eu lírico cháma a mulher amada dc diferentes nomes: Maria, Julieta, Marion e Consuelo. Todas clas säo personagens de histórias de amor de eseritores europeus. Com que finalidade o eu lírico atribui essa multiplicidade de nomes a mulher amada? Dé uma interpretaeäo possível. Sousándrade: a comunicacao solitária Joaquim de Squsji Andrade (1833-1902), au_ Sousándrade, como gostava de ser chanmdo, foi o poeta brasileiro mais original no século passado. Filho de fazendeiros, nasceu no Maranhäo e estudoiF ha "FrancaJf~ř35de se bacharelou em Letras e Engenharia de minas. Tentou a agricultura, mas logo a abandonou. Peregrmou por váriqs países, como Franca, Bélgica, Estados Unidos e Chile. Estreando em nossa literatura em 1857, com sua Harpas selvagens, Sousándrade poderia figurar tanto entre os poetas da segunda geraeäo romäntica, pelo eritério cronológico, quanto entre os poetas da terceira geraeäo, dado o teor abolicionista c republicano de alguns de seus textos. Entretanto nenhum desses eritérios é sufícientc para examinar e avaliar a contribuigäo de Sousándrade á poesia brasileira. Incompreendido pelos críticos, pelos leitores e até pelos familiäres, Sousándrade, consciente de sua condigäo, já afirmava em 1877, nunia introdueäo ao canto VII de sua obra maxima Guesa errante: "Ouvi dizer já por duas vezeš que o Guesa erranre será lido cinqücnta anos depois; entristeci ~ dcccpcäo de quem esereve cinqiienta anos antes". Dotado de uma compreensäo mais ampla e crítica acerca da pátria e do indianismo, entäo vigentes na poesia de seus contemporáneos románticos, Sousándrade defendia uma nova civilizagäo americana, independente, jjolítica e culturalmcnte. Em seu ameri-canismo, que funde as trés Áméricas. encontram-se alusoes aos aspectos tanto paradisíacos quanto infernais da Amenta. É um americanismo crítico: ao mesmo tempo que recupera as tradigoes indígenas amazonenses e colombianas, aponta o cáncer do mundo moderno, na república do Nořte, o interno fmancciro de Wall Street. Avaliada pela crítica da época com os mesmos eritérios utilizados para julgar a producáo dos románticos, sua obra foi marginalizada e esquecida durante longo tempo. Somente nas ultimas décadas do nosso século, após a publicacao de Revisdo de Sousándrade, dos críticos Augusto e Haroldo de „Campo.s, é que o poeta passou a ser defendido como um dos precuršores ďé toda a literatura moderna, ao lado de grandes nomes internacionais, como Charles Baudelaire e Edgar Allan Poe. Como exemplo, observe estes fragmentos do poema 'Novo Eden', eserito entre 1888 e 1889, no exato momento em que se davam os desdobramentos políticos que levariam á aboligao e á república. Alegoricamente, o poeta faz um paralelo entre o fim da Monarquia c a queda de Adáo e Eva do paraíso. mm MM ■Bili Banidós do paraíso: olhando para trás, D'espelho que se parte o relampagucamento D'estampido seguido e que cegueira faz Que ďalma a dor profunda apaga no momento, Viram... urn lago! ao longe... um monte!... nada mais. Já era o :p6r-dg-spl: cansados do caminho, Eva chorándo, o abrolho, o card'ey'a urtiga, o espinho, Rasíos dos pés sangrando: unidóssedeilaram Sem mais o éncanto edenvo... Ainar? os céus olharam: Os aslros cm suas frontes cm suor; Traycsseiro? urna pedra. Bosastros sempře Hnido!'... Foi quando Pronieteus náopode mais; e trouxe Dos céus céntéltía: e ao fogoohomemque aqiiemou-sc: Toda trísteza ante ele, os olhos reluzindo Meiga, mortal, calada: ao cold:dantuiher, No Eden do amor, o lar cosmopplita, achou-se Tmagem de Deus uno, a came fdsiclér; Forma flor, forma céus, páfa-olhos e pára-almas, ? Da Criaeao o amor em gémeos, dots amores, Corpos vibrantes dois, duás psíquicas pahnas .•■';; Os coracoes em luz, cárhiiriumš, sahgůéš, dores E o ideal Promctcus, a ideal imagem-Dcus, SHI MĚm sm Tam ■BEmE >Bfa hJh BBHH2 HBfßSI KlllllliEIJ Brn MESSE •jjjjt hl i ■ .■■ 1111 lir, i 1 -lL'1 mm BSaT ■ um liiB I I i1 ll u , 142 ■E2E2S ■HHHÍ ■■HI HHHHH wLWĚ Egressos Ďo Eden, foi, travesseiro a pedra e o leito Entre abrolhos e cspinhos, que os esposos Casáram consolando-se: que apenas Adolescéncia, puberdade, sonhos, Ainda nas rnaos de Dens se perfazendo Nevosos copos do alvo seio d'Eva, Risos, auroras, nos jardins houveram De delicias, que těm da divindade, Que Deus nao deu no irrational d'instintos, Ao qual mandou procriar sem rir nem ciencia, (Em Augusto e Haroldo de Campos. Revisäo de Sousähdrade. 2a ed. Rio de Janeiro, Nova Fron-«eira, 1982, p. 381.) abrollio: tipo de planla, uspinho. cardo: planta espinhosa, l'iilgur: brillio. PrometcHs: um dos titäs da mitologia; roubou o ťogo do Olimpo para daft ao hörnern. rosiclcr: tonalidadc rósco-pňlida. ťurnuriiuns: trata-se de um ncologismo. Castro Alves Adormecida Uma noite, eu me lembro... Ela dormia Numa rede encostada molemente... Quase aberto o roupao... solto o cabelo E o pé descalco do tapetě rentě. 'Stava aberta a janela. Um cheiro agreste Exalavam as silvas da campina... E ao longe, num pedaco de horizonte, Via-se a noite plácida e divina. De um jasmineiro os galhos encurvados, Indiscretos entravam pěla sala, E, de leve oscilando ao tom das auras, lam na face trěmulos - beijá-la. Era um quadro celeste!... A cada afago Mesmo em sonhos a moca estremecia... Quando ela serenava... a flor beijava-a... Quando ela ia beijá-la... a flor fugia... Dir-se-ia que naqucle doce instante Brincavam duas Candidas crian9as... A brisa, que agitava as folhas Verdes, Fazia-lhe ondear as negras trancas! E o ramo ora cliegava, ora afastava-se.. Mas quando a via despertada a meio, Pra näo zanga-la... saeudia alegre Uma chuva de perolas no seio... Eu, fitando esta cena, repetia Naquela noite länguida e sentida: "O flor! - tu és a virgem das campinas! "Virgem! tu és a flor da minha vida!..." (Op. cit., p. 68.) 1. (Covcst-PE) Descansem o meu leito solitário Na floresta dos homens esquecida, A sombra de uma cruz, e escrcvam nela: - Foi poeta sonhou - e amou na vida. Assinale falsa ou verdadeira: a) Os versos fazem parte de tm longo poema de Grcgório de Matos, escrito em 1634. b) Mostram como Álvares dc Azevedo foi marcado pelo tenia da morte e da solidäo. c) Säo tipicos da poesia Pau-Brasil. d) Definem o poeta tal qual o concebia o Realisme e) Säo tipicos do Mal-do-Século. (Integrado-RS) Tex to para as questôcs 2 e 3. Romantismu Quern tivesse um amor, ncsta noite de lua, para pensar um belo pensamento e pousá-lo no vento! Quem tivesse um amor - longe, certo e impossivel -para sc ver chorando, e gostar dc chorar, e adormecer de lágrimas e luar! Quem tivesse um amor, c, entre o mar e as estrelas, partísse por nuvens, dormente e acordado, levitando apenas, pelo amor levado... Quem tivesse um amor, sem dúvida nem mácula, sem antes nem depois: verdadc e alegória... Ah! quem tivesse... (Mas, quem tevc? quem teria?) (Cecilia Meireles. Mar absolute. Rio de Janeiro, Aguilar, 1967.) 2. Justifique o título do poema com base em elementos caracteristicos do estilo romäntico presentes no texto. 3. A visäo modernista da autora considera possivel ou impossivel a existencia de um amor romäntico? Justifique com apoio nas variacôes verbais da ultima estrofe do poema. (Vuncsp) As questôes de números 4 e 5 tomam por base o seguintc texto: "Seja qual for o lugar em que se ache o poeta, on apunhalado pelas dorcs, ou ao lado de sua bela, embalado pelos prazercs; no cárcere, como no palácio; na paz, como sobre o campo de batalha; se ele é verdadeiro pocta, jamais deve esquecer-se de sua missäo, e achá sempře o segredo de encantar os sentidos, vibrar as cordas do coracäo, e elevar o pensamento nas asas da harmonia até as idéias arquétipas." O trecho acima foi extraído da "Advertěncia" ao leitor feila por Domingos José Goncalvcs de Magalhäes nas páginas iniciais de seu livro Suspiros Poéticos e Saudades. Que representa esta obra na história da literatura brasileira? 5. A lcitura do trecho citado nos permite identificar o periodo literário a que pertence a obra. Comente duas passagens desse trecho que revelem caracteristicas da literatura do periodo em questäo. (Cesgranrio-RJ) Texto para as questöes de 6 a 11. V 1 Scnhor Deus dos desgracados Dizei-me vós, Senhor Deus! Se é loucura... se é verdade Tanto horror perante os céus?! 5 O mar, por que näo apagas Co'a esponja de tuas vagas De teu manto este borräo?... Aslros! noites! lempestades! Rolai das imcnsidadcs! 10 Varrei os mares, tufäo! Quem säo estes desgracados Que näo encontram em vós Mais que o rir calmo da turba Que excita a fúria do algoz? 15 Quem säo? Se a estrela se cala, Se a vaga á pressa resvala Como um cúmplice fugaz, Perante a noite confusa... Dize-o tu, severa Musa, 20 Musa Uberrima, audaz!... Säo os filhos do deserto, Onde a terra esposa a luz. < Onde vive em campo aberto A tribo dos homens nus... 25 Säo os guerreiros ousados Que com os (igres mosqueados Combatem na solidäo. Ontem simples, fortes, bravos... Hoje miseros eseravos. 30 Sem luz, sem ar, sem razäo... (Castro Alves, O Navio Negreiro. In _, Poesias complelas. S. Paulo, Saraiva, 1960. p. 530-831.) 6. As indagacöes na la e na 2a estrofes indicam: a) dúvida. b) perplexidade. c) hesitacäo. d) negatividade. e) surpresa. 7. A Musa a que o poeta se refere é: a) a natureza em geral. b) a inspiracäo poética. c) a estrela. d) a sua amada. e) a figura divina. 8. Assinalc a opcäo que näo conťírma caracteristicas da poética de Castro Alvcs, de acordo com o texto: a) inquietacäo decorrente de problemas objetivos. b) sentimento humanitário diante de desigualdades sociais. c) aproveitamcnto de imagens bíblicas. d) mistura de erudicäo com cxaltacäo de apelo popular. e) tendencia á autocompaixäo. 9. A cloquéncia, freqiiente em Castro Alves, se revela neste poema pela presenca de: a) apóstrofes e imagens bucólicas. b) exclamacöes e imperativos. c) inlerrogacčes e estrofes eurtas. d) retiečncias c cor local. e) elipses e temática social. 10. Assinale a afirmativa incorreta quanto a tracos do Romantismo presentes no poema: a) contraste entre o real e o ideal. b) tendencia ao passional. c) assimilacäo de um ritmo recitativo. d) referéncias á natureza. e) propensäo á melancolia. 11. Säo consideradas ricas as rimas que se fazem com palavras de classe gramatical diferente, como apagas / vagas (versos 5 e 6). Assinale as rimas do texto que também podem ser consideradas ricas: a) Deus / céus (versos 2 e 4) b) borräo / tufäo (versos 7 e 10) c) cala / resvala (versos 15 e 16) d) fugaz / audaz (versos 17 e 20) e) confusa / Musa (versos 18 e 19) 12. (Fatec-SP) Sens olhos, täo negros, táo belos, täo puros, Tém mciga expressäo, Mais doce que a brisa, - mais doce que o naula De noite cantando, - mais doce que a fraxrta Quebrando a solidäo. Indique a alternatíva errada: a) Estes versos representant bem a idéia popular do Romantismo, contida - por exemplo - na expressäo: - Como ele é romäntico! b) A ideológia do Romantismo pendia para o socialismo. c) No Romantismo brasilciro há preocupa<;äo social: libertacäo dos eseravos. d) O ritmo dos versos acima realca ameiguice, a docura. e) O Autor näo contraria a temática do Arcadismo em que sc atribui a flauta ao pastor; näo se está afirmando que o marinheiro toca flauta. 13. (Fuvest-SP) I. "Ah! enquanto os destinos impiedosos Näo voltam contra nós a face irada, Facamos, sim facamos, doce amada, Os nossos breves dias mais ditosos," II. "E a vaidade, Fábio, nesta vida, Rosa, que da manhä lisonjeada, Purpuras mil, com ambigäo dourada, Airosa rompe, arrasta presumida." III. "E quando eu durmo, e o coragao ainda Procura na ilusao tua lembranga, 1 Anjo da vida, passa nos meus sonhos E meus lábios orvalha de esperanga!" Associe os trechos acima com os respectivos movimentos literários, cujas características estao enunciadas abaixo: Romantismo: evasao e devaneio na realizagáo de um erotismo difuso. j Arcadismo: aproveitamento do momento presente ("carpe diem"). Barroco: cfemeridade da beleza fisica, brevidade enganosa da vida. a) I - romantismo; II - arcadismo; III - barroco b) I - barroco; II - arcadismo; III - romantismo c) 1 - arcadismo; IT - romantismo - IIT - barroco d) I - arcadismo; II - barroco; III - romantismo e) I - barroco; II - arcadismo; III - romantismo 14. (Covesp-PE) Identifique as geragôes romänticas a que pertence cada texto abaixo: "Adeus, meus sonhos, eu pranteio e morro! Näo levo da existencia uma saudade". "O gcrrciros da Tribo Tupi, O guerreiros, meus cantos ouvi". "Quebre-se o cetro do papa, Faga-se dele uma cruz! A purpura sirva ao povo p'ra cobrir os ombros nus". "Bom tempo foy o ďoutrora Quando o reyno era christäo, Quando nas gueras de mouros Era o rey nosso pendäo". A seqiiéncia conseguida foi: a) 1" geragäo - 1" geragäo - 2- geragäo - 3" geragäo b) 1- geragäo — 1* geragäo — 3a geragäo — \- geragäo c) 3a geragäo - la geragäo - 1° geragäo - 2" geragäo d) 3D geragäo - 1* geragäo - 3a geragäo - 1° geragäo e) 2° geragäo - 3a geragäo - lu geragäo - 2° geragäo 15. (Fuvest-SP) Já da morte o palor me cobre o rosto, Nos lábios meus o alento desfalccc, Surda agónia o coragäo fenece, E devora meu ser mortal desgosto! No fragmento acima, pertencente a um poema de Alvares de Azevedo, notam-se características de qual tendencia romäntica? a) Mal-do-século. b) Bucolismo. c) Pocsia condoreira. d) Nacionalisme e) Indianismo. 148 16. (Covesp-PE) Utilize os códigos; a) se apenas a informagäo I lor correta; d) se apenas a II e a III forem corretas; b) se apenas a II for correta; e) se todas esliverem corretas. c) se apenas a I e a II forem corretas; "No Brasil, ultra-romänticos foram os poetas - estudantes, quase todos falccidos na segunda adolescéncia, membros de rodas boémias, dilacerados entre um erotismo länguido e o sarcasmo obsceno. Os que dobraram a casa dos vinte e cinco acumularam os fracassos profissionais e os rasgos dc instabilidade, conlirmando a indole desajustada desses 'poetas da dúvida', a que faltam por complcto a afírmatividade dos romänticos indianistas e a combatividade dos condoreiros..." (José Guilherme Mcrquior) I - O autor faz referencia ao "mal do século". TI - Os ultra-romänticos formám a segunda geragäo da poesia romäntica no Brasil. III Os poetas indianistas represenlam a primeira geragäo romäntica e a terceira é representada pelos condoreiros. 17. (ITA-SP) Marque a opgäo que identifica autor, obra e escola a que pertence o seguinte excerto: Säo mulheres desgragadas Como Agar o foi também, Que sedentas, alquebradas, Dc longc... bem longe věm... Trazendo com tíbios passos, Filhos e algemas nos bragos, N alma lágrimas e ľel. a) Fagundes Varela - Vozes da America - Romantismo. b) Basílio da Gama - O Uraguai - Neoclassicismo. c) Castro Alves - O Navio Negieiro - Romantismo. d) Jorge dc Lima - Pocmas Negros - Modernismo. e) Manuel Bandeira - Cinza das Horas - Modernismo. 18. (F. Carlos Chagas-BA) É bela a noite, quando grave estende Sobre a terra dormente o negro manto De brilhantes estrelas recamado; Mas nessa escuridäo, nesse silencio Que ele consigo traz, há um quě de horrível Que espanta e desespera e geme n'alma; Lím que de triste que nos lembra a morte! Os versos acima: a) ilustram a característica romäntica da projegäo do estado de espírito do pocta nos elementos da natureza. b) exempliíicam a caracteristica romäntica do pessimismo, mal do século, que vé na natureza algo nefando, capaz dc matar o poeta. c) exploram a caracteristica romäntica do sentimentalismo amoroso, que vé em tudo a tragédia do amor näo correspondido. d) apontam a característica romäntica do nacionalismo, que valoriza a paisagem de nossa terra. e) apresentam a característica romäntica do deseritivismo, capaz de valorizagäo exagerada da natureza. 149 1- '.: Erw. ■■■■Hl Para biilicr ninh sobro n prusu lonuntica u asiiciiW)'; afms. suqerimos: LER: alciuns dos romances euro-ppus qui'1 infiiirnninmm rossns ronianuisUs loiiiuuticos. E u c;ri so de obias> como A Danra das Cornelias, dp Alexandre Dumas Filho, e os contos de E. T. A. Hoffmann e Edgar A, Poe, impor-tantissimos para a tradigao goti-ca na prosa. ASSI5TIR: aos filmes A Dama das Camelias (1936), de George Dewey Cukor, Iracema, a virgem dos läbios de mel (1949), de Carlos Coimbra, e Iracema - uma transa amazönica, de Jorge Bo-danski (1980), O Guarani, de Fauzi Mansur (1979), e aos filmes da tradicäo götica, como Nosferatu, de Werner Herzog, Dräcula de Brain Stoker, de Francis Coppola (1992), e värios do cineasta brasi-leiro Z6 do Caixäo. OUVIR: a müsica de composi-tores romänticos como Beethoven, Schubert e Mendelssohn, alem da opera O Guarani, do compositor brasileiro Carlos Gomes. Ouca ainda a composicao 'Meu doce vampiro', de Rita Lee e Roberto de Carvalho, que tam-bem se relaciona com a tradicao gotica. CONHECER: a obra de pin-tores romanticos, como Goya, Gros e Delacroix. COMPARAR: com base na literatura e no cinema, as diferen-?as de tratamento dado ao indio e ao negro na cultura brasileira. ^ ****** '|„ If I KIP ^Tf?E 4 No Brasil pos-Independencia, colocou-se um desafio para nossos escritores romänticos: definir o conceito de nacäo e de cidtura brasileiras. 0 romance brasileiro. ao surgir nesse contexto, assume o papel de um dos principals instruinentos nesse processo de "rcdescoberta" do pais e de bnsca de uma identidade national. Riinianii.sMH) obteve ampla aceita9ao entre os leitores de literatura no Brasil. Isso se deve principalmente a dois fatores: a identificagao imediata do publico com a poesia romantica, de comunicafao direta e acessível, e o aparecimento de um género literário novo em nosso pais: o romance. As origens do romance A palavraj^^flce origina-se do termo medieval romanpo, que designavažras linguas usadas pelos povos sob domínio da Império Romano. Essas linguas eram uma forma popular e evoluida do latim. Também se""čhamlí^"l^mance as 'composicoes de cunho popular e folelórico, escritas nesse jatim vulgar, em prosa ou em verso, que contavam histórias cheias de imagina9ao, fantasia e avenluras. /1 O romance, como genero literärio, modifica-se de acordo com as transforma90es culturais e com as exigencias de seu publico consumidor. O genero assume formas de romance de cavalaria, romance sentimental, romancejastoriL Somente emjmeados do seculo XVIIIjque a palavra romance passou a designar o genero como o entendemos hoje: um texto em prosa, normalmente longo, que possui värios nücleosjarrativos em torno de urn nucleo central. Narrajnto criados ou relacionados a personggens, numa seqiiencia de tempo relativamente ampla e em determinado lugar ou lugares. Esse tipo dc romance esta vinculado diretamente ä formapäo de um novo publico consumidor, a burguesia, e äs origens do proprio movimento romäntico. O romance e a burguesia As origens populäres e o senso prätico da burguesia näo coincidiam com o refmamento da arte clässica. :AJ)U£guesia, quejiiara^ideqlogka^ o Arcadismo, ainda carecia de uma arte sua, capaz de exprimir o universo do h^cmiem burgues, lanlo na forma quanto no conteüdo. Ö romance, por relatar aeonteeimentos da vida comum e cotidiana, e por dar vazäo ao gosto burgues pela Jantasia e pela aventura, vem a scr o mais legitimo veiculo de expressäo artistica dessa classe. Sob certo ponto de vista, o.romance vem substituir a epopeia, um dos generös de maior prestigio da tradi9äo clässica. Contudo altera-lhe o foco de interesse: enquanto a epopeia narra um fato passado, em geral um mito da cultura de um povo, o romance narra o presente, as coisas banais da vida e do mundo, numa linguagem simples e direta. Os primeiros romances, na acep9äo moderna, surgem na Europa ja identificados com o inicio da revohifäo romänlica. O gencro passa desse modo a scr quase sinonimo do movimento e, no seculo XIX, solidifica-se como a sua maior expressäo. Destacam-se dentre os primeiros romances europeus: Manon Lescaut, do abade Prevost (1731), A historic! de Tom Jones, de J^?jirxJReJdin£j_i 749). O romance e o folhetim Tanto na Europa quanto no Brasil, o romance surgiu inicialmentc sob a forma de Jolhetim, que era uma publica9ao diaria, em jornais, de capitulos de deter-minada obra literaria. Assim, ao mesmo tempo que ampliava o publico lcitor de jornais, o folhetim tambem ampliava o publico de literatura. Inicialmente os folhetins aqui publi-cados eram Jraducoes de obras cstrangei-ras; posteriormente foram publicadas produces nationals. Seu publico leitor, "TSrmado principalmente por mulheres, incorporava tambem estudantes, comcr-ciantes, militares e funcionarios piiblicos. FOLHETIM iIUllO SANOSAU .. í Como quasf lodns ns nldeias ntravessadaa for iii/m e.strndo de primeim. elasse, Nouvy-Jos-Ui«í|mis ií linrr'MXiMn, -' tmnucentu. no in-viiľiio, nm ľóco do pii no vedu, e:, nm Uiiu o iiiii|ľi, duaUluida dii poosiii, de encunUw o i l'uwi nu oonliBcer n bim Impoi'tniieia hustil iliwr-rid i|Uí!, initus do díu"om <]nn corneja osia sltigellu imrwlivo, íiuiiliniii dnu «oiw Im? IiUwiUis bo Imulmiva ijim uum vluUiru ]hi-blica, qiiulijuiir, dfUsii A }n'ijiionn oldola m Iľiiirii.s iln umu tixltii mn ])»lieo iliimonidii.. Jistii indittnruMfii ,qii(!«» ľueliftinM u «m-duntores niiiiiifiistíiri'nn, tun tuilno tsinpoi'jmr-N'cuvy-dos-Iloäiiui's, di't iliaii fruqiiU.siiini Hela do minlidude doa wiim vính'w. En» i) mn dominíro ďi rmlianim, nntrniil In nldoin, h»()«irtí»t tt> i mihlu iiľľtioiidicit^s ( O folhetim dcsapareccu no seculo XX. O romance evoluiu. explorou novas expe-ricncias e modificou sua estrutura. Apesar disso. o genero folhelinesco foi retomado na litci'ntura, na decada de 70 dcste seculo, pel.1 i-.um Maui-i de Souza, com seu Galvez, o imperador do Acre. O romance brasileiro e a identidade national Com a Independencia do Brasil, em 1822, nossos artistas c intelectuais empenEaram-sc cm defmir uma identidade cultural do pais. Afinal, o que era ser brasileiro naquele momento? Qual a nossa lingua, nossa raga, nosso passado historico, nossas tradigdes, etc? O romance, muito mais do que a poesia, procurou dar respostas imediatas a essas perguntas, assumindo o papel de principal instrumento de construgao da cultura brasileira. Assim, procurando ""rc-dcscobrir" o pais, o romance brasileiro esta radicalmente ligado ao reconhecimento dos espagos nacionais, tornados em tres frentes: a selva. o campo e a cidade, que darao origem, respectivamente, ao romance indianistu e historico (a vida primitiva), o romance regional (a vida rural) e o romance tirbano (a vida citadina). Jose de Alencar, por exemplo, o maior romancista de nosso Romantismo, escreveu obras ligadas a esses tres espagos, como O Guarani, romance historico-indianista; O gaucho, romance regional; e Senhora, romance urbano. f\ It Pfll lpf(IC-*1'!'1 {'\'.-\ i'íř'OiS3 Y'lYft"i3IIílCřl O romance romäntico tcve aproximadamente quarenta anos.4?.yitU>: da década de 40_a década de HO do seculo XIX. Nessa trajetória, modificou-se, amadureceu, aprimorou suas técnicas e preparou as bases para o surgimento de grandes mestres no género, como Machado de Assis. Contudo, certas características säo comuns a quase todos eles; por isso convém examiná-las. A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo O primeiro romance brasileiro propriamente dito, depois de algumas tentativas malsucedidas no género, foi_A_Moreninha (1844), de Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882). Embora formadTTěm Medicína, Macedo d^ejlica^-se ao jornalismo e á politica. Sua primeira obra, A Moreninha, confere-lhc ampla jsopularidade, que se estenderá a outros romances." Nessa primeira publicagäo, Macedo encontrou os ingredientes necessá-rios para satisfazer o gosto do publico lcitor da época e repetiu-os, em sens dezessete romances posteriores, até á exaustäo. De modo gerai, esses ingredientes säo: a comicidade, o namoro dificil ou impossivel, a dúvida entre^o dever e o desejo, a revelagäo surpreendente de uma identidade, as brincadeiras de estudantes e uma linguagem mais incKnada para o coloquial. O texto que segue é um fragmento do romance A Moreninha, e por mcio dele estudaremos a linguagem da prosa romäntica. Um grupo de amigos - Augusto, Fabrício, Leopoldo e Filipe - vai passar o Dia de SanťAna na casa da avó de Filipe, mima ilha próxima ao Rio de Janeiro. Filipe aposta que os rapazes iräo interessar-se por suas primas ou sua irmá, Carolina, que lá estaräo. Augusto itceitn a aposta, e fica combinado que quem perder esereverá a história de sua derrota. Mais tanie se vem a saber que essa história é a propria obra A Moreninha. De fato, Augusto apaixona-se pela moreninha Carolina, mas näo podc realizar seus sentimenlos; ha via fcito, sete anos antes - aos treze anos de idade -, urn juramento de fidelidade a uma menina que conhecera na praia. Ele e a menina haviam-se unido para auxiliar um moribunde, o qual, num gesto simbólico, casara-os e fizera com que trocassem presentes - ele deu a ela urn camafeu, c ela deu a ele uma esmeralda -, além de Juras de um casamento verdadeiro no future Augusto, agora com vinte anos, confessa seu amor a Carolina, que considera a atitude do rapaz uma prova de sua infidelidade amorosa e lhe pede que vá embora, ao encal?o daquela a quern jurara amor. Ele concorda. Em seguida... D, Carolina deixou cair uma lágrima, e falou ainda, mas já com voz fraca e trémula: - Sim, deve partir... vá... Talvez enconlre aquela a quern jurou amor etemo... Ah! senhor! nunca Ihe seja perjure - Se eu a encontrasse!... - Entao?... que faria?... - Atirar-me-ia a seuš pes, abracar-me-ia com eles e Ihe diria: "Perdoai-me, perdoai-me, senhora, eu já nao posso ser vosso esposo! tomai a prenda que me desles..." E o infeliz amante arrancou debaixo da camisa um breve, que convulsivamente apertou na mao. - O breve verde!... exclamou D. Carolina, o breve que contém a esmeraldal... - Eu Ihe diria, continuou Augusto: "recebei este breve que já náo devo conservar, porque eu amo outra que nao sois vós, que é mais bela c mais cruel do que vós!..." A cena estava se tornando patética; ambos choravam e só passados alguns instantes, a inexplicável Moreninha pode falar e responder ao triste estudante. Oh! pois bem, disse; vá ter com sua antiga desposada, repita-lhe o que acaba de dizer, e se ela cedcr, sc pcrdoar, volte que eu serei sua... csposa. -Sim... eu corro... Mas meu Deus, onde poderei achar essa moca a quern náo tornei a ver, nem poderei conhecer?... onde, meu Deus?... onde? E tornou a deixar correr o pranto por um momenta suspense - Espcrc, tornou d. Carolina, escute, senhor. Houve um dia, quando minha mac era viva, em que eu também socorri um velho moribundo. Como o senhor e sua camarada, matei a fome de sua família e cobri a nudez de seus filhos; em sinal de reconhecimento também este velho me fez um presente; deu-me uma reliqtiia milagrosa, que, asseverou-me ele, tem o poder uma vez, na vida de quem a possui, de dar o que se deseja. Eu cosi essa relíquia dentro de um breve; ainda nao Ihe pedi coisa alguma, mas lrago-a sempře comigo; eu lha cedo... lome o breve, descosa-a, tire a relíquia e á mercé dela lalvez encontre sua antiga amada. Obtenha o seu perdao e me terá por esposa. - Isto tudo me parece um sonho, respondeu Augusto, porém, déme, dé-me esse breve! A menina, com efeito, entregou o breve ao estudante, que comegou a descosě-lo precipitadamente. Aquela rehquia, que se dizia milagrosa, era sua ultima esperanga; e, semelhante ao náufrago que no derradeiro extremo se agarra á mais leve tábua, ele se abragava com ela. Só faltava a derradeira capa do brevc... ci-la que cede c sc descosc... salta uma pedra... c Augusto, entusiasmado c como delirante, cai aos pés dc d. Carolina, exclamando: - O meu camafeu!... o meu camafeu!... A senhora d. Ana e o pai de Augusto entraram nesse instante na gruta e encontraram o feliz e fervoroso amante de joelhos e a dar mil beijos nos pés da linda menina, que também por sua parte choráva de prazer. - Que loucura é esta? perguntou a senhora d. Ana. - Achei minha mulher!... bradava Augusto; encontrei miuha mulher!... encontrei minha mulher!... - Que quer dizer isto, Carolina?... - Ah, minha boa avó!... respondeu a travessa Moreninha ingenuamente: nós éramos conhecidos antigos. (2? ed. Sáo Paulo, Ática, s. d. p. 144-6.) breve: escapulário, santinho: 1. Um dos liagos que marcam a linguagem da prosa romäntica é a presenga constante do seutimentalismo. Destaque do texto um fragmente em que tal trago se evidencie. 2: ..Oamot impossivel e a mulher idealizada säo também componentes freqiientes da prosa romäntica. Como solugäo pára o impasseamoróso, čostuma haver dois tipos de saida: o final feliz, em que o amor súpera as barreiras sociais; c o final trágico, em que a morte se coloca como única saida, adiando a realizagäo amorosa para a vida eterna. Em A Moreninha: a) Qual a saída dada pelo autor ao impedimenta amoroso? b) Podc-sc afirmar que essa saída está de acordo com as normas sociais ou é contrária a elas? Justifique com elemenlos do texto. 3. O romance romántico, em sua fase iniciál, caracteriza-sc pela ocorréncia deperipécias, islo é, fatos surpreendentes que alteram o rumo da narrativa. a) Que efeito a peripécia sentimental busca provocar no leitor? b) Que fato da obra A Moreninha pode ser visto como exemplo da peripécia sentimental romäntica? Características da prosa romäntica Além das características da prosa romäntica estudadas no texto, outras merecem destaque: • o flush-back narrativo: o narrador faz uma "volta no tempo", para explicar, por meio do passado, certas atitudes das persottagens no presente. Äsjyezes, esse flash-back traz reyelacôes surpreendentes, confundindo-se cntäo com a peripécia. Em A Moreninha, por exemplo, o flash-back explica o comportamento indiferente de Augusto em relagäo ás mulheres (o casamento com a menina, na infäncia), ao mesmo tempo que prepara a peripécia: Carolina era a menina. • o amor como redetifäo: o conflito narrativo dos romances romänticos é normalmente a oposicäo entre os valores da sociedade e o desejo da reaíizacäo amorosa dos amantes: ou a família näo deseja a uniäo do casal, ou um dos dois está impossibilitado (social ou religiosamente) ou näo merece moralmenle o amor do outro, De qualquer forma, o amor é I sempře visto como o único meio dc o herói ou o viläo i romántico se redimirem e se "purificarem". # idealizafäo do herói: o herói romántico cm geral é um ser dotado de idealismos, de honra e coragem. As vezes pôe a propria vida cm risco para atender aos apelos do coragao ou da justica. Em algumas obras de influéncia medieval, o herói romántico assume feigôcs de cavaleiro medieval, como é o caso de Peri da obra Ô Guarani, de José de Alencar. * idealizafäo da mulher: normalmente as heroínas romänticas säo mogas sem opiniäo propria, dominadas pela emogäo, obedíentes ás determinagóes dos pais e educadas para o casamento. E'rágeis, freqüentemente sofrem de mal-estar ou desmaiam. Sua ocupacäo principal é sonhar com um "principe encantado" e tramar intrigas sentimentais. personagens planus: embora o Romantismo, como a estética da emocäo, valorize o mundo interior das personagens, só raramente essa exploragäo interior alcanga profundidade. Em geral, as personagens säo trabalhadas emocionalmente, mas näo como um todo; ou seja, näo se mostra o lado racional delas, suas rcflcxöcs existenciais, scus conflitos interiores. Älčm dissö, essas personagens normalmeate säo lineares, isto é, näo sofrem_ mudanca e mantém esse perfil do comeco ao fim da obra - por issosäo chaniadas de personagens planas. As poucas personagens esfericas do Romantismo pertencem a obras de transicäo para o Rcalismo. lingiiagem metafórica: a prosa romäntica tende ajantasia e á imaginagäo, por isso säo freqüentes as describes com aďjetivacäo abundante, as comparacöes e as metáforas, com a finalidade de idealizar um ambiente ou uma personagem. Observe esses procedimentos na dcscrigäo que Jose de Älencar faz da india Iraccma: Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais loligos que seu talhe de palmeíra. Em síntese, assim podem ser esquematizadas as principals características da prosa romäntica: f r, Scntimcntalismo Imp.ľ-'-Ľ :ii:niľ(is(i. coi-i liual Ich/ ou lujico ■s Oposicäo aos valores sociais .s s1 ľoi i péci:-s ■ ľliiih-l'ai-': :iarrativo » O ;nior fniiiii redengäo «9 Idealizacäo do herói ® Idoidi/ac.io da mulher Personagens planas I.inguagem moiaTórica Cchvlo Cardoco'Karno'Q Kcvl'u 0 Roraantismo brasileiro encontrou no índio urna dc suas mais aiiťčnŕic expressôes. Näo era preciso importar o mito do "bom selvagem". dc Rousseau: ele estava vivo nas matas brasilciias, ideiitiľicailas como o "paraíso perdido" que nem mesmo nós coiiheeíamos. O romance indianista celebra tanto o estado de pureza c inocencia do índio quanto a formacäo mestica da raya brasilcira. indianismo foi urna das principals tendencies do Romantismo brasileiro. Dele sairam algumas das melhores contribuicôes da nossa literatura romäntica, quer na poesia de Goncalves Dias, quer na prosa de José de Alencar. O prestígio dessa corrente entre o publico foi umplo e , ,u • imediato. Vários fatores contribuiram para sua ímplanta- „-.-.J*, cäo e solidiťicacäo em nossa cultura. ' 'i; ■ Razôes do indianismo na literatura j Tradifäo indianista colonial A vida e os costumes dos índios sempre despertaram curiosidade c interesse no publico portugués e no brasileiro. Já desde os séculos XVI e XVII tinham sido escritas cartas, p tratados c poemas em torno do índio brasileiro. No sécu- 1 lo XVIII, a épica de Basílio da Gama e a de Santa Rita Duräo däo continuidadc ao terna. O índio visto como o "bom selvagem" As idéias do pensador iluminista e pré-romantico Jean-Jacques Rousseau tiveiam ampla aceita9äo cntre os románlicos brasileiros, Partindo do princípio de que o homem oríginalmente é puro, mas é corrompido ao entrar em contato com a civilizacäo, Rousseau via no homem primitivo, no selvagem, o modelo de ser humano. Tanto o índio quanto o proprio Brasil passam a ser vistos como partes de um "paraíso americano", distante da decadcncia da civilizacäo européia. O índio como o passado histórico nacionál O Romantismo europeu valorizava o passado medieval, no qual se buscava reencontrar as raizes históricas c culturais de cada povo e de cada nafäo. O Romantismo brasileiro, por näo contar com a riquíssima materia aventuresca medieval, recorre ao periodo anterior ao nosso descobrimento, no qual o índio, por adaptafäo, corresponde á figura do cavaleiro medieval. O índio como simholo de nacionalidade Na tentativa de dcfinir a etnia brasileira, os escritores romänticos constataram que o índio era o verdadeíro representante da ra9a brasileira, mais que o branco (identificado com o colonizador portugtiés) e o negro (vindo de outro continente). A simpatia pelo índio resulta também do trabalho de conscientiza9äo feito pelos jesuítas no sentido de preservar a liberdade dos silvícolas. S J^! i ' í A Jose de Alencar (1829-1877) foi o principal romancista brasileiro da fase romäntica. Cearen-se, cursou Direito em Säo Paulo e viveu a maior parte de sua vida no Rio de Janeiro. Dedicou-se á carreira de advogado, jornalista e escritor. Como o pai, devotou-se á política, sendo eleito várias vezes deputado, e chegou ao cargo de ministro da Justi9a, que exerceu de 1868 a 1870. Na literatura, escreveu romances indianistas, históricos, urbanos e regionalistas. Foi também autor de crönicas, eríticas e várias pe9as teatrais, como Mae e O Jesuita, encenadas na época. A produ9äo diversificada de Alencar estava voltada ao projeto de constrti9äo da cultura brasileira, no qual o romance indianista, buscan-do um tema nacionál e uma lingua mais brasileira, ganha papel de destaque. Sobre a importáncia da pesquisa linguistica, Alencar escreveu: O conhecimento da lingua indigena ó o melhor eritério para a nacionalidade da literatura. Ele nos dá hao só o verdadeíro estilp, como as imagens poéticas do selvagem, os modos de Seu pensaniento, as tendéncias de seti espírito, e até as mcnqres panicularidades de sua vida. E nessa fonte que deve bchor o poeta brasileiro; é delá que há de sair o verdadeíro poema nacionál, tal como eu o imagine : ! [Em/racema. ^ ed. Edlcáo crítiča dě M. Cavalcanti Proenga. Sao Paulo, Edusp, 1979, p. 206.) As principals realiza9Öes indianistas em prosa de nossa literatura säo trés romances de Jose de Alencar: O Guar ani (1857), Iracema (1865) e Ubirajara (1874). Iracema: a invencäo de uma lenda Iracema, que o autor chamou de "lenda do Ceará", é urna das mais belas realiza9Ôes indianistas de nossa prosa romäntica. O romance, publieado em 1865, é quase que um Jongo poema em prosa, tal a beleza e a plasticidadc de suas imagens, a musicalidade de seu vocabulário indianista e a sua densidade lírica. Comprometido com o projeto nacionalista do movimento romäntico, o romance narra a lenda (criada pelo próprio Alencar) da origem do Ceará (Estado natal do autor) e da civiliza9äo brasileira, fruto dos amores proibidos entre o guerreiro portugués Martim, que se encontra em expedÍ9äo no Brasil, e a virgem Iracema, uma jovem india filha do pajé Araquém. Depois de térem se encontrado na floresta e Iracema quase ter matado Martim, ao atingi-lo com uma flecha, a india leva-o á tribo taba jara, apaixo-nando-se por ele. Con-tudo o amor entre eles era impossível, porquc cla conhecia o segredo da jurema - bebida mágica utilizada nos rituais religiosos da tribo - e deveria se manter virgem e ŕíel a Tupä. Alem disso, apesar de atraído pela india, Martim sentiu siiLidades de čerta mo9a que deixara em Portugal. Eis um trecho da obra, o momcnto em que Iracema conhece Martim: Alem, muito alem daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema, Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais longos que seu talhe de palmeira. O favo da jati nao era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado. Mais rápida que a ema selvagcm, a mořena virgem corria o sertao e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nacáo tabajara, O pé grácii e nu, mal roijando, alisava apenas a verde pelúoia que vestia a terra com as primeiras águas. [...] [.,.] Ergue a virgem os olhos, que o sol nao deslumbra; sua visla perturba-sc. Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro estranho, se é guerreiro e nao algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das areias que bordam o mar; nos olhos o azul Iriste das águas profundas. Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo. Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A ílecha embebida no areo partiu. Gotas de sangue borbulham na face do desconheeido. De primeiro ímpeto, a mao lesta caiu sobre a cruz da espada; mas logo sorriu. O mocn guerreiro aprendeu na religiao de sua mae, onde a mulher é símbolo de ternura e amor. Sofreu mais ďalma que da ferida. O sentimento que ele pos nos olhos e no rosto, nao o sei cu. Porém a virgem larvou de si o areo e a uirapaba, ecorren para o guerreiro, sentida da mágoa que causara. A mao que rápida ferira, estaneou mais rápida e compassiva o sangue que gotejava. Depois Iracema quebrou a ílecha homicida: dcu a haste ao desconheeido, guardando consigo a ponta farpada. O guerreiro falou: - - Qucbras comigo a ílecha da paz? - Quem te ensinou, guerreiro branco, a linguagem de meus irmaos? Donde vieste a estas matas, que nunca viram outro guerreiro como tu? - Venho de bem longe, filha das florestas. Venho das terras que teus irmaos já possuíram, e hoje těm os meus. - Hem-vindo seja o estrangeiro aos campos dos tabajaras, senhores das al-deias, e á cabana de Araquém, pai de Iracema. (Op. cit, p. 12-3.) O Guarank o mito da povoa^äo . O Guarani, de Jose de Alcncar, é um romance histórico-indianista que foi inicialmente publicado sob a forma de folhetins no Diário do Rio de Janeiro, em 1857. D. Antonio de Mariz, ftdalgo portugués, muda-se para o Brasil com sua família: D. Lauriana, sua esposa; Cecilia e D. Diogo, filhos do casal; e Isabel, oficialmente sobrinha do fidalgo, mas, na verdade, filha dele com uma india. Acompanha a família o jovem cavaleiro D. Alvaro de Sá, alem de muitos outros empregados. A obra se articula a partir de alguns fatos essenciais: a devo5áo e fidelidade de um índio goitacá, Peri, por Cecilia; o amor de Isabel por Alvaro, e o amor děste por Cecilia; a mořte acidental de uma india aimoré por D. Diogo e a conseqiiente revolta e ataque dos ařmorés, simultancamente a uma rebeliäo dos homens de D. Antonio, liderados pelo ex-frei Loredano, hörnern ambicioso e devasso, que desejava saquear a casa e ráptar Cecilia. Durante o ataque, D. Antonio, ao perceber que näo havia mais condiyöes de resistir, incumbe Peri de salvar Cecilia, após té-lo batizado como eristáo. Os dois partem e véem, ao longe, a casa explodir. A Cecilia, só resta Peri. Durante dias rumam para destino ! _ j desconheeido e säo surpreendidos por : j uma forte tempestade, que se transfor- : ma em dilúvio. Abrigados no topo de o uma palmeira, Cecilia espera a mořte chegar, mas Peri lhc conta uma lenda indígena segundo a qual Tamandaré e sua esposa se salvaram de um dilúvio abrigando-se na copa de uma palmeira desprendida da terra e alimentando-se de seus frutos. Ao término da euchente, Tamandaré e sua esposa desceram da palmeira e povoaram a Terra. As águas sobem, Cecilia se deses-pera. A lenda de Tamandaré parece se repetir. I Há, a seguir, dois textos indianistas. O primeiro registra a cena finál de O Guurani, de Alencar; o segundo pertence ao romance moderno A Expedipäo Montaigne, de Antonio Callado, publieado em 1982, qtie dá continuidadc á tradicäo indianista nos dias de hoje. Leia os textos atentando para a visäo de cada um acerca do índio brasileiro. Texto T Entäo passou-se sobre esse vasto deserto dágua e céu urna cena estupenda, heróica, sobre-humana; um espetáculo grandioso, uma sublime loucura. Peri alucinado suspendeu-se aos cipós que se entrelagavam pelos ramos das árvores já cobertas dágua, e com esľorco desesperado cingindo o tronco da palmeira nos seus bragos hirtos, abalou-o até ás raizes. Trés vezes os seus músculos de ago, estorcendo-se, inclinaram a haste robusta; e trés vezes o scu corpo vcrgou, cedendo á rctracäo violenta da árvore, que voltava ao lugar que a natureza lhe havia mareado. Luta terrível, espantosa, louca, esvairada; luta da vida contra a materia; luta do hörnern contra a terra; luta da forga contra a imobilidade. Houve um momento de repouso em que o hörnern, concentrando todo o seu poder, estorceu-se de novo contra a árvore; o impeto foi terrível; e pareceu que o corpo ia despedacar-se nessa distensäo horrivel. Ambos, árvore e hörnern, embalangaram-se no seio das águas: a haste oscilou; as raizes desprenderam-se da terra já minada profundamente pela torrente. A cupula da palmeira, cmbalangando-se graciosamcntc, rcsvalou pela flor da água como um ninho de gargas ou alguma ilha flutuante, formada pelas vegetacöes aquáticas. Peri estava de novo sentado junto de sua senhora quase inanimada; e, tomando-a nos bracos, disse-lhe com um acento de Ventura suprema: - Tu viverás! Cecília abriu os olhos c vendo seu amigo junto dela, ouvindo ainda suas palavras, sentiu o enlevo que deve ser o gozo da vida eterna. - Sim!... murmurou ela; viveremos!... lá no céu, no seio de Deus, junto daqueles que amamos!... O anjo espanejava-se para remontar o bergo. Sobre aquele azul que tu ves, continuou ela, Deus mora no seu trono, rodeado dos que o adoram. Nós iremos lá, Peru Tu viverás com tua irmä, sempre!... Ela embebeu os olhos nos olhos do scu amigo, e länguida reclinou a loura fronte. O hálito ardente de Peri bafejou-lhe a face. Fez-se no semblante da virgem um ninho de castos rubores e länguidos sorrisos: os lábios abriram como as asas purpureas de um beijo soltando o vôo. A palmeira arrastada pela torrente impetuosa fugia... E sumiu-se no horizonte... (Rio de Janeiro, Edicöes de Ouro, s. d. p. 426-7.) Texto II A Expedipäo Montaigne narra a história do jornalista Vicenlino Beiräo, que deseja armar um exército de índios na Amazônia contra o colonialismo branco. O romance é urna satira política ao Brasil da guerrilha (anos 60-70) e um retrato da decadéncia do índio brasileiro. Nesta cena, Vicentino tenta seduzir o índio Ipavu para o seu projeto. - O que a gente vai fazer, de fato, é levantar, em guerra de guerrilha, as tribos indígenas contra os brancos que se apossaram do território a partir daquele glauco gfuglu do ferro da cabrália caravela logo depois que a figura de proa, langa de S. Jorge e lingua do dragäo, abriu as coxas e os grandes lábios de mel da bugra Iracema, ocupada a lavar-se, sem uluri, na praia, Vamos botar os brancos de joelhos, por térem descabagado Iracema, assim como, se soltando do cabrestante e se enfiando no mar baiano, a äncora da nau de Pedro varou o hímen nheengatu. - Quem falava em guerra de guerrilha e em acabar com os brancos, disse Ipavu, era o guerrilheiro Zeca Ximbioá, que ainda botou mais minhoca do que já tinha na cabeca de Ieropé, nosso pajé, mas acontece que tanto Ieropé como o tal do Zeca, que morreu por lá mesmo, só queriam, feito voce, branco degenerado, que o índio tomasse conta do Brasil de novo e nessa eu näo entro näo, nessa cumbuca näo entra mäo de Ipavu, näo. - Ninguém no Brasil sabe nada de indio, Ipavu, a gente pode dizer o que quiser e o lugar da tua tribo é muito jeitoso, com aquele lagoäo, longe, lá no centro do Brasil, de forma que durante a longa viagem a Expedicäo Montaigne vai levantando, armando os indios. Quando a gente chegar á lagoa Ipavu c voce, Ipavu, for recebido, entre choro e ranger de dentes, pelos camaiurá e outros povos xinguanos, a gente terá arregimentado o bando formidável dos que häo de cercar, com sebes de flechas, as cidades. Quando ocorrer tua aparigäo c epifania de pródigo já se alastrou pelo pais o levante dos miseros e... Mas ai Ipavu já estava em outra, que era a delc. - A gente pode ir nos camaiurá rapidinho, perguntou Ipavu, e sair logo depois, quer dizer, chegando lá deprcssa, de aviäo, pra voar dc volta dia seguinte, feito quern visita pa-rente chato e näo quer nem sentar pra tomar café com beiju? Pode, Vicentino? Tem campo de pouso, no Tuatuari, desde o meu tempo, e agora pode até descer aviäo bem > - 1 erescido, aviäo-real, de penacho, onde cabe muita bagagem, muito trem, gente saindo pelo ladräo, foi o que me falaram. (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1982. p. 30-1.) ■k 1. A proposito do texto I, indique: a) as ayöes de Peri quc sc asscmclham aos feitos heröicos dos cavalciros das novelas de eavalaria medievais; b) a expressäo que indica a superioridade da mulher em rela9äo ao seu amante, conforme a tradifäo medieval. 2. No texto I, o dihivio arrasta, alem da palmeira, o passado dos dois jovens. A ägua, simbolo de purificacäo e renova^äo, ao mesmo tempo que desabriga o casal, iguala-o. Ja näo säo mais o primitivo e o civilizado: säo apenas homem e mulher, livres de quaisquer eonven^öes, prontos para habitar o "paraiso americano" o vivcr a "vida natural" idealizada por Rousseau. a) Destaque do texto a passagem que revela uma nova forma de relacionamento entre Peri e Cecilia. b) Tcndo em vista a lenda de Tamandare, que se repete, quais os proväveis resultados da nova forma de relacionamento entre os jovens? c) Na visäo do autor, que tipo de ra?a devera formar o povo brasileiro? 3. A proposito do texto II: a) Em que aspectos o indio Ipavu difere de Peri? b) Em que aspectos a figura de Vicentino Beiräo difere da do colonizador branco tradicional? e) Levando em conta sua resposta aos itens a e b, por que se pode dizer que o romance A Expedifäo Montaigne, dentre outras coisas, satiriza a tradicäo indianista romäntica? O indio, o portugues e o negro no romance romäntico nacional Das tres ragas que defmiram a etnia nacional - o branco portugues, o negro e o indio -, apenas o indio tornou-se heröi em nossa literatura romäntica. Atribuir ao colonizador portugues o papel de lieroi nacional seria disparate, principalmente se considerada a longa tradifäo nativista de nossa literatura e a onda de nacionalismo e antilusitanismo p6s-Independencia. Apesar disso, o portugues e tratado por nossos romancistas romänticos com certa condescendencia e simpatia, mais ate do que se podia esperar. Por exemplo, D. Antonio de Mariz, de O Guarani, e Martim, de Tracema, näo säo os vilöes das histörias, mas homens corajosos, honrados e de caräter. Quanto ao negro, este representava o alicerce econömico daquela estrutura social, a mäo-de-obra escravizada e compelida ao trabalho. Seria, portanto, um contra-senso econömico e social elevä-lo ä condi9äo de heröi, de clcmento ativo, corajoso e rico cm qualidadcs intcriores, ja que tais caracteristicas fugiam aos interesses de alguns escritores e do publico leitor, que eram na maioria integrantes da classe dominante e compactuavam com o regime escravocrata. Desse modo, caberia ao indio, isento de conota9Öes negativas, quer sociais, quer econömicas, o papel de heröi de nossa literatura romäntica. Mesmo näo sendo o retrato fiel do indio brasileiro, do passado ou do presente, o indio romäntico cumpriu o seu papel literärio, que era o de satisfazer aos auseios do publico leitor e contribuiu com sugestöes temäticas e lingüisticas para a constru9äo de uma identidade nacional. Diferentemente dos outros tipos de romances romänticos, o romance regional näo tinlia modelos no Romantismo curopcu e, por isso, foi obrigado a construir seus próprios modelos. Como conseqüencia, a literatura alcanna maior autonómia e o Brasil passa a se conhecer melhor em suas enormes diversidades regionais. oube ao romance regionalista, mais do que aos romances indianista, histórico e urbano, a missäo nacionalista do Romantismo de dar ao pais uma visäo sobre si mesmo. Estendendo o olhar para os quatro cantos do Brasil, o romance regional buscou comprccndcr c valorizar as difereii9as étnicas, lingüisticas, sociais e culturais que ainda hoje marcam essas regiöes. Sem apoio nos modelos do Romantismo eutopeu, o romance regionalista teve de abrir sozinho seus próprios caminhos. Portanto era uma experiencia nova em nossa literatura, quc requeria dos escritores pesquisa e senso de observa9äo da realidade presente. Como resultado, os romances regionais romänticos däo um passo decisivo no sentido de alcaii9ar a täo desejada autonómia da cultura brasileira em rela9äo ás culturas portuguesa e européia em geral. Iii 'JOT lili Quatro säq.os espacos nacionais que despertaram maior interesse entre os escritores románticos: o espaco das capitals, normal-mente situadas no litoral, com ampio destaque para a entäo capital do pais, o Rio de Janeiro; e as regiöes Sul, Nordeste c Ccntro-OcštéTT) espaco das capitais é descrito pelo romance urbano; os demais espacos säo retratados pelo romance regional. 0 Sul: O gaiícfto, a alma pampa A obra O gaiícho, de José de Alencar, é a principal realizacäo romäntica que tematizou o Sul do pais. Ňela säo evidentes as preocupacôes do autor em compor o painel sociocultural do Rio Grande do Sul no século passado, re«saltando-lhe os valores e os costumes sociais, as pecuiia-ndades lingiiísticas, as características naturais e geográficas ■ h> I m. d ' c •■ li p.i--.ii|i> I is órico. A obra situa-se á época de 1832, portanto ás vôsperas da Guerľd dos I'arrapos (1835), que abalou a regiäo Sul do pais. Participant do romance personagens históricas do Brasil e do 1 ui-iľ. .i niľ I n i-ju-.li Rivera (primeiro presidente do Uiuguai), Jium Lavalleja (principal adversário dc Frutuoso Rivcia) c o militai brasileiro Bento Goncalves. O protagonista da obra é Manuel Canho (so-1'iinho de Bento Goncal-:s), um típico gaúcho, >m largo conhecimento t regiáo c vcrdadeira loracao pelo cavalo, seu I ,:1 companheiro. Ao lado )s acontecimentos politics que permeiam toda a >ra, tem destaque o en-ilvimento sentimental en-lie Canho e Catita, filha .1 > dono dc uma pousada. Observe como, neste fragmcnto de O gaúcho, Alencar procura ressaltar a integraeäo da natureza e do hörnern locais. Quailtos seres habitarn as estepes americanas, sejam hörnern, animal ou planta, inspiram nelas uma alma pampa. Tem grandes '■ virtudes cssa alma. A coragem, ä sobriedade, a rapidez säo indigenas da savana. Como a árvore, säo a ema, o touro, o cored, todos'os filhos bravios da savana. Nenhum cnte.porém, inspira mais energicamente a alma pampa do que o hörnern, o "gaúcho". De cada ser que pöyoa o deserto, torna ele o melhor; tem a velooidade da ema ou da eorea. os brios do corcel e a veeméncia do touro. . O coraeäo, fé-lo a natureza franco e descortinado como a vasta , Goxilha; a paixäo que o agita lembra os impetos do furacäo, o mesmo bramido, a mesma pujanca. A esse turbilhäo do sentiménto era indispensável uma amplitude de coraeäo, imensa comp a savana. Tal é o pampa. Esta palavra originária da lingua quíchua significa simplcsmente oplaino; mas sob a fria expressäo do yocábulo está viva e pälpitante a ídéia. Pronunciai o nome, corrio o povo que o inventou. Näo vedes no som cheio da voz, que reboa e sevai propagando expirar np vago, a imagem fiel da savana a dilatap-sé por hbrizontes infmdos? Näo oüvis nessä majestosa onomatopéia repéreutiř; a surdina profunda e mereneória da vasta solidäo? ; Nas margens do Uruguaj, onde; a civilizaojäo já babujou a virgindade primitiva dessas regiôes, pérdeu o pampa seu belo; horne amerícano. O gaúcho, habitant* da savana, dá-lhe o nome de campaíiha. (2? ed. Säo Paulo, Átlca, 1982. p. 23-5.) O Nordeste: protesto de Franklin Távora Franklin Távora (1842-1888) nasecu no Ceará e estudou Direito no Rio de Janeiro. Foi um dos mais polémicos e radicais eseritores regionalistas. Rebelou-sej por exemplp, contra Á."l^r^xí£dô Súľ^. OTj^aalméňle'a^de Alencar, scu conterräneo, alegando que ele se deixava levar pelos modelos estrangeiros (referencia aos romances urbanos) e que, quando se dedicava a romances regionalistas, desčonhecia a regiäo retratada (referencia a O gaúcho). No prefácio de O Cabeleira, sua obra célebre, Távora chama a atencäo para a necessidade e a capacidade do JMordeste _dc criar sua propria literatura, constniída a partir de um farto material disponível, como o passado hlstórico cheio de heroísmos, os costumes típicos da regiäo e a poesia popular. Afirma o eseritor: "Proclamo uma verdade irreeusável. Norte e Sul säo irmäos, mas säo dois. Cada um há de ter uma literatura sua, porque o génio de um näo se confunde com o do outro". Deixando de lado o tom ressentido do eseritor - provavelmente causado pelo prestígio que gozava a regiäo Sul na época, cm virtude do plantio do café -, Franklin Távora, com O Cabeleira, inaugurou um dos veios mais férteis de nossa ficgao regional. Trouxe á tona problemas até entäo pouco conhecidos em outras regiöes do pais, abrindo ou apontando certos temas tais como o banditismo, o cangaco, a seca, a miséria, as migra9Öes, etc. — que seriam, mais tarde, explorados por ficcionistas de porte, como Graciliano Ramos, Jose Lins do Rego, Jorge Amado e outros. O Cabeleira O Cabeleira é uma crónica histórica pernambucana que focaliza a vida do famoso cangaceiró José Gomes, o "Cabeleira", que, ao lado dc dois malfeitores, Joaquim Gomes, seu pai, e Ťeodósio, aterrorizam as popula95cs das cidades pernambucanas no século XVTTT. Á obra oscila entre a fic9áo e o relato histórico e a exposÍ9áo analítico-dissertativa. Este fragmento da obra ■nostra as personagens Zé (romes, o Cabeleira, e seu pai invadindo um povoado e atemorizando a popula9äo. (>bserve como esse quadro prenuncia o terna do canga-90, que aparecerá na literatura e no cinema décadas dcpois. - O Cabeleira! O Cabeleira! Grandes desgragas vamos tcr, minha gente! — clamou o mal-avisado roceiro. Estas palavras caíram como raios mortíferos no meio da multidäo que se entregava, incuidosa e confiante, a o regozijo oficial. A confusäo foi indescrilível. As expansöes da publica alcgria sucederam as demonstragôes do goral terror. Homens, ňiulheres, criangas atropelaranvse, correndo, fugindo, gritando, caindo como impelidos por infernal ciclone. A fama do Ciiheleira linha, näo sem razäo, eriado na iniaginagäo do povo um fantasma sangumário que naquele momento se animou no espírito de todos e a todos ameagou com inevitável oxtermínio. - Estás com medo, Zé Gomes, deste poviléu? Parece-me ver-to fraquear. Por minha bénfäo e maldigäo te ordeno que me ajudes a fazer o bonito enquanto é tempo. Näo sejas mole, Zé Gomes; sé valentäo como é teu pai. Tendo ouvido estas palavras, o Cabeleira, em cuja vontadc exercitava Joaquim irresistível poder, fez-sc fúria dcscomunal e. atirando-sc no meio do concurso de gente, foi acutilando a quern encontrou com diabólico desabrimento. Como dois raios extermina-dores, descreviam pai e filho no seio da massa revolta desordenadas e vertiginosas elipses. (2? ed. Säo Paulo, Ática, 1973. p. 23-4.) O Centro-Oestc: Visconde de Taunay Alfredo d'Escragnolle Taunay = (1843-1899), Visconde de Taunay, era carioca e exerceu a carreira militar, chegando a participar da Guerra do Paraguai. Mais tarde abandonou o Exército e ingressou na carreira políti-ca, alcan9ando o cargo de senador. De suas andan9as pclo pais como militar, principalmenle pela regiäo de Mato Grosso, Taunay colheu as expe-riencias para compor suas obras. Res-salta nelas sua capacidade de transpor para a literatura as impressöes visuais da paisagem sertaneja, com aspectos precisos da fauna e da flora da regiäo. Foi autor dc romances, como Inocéncia (1872), sua obra-prima, c livros sobre a guerra e o sertäo, como Retirada da Laguna (1871). Inocéncia: a busca do sertäo Inocéncia é considerada a obra-prima do romance regionalista de nosso Romantismo. A qualidade da obra resulta do equilibrio alcan9ado cntrc vários aspectos que chegaram a comprometer outras obras regionalistas, como a tensäo entre fíc9äo e realidade, entre valores romänticos e valores da realidade bruta do sertäo, cntrc linguagem culta e regional. Inocéncia é uma história de amor impossível envolvendo Cirino, prático de farmácia que se autopromoveu a médico, e Inocéncia, urna jovem do sertäo de Mato Grosso, fílha de Pereira, pequeno proprietário, representante típico da mentalidade vigente entre os habitantes daquela regiäo. A realiza9äo amorosa entre os jovens é inviável, porque Inocéncia fora prometida em casamento pelo pni a Manecäo Doca, um rústico vaqueiro da regiäo; e também porque Pereira exerce forte vigiläncia sobre a filha, pois, de acordo com seus valores, ele tem de garantir a virgindade de Inocéncia até o dia do casamento. Ao lado dos aeonteeimen- m> tos que constituem a trama amorosa, há também o cho-que de valores entre Pereira c Meyer, um naturalista alemäo que se hospedara na casa de Pereira á procura dc borbolc-tas, evidenciando as coniia-dÍ90es entre o meio riinl brasileiro e o meio urb;i iromance_urbano_conscguiu uma comunicacao direta com o publico burgues. Tratando das particularidades da vida cotidiana desta classe, o romance urbano amadureceu o proprio romance como genero, ao mesmo tempo que solidificou . o Romantismo e preparou os caminhos do romance politico-social, 0 mais ctdtivado por outros movimentos literarios. romance romäntico, em vez de tratar de temas antigos, relacíonados aos gregos e aos romanos, retratava o dia-a-dia do leilor, pondo em discussäo certos valores e problemas vividos pelo proprio publico "naTcidaäesTPara a burguesia de entäo, ver o seu mundo retratado nos liyros era uma novidade maravilhosa. Por essa razäo, o romance urbano, mais do que qualquer outro que sc produziu na Europa ou no Brasil, no século passado, foi o tipp dc romance mais lido durante o Romantismo, depois dele e até hoje. No Brasil, a literatura romäntica contou com um numero eonsjderáyel _de romances lirbanps, dos quais se destacam Memórias de um sargento de milicias, de Manuel Antonio de Almeida, e Luciolu e Se.nhora, ambos de Jose de Alcncar. Manuel Antonio de Almeida (1831-1861) nasecu no Rio de Janeiro em uma família simples. Estudando com diflculdades econômicas, eursou a Escola de Belas-Artes e Medicína, no Rio, contudo nunca exerceu a proflssäo, dedicando-se ao jornalismo. Como escritor, Manuel Antonio de Almeida produziu uma única obra, nunca tendo aspirado a uma carreira de suces- so._Esse^ descompro- misso com a moda vigente, alíado ao sen-" so cle humor que lbe era proprio, permiti-ram-lhe criar uma das obras mais originais do Romantismo brasileiro: Memórias de um sargento de milicias. Memóľias de um sargento de milicias Esse romance foi publieado sob a forma de folhetins anônimos, assinados com o pseudônimo de "um brasileiro", no Correio Mercantil, onde Manuel Ántônio de Almeida trabalhou como jornalista de 1852 a 1853: Provavelmente o autor valeu-se de sua experiéncia pessoal junto ás camadas mais humildes da populacäo carioca no século passado para construir o universo social de Memórias de um sargento de milicias. O enredo A narrativa situa-se á época de D. Joäo VI, no início do século passado, quando se muda para o Brasil o mcirinho Leonardo Pataca - pai de Leonardo, o protagonista da história , que, no navio, conhece Maria das Hortalicas. lil Mm Já no Brasil, após o nascimento e o batizado de Leonardo filho, Maria é flagrada pelo marido com outro hörnern e foge para Portugal. Com a separacäo do casal, Leonardo č criado pelo padrinho (um bäŕbeiro), com ajuda de sua madrinha (uma parteira). As travessuras de Leonardo säo o centro da narrativa e servem tanto para a concalenacäo de outras personagens e acôes da obra quanto para a descricäo de tipos, ambientes e costumes da sociedade carioca no comeco do século passado. . Essa serie de malandragcns de Leonardo só tem fim quando, em virtude de sua ampla experiéncia no mundo da vadiagem, ele é escolhido por Vidigal (chefe de polícia) para ocupar o cargo que vagara na tropa de granadeiros (s old ados). Alem de ter se dedicado ao romance indianista e ao romance regional, como já foi estudado, Jose de Alencar foi também um de nossos melhores romancistas urbanos. Suas obras, alem de conter os ingredientes comuns ao romance urbano romäntico - intrigas amorosas, chantagens, amorcs impossiveis, peripetias, etc. -, conseguem analisar com profundidade certos temas delicados daquele contexto social. Em Senhora säo abqrdados os temas do casamento por interesse, da ascensäo social a qualquer preco e da independencia feminina. Em Luciola se discute a prostituicäo nas altas camadas sociais e, como em Senhora, a oposicäo entre o amor e o dinheiro. O romance Diva, juntamente com Senhora e Luciola, constitui a série "perlíš femininos". Senhora Publicada em 1875, Senhora h uma das liltimas obras da carreira de Alencar. Ao tematizar o casamento como forma de ascensäo social, o autor abre a discussäo sobre certos valores e comportamentos da sociedade carioca da segunda metade do seculo passado, resultantes de um capitalismo emergente no Brasil. '' iťjrVjirJ O enredo Aurélia Camargo é uma moca pobre e órfä de pai, noíva de Fernando Seixas. Scixas é um bom rapaz, porém tem o desejo de ascender rapidamente na escala social e, por isso, troca Aurélia por outra moca de dote melhor. Aurélia passa a desprezar todos os homens, e eis' que, com a morte de um avô, torna-se milionária e, por isso, uma das mulheres mais corteja-das das cortes do Rio de Janeiro. Como vinganca, manda oferecer a Scixas um dote de cem contos, mas sem que fosse revclado o nome da noiva, só conhecido no dia do casamento. Seixas aceita e se casam; porém, na noite de núpcias, Aurélia revela-lhc scu desprezo. Seixas cai em si c percebe o quanto fora vil em sua ganäncia. Vivem como estranhos na mesma casa durante onze meses, mas socialmente formám o "casal perťcito". Ao longo desse periodo, Seixas trabalha arduamente até conseguir a quantia que recebera como sinal pelo "acordo". Devolve os cem mil réis á esposa e se despede. Nesse momento, porém, Aurélia revela-lhe scu amor. Os dois, agora, igualados no amor e na honra, podem desfrutar o casamento, que ainda näo havia se consumado. WwĚĚm A seguir vocé lerá dois textos. O primeiro é um fragmenlo de Memoria* cle um surgcnio t/e milkias; o segundo, de Senhora. Leia-os atentando para as difercneas de linguagem e de ambienie social. Texto I [...] Ao sair do Tejo, estando a Maria encostada ä borda do navio, o Leonardo fingiu quc passava distraido por junto dela, e com o ferrado sapatäo assentou-lhe uma valente pisadela no pe direilo. A Maria, como se ja esperasse por aquilo, sorriu-se como envergonhada do gracojo, c dcu-lhc tambem em ar de disfarce um tremendo beliscäo nas coslas da mäo esquerda. Era isto uma declara9äo em forma, segundo os usos da terra: levaram o resto do dia de namoro cerrado; ao anoitecer passou-se a mesma cena de pisadela e beliscäo, com a diferenpa de serem desta vez um poueo mais fortes; e no dia seguinte estavam os dois amantes täo extremosos e familiäres, que pareciam se-lo de muitos anos. Quando saltaram em terra comecou a Maria a sentir certos cnojos; foram os dois morar juntos; e dai a um mes manifestaram-se claramente os efeitos da pisadela e do beliscäo: seie meses depois teve a Maria um filho, formidävel menino de quase tres palmos de comprido. gordo e vermelho, cabeludo, esperneador e choräo; o qual, logo depois que nasceu, mamou duas horas scguidas sem largar o peito. E este nascimento c certamente de tudo o que temos dito o que mais nos interessa, porque o menino de quern falamos é o herói desta história. Chegou o dia de batizar-se o rapaz: foi madrinha a parteira; sobre o padrinho houve suas dúvidas: o Leonardo queria que fosse o Sr. juiz; porém teve de eeder a instäncias da Maria e da comadre, que queriam que fosse o barbeiro de defronte, que afinal foi adotado. Já se sabe que houve nesse dia funcäo: os convidados do dono da casa, que eram todos dalém-mar, cantavam ao desafio, segundo seus costumes; os convidados da comadre, que eram todos da terra, dancavam o fado. O compadre trouxe a rabeca, que é, como se sabe, o inštrumente favorito da gente do oficio. A princípio, o Leonardo quis que a festa tivcsse arcs aristocráticos, e propos que se dancasse o minuete da corte. Foi aceita a idéia, ainda que houvesse dificuldade em encontrarem-se pares. Afinal levantaram-se uma gorda e baixa matrona, mulher de um convidado; uma companheira desta, cuja figúra era a mais completa antitese da sua; um colega do Leonardo, miudinho, pequenino, e com fumacas de gaiato, c o sacristäo da Sč, sujcito alto, magro c com prctcnsôcs de elegante. O compadre foi quem tocou o minuete na rabeca; e o afllhadinho, deitado no colo da Maria, acompanhava cada arcada com um guincho e um esperneio. Isto fez com que o compadre perdesse muilas ve/.es o compasso, e fosse obrigado a recomecar outras tantas. Depois do minuete foi desaparecendo a cerimônia, e a brincadeira aferventou, como se dizia naquele tempo. Chegaram uns rapazes de viola e machete: o Leonardo, instado pelas senhoras, decidiu-se a romper a parte lirica do divertimento. Sentou-se num tamborete, em um lugar isolado da sala, e tomou uma viola. Fazia um belo efeito cômico, vé-lo, em trajes do oficio, de casaca, calcäo e espadim, acompanhando com um monótono zum-zum nas cordas do instrumento o garganteado de uma modinha patria. Foi nas saudades da terra natal que ele achou inspiracäo para o seu canto, e isto era natural a um bom Portugues, que o era ele. [...] O canto do Leonardo foi o derradeiro toque de rebate para esquentar-se a brincadeira, foi o adeus ás cerimônias. Tudo daí em diante foi burburinho, que depressa passou á gritaria, e ainda mais depressa á algazarra. [...] (6! ed. Säo Paulo, Átlca, 1976. p. 9-11.) Texto II Há dois anos raiou no céu fluminense uma nova estrela. Desde o momento de sua ascensäo ninguém lhe disputou o cetro; foi proclamada a rainha dos salöes. Tornou-sc a deusa dos bailes; a musa dos poetas e o ídolo dos noivos em disponibilidade. Era rica e formosa. Aurélia era órfä; tinha em sua companhia uma velha parenta, viúva, D. Firmina Mascarenhas, que sempre a acompanhava na sociedade. Mas essa parenta näo passava de mäe de encomenda, para condescender com os escrúpulos da sociedade brasileira, que naquele tempo näo tinha admitido ainda čerta emancipapäo feminina. Guardando com a viúva as deferéncias devidas á idade, a moca näo declinava um instante do firme propósito de governar sua casa e dirigir suas acôes como entendesse. Na sala, cereada de adoradores, no meio das espléndidas rcvcrbcracôes de sua beleza, Aurélia bem longc de inebriar-sc da adoracäo produzida por sua formosura, e do culto que lhe rendiam, ao contrario parecia unicamente possuída de indignacäo por essa turba vil e abjeta. Convencida de que todos os seus inúmeros apaixonados, sem excecäo de um, a pretendiam unicamente pela riqueza, Aurélia reagia contra essa afronta, aplicando a esses indivíduos o mesmo estaläo. Assim costumava ela indicar o mereci-mento relativo de cada um dos pretendentes, dando-lhes certo valor monetário. Em lingua-gem financeira, Aurélia contava os seus adoradores pelo prečo que razoavelmente poderiam obter no mereado matrimonial. Riam-se todos destes ditos de Aurélia e os lancavam á conta de gracinhas de moca espirítuosa; porém a maior parte das senhoras, sobretudo aquelas que tinham filhas mocas, näo cansavam de criticar esses modos desenvoltos, impróprios de meninas bem-educadas. Os adoradores de Aurélia sabiam, pois ela näo fazia mistério, do prečo de sua cotacäo no rol da moca; c longe de se agastarem com a franqueza, divertiam-se com o jogo que muitas vezes resultava do ágio de suas acôes naquela empresa nupcial. (7; ed. Säo Paulo, Ática. 1977. p, 13-6.) 1. Os dois textos apresentam em comum o ambiente urbano do Rio de Janeiro no século passado c o relacionamento entre hörnern e mulher. a) Que classe social cada um dos textos retrata? b) Que importäncia ou signifieado tem o casamento para as personagens do texto I e para as do texto II? 2. Nas duas obras, as personagens femininas centrais - Maria das Hortalicas e Aurélia - transgridem as regras sociais, porém de forma diferente. a) Qual a transgressäo de Maria das Hortaligas? b) Qual a de Aurélia? c) De acordo com os textos, em qual dos grupos sociais a transgressäo é mais reprimida? s 3. No tcxto I, Lconardo, o pai, revcla ccrta "mánia de grandeza" em relacäo ao batizado e á festa. Como quería a festa? O que acabou ocorrendo? Por qué? 4. No texto II, Aurélia, considerando-se sua condicäo de mulhcr e a pouca idade que tinha, apresenta um comportamento raro naquela sociedade. a) Em que o comportamento de Aurélia difere do das demais mocasV b) A que se deve essa diferenga? 5. Senhora e Memórias de um sargento de milícias säo obras consideradas precursoras do Realismo -movimcnto litcrário da segunda metade do século XIX, que se caracteriza pela objetividade e pela crítica ostensiva á sociedade burguesa - em virtude do retrato mais direto, crítico c objetivo que fazem da realidade. Contudo as duas obras ainda estäo prcsas a certas convencôes romänticas. a) Qual dos dois romances fogc mais ás convencôes romänticas? Justifique. b) Qual dos dois romances aprofunda mais a crítica á sociedade, preparando a crítica realista? Justifique. Contrapondo-se aos valores racionalistas e materialistas da sociedade burguesa, certos escritores do Romantismo criam uma literatura fantasiosa, identificada com urn universo de satanismo, misterio, mode, sonho, loucura e degradacao. Trata-se da tradicao gotica, que ate hoje encontra representaiites na literatura, na musica e no cinema, oce já ouviu estes versos, de Rita Lee e Roberto de Carvalho? Yenha me beijar, meu doce vampiro O, uou, na luz do luar Ah, ah, ah, ah, venha sugar o calor Dc dentro do meu sanguc, vcrmclho, táo vivo, tao eterno, veneno j que mata a sua sede que me bebe quente como um licor brindando á morte e fazendo amor O vampirismo, o amor, a morte e o ambieiite noturno, presentes no ( texto acima, sao elementos da tradifao gótica, introduzida na literatura brasileira pelo paulista Alvares dc Azcvcdo c por outros poetas da segunda geracao do Romantismo, marcada pelo byromsmo e pelo mal do século. A tradicäo gótica: ao diabo o status quo\ A tradicäo gótica é representada pela prosa de Álvares de Azevedo, por parte de sua poesia (a face Caliban) e por algumas contribuicöes de Bernardo Guimaräes e Junqueira Freirc. Do ponto dc vista social, essa producäo representa uma ruptúra näo apenas com os padrôes literários vigentes, mas também com os próprios valores da sociedade. E, em suma, uma literatúra que afronta o racionalismo e o matcrialismo burgucscs e opta por zonas escuras e antilógicas do subcons-ciente, onde se fundem instintos de vida e de morte, libido e terror. A literatura gótica sempre teve um caráter meio marginal, como se scntiam marginais os próprios escritores ultra-romänticos que deram origem a ela em nosso pais. Na Europa, ligaram-se a essa tendencia o pós-romäntico Charles Baudelaire e Mallarmé, um dos pais do Simbolismo francés; nos Estados Unidos, o poeta e prosador romäntico Edgar Allan Poe; no Brasil, os simbolistas Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens e o pré-modernista Augusto dos Anjos. Doš anos 60 do séculb XX para cá, o macabro tem encontrado adeptos no cinema, na literatura e principalmente enlre grupos dc rock, jovens, adolescentes e sociedades alternativas, que veem nessa tradicäo uma forma de protesto contra a ordem social. A produgao gótico-romántica em prosa é representada pelas obras Noite na taverna, dc contos, e a pega teatral Macário - ambas realizacoes de Alvares de Azevedo. O ambiente no turn o e degradado desses textos nao tem qualquer vinculo direto com as vivéncias do eseritor, morto precocemente aos 21 anos. Sao fruto da imaginacáo fantasiosa do quase adolescente Alvares, somada ás influcncias do eseritor Lord Byron. Noite na taverna: o relato do absurdo Noite na taverna pode ser considerada uma obra de contos, apesar de haver um fto narrativo que une todas as histórias. No primeiro capítulo da obra, um narrador em terccira pessoa faz a apresentagao do ambiente: uma taverna, povoada de bébados e loucos; a uma mesa, alguns homens conversant e bebem. Excitados pelo álcool, cada um deles conta uma história de sua vida, de modo que cada capítulo subseqůente ao primeiro tem o nome de seu narrador-personagem. Todas as histórias narradas sao fantásticas, envolvendo trágicos acontecimentos de amor e mořte, vícios e crimes. Depreende-se, de todos os narradores, um forte pessimismo diante da vida. Os temas mais excéntricos ao gosto romántico vigente sao encontrados nessas narrativas: violéncia fisica e sexual, adultérios, assassinatos, incestos, neerofilia, antropofagia, corrupeáo e outros. PRIMEIRO A GENTE 86NT0U NA &ALAĚ PlCAMOS PUAS HO-RAS SEM T6R Ag-S0LUTAM6NTĚ MAPA FARA Ví-Z6R UNS A06 Om"S?OS. A\'A CAKMINHa\ nAo AGUENTOU 1 ^E^U60U A TVI NE&ATlVO OTEPlb\ CONTINUOU i I6UAUMAS 11, NUM NÍV EC r-Jr^*) tW<*<& CX-»* 1 (Alvares de Azevedo & Gé. Mal dos sěculos, Säo Paulo, Melhoratnentos. p. 20.) Capítulo II Solíieri Sabei-o. Roma é a cidade do fanatismo e da perdÍ9äo: na alcova do sacerdote dorme a gosto a amásia, no leito da vendida se pendura o cruciftxo lívido. E um rcquintar dc gozo blasfemo, que mescla o sacrilégio á convulsäo do amor, o beijo lascivo á embriaguez da crenca! Era cm Roma. [...] A noite ia bela. En passeava a sós pcla ponte de... As luzes se apagaram uma por urna nos palácios, as ruas se faziam ermas, e a lua de sonolcnta se escondia no leito de nuvens. Uma sombra de mulher apareceu numa janela solitária e escura. Era uma forma branca. A face daquela mulher era como dc uma estátua pálida ä lua. Pelas faces dela, como gotas de uma la<;a caída, rolavam fios de lágrimas. Eu me encostei á aresta de um palácio. A visäo desapareceu no escuro da janela... e daí um canto se derramava. Näo era só uma voz melodiosa: havia naquele cantar um como choro de frenesi, um como gemer de insänia: aquela voz era sombria como a do vento á noite nos cemitérios, cantando a nénia das flores murchas da morte. Depois o canto calou-se. A mulher apareceu na porta. Parecia espreitar se havia alguém rias ruas. Näo viu ninguém: saiu. Eu segui-a. Andamos longo tempo pelo labirinto das ruas, enfim ela parou: estávamos num campo. Aqui, ali, além éram cruzes que se erguiam de entre o erva9al. Ela ajoelhou-se. Parecia solu(ar: em torno dela passavam as aves da noite. Näo sei se adormeci: sci apenas que quando amanheceu achei-me a sós no cemitério. Contudo a criatura pálida näo fora uma ilusäo: as urzes, as cieutas do campo-santo estavam qucbradas jtmto a uma cruz. O frio da noite, aquele sono dormido á chuva, causaram-me uma fcbre. No meu delírio passava e repassava aquela brancura de mulher, gemiam aqueles solujos, e todo aquele devaneio se perdia num canto suavíssimo... Um ano depois voltei a Roma. Nos beijos das mulhcrcs nada me saciava; no sono da saciedade me vinha aquela visäo... Uma noite, e após uma orgia, eu deixara dormida no leito dela a condessa Barbora. Dei um último olhar aquela forma nua c adormecida com a febre nas faces e a lascívia nos lábios úmidos, gemendo ainda nos sonhos como na agónia voluptuosa do amor. Sai. Näo sei se a noite era límpida ou negra; sei apenas que a cabe9a me escaldava dc embriaguez. As ta9as tinham ficado vazias na mesa: aos lábios daquela criatura eu bebera até a última gota o vinho do deleite... Quando dei acordo de mim estava num lugar escuro: as estrelas passavam seus raios brancos entre as vidrajas de um templo. As luzes de quatro círios batiam num caixäo entreaberto. Abri-o: era o de uma mo9a. Aquele branco da rnortalha, as grinaldas da morte na fronte dela, naquela tez lívida e emba9ada, o vidrento dos olhos mal apertados... Era uma defunta!... e aqueles tra9os todos me lembraram uma idéia perdida... Era o anjo do cemitério! Cerrei as portas da igreja, que, ignoro por que, eu achara abertas. Tomei o cadáver nos meus bra9os para fora do caixäo. Pesava como chumbo... [..,] Tomei-a no colo, Preguei-lhe mil beijos nos lábios. Ela era bela assim: rasguei-lhe o sudário, despi-lhe o véu e a capela como o noivo os despe á noiva. [...] O gozo foi fervoroso - cevei em perdÍ9äo aquela vigília. A madrugada passava já frouxa nas janelas. Aquele calor de meu pcito, á febre de meus lábios, á convulsäo de meu amor, a donzela pálida parecia reanimar-se. Súbito abriu os olhos empanados [...] Näo era já a morte; era um desmaio. [...] Nunca ouvistes falar da catalepsia? E um pesadelo horrível aquele que gira ao acordado que emparedam num sepulcro; sonho gelado em que se sentem os membros tolhidos, e as faces banhadas de lágrimas alheias, sem poder revelar a vida! A mo9a revivia a pouco e pouco. Ao acordar desmaiara. Embucei-me na capa c tomci-a nos bra90s coberta com seu sudário como uma criunva. Ao aproximar-me da porta topei num corpo, abaixei-me, olhei; era algum coveiro do cemitério da igreja que ai dormia de ébrio, esquecido de fechar a porta... Caminhei. Estava cansado. Custava a carregar o meu fardo; e eu sentia que a mo9a ia dcspcrtar. Temeroso de que ouvissem-na gritar c acudissem, corri com mais esfoi9o... Quando eu passei a porta ela acordou. O primeiro som que Ihe saiu da boca foi um gtito de medo... Dois dias e duas noites levou cla de febre assim... Näo houve sanar-lhe aquele delírio, nem o rir do frenesi. Morreu depois de duas noites e dois dias de delírio. Ä noite saí; fui ter com um estatuário que trabalhava perfeitamente em cera, e paguei-lhe uma estátua dcssa virgem. Quando o escultor saiu, levantei os tijolos de mármore de meu quarto, e com as mäos cavei aí um túmulo. Tomei-a entäo pela última vez nos bra90s, apertei-a a meu peito muda e fria, beijei-a e cobri-a adormecida do sono eterno com o len9ol de seu leito. Fcchei-a no seu túmulo e estendi meu leito sobrc ele. Um ano - noite a noite - dormi sobre as laješ que a cobriam... Um dia o estatuário me trouxe a sua obra. Paguei-lha e paguei o segredo... - Näo te lembras, Bertram, de uma forma branca de mulher que entrevistes pelo véu do meu corlinado? Näo te lembras que eu te respondi que era uma virgem que dormia? - E quem era essa mulher, Solfieri? Quem era? Seu none? - Quem se importa com uma palavra quando sente que o vinno queima assaz os lábios? Quem per-gunta o nome da prostituta com quem dormiu e senttu morrer a seus beijos, quando nem há dole mister por escrever-lho na lousa? So [fieri encheuuma ta9a e bebeu-a. Ia erguer-se da mesa quando um dos convivas tomou-o pelo bra90. - Solfieri, näo é um conto isso tudo? Pelo interno que näo! Por meu pai que era conde e bandido, por minha mäe que era a bela Messalina das ruas, pela perdi9äo que näo! Desde que eu proprio calquei aquela mulher com meus pés na sua cova de terra, eu vo-lo juro! - guardei-lhe como amuleto a capela de defunta. Ei-la! Abriu a camisa, e viram-lhe ao pesco90 uma grmalda de flores mir-radas. - Vede-a? Murcha e seca como o cranio dela! (Säo Paulo, Martins, 1965. p. 39.] 1. A narrativa se desenvolve numa atmosféra de expectativa e surpresas, criada tanto pelo ambiente em que se dcscnrolam as ai;5es quanto por algumas técnicas de suspense cmpregadas. a) Faca um levantamento dos ambientcs cm que se situam as acöes de Solfieri, do inicio ao fim do conto, e indique as caracteristicas que, de modo geral, eles apresentam. b) Como o narrador cria suspense ao contar sua saida da capela? 2. O conto lido apresenta a técnica da narraeäo dupla, isto é, Solfieri narra sua propria história aos amigos, no bar. Terminada a narraeäo da personagem, um narrador desconhecido narra em 3" pessoa o que está acontecendo no bar, entre Solfieri e seus amigos. Identifique o parágrafo a partir do qual surge a segunda narrativa. 3. O ideal de beleza feminina que comumente é empregado nos textos de inspirasao byroniana difere bastante dos padröes atuais e nacionais de beleza. Releia o segundo parágrafo do texto e destaque as palavras e expressöes utilizadas para caracterizar a mulher amada de Solfieri. 4. Uma das caracteristicas comuns a esse lipo de narrativa - pur sinal chocante e surpreendente -pode ser verificada no episódio em que Solfieri adentra a capela do cemitério e encontra a muther amada. a) Que fato inusitado ocorre entre os dois? b) De que modo a propria narrativa desfaz o impacto desse fato? 5. Em vez de uma visäo logica e coerente da realidade, a narrativa gótica prefere sondar as zonas obscuras do subconsciente, beirando, portanto, os limites do sonho e da loueura. Identifique no comportamento de Solfieri e de sua amada atitudes que sejam exemplo dessa inclinagäo para o inconsciente. 6. Observe os fragmentos seguintes extraídos do conto. Todos dizem respeito a Solfieri, o narrador-protagonista da lústória. e "Nos beijos das mulheres nada me saciava"; s "Uma noite, c após uma orgia"; « "sei apenas que a cabe9a me escaldava de embriaguez"; • "Por meu pai que era conde e bandido, por minha mäe que era a bela Messalina das ruas". Com base na observaeäo desses fragmentos, responda: Que visäo do mundo clas expressam? Que perspectivas de vida tern Solfieri? Dizer que alguns grupos de rock'n'roll veioulam influěncias ou mensagens de tipo satänico, como diz o escritor fiances René Laban em Rock et Satanisme, näo é algo propriamente novo, nem secreto, pois alguns roqueiros orgulham-se abertamenle disso. Faz parte do marketing de alguns, como Alice Cooper e Ozzy Osbourne, um teatro de atos de mágia negra no palco. [...] Antes de chegar äs sugestöes francamente demoniacas de um Black Sabbath ("Sahá Negro") e ás fantasias sadomasoquistas de um Kiss, o rock cantava o amor, a liberdade, o sexo, as drogas c o álcool. Mas näo foi precise esperar muito para que grupos como os Beatles e os Rolling Stones acrescentassem mais um terna á lista: o Capeta. (Mateus Soares de Azevedo. Jornal da Tarde, 12/12/92.) Rock do diabo ^^^^^^^^^^^^^^^^^Kj^^^^^^^^^B^^S ■ 9 diabo usa capote ^^^^^^^^^^^^^p4=!^--?^^^^^^^^^P|^^B É roque, é toque, é folk Foi ele mesmo quem me deu o toque Enquanto Freud explica as coisas O diabo fica dando os toques ^^^^^^^^^^^^^S^^^^Sí^^^^^^^W^H Existem dois diabos So que um parou na pista Um deles é o do toque O outro é aquele do Exorcista I O diabo é pai do rock! (Raul Seixas e Paulo Coelho) (PUC-SP) As questöes de números 1 e 2 referem-se ao texto a seguir: O diabo é pai do ROCK? "Sei que os Beatles farao sucesso como nenhum outro conjunto jamais fez ou fará. Sei , porque tive de vender minha alma ao diabo para isto." A declara9ao é de John Lennon. Foi ťeila cm 1%1, segundo o cantor Toni Sheridan, com quem os Beatles, ainda como Beat Brothers, gravaram seu piimeiro IP |...|. nu:. "O diabo é pai do rock", Raul Seixas responde a indagac&o colocada no título děste artigo , ) (em Rock do diabo, composisao de 1975) [...]. "Há dois anos raiou no céu fluminense uma nova estrela. Desde o momento de sua ascensäo ninguém lhe disputou o cetro; foi proclamada a rainha dos salôes. Tornou-se a deusa dos bailes; a musa dos poetas e o idolo dos noivos em disponibilidade. Era rica c formosa. Duas opuléncias, que se real9am como a flor em vaso de alabastro; dois esplendores que se refletem, como o raio de sol no prisma do diamante. Quem näo se recorda de Aurélia Camargo, que atravessou o firmamente da corte como brilhante metcoro, e apagou-se de repente no meio do deslumbramento que produzira o scu fulgor?" (José de Alencar - SENHORA) 1. Afírma o texto acima que Aurélia era rica e formosa. Considerando o romance como um todo, sabemos que a personagem referida nem sempře foi rica, apesar de formosa. Prctcrida mim primeiro momento por Fernando Seixas, grande amor de sua vida, mas contumaz ca9a-dote, Aurélia acaba se casando com ele. Pergunta-se: a) Qual a forma que Aurélia enconlrou para consumar esta uniäo? b) Como o conflito amoroso se resolve nessa narrativa? 2. As narrativas romänticas objetivam a realizacao do senlimento amoroso pelo casamento. Todas as acôes concorrcm para o desfecho feliz. Quando isso näo ocorrc, tcmos a tragédia passional, marcada pelo inconformismo de viver longe da pessoa amada. Diante disso: a) indique, das obras a seguir, aquelas em que a realizaíäo amorosa näo se dá: A Moreninha / Cinco Mimttos / Inocéncia / A Escrcmi Isawa / Senhora; b) justifique sua resposta. 3. (Unicamp-SP) "Manuel Antonio deseja contar de que maneira se vivia no Rio popularesco de D. Joäo IV; as famílias mal organizadas, os vadios, as procissoes, as festas e as dancas, a polícia; o mecanismo dos empenhos, influéncias, compadrios, puni?ôes que determinavam certa forma de consciéncia e se manifestavam por certos tipos de comportamenlo [...] O livro aparece, pois, como seqúéncia de situacôes." (Antonio Candido, Formapäo da Literatúra Brasileira.) Podemos entender a "seqiiéncia de situacôes" a que se refere Antonio Candido como uma série de pequenos relatos no interior de Memórias de um Sargeuto de Militias, de Manuel Antonio de Almeida. a) Quern dá unidadc, na obra, a cssa seqiiéncia de relatos aparcntcmcntc soltos? b) Cite um desses relatos e mostre como ele se articula com a linha-mestra do romance. 4. (Fuvest-SP) Iracema faz parte da triadc indianista de Jose dc Alcncar, juntamcnte com outros dois romances. a) Quais? b) Cada um desses romances teria uma finalidade histórica. Qual teria sido a intencao do autor em Iracema] 5. (Fatec-SP) Em Iracema, de José de Alencar, observa-se que o autor: a) procurou ser fiel á tradicäo histórica, e suas personagens foram participantes de episódios reais da colonizacäo brasileira. b) procurou basear-se na história da colonizacäo para recompor, era lermos poéticos, as origens do Ceará. c) procurou explorar o lado pitoresco c sentimental da vida dos índios, na época cm que os Portugueses ainda näo haviam chegado. d) procurou enľatizar o problema da destruicäo da cultura indígena pelo domínio portugués. c) procurou negar a existencia de conflitos culturais entre colonizadores e nativos. 6. (Fuvesl-SP) "O primeiro cearense, ainda no berco, emigrava da terra da patria. Havia a! a prcdcstinacäo de uma raca?" Eis aí uma refiexäo sob a forma de pergunta que o autor, faz a si mesmo - com toda propriedade, e por motivos que podemos interpretar como pessoais -, ao finalizar o romance ... Assinale a alternatíva que completa os espacos. a) José Lins do Rego - Menino de engenho b) José de Alencar - Iracema c) Graciliano Ramos - Säo Bernardo d) Aluísio Azevedo O mulato ( e) Graciliano Ramos - Vidas secas 7. (PUC-RS) A vida carioca na época de ... é retratada com vivacidade, de maneira intencionalmente numa linguagem em Memórias de um sargento de milicias, de Manuel Antônio de Almeida. a) Mem de Sá - histórica - desalinhada b) Duarte Coelho - bibliográfica - retórica c) D. Maria I - folhetinesca - pedante [ d) D. Joäo VI - humorística - simples e) D. Pedro I - sentimental - popular 8. (Fuvest-SP) "A identificacao da natureza com o sofrimento humano, a tragédia pereně do amante rejeitado, o jovem andarilho condenado á vida errante em sua curta eternidade, a solidao do artista. E, enfim, a resignacáo e a reconcilia9áo - ressentidas um pouco, por certo." O texto acima enumera preferéncias temáticas e concep^oes existenciais dos poetas: a) barrocos b) arcádicos c) románticos d) simbolistas e) parnasianos 9. (Fuvest-SP) Dentre as obras seguintes, qual nao se filia ao regionalismo romántico? a) Iiiocéiicia b) O Cabeieira c) O sertanejo d) O gaácho e) A pata da gazela 10, (Fuvest-SP) Sobrc o romance indianista de José de Alencar, pode-se afirmar que: a) analisa as rea9oes psicológicas da personagem como um efeito das influencias sociais. b) é um composto resultante de formas originais do conto. c) dá forma ao herói amalgamando-o á vida da natureza. d) representa contcsta9áo política ao domínio portugués. e) mantém-se preso aos modelos legados pelos clássicos. 11. (FEI-SP) Indique, através do texto a seguir: a) autor; b) obra; c) estética literária. Um grupo de estudantes de Medicína, formado de Augusto, Leopoldo, Fabricio e Filipe, resolve passar um flm de semana na ilha de (...), onde mora o ultimo deles. Como Augusto se dizia capaz de resistir a qualquer compromisso amoroso duradouro, Filipe aposta com ele que, se "tiver amado a uma só mulher durante quinze dias ou mais, será obrigado a eserever um romance cm que tal acontecimento confesse". O encanto dc Carolina, irma de Filipe, fá-lo perder a aposta. Neste capítulo e nos próxi-mos, vocě estudará a literatura realista, naturalista e pamasiana. Para saber mais sobre o assunto e sobre o contexto da época, sugerimos: .> iMS'ii-: aos filmes Madame Bovary (1991), de Claudo Cha-brol, baseado no romance com o mosmo nome, de Gustave Flaubert, que inaugurou o Roa-lismo na literatura; Sacco e Vanzetti (1971), de Giuliano Montaldo, que trata do anar-quismo. COl-iHECEíc a pintura realista, principalmente as obras de Gus- tave Courbet, Daumier e do pre-realista Millet. OUVIR: a musica de Wagner, Tchaikovsky e Strauss. 'E5QU1SAR: sobre as correntes filosoficas e cientificas da epoca, como positivismo, de Augusto Comte; determinismo, de Hipoly-te Taine; evolucionismo, de Darwin; o socialismo cientihco, de Marx e Engels. ji Ívfi(& P - í" Motivados pelas tcorias científicas e filosóflcas da época, os escritores realistas desejavam retratar o homem e a sociedade em sua totalidade. Näo bastava mostrar a face sonhadora e idealizada da vida como flzerani os romänticos; era preciso mostrar a face minca antes revclada: a do cotidiano massacrante, do amor adúltero, da falsidade e do egoísmo humano, da impotencia do homem diante dos poderosos. I ■B wĚBĚĚĚ ■HB ■H Hl), EH M Im i I 1>- I |i i l|> UBSJí WEma HB I I I I II I jŕ U I I mi -f ■ŕ WĚĚĚ8Ě 399 mundo de cavaleiros destemidos, de virgens mgénuas e frágeis, e o ideal de urna vida primitíva, distante da civilizagäo - tudo isso terminou. A segunda metade do século XIX presencia profundas modificacôcs no modo de pensar e agir das pessoas. No piano das idéias, surgem inúmcras correntes científicas, que procuram explicar fenômenos sociais, naturais e psicológicos ä luz de teorias materialistas. No piano da acäo, vive-se a segunda etapa da Revolucäo Industrial, cujas contradicôes sociais comecam a aparcccr. A arte e a literatúra reíletem essas mudancas. Em lugar do egocentrismo romäntico, verifica-se um enorme interes-se em descrever, analisar e até em criticar a rcalidade. Ao invés da visäo subjctiva c parcial da realidade, os artistas: realistas procuram relratá-la de uma forma ohjeliva, fiel, sem distorgöes. Em lugar da fúga ä realidade, os realistas procuram apontar suas falhas como forma de estimular a mudanca das instituigöes e dos comportamentos humanos. Em lugar dc heróis, temos pessoas comuns, cheias de problemas e limitacöes como qualquer um de nos. O Realismo, o Naturalismo e o Parnasianismo Na Europa, esses movimentos těm início, respectivamente, com a publicacao do romance realista Madame Bovary (1857), de Gustave Flaubert, Thérése Raquin, de Emile Zola (1867), e das antologias parnasianas intituladas Parnasse contemporain (a partir de 1866). Embora guardem diferencas formais e ideológicas, essas trěs tendencias possuem alguns aspectos comuns: o combale ao Romantismo, o resgate do objetivismo na literatura e o gosto pelas deseriedes. De modo geral, pode-se dizer que o Naturalismo é uma espécie de Realismo cientíťíco, enquanto o Parnasianismo é uma volta da poesía ao estilo clássico, abandonado pelos románticos. Essas semelhancas e diferencas serao tratadas de maneira mais aprofundada nos próximos capítulos. ERA CLÁSSICA ROMANTISMO REALISMO NATURALISMO PARNASIANISMO Classícismo Barroco Arcadismo ň íínguagem SlIiiilllB Enterrada a mulher, o viúvo teve uma única preocupagäo: deixar a música, depois de compor um Requiem, que faria exeeutar no primeiro aniversário da morte de Maria. Escolheria outro emprego, eserevente, carteiro, mascate, qualquer cousa que lhe lizesse esqucccr a arte assassina c surda. Comegou a obra; empregou ludo, arrojo, paciéncia, meditagäo, c até os caprichos do acaso, como tizera outrora, imitando Mozart. Rclcu c estudou o Requiem deste autor. Passaram-sc semanas c meses. A obra, célere a principio, afrouxou o andar. Pestana tinha altos e baixos. Ora achava-a incompleta, näo lhe sentia a alma sacra, nem idéia, nem inspiragäo, nem método; ora elevava-se-lhe o coragäo e trabalhava com vigor. Oito meses, nove, dez, onze, e o Requiem näo estava concluído. Redobrou de esforgos; esqueceu ligôes e amizades. Tinha rcfcito muitas vezeš a obra; mas agora queria concluí-la, fosse como ľosse. Quinze dias, oito, cinco... A aurora do aniversário veio achá-lo trabaľhando. Contentou-se da missa rezada e simples, para cle só. Näo se pode dizer se todas as lágrimas que lhe vieram sorrateiramente aos olhos, foram do marido, ou se algumas éram do compositor. Certo é que nunca mais tornou ao Requiem. "Para que?" dizia ele a si mesmo. Correu ainda um ano. No principio de 1878, apareceu-lhe o editor. Lá väo dois anos, disse este, que nos näo dá um ar da sua graga. Toda a gente pergunta se o senhor perdeu o talento. Que tem feito? - Nada. - Bern sei o golpe que o feriu; mas lá väo dois anos. Venho propor-lhe um contrato; vinte polčas durante doze meses; o prego antigo, e urna porcentagem maior na venda. Depois, acabado o ano, podemos renovar. Pestana assentiu com um gesto. Poucas ligôes tinha, vendera a casa para saldar dívidas, e as necessidades iam comendo o resto, que era assaz escasso. Aceitou o contrato. Mas li primeira polca há de ser já, explicou o editor. É urgente. Viu a carta do Imperador ao Caxias? Os liberais foram chamados ao poder; väo fazer a reforma eleitoral. A polca há de chamar-se: Bravos a EieifBo Direta! Näo é política; é um bom título de oeasiäo. Pestana compôs a primeira obra do contrato. Apcsar do longo tempo de siléncio, näo perdera a originalidade nem a inspiragäo. Trazia a mesma nota genial. As outras polcas vieram vindo, regularmente. Conservara os retratos e os repertories; mas fugia de gaslar todas as noites ao piano, para näo cair em novas tentativas. Já agora pedia uma entrada de graga, sempre que havia alguma boa opera ou concerto de artista, ia, mctia-se a um canto, gozando aquela porgäo de cousas que nunca lhc haviam de brotar no cérebro. Uma ou outra vez, ao tornar para casa, cheio de música, despertava nele o maestro inédito; entäo, sentava-se ao piano, e, sem idéia, tirava algumas notas, até que ia dormir, vinte ou trinta minutos depois. Assini foram passando os anos, ate 1885. A fama do Pestana dcra-lhe definitivamente o primeim lugar entre os compositores de polcas; mas o primeiro lugar da aldcia näo contentava a este Cesar, que continuava a preferii'-lhe, näo o segundo, mas o centesimo em Roma. Tinha ainda as allernalivas de outro tempo, acerca de suas composigfies; a diferenca e que eram menos violentas. Nem entusiasmo nas primeiras horas, nem horror depois da primeira semana; aigum prazer e certo fastio. Naquele ano, apanhou uma febre de nada, que em poueos dias cresceu, ate virar perniciosa. Jä estava em perigo, quando Ihe apareceu o edilor, que näo sabia da doenca, e ia dar-lhe noticia da subida dos conservadores, e pedir-lhe uma polca de ocasiäo. O enfermeiro, pobre clarineta de teatro, referiu-lhe o estado do Pestana, de modo que o editor entendeu calar-se. O doente e que instou para que Ihe dissesse o que era; o editor obedeceu. - Mas hä de ser quando estiver bom de todo, concluiu. - Logo que a febre decline um poueo, disse o Pestana. Seguiu-se uma pausa de alguns segundos. O clarineta foi pe ante pc preparar o remedio; o editor levantou-se e despediu-se, - Adens. - Olhe, dissc o Pestana, como e provävel que eu morra por estes dias, laeo-lhe duas polcas; a outra servirä para quando subirem os liberais. Foi a unica pilheria que disse em toda a vida, e era tempo, porque expirou na madrugada seguinte, äs qualru horas e cinco mirmtos, bem com os honiens e mal consigo mesmo. (Em Obras completas. Rio de Janeiro, Aguilar, 1959. p. 497-504.) 1. A descrigäo é um recurso que tanto serviu á prosa romántica quanto á prosa realista. Compare estas duas descrigôes: a primeira de Aurélia, da obra Seiihora, de Alencar; e a segunda de Pestana, do conto 'Lhn homem célebre': Texto ľ. "Era uma expressäo fria, pausada, inľlexível, quejaspeava sua beleza, dando-llie quase a gelidez da estátua. Mas no lampejo dc seus grandes olhos pardos brilhavam as irradiacôes da inteligencia". Texto 2: "Sinhazinha Mota estava longe de supor que aquele Pestana que cla vira á mesa de jantar e depois ao piano, metido míma sobrecasaca cor de rape, cabelo negro, longo e cacheado, olhos cuidosos, queixo rapado, era o mesmo Pestana compositor". Considcrando o tipo de linguagem que cada um dos textos emprega, aponte diferencas entre a descrigäo romántica e a descrigäo realista. 2. A linguagem da prosa realista também é caracterizada pela precisäo do tempo e do espaco e pela narrativa lenta, tragos que objetivam retrain r a realidade com a maior íldelidade possível. a) Faca um levantamento das datas que aparecem no texto. Exatamcntc quanto tempo da vida de Pestana é narrado? b) Destaque um trecho ou um parágrafo que sirva como exemplo da lentidäo da narrativa. "3, A seguir é relacionado um conjunto de caractcrísticas do Romantismo, reférentes ao heróí romántico. Elabore um quadro comparativo com as características realistas correspondentes, reférentes a Pestana. • A mulher amada, para o herói romántico, é sinônimo de beleza e perfeigäo. • O casamento, para o herói romántico, é normalmente resultado de um amor profundo e o tím de uma longa trajetória de obstáculos. • O amor é a mola-mestra que impulsiona e purifica as acôes humanas. « As facilidades e os apelos da vida material - dinheiro, posigäo social, poder - těm menor importäneiu para o herói romántico do que o amor. 4. Pestana era perfeccionista. Näo se contentava com as polcas; queria fazer uma arte clássica e univcrsal, que lhc trouxesse a imortalidade. Levando em conta a realidade materialista e burguesa em que a personagem vive, o que se pode esperar desse idcalísmo? 5. Pestana, ao longo da história, altera sua rclagäo com o editor c tambôm se modifica como pessoa, passando a ter também uma nova relagäo com as polcas e com a arte clássica. a) Que tipo de mudanga ocorre em relagäo ao editor? b) Como passa a se relacionar com as polcas e com a arte clássica? c) Com base nessas mudangas, conclua: que tipo dc visäo Machado dc Assis nos transmite sobre o homem, sua condigäo e seus ideais? Características da linguagem da prosa realista Além das características estudadas no conto dc Machado de Assis, outras merecem ser lembradas: • introspecpäo psicológica: o conhecimento sobre a personagem realista näo provčm apenas de suas atitudes e das descricöes físicas. O narrador realista faz um relato de suas vivéncias inferiores, revelando seus conflitos, sentimentos, aspiragôes, lembrancas do passado, etc. Assim, permite-se uma visäo de conjunto, mais ampla e defmida do todo que forma a personagem. • universalizapäo: embora a prosa realista tomc como ponto de partida o indivíduo comum e anônimo, ela tende á universalizapäo, porque todos os hometis vivem mais ou menos os mesmos problemas e se sentem da mesma forma. Quem é o Pestana, por exemplo? Além de um artista fracassado, pode representar todos os artistas da época e de hoje e sua luta contra o obseurantismo e contra seu proprio desejo de perfeigäo. Pode representar também o proprio artista Machado de Assis, bem como cada um de nós, pessoas comuns. Assim, trabalhando com temas universais, a prosa realista consegue fazer com que o leitor se envolva e se veja criticamente na propria obra aue le. Como síntese, as principals caracteristicas da prosa realista podem ser assim esquematizadas: se por alvo a burguesia e o sistema capitalista. Tal teória contrapunha-se äs idéias do socialismo utópico, de Robert Owen, Proudhon e outros, que acreditavam na possibilidade de se cliegar a uma organizacäo comunista da sociedade sem luta de classes. I ;xto ao ÍX............. As idčias de liberdade difundidas pela Revolucäo Francesa espalham-se pela Europa,-no comeco do século XIX. No periodo que vai de 1820 a 1848, as nacoes européias esforcam-se para contcr o avanco dessas idéias e da expansäo napoleónica. O ano de 1848 antecipa aquilo que seria toda a segunda metade do século: lutas sociais c fcrmentacäo de idéias políticas. A es tru tura social A sociedade européia da segunda metade do século XIX vive os efeitos da Revolucäo Industrial e do amplo progresso científico e tecnológico que a acompanham, tais como a substituicäo do ferro pelo aco e do vapor pela eletricidadc; o desenvolvimento de maquinaria automática, dos transportes e das comunicacöes; o aprimoramento da estráda de ferro; as primeiras experiéncias com automóveis (triciclos motorizados), etc. E uma época de progresso material, de benefícios eco-nómicos para a burguesia industrial; contudo o operariado vive um periodo de intensa erise e miséria. No ano de 1848, em vários países europcus, como Itália, Alemanha e Franca, ocorrem intensas conturbacöes sociais. Eram movimentos de origem popular, com idéias liberais, nacionalis-tas e socialistas. No mesmo ano é publicado o Manifesto Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels, em que se defendia que o socialismo científico (sistema no qual existiria uma sociedade igualitária, sem a exploracäo do homem pelo homem) só seria alcanca-do por meio da luta de classes que lives- ,Jí --í>iBS« As idéias cíentíflco-filosóficas No piano científico-filosófico, verifica-se uma verdadeira onda de cientificismo e materialismo, que alguns chegam a identificar como uma continuidade ou uma segunda etapa do Iluminismo do século XVIII. Dentre as mais importantes correntes da época, destacam-se: . ,: « positivismo: eriado por Augusto Comte, parte do princípio de que o único conhecimento válido é o conhecimento ;' positivo, isto é, oriundo das ciéncias. E uma filosofia empírica, que se baseia na observaeäo do mundo físico; por isso rejeita a metafisica. Acredita na capacidade do homem de amar e ser solidário socialmente. • determinismo: eriado por H. Taine, parte do princípio de que o comportamento humano é determinado por trés aspectos básicos: o meio, a raca e o momento histórico. • darwinismo: dando continuidade, sob outro enfoque, á teória do evohicionisino, de Lamarck, Charles Darwin, em sua obra Origem das espécies (1859), apresenta a teória da selepäo natural, segundo a qual a natureza ou o meio selecionam cntrc os seres vivos aquclas variacôes que estäo destinadas a sobreviver e perpetuar-se. Assim, os mais fortes sobrevivem e procriam, e os mais fracos säo eliminados antes de exercerem a proeriaeäo. Dcstacam-se ainda, na época, as pesquisas no campo da Fisica, da Química, da Biológia e, principalmcntc, no da Mcdicina. Säo dessa época igualmente os primeiros esforcos no sentido de criar tres areas cienlificas novas: a Sociológia, a Antropológia e a Psicologia. A literatura realista e seu contexto É nesse contexto sociopolitico-cientifico que surgem o Realismo, o Naturalismo e o Parnasianismo. A alteracäo do quadro social e cultural exigia dos escritores outra forma de abordar a realidade: menos idealizada do que a romäntica e mais objetiva, erítica e participante. Contudo há semelhancas e diferencas entre essas correntes. As semelhancas residem na objetividade, na luta contra o Romantismo e no gosto por descricöes minuciosas. A designaeäo de Realismo ao movimento näo č a mais adequada, porque em todas as épocas se pode identificar mais ou menos o realismo artístico, em oposicäo á fantasia e á imaginaeäo. Contudo o Realismo da segunda metade do século XIX preconiza maior aproximaeäo com a realidade ao descrever os costumes, o rclacionamento homem e mulher, as relagöes sociais, os conflitos inferiores do ser humano, a crise das instituicöes (Estado, Igreja, família, casamento), etc. O Naturalismo é uma tendencia que procura dar um novo tratamento ao Realismo, atribuindo-lhe um caráter mais científico, a partir das teorias que circulavam na época. A exemplo da Medicína experimental e das expericncias de laboratories os naturajistas criam o romance experimental ou o romance de tese, em que säo "provadas" certas teorias no laboratório humano de fíccäo: o romance. Fľeqiientemente säo realeados certos tracos instintivos e patológicos do ser humano, identifieado como nm animal. E o enfoquc c dado prcfcrcncialmente aos aglomerados humanos e ás camadas mais pobres da populaeäo. Diferentemente dos outros dois movimentos, que sc voltam para a observasäo e para a análise da realidade, o Parnasianismo é urna tentativa de recuperar os ideais clássicos varridos pelo Romantismo e restabelecer o equilíbrio, a razäo e a objetividadc. Imitando os modelos greco-latinos, os parnasianos contentam-se em cultivar temas convencionais e aspiram ao perfeccionismo formal e ao purismo lingiiístico. Desses tres movimentos, o primeiro e o segundo sofreram iníluSncia das idcias filosóílcas, políticas e científicas da época. O romance naturalista é a propria expressäo lilerária das idéias científicas vigentes. pi ,...JßEMF% ■Bil ^njHhl-BajT ■f 1 1 ■Hilf m I p ..U ■ j ŕ í j ■fll 9 í 1 v.í . - ■ IP11 -fmĚĚĚĚ \WiSmSmKim i' ľ;- i.;-i.i ■ ,', kononraphia - '/.'i, { Na segunda metade do século XIX, surgiu um dos melhores prosadores da literatura brasileira: Machado de Assis. Sua obra traz o ambiente do Kio de Janeiro do Segundo Reinado e dos primeiros anos da República, um periodo de muitas mudancas no cenário e na vida brasileira. Machado de Assis, entretanto, ultrapassa os limites locais com sua invulgar agudeza na penetracSo da alma humana e confere ao romance brasileiro uma profundidade e uma dimensáo raramente atingidas por outros eseritores brasileiros. a Sk obra Memörias pdstumas de Bräs Cubas (1881), de Machado de Assis, tradicionalmente tein sido apontada conio marco inicial do Realismo no Brasil. Contudo essa nova postura artistica ja se esboeava desde a primeira metade do seculo XIX, no interior do proprio Romantismo. A observaeäo da produeäo literäria dos escritores da ultima geraeäo romäntica, dos anos 60-70, revel a a existencia de algumas tendencias que apontavam cada vez mais para uma literatura preocupada com o seu tempo, o que caracterizaria o Realismo alguns anos depois. Säo exemplos dessas tendencias: a objetividade das descricöes de certos romances, como Senhora, I.uciola e O Cabeleira; e o sentimento libertärio e reformador da poesia social de Fagundes Varela e Castro Alves. Essas obras, em parte ja distanciadas de algumas posturas iniciais do Romantismo, como o exotismo, a fuga da realidade, o "mal do seculo" e outras, representam o inicio de um processo que culminaria numa forma diferente de sentit' e ver a realidade, menos idealizada e mais verdadeira e critica: a perspectiva realista. Mache» II. >< < I , Assis: a Hnguagem pensante Machado de Assis (1839-1908) nasceu no Rio de Janeiro. Mestico de origem humilde - filho de um mulato carioca, pintor de paredes, e de uma imigrante acoriana -, apesar de ter freqüentado apenas a escola primaria e de ter sido obrigado a trabalhar desde a infäncia, alcancou alta positäo enquanto funcionário publico e obteve consideracäo social iiuma época em que o Brasil ainda era uma monarquia escravocrata. Foi tipógrafo e revisor em casa editora. Admitido á redacäo do Correio Mcrccinlil, comecou a publicar seus escritos em vários jornais e revistas. Na década de 60, escreve todas as suas comédias e os versos ainda romänticos de Crisálidas. Em 1869, casou-se com uma senhora portuguesa de boa cuitura, Carolina Xavier de Novais, sua companheira até á morte e que lhe iria inspirar a personagem Dona Carmo, de Memorial de Aires. Amparado por uma carreira burocrática, primeiro no i Diário Oficial e depois na Secretaria da Agricultura, o escritor pôde entregar-se livremente á sua vocacäo de ficcionista. Machado de Assis foi jornalista, crítico lilerário e crítico teatral, teatrólogo, poeta, contista e romancista. j De sua extensa e variada obra, sobressai o Machado de j Assis contista e romancista, näo só preocupado com a j expressäo, com a técnica de composisáo, mas também com a 1 articulayäo dos temas, com a análi se do caráter e do comportamcnto humano. Podemos identificar em sua producäo dois grupos de obras, porém sem prejuízo de sua perfeita unidade. Ao primeiro grupo pertencem Ressurreipäo, Helena, A mäo e a iuva, laid Garcia, obras que apresentam caractcrísticas mais gerais do romance do século XDÍ do que propriamente da heranca romäntica. Memórias pôstumas de Brás Cubas inaugura uma segunda etapa da producäo de Machado de Assis. A partir dessa obra ele se revela um genio na análise psicológica de personagens, tornando-se o mais extraordinário contista da lingua portuguesa c um dos raros romancistas de interesse universal, conforme atestam as inúmeras traducöcs das suas obras mais representativas. Nesse grupo inciuem-se os romances Quincas Borba, Dom Casmurro, Esaú e Jacó e Memorial de. Aires. Machado de Assis cscrcvcu por volta de duzentos contos. Como ocorreu com o romance, o conto machadiano estreou em pleno Romantismo (Contos fluminenses, 1869) e sofreu significativa mudanca de perspectiva e de linguagem a partir j da coletánea Papéis avulsos (1882), uma obra que representa j para o género a mesma revolueäo que para o romance j significou Memórias pôstumas de Brás Cubas. Dentre seus inú- meros contos, destacam-se 'O alienista', 'Missa do galo', 'A cartomante', 'Noite de almirante', 'Teória do medalhäo', 'O espelho', 'Cantiga de esponsais', 'Sereníssima república', 'Verba testamentária'. Perspicaz e quase ferino na análise da alma humana, Machado de Assis criou uma obra extremamente inovadora, que permanece viva e atual, gerando polémicas e conquistando a estima de sucessivas geracôes de leitores. Memórias pôstumas de Brás Cubas: a ruptúra do romance Memórias pôstumas de Brás Cubas, editado em lívro em 1881, foi publieado em folhetim no ano anterior, na Revista Brasileira. O romance é a autobiografia de Brás Cubas, que, depois de morto, resolve eserever suas memórias. Dentre os fatos ligados á sua vida, destacam-se: seus amores juvenis por Marcela, suas aspiracôes á vida política, sua amizade com o fílósofo Quincas Borba e seu caso amoroso com Virgília, mulher de Lobo Neves. ■ Os textos a seguir pertencem ao romance Memórias pôstumas de Brás Cubas. O primeiro, 'Ao leitor', é uma espécie de prólogo em que o "autor", o falccido Brás Cubas, "explica" a obra. Por meio deste e dos dois outros textos, vocé conhecerá um pouco do modo machadiano de eserever. Ao leitor Que Stendhal confessasse haver eserito um de seus livros para cem leitores, coisa é que admira e consterna. O que näo admira, nem provavelmente consternará é se este outro livro näo tiver os cem leitores de Stendhal, nem cínqiienta, nem vinie e, quando muito, dez. Dez? Talvez cinco. Trata-se, na verdade, de uma obra difusa, na qual eu, Brás Cubas, se adotei a forma livre de um Sterne, ou de um Xavier de Maístre, näo sei se lhe meti algumas rabugens de pessimismo. Pode ser. Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, e näo é difícil antever o que poderá sair desse conúbio. Acresce que a gente grave achará no livro umas aparéncias de puro romance, ao passo que a gente frívola näo achará nele o seu romance usual; ei-lo aí fica privado da estima dos graves e do amor dos frívolos, que säo as duas colunas máximas da opiniäo. Mas eu ainda espero angariar as simpatias da opiniäo, e o primeiro reinédio é fugir a um prólogo explicito e longo. O melhor prólogo é o que contém menos coisas, ou o que as diz de um jeito obscuro e truncado. Conseguintemente, evito contar o processo extraordinário que empreguci na composicäo destas Memórias, trabalhadas cá no outro mundo. Seria curioso, mas nimiamente extenso, e alias desnecessário ao entendimento da obra. A obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago-me da tarefa; se te näo agradar, pago-tc com um piparote, e adeus. Brás Cubas. Capítulo LXXI / O sendo do livro Come90 a arrepender-me děste livro. Näo que ele me cause; cu näo tenho que fazer; e, realmente, expedir alguns magros capitulos para esse mundo sempře é varefa que distrai um poueo da eternidade. Mas o livro 6 enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa contragäo cadavérica; vicio grave, e alias infimo, porque o maior defeito deste livro és tu, leitor. Tu tens pressa de envelhecer, e o livro auda devagar; tu amas a narra^äo direila e nutrida, o eslilo regular e ftuente, e este livro e o meu estilo säo como os ébrios, guinam á dircita e á esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, amea?am o céu, escorregam e caem... E caem! - Folhas misérrimas do meu eipreste, heis de cair, como quaisquer outras belas e vistosas; e, se eu tivesse olhos, dar-vos-ia uma lágrima de saudade. Esta é a grande vantagem da mořte, que, se näo deixa boca para rir, também näo deixa olhos para chorar... Heis de cair. Capítulo CLX / Das negativus Hnlre a morte do Quincas Borba e a minha, mediaram os sucessos narrados na primeira parte do livro. O principal deles Ibi a invenfäo do emplasto Brás Cubas, que morreu comigo, por causa da moléstia que apanhei. Divino emplasto, tu me darias o primeiro lugar entre os homens, acima da ciéncia e da riqueza, porque eras a genuina e direta inspira9äo do céu, O aeaso delerniinou o contrario; e ai vos ficais eternamente hipoeondriacos. Este ultimo capítulo é todo de negativas. Näo aleaneei a celebridade do emplasto, näo fui ministro, näo fui califa, näo conheci o casamento. Vcrdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de näo comprar o päo com o suor do meu rosto. Mais; näo padeci a morte de Dona Plácida, nein a semideméncia do Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa řmaginará que näo houve mingua nein sobra, e conseguintemente que sai quite com a vida. E imaginará mal; porque, ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: - Näo tive nihos, näo transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria. (Säo Paulo, Abril Educacäo, 1978. p. 11,102 e 173.) 1. Sabc-sc que, pclo foco narrativo cm primeira pessoa, o narrador, que e tambcm pcrsonagem, nao tem acesso ao estado mental das demais personagens, Seu conhecimento a respeito dos fatos limita-se quase exclusivamente as suas percep9oes, pensamentos e sentimentos. Que recurso Maehado de Assis utiliza para romper as limila9oes desse tipo de narrador? 2. Qual é o significado da frase "Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia" primeiro texto? do 3. A opiniao publica divide-se em leitores graves e frívolos. Considcrando as caractcrísticas particulares destas memórias, responda: a) O que caracteriza cada grupo de leitores? b) Diante dessa caracteriza9ao, como fica a obra em relavao aos leitores? 4. No segundo texto, Brás Cubas desmitifica sua própria obra, acrescentando-lhe, ironicamente, outras características e responsabilizando o leitor pelos defeitos de seu livro. a) Que "defeitos" sao esses que caracterizam sua narrativa? Retire do texto elementos que justifiquem sua resposta. b) Considerando que Machado de Assis é um mestre na análise psicológica das personagens, em que medida a narrativa lenta ("o livro anda devagar") e seu estilo "ébrio" contribuem para isso? 5. Um dos tra9os inovadores da teenica machadiana encontra-se na rela9äo narrador-leitor. Observe neste trecho: "[...] o maior defeito deste livro es tu, leitor. Tu tens pressa de envelhecer, e o livro anda devagar; tu amas a narrafäo direita e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e o meu estilo säo como os ebrios, guinam ä direita e ä esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, amea9am o ceu, escorregam e caem..." Com que proposito o autor conversa com o leitor? 6. Aponte exemplos de ironia nos textos. 7. Com base no capitulo CI,X, responda: a) O que pensa ßräs Cubas a respeito dos homens e da sociedade em que vivem? b) O que pensa Bras Cubas a respeito de si mesmo? c) Considerando que dentre os valores ideais do hörnern estäo o de ter filhos e deixar-lhes alguma coisa, que atitude perante o mundo Bräs Cubas manifesta na passagem "Näo tive filhos, näo transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miseria"? Dom Casmurro: um olhar suspeito Dom Casmurro, obra publicada em 1899, constitui, juntamente com Memorias pöstumas de Bräs Cubas (1881) e Quincas Borba (1891), a trilogia mais significatfva dos romances de Machado de Assis. O romance tematiza o adulterio sob a otica de seu personagem-nar-rador, o solitärio Dom Casmurro, que acredita ter sido traido por sua mulher, Capitu. Vizinhos um do outro quando adolcscentes, crescem juntos e cedo comc9am a se amar. Bentinho, porem, e destinado ao seminärio por uma promessa de sua mäe. O compromisso e desfeito e Bentinho pode escolher uma carreira liberal e casar-sc com Capitu. Tem um filbo, Ezequiel, e mantem estreita amizade com o casal Escobar c Sancha. Morre Escobar, e Capitu sofre tanto que Bentinho come9a a suspeitar que ela o tivesse amado. A desconfian9a aumenta ä medida que Ezequiel cresce e se parece cada vez mais com Escobar. O casamento c desfeito, e eis agora Bentinho, solitärio, a querer, com o livro, "atar as duas pontas da vida, e restaurar na velhice a adolcsccncia". Em Dom Casmurro, Machado de Assis veicula, a seu modo, um dos mais explora-dos motivos da prosa literäria - o triängulo amoroso - por mcio das personagens Bentinho, Capitu e Escobar. E, entretanto, pel a fa la de Bentinho que conhecemos os fatos e e pelo filtro de sua visäo que formamos o perfil psicolögico de cada uma das personagens. Com isso, Machado de Assis cria uma narrativa ambigua, que oscila entre dois polos: Capitu teria ou näo traido Bentinho? Defender um dos polos da ambigüidade do romance Dom Casmurro, eis um bom H. GARNIER, UVREIR0-EDIT0K motivo Para ler integralmente o livro. POR MACHADO DE ASSIS DA ACADEMIA BRASILEIHA 71. BUA HORtlRA CEZAR, 71 RIO DE JANEIRO G,Hl]SDES!üINl?-i%rc,6 PARK 1899 O trecho selecionado para estudo mostra a descoberta do amor de Bentínho (Dom Casmurro) e Capita e esboga as personalidades de ambos. Ao lé-lo, observe com que perfeigäo o narrador deliueia a enigmática Capitu, uma das mais fascinantcs personagens femininas da literatúra brasileira, Capítulo XXXII / Olhos de ressaca Tudo era materia ás curiosidades de Capitu. Caso houve, porém, no qual näo sei se aprendeu ou ensinou, ou se fez ambas as coisas, como eu. E o que contarei no outro capítulo. Neste direi somente que, passados alguns dias do ajuste com o agregado, fui ver a minha amiga; eram 10 horas da manhä. Dona Fortunata, que estava no quintal, nem esperou que eu lhe perguntasse pela filha. - Está na sala penteando o cabelo - disse-me -; vá devagiir/inho para lhe pregar um sústo. Fui devagar, mas on o pé ou o espelho traiu-me. Este pode ser que näo fosse; era um espelhinho de pataca (perdoai a barateza), comprado a um mascatc italiano, moldura tosca, argolinha de latäo, pendente da parede, entre as duas jiinelas. Se näo foi ele, foi o pé. Um ou outro, a verdade é que, apenas entrei na sala, pente, cabelos, toda ela voou pelos ares e só lhe ,|,, li.njf.^;,,,' ,., \h: -.J.v. ]," ouvi esta pergunta: - Há alguma coisa? - Näo há nada - respondi -; vim ver voce antes que o Padre Ca bral chegue para a licäo. Como passou a noite? - Eu, bem. Jose Dias ainda näo falou? - Parece que näo. - Mas entäo quando fala? - Disse-me que hoje ou amanhä pretende tocar no assunto; näo vai logo de pancada, ľalará assim por alto e por louge, urn toque. Depois, enlntrá em matéria. Quer primeiro ver se mamäe tern a repolugäo feita... - Que tem, tem - interrompeu Capitu. - E, se näo fosse preciso alguém para veneer já, e de todo, näo se lhe falaria. Eu já nem sei se Jose Dias poderá influir tanto; acho que fará tudo, se sentir que voce realmente näo quer ser padre, mas poderá alcantpar?... Ele é atendido; se, porém... É um inferno isto! Voce teime com ele, Bentínho. - Teimo; hoje mesmo cic há de falar. - Voce jura? - Juro! Deixe ver os olhos, Capitu. Tinha-me lembrado a definigäo que Jose Dias dera deles, "olhos de cigána oblíqua e dissimulada". Eu näo sabia o que era oblíqua, mas dissimulada sabia, e quería ver se se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar, Só me perguntava o que era, se nunca os vira; eu nada achei extraordinário; a cor e a dogura eram mínhas conhecídas. A demora da contemplagäo ereio que lhe deu outra idéia do meu íntento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que enlrassem a ficar erescidos, erescidos e sombrios, com tal expressäo que... Retóríca dos namorados, dá-me uma comparagäo exala e poética para dízer o que foram aqueles olhos de Capitu. Näo me acode imagem capa/, de dizer, sem quehra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia dítquelti luiciío nova, Tra/iam näo sei que fluido misterioso e enérgico, uma forea que arrastava ptira dendo, como ;i vtign que se rebra da praia, nos dias de ressaca. Para näo ser arrastado, agarrei-me ás outras partes vizinhas, ás orelhas, aos bragos, aos cabelos espalhados pelos ombros; mas täo depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vínha crescendo, cava c eseura, amcagando envolver-me, puxar-mc c tragar-mc. Quantos minutos giisltiuios naquele jogo? Só os relógios do céu tcräo mareado esse tempo infinito e breve. A eternidade tem as suas péndulas; nem por näo acabar nunca deixa de querer saber a duragäo das felicidades e dos suplícios. Há de dobrar o gozo aos bem-aventurados do céu conhecer a soma dos tormentos que já teräo padecido no inferno os seus inimigos; assim também a quantidade das delícias que teräo gozado no céu os seus desafetos aumentará as dores aos condenados do inferno. Este outro suplício escapou ao divino Dante; mas eu näo estou aqui para emendar poetas. Estou para contar que, ao cabo de um tempo näo mareado, agarrei-me definitivamente aos cabelos de Capitu, mas entäo com as mäos, e disse-lhe - para dizer alguma coisa - que era capaz dc os pentear, se quisesse. - Vocé? - Eu mesmo. - Vai embaragar-me o cabelo todo, isso sim. Se embaracar, voce desembaraca depois. - Vamos ver. (Säo Paulo, Abril Educacäo, 1978. p. 218-20.) ... I V .mu > u tiu:o literário Antonio Candido, o narrador Dom Casmurro simultaneamente opöe ao angulo oa reconstituigäo do passado o ángulo do proprio momento da evocagäo, dando ao leitor uma dupla visäo dos fatos, ou seja, ao mesmo tempo que os expöe, analisa-os. Indique no lexto um trecho em que o narrador expöe um fato acontecido no passado e ao mesmo tempo o analisa, permitindo ao leitor ver o fato sob dupla visäo. 2. Por que o narrador caracteriza os olhos de Capitu como "olhos de ressaca"? 3. Caractcrize psicologicamente Capitu, a partir: a) do comentário de Jose Dias sobre seus olhos; b) do diálogo que Capitu mantém com Bentinho; c) da narragäo de Bentinho. 4. Os caracteres de Bentinho e Capitu contraslam nitidamente. Qual dos dois tem caráter mais forte? Retire do texto um trecho que justifique sua resposta. 5. Releia o trecho seguinte, dando especial atengäo aos verbos creio, imaginou c atribuo: "A demora da contemplagäo creio que lhe deu nutra idéia do meu intento; imaginou que era pretexto para mirá-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que entrassem a ficar crescidos, crescidos c sombrios, com tal expressäo que..." Vocě acha que o narrador-personagem tem onisciéncia dos fatos? Justifique. O Inimanitismo A célebre filosofia do humanitismo, eriada pela personagem Quincas Borba, um filósofo semilouco, aparece em dois romances de Machado dc Assis; Memárias póstumas de Brás Cubas e Quincas Borba. Provavelmente, com essa filosofia o eseritor visava ironizar as teorias filosófícas em voga na época, em particular o positivismo c o determinismo. Quincas Borba, publicado em 1891, é um romance narrado em terceira pessoa e conta a liistória de um professor mineiro, Rubiáo, para quem Quincas Borba, o filósofo, deixa uma grande heranca, com a condicáo de que Rubiáo cuide de seu cachorro, também chamado Quincas Borba. Há, a seguir, dois textos. O primeiro é um fragmento do romance Quincas Borbu, no momento em que o fdósofo expoe a Rubiáo a teoria do humamtismo. O segundo é um fragmento do romance Memórias póslumas ilr Bros Cabas, no trccho em que Brás Cubas e Quincas Borba, em um passeio, assistem a uma briga de cáes. Texto I Nao há mořte. O cncontro de duas expansoes, ou a expansáo de duas formas, pode dcterminar a supressáo de uma delas; mas, rigorosamentc, nao há mořte, há vida, porque a supressáo de uma é a condigao da sobrevivcncia da outra, e a destruicao nao atinge o principio universal e comum. Dai o caráter conservador e benéfico da guerra. Supoe tu um campo de batatas c duas tribos famintas. As batatas apenas chegam para alimentar uma das tribos, que assim adquire forcas para transpor a montanha e ir á outra vertente, onde há batatas em abundáncia; mas, se as duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, nao chegam a nutrir-se suficientemente c morrem de inanicao. A paz, nesse caso, é a destruigáo; a guerra é a conscrvagáo. Uma das tribos extermina a outra e reeolhe os despojos. Dai a alegria da vitória, os hinos, aclamagoes, recompensas públicas o todos os demais efeitos das acoes bélicas. Se a guerra náo fosse isso, tais demonstragoes náo chegariama dar-se, pelo motivo real de que o homem só comcmora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma acáo que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixáo; ao vencedor, as batatas. (Em Alfredo Bosi et alii. Machado de Assis. Sáo Paulo, Ática, 1982. p. 236.) Texto II Dai a pouco demos com uma briga de caes; fato que aos olhos dc um homem vulgar náo teria valor. Quincas Borba fez-me parar e observar os cáes. Eram dois. Notou que ao pé deles estava um osso, motivo da guerra, e nao deixou de chamar a minha atengao para a circunslfincia de que o osso nao tinha carne. Um simples osso nu. Os caes mordiam-se, rosnavam, com o furor nos olhos... Quincas Borba meteu a bcngala debaixo do braco, e parecia em éxtase. - Que belo que isto é! - dizia ele dc quando em quando. Quis arrancá-lo dali, mas náo pude; ele estava arraigado ao chao, e só continuou a andar quando a briga cessou inteiramente, e um dos caes, mordido e vencido, foi levar a sua fome a outra parte. Notei que íicara sinceramente alegrc, posto contivesse a alegria, segundo convinha a um grande filosofe Fez-me observar a beleza do espetáculo, relembrou o objeto da lula, concluiu que os cáes tinham fome; mas a privayao do alimento era nada para os efeitos gerais da filosofía. Nem deixou de recordar que cm algumas partes do globo o espetáculo é mais grandioso: as eriaturas humanas é que disputam aos cáes os ossos e outros manjares menos apetecíveis; luta que sc complica muito, porque en tra em aciio a inteligěncia do homem, com todo o acúmulo de sagacidade que lhe deram os séculos, etc. (Op. cit, p. 160.) 1. A propösito do texto I: a) Por que o narrador aflrma que, rigorosamente, näo existe morte? b) Na oposicäo guerra e paz, explique, por meio do exemplo, a ideia da paz como destruigiio e da guerra como conservacao. c) Considerando que a vitöria de uma tribo sobre outra exemplifica a teoria do humamtismo, qual e, porlanto, seu principio? d) Qual e o significado da expressäo: "ao vencedor, as batatas"? 2. Explique a relagäo existente entre a teoria do humamtismo e o episbdio narrado no texto II. r-.^«u„ rél, " i \ \ í- llV: , If*. It," m r v «n r f*■ í v' <'' ci •■■ i r 'í v t , '* j jgaa^sýwB^^e^ VK^B&ÄBn. ' ^^N^iiijili, a^ii W \p^\^Tom~ h ^ ( íconographia O Nafuralismo, assim como o Realismo, se volta para a realidade. Entrctanto, observa-a, documenta-a, analisa-a, disseca-a sob uma ótica rigorosamente científica. Os eseritores naturalistas, valendo-se de temas inovadores, mostram a decadéncia das instituicôes, demmciam a hipocrisia, caracterizam as lutas sociais, com espírito participativo e reformista. N. J os fins do século XIX, erguia-se a forca da ciéncia, por meio da qual o mundo séria esmiugado para ser transformado. Da Európa, agitada pela Revolucäo Industrial, chegavam informacóes, novas concepgôes que comegaram a surtir cfcito entre nós. Sistcmatizavam-se a Biológia, a Psicologia e a Sociológia, que punham em xeque toda uma cultura impregnada de idealismo e religiosidade crista. I. Lau« ;>0! Neste capítulo vocé estará estudando o Naturalismo no Brasil e seus autores. Para saber mais, sugerimos: s ASSISTIR: ao filme O cortigo, dirigido por Francisco Rama-llio Junior. a CONHECER: as pinturas im-pressionista e expressionista da Monet, Manet, Renoir, Cezanne, Pizarro, Degas, Renoir, Van Gogh, Gauguin e outros, com as quais, segundo o erítico Afränio Coutinho, o romance O Ateneu se identifies. « COMPARAR: a vida no inter-nato nos romances O Ateneu e Doidinho, terna explorado por Raul Pompéia e retomado pelo romancista moderno José Lins do Rego. i Tal qual um dentista, os escritores assumem uma nova postura diante do fazer literário. As novas palavras de ordern säo documentar, dissecar e 'analisar. Faz-se a defcsa de uma arte participante e reformista. Os escritores naturalistas brasileiros, entretanto, com raras cxcegôes, em vez de se dedicarem ao estudo de grupos humanos, que refletiam melhor a problemática social do Brasil de entäo, detiveram-se mais em casos individuals de temperamento patológico. Desse modo, fatos históricos e sóciäis de maior releväncia, como a Aboligäo, a República, a Revolta da Armada e o Encilbamento foram subestimados, ganhando destaque pequenos casos que näo säo representatives da realidade brasileira. Aluisio Azevedo, por exemplo, como romancista, cstabelecera um piano: tragar um grande painel da sociedade brasileira da sua epoea, produzir uma [...] cópia fiel dos fatos politicos c sociais, representados nos personagens que teräo fatalmente de dcsaparcccr com o reinado do Sr. D. Pedro li. [...] reunir todos os tipos brasileiros, bons e maus, do sen tempo e compendial, em I'orma de romance, lodos os fatos dc nossa vida publica, que jamais scrao aprcsentados pcla História. (Em O wulato. Säu Paulu, Alica, 1992. p. 20.) Seriam cinco romances, reunidos sob o título de Brasileiros antigos e modernos, que registrariam as modificacöes sofridas pelo pais desde o início dalndependěncia até 1887. Desse projeto, O cortipo foi a primeira e a única obra realizada. A publicacäo do romance O mulato, de Aiuísio Azevedo, em 1881, marca oficialmente o início do Naturalismo no Brasil. Embora essa näo seja a nossa mais representativa obra naturalista, impressionou e causou represália ao autor, tanto da parte do clero, como da parte da alta sociedade de Säo Luis do Maranhäo, pelos temas que abordava: o antielericalismo, o racismo, a pressäo do meio sobre o indivíduo, o puritanismo sexual. E entretanto em 1890, com o lancamento de O cortipo, também de Aiuísio Azevedo, que o Naturalismo atinge seu apogeu. Nesse mesmo ano, embora despercebido, aparece também o livro de Rodolfo Tcófilo, A fame. No ano seguinte surge O missionário, de Ingles de Soiiza, seguidô de A normalista (1892) e O bom erioulo (1895), de Adolfo Caminha. Nessas obras,, o fatalismo das forcas sociais e naturais atuam pesadamente sobre o hörnern. Natureza, ambiente social, educagäo, taras, instintos geram conflitos dramáticos, situacöes anormais, finais catastrófi-cos, Em O cortifo, é o jogo dos fatores sociais; Inglés de Souza, em O missionário, acentua a influencia do meio físico na conduta humana; e Adolfo Caminha aborda, com precisäo e sobriedade, um caso de desvio sexual. O regionalisnio,)niciado com vigor pelos románticos, teria continuidade nesse periodo, formando um segmento importante de nossa ficcäo. A melhor producäo regionalista desse periodo é Dona Guidinha do Popo, de Manuel de Oliveira Paiva, que aprofundou o estudo das rclagöes do hörnern com a paisagem. Raul Pompéia foi um caso á parte no Naturalismo, como veremos a seguir. A lingualem da prosa naturalista Para os naturalistas, o hörnern näo passa de um animal cujo destino é determinado pelo meio social em que vive e pela hereditariedade. Nessa visäo, roubam-lhe o livre-arbítrio, deixando-o á mercé de forcas que estäo além de seu controle. A literatura naturalista constrói sua ficcäo sob o regime das leis científieas: o hörnern é um caso, um objeto a ser cientificamente estudado. O romancista assume uma atitude de frieza diante das personagens, pois ele é um observador que deve registrar impessoalmente, com precisäo e objetividade científica, a realidade. A lmguägem naturalista caracteriza-se ainda pela exatidäo das descrigôes, pelo apelo á minucia e pcla linguagem simples, coloquial. O Naturalismo introduz na literatura todos os assuntos ligados ao hörnern, inclusive aqueles repulsivos e bestiais, e dá voz ás camadas desfavorecidas da sociedade. O texto que segue é um fragmente do capätulo III de O cortifo, dc Aluisio Azevedo, a obra-prima do Naturalismo brasileiro. Eram cinco horas da manhä e o cortico acordava, abrindo, näo os olhos, mas a sua infmidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada, sete horas de chumbo. Como que se sentiam ainda na indoléncia de neblina as derradeiras notas da ultima guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se á luz loura e tenra da aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia. A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros, umedecia o ar e punha-lhe um fartutn acre de sabäo ordinário. As pedras do chäo, esbranquicadas no lugar da lavagem e em alguns pontos azuladas pelo anil, mostravam uma palidez grisalha e triste, feila de acumulacSes de espumas secas. Entretanto, das portas surgiam cabecas congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; comeeavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplantando todos os outros; troeavam-se de janela para janela as primeiras palavras, os bons-dias; reatavam-se conversas interrompidas á noite; a pequenada cá fora traquinava já, e lá dentro das casas vinham choros abafados de criancas que ainda näo andam. No confuso rumor que se formava, destaeavam-se risos, sons de vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, caearejar de galinhas. De alguns quartos saíam mulheres que vinham dependurar cá fora, na parede, a gaiola do papagaio, e os louros, á semelhanca dos donos, cumprimentavam-se ruidosamente, espanejando-se á luz nova do dia. Dai a pouco, em volta das bicas era um zunzum crescente; uma aglomeracäo tumultuosa de machos e fémeas. Uns, após outros, lavavam a cara, ineomodamente, debaixo do fio de água que cscorria da altura de uns cinco palmos. O chäo inundava-se. As mulhercs precisavam já prender as saias entre as coxas para näo as molhar; via-se-lhes a tostada nudez dos bracos e do pescoco, que elas despiam suspendendo o cabelo todo para o alto do casco; os homens, esses näo se preocupavam em näo molhar o pélo, ao contrario metiam a cabeya bem debaixo da água e csfrcgavam com forga as ventas e as barbas, fossando e fungando contra as palmas da mäo. As portas das latrinas näo descansavam, era um abrir e fechar de cada instante, um entrar e sair sem tréguas. Näo se demoravam lá dentro e vinham ainda amarrando as ealcas ou as saias; as criangas näo se davam ao trabalho de lá ir, despachavam-sc ali mesmo, no capinzal dos fundos, por detrás da estalagem ou no recanto das hortas. O minor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se näo destacavam vozes dispersas, mas nm só ruido compacto que enchia todo o cortico. Comc9avam a fazcr compras na vcnda; ensarilhavam-se discussôes e re/.ingas; ouviam-sc gargalhadas e pragas; já se näo falava, gritava-se. Sentia-se naquela fermcntaeäo sangiiinea, naquela gula vÍ90sa de plantas rasteiras que mergulham os pes vigorosos na lama preta e nutľiente da vida o prazer animal de existir, a triunfante satisfa9äo de respirar sobre a terra. (9? ed. Säo Paulo, Alica, 1970. p. 28-9.) 1. Urn proeedimento narrativo caracteristico do Naturalismu é aprcscntar o ambiente físico e social mim grande painel informativo, como se o narrador estivesse munido de uma máquina fotográfica dotada de lentes do tipo zum, que lhe permitisse compor e decompor os detalhes do cenário em que ocorrem os fatos para o leitor. a) Quais säo os indices da vida miserável e desconforlável do cortÍ90? b) Que grupo social é deserito nessa cena? c) Qual 6 a atmosféra reinante no acordar do cortÍ90? 2. De que ponto de vista - físico, psicológico ou social - as personagens säo deseritas? Justifique com elementos do texto. 3. "As mulheres precisavam já prender as saias entre as coxas para náo as molhar; via-se-lhes a tostada nudez dos bra90s e do PCSC090, que elas despiam suspendendo o cabelo todo para o alto do casco [...]" Em que essa descrÍ9áo da mulher difere da descrÍ9áo da mulher romántica? 4. O ser humano é visto pelo naturalista numa perspectiva biológica, em que se considera seu lado instintivo e animal. a) Retire do texto alguns trechos que comprovem a animaliza9áo dos habitantes do cortifo. b) Há algum trecho em que se pode identificar sensualismo? Se houver, indique-o. 5. Releia o quinto parágrafo do texto e responda: há nesse trecho algum exemplo de degrada9iío humana? Sc houver, exemplifique. 6. O Naturalismo demonstra gosto por agrupamentos coletivos. For que, na sua opiniáo, no texto em estudo, o narrador náo singulariza os habitantes? 7. A linguagem naturalista canicteriza-se pela ado9ao de uma postura científica diante da rcalidade. Em que o foco narrativo cm 3* pessoa contribui para isso? 8. O narrador, para dar cor local á sua narrativa, utiliza-se de inúmeras sugestoes sensitivas. Retire do texto exemplos de sensa9oes olfativas, auditivas, táteis e visuais. 9. Tal qual o Realismo, o Naturalismo preocupa-se com pormenores, tornando lenta a narrativa. Indique uma passagem signifícativa que ilustre essa afirma9áo. 10. Um dos sentidos da palavra cortipo é "caixa cilíndrica, de cornea, na qual as abelhas se eriam e fabricam o mel e a cera". Relacione esse sentido da palavra ao trecho: "Dai a pouco, em volta das bicas era um zunzum crescente; uma aglomcra9ao tumultuosa de machos e femeas". Características da linguagem naturalista Alem das características da linguagem naturalista observadas no estudo acima, outras merecem destaque. Segundo Afränio Coutinho, o Naturalismo amplia as características do Realismo, acentuando-as e acrescentando-lhes certos elementos que tornám inconfundível sua fisionomia em rclacäo ao Realismo. Säo estes os elementos: i * determinismo: para os naturalistas. o homem é uma máquina guiada pela a9äo de leis físicas e químicas, pela hereditariedade e pelo meio físico e social. Os seres aparecem, entäo, como produtos, como conseqůéncias de forcus preexistentes que Ihes roubám o livre-arbítrio. que limitám sua responsabilidade e os tornám, em casos extremos, verdadeiros joguetes nas mäos do destino. Njo -cr:.i :illiľ de Pud m Kľiciui <\' Morals, i" Jow.ivi : agende.i u do l(!iliiil)ľ-MiMin. ~ľ n h'1 c.Mvbro näo fos^e dcmui.ido [mi iiiMíiiIo-.'ľiiísl.^iis. que a priv.icíio do- pruxcics nyUiaMi e que umu ťd-.ieacjo 1 -ii|vrľiciul nao soiňera sr.bjug,.!'. ľ. lhiiii' o, m,nhnrc-< p.idivs do Scni.iá.i-i hawair. pKlC:ididu di-sliui:. mi ao nuv'.os. regular e coaler a ucao dominante d.i licu'diliirn'diKie psiculísiológica sob e o LČu-brn do ? seminarista? «j (Ingles de Sousa, O minsionário.} • prefevincia por temas de patologia social: baseando-se nos problemas da heroditariedade (ainda pouco conhecidos na čpoca), os escritores naturalistas näo hesitaram em ressaltar o efeito das taras, das doencas c dos vicios na formagao do caráter, juntando-lhes ainda os efeitos I complementares da formacäo familiar, da educacäo e do nivel cultural. Í Intcrcssam-se por temas como miséria, adultério, criminalidade, desequi- i librio psiquico, problemas ligados ao sexo, etc. Observe: Ele ali se achava lambém, no sen posto, á cspcra de um sinal para descarregar a chibata, implacaveltnente sobre a vítima. Sentia um prazer especial naquilo, que diabo! cada qual tem a sua mania... (Adolfo Camlnha, O bam crfculo.) ' " «"/'toi/,; ■ ľ *S / \ ! t. ísis • objetivismo científico e impessoalidade: das teorias científicas em voga, amplamente divulgadas na época, o Naturalismo toma-lhes a precisäo e a objetividade, descrevendo com impessoalidade, exatidäo e minúcia, e atendo-se somente aos fatos. « literatura engajada: o Naturalismo implica urna posicäo de combate, de análise dos problemas evidenciados pela decadéncia social, fazendo da obra dc arte uma verdadcira tese com intenfäo científica. Apresenta a mesma intencäo realista de reformar a sociedadc. Com base no que foi estudado até aqui, podemos sintetizar as principais características da linguagem naturalista deste modo: QUANTO Á FORMA QUANTO AO CONTEÚDO e Linguagem simples « Clareza, equilibrio e Harmonia na composÍ9äo • Preocupa9äo com minúcias • Preseruja de palavras regíonais « OesCrÍ9äo e narrativa lentas • Impessoalidade : • Determinismo • Objetivismo científico • Temas de patologia social « Observa9äo e análise da realidade • Ser humano deserito sob a óticä do animaiescQ e do sensual « Despreoeupa9äo coma moral • Literatúra engajada :; Aluisio Azevedo e a paisagem coletiva Aluisio Azevedo (1857-1913) nasccu em Säo Luis do Maranhäo. Fez estudos irreguläres, enquanto trabalhava no comercio e praticava pintura. Em 1881, ano da publica9äo de O mulato, transferiu-se defmitivamcntc para o Rio de Janeiro. Integrou-se nos grupos boemios da "epoca. dedicando-se ao mesmo tempo ä elabo-ra9äo de seus romances. Em 1895, ingressou na carreira consular e prestou servi90 em värios paises: Espanha, Japäo, Inglatcrra, Argentina. Com a publica9äo de O mulato (1881), Aluisio Azevedo consagrou-se como escritor naturalista. A partir dai tentou viver exclusiva-mente como escritor. Para isso, rccorreu, como outros, ao jornalismo, escreveu romances para publica9ao em folhetins, sujeitou-se muitas vezes äs exigencias de um publico heterogeneo, da prcssa c da improvisa9äo. Tudo isso explica c justifica a irregulandadc dc sua produ9äo literäria, oscilante entre Realismo ,. N mi i imh i alternando trechos de intensa morbidez romanticu com outros predominantemente realistas. E [...] como romancista social que melhor se afiimou o talcnto de Aluisio. K o escritor apaixonado, o (iilisui combative, pondo a nu os problemas sociais c morals da rcalidadc brasilcira do seu tempo: o preconccito de cor, os preconceitos de classe, a ganäncia de lucro fäcil - e toda-, as injusti9as c miserias decorrentes. Mais do que o individuo, e N a sociedade que lhe interessa. Mais que miniatunsta dc alma, \ c o pintor de amplos murais. E e na pintura urn verdadeiio impressionista: colorido vivo, tons fortes e quentes. Mostia preferencia polos tipos vulgares e grosseiros, pelos ambjentes sujos e siüia^ües deprimentes o artista procurando acoidar a consciencia do leitor, da sociedade compromctida nas injusti;as. (Celso Pedro Luft. Dicionärio de literature porluguesa e brasileira Porto Alcgro, Gtobo, 1067. p. 21.) O cortipo representa uma conquista definftiva do nosso romance, pois, pela primeira vez na literatura brasileil n, um escritor da vida e corpo a um agrupamento humano, uma habita9äo coletiva. Inümeros tipos humanos, quase todos representank ili uma popula9äo marginal, desfilam pelas päginas do rotii i kc O ambiente degradado c corrupto ondc vivem 6 o cot Ü90. cujo dono e o portugues Joäo Romäo, tambem propri' t 11 1 da pedreira, onde trabalham, e da venda, onde se endfvidum ao comprar fiado. ■It vV'f Ui-lil" .-ml' O trecho a scguir flagra um momento de lazer de O cortipo, o momento em que Rita Baiana danca e causa impressäo em Jerönimo, um portugues recem-chegado ao Brasil, E viu a Rita Baiana, que fora trocar o vestido por uma saia, surgir de ombros e bragos nus, para dangar. A lua destoldara-se nesse momentü, envolvendo-a na sua cama de prata, a cujo refulgir os meneios da mestiga melhor se acentuavam, cheios de uma graga irresistivel, simples, primitiva, feita toda de pecado, toda de paraiso, com muito de serpente c muito de mulher. Ela saltou cm meio da roda, com os bragos na cintura, rebolando as ilhargas e bamboleando a cabega, ora para a esquerda, ora para a direita, como numa sofreguidäo de gozo carnal num requebrado luxurioso que a punha ofegante; ja correndo de barriga empinada; ja recuando de bragos estendidos, a tremer toda, como se sc fosse afundando num prazer grosso que nem azeite em que se näo toma pe e nunca se encontra fundo. Depois, como se voltasse a vida, soltava um gemido prolongado, cstalando os dedos no ar e vergando as pernas, descendo, subindo, sem nunca parar com os quadris, e em seguida sapateava, miüdo e cerrado freneticamente, erguendo e abaixando os bragos, que dobrava, ora um, ora outro, sobre a nuea, enquanto a carne lhe fervia toda, fibra por fibra titilando, Naquela mulata eslava o grandc misterio, a sintese das impressöes que ele recebeu chegando aqui: ela era a luz ardente do meio-dia; ela era o calor vermelho das sestas da fazenda; era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas brasileiras; era a palmeira virginal e esquiva que se näo torce a nenhuma outra planta; era o veneno e era o agücar gostoso; era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que abre feridas com o seu azeite de fogo; ela era a cobra verde e traigocira, a lagarta viscosa, a murigoca doida, que esvoagava havia muito tempo em torno do corpo dele, assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe as fibras embambecidas pela saudade da terra, picando-lhc as arterias, para lhe cuspir dentro do sanguc uma centelha daquele amor setentrional, uma nota daquela mäsica feita de gemidos de prazer, uma larva daquela nuvem de cantäridas que zumblam em torno da Rita Baiana e espalhavam-se pelo ar numa fosforescencia afrodisiaca. (Op. Oit., p, 56-7.) O narrador descreve a danga por meio de substantivos e adjetivos que contém idéia de agäo (sofreguidäo, gozo, requebrado, gemido, ofegante, empinado, prolongado) e de verbos de agäo (rebolar, bambolear, tremer, sapatear, etc.). a) Que papel desempentiam no texto as palavras indicativas de agäo? b) Que substantivos referem-sc ao corpo de Rita Baiana? c) Qual a parte do corpo que o narrador mais destaca? Por que? Observe a linguagem utilizada pelo narrador na descrigäo de Rita. Que palavras c expressöes do texto identificam a personagem como a encarnagäo do scnsualismo tropical? Indique situagöes do texto que demonstram as seguintes atitudes da linguagem naturalista: a) a equiparagäo do hörnern a animais, quer pela semelhanga fisica, quer pelas leis biológicas a que está sujeito; b) o predomínio do instinto sobre a ra/äo; c) a inffuéncia do meio fisico e social sobre a personagem. Raul Pompéía e O Aténe u j t J/ A nun I i .J,^--- t ' ' \, n> ,Sa'o Paulo, b de V Raul Pompéia (1863-1895) nas-ceu no Estado do Rio de Janeiro. Na cidade do Rio de Janeiro passou quase toda a sua vida. Estudou no Colégio Abílio e, depois, no Imperial Pedro II. Estudou Direito, primeiro em Säo Paulo, depois no Recife, onde concluiu o curso. Estreou muito cedo na literatura, em 1880, com uma novela romancsca, Č7;na tragédia no Amazonas. Dedicou-se ao jornalismo, foi colaborador da Gazeta de Nott-cias, publicando aí e em outros periódicos, a partir de 1881, crônicas e contos reveladores de um espírito atormentado, sutil e apaixonado -, além da novela As jóias da coroa, uma satira agressiva feita á família imperial, sem valor literário. Raul Pompéia, entretanto, nota-bilizou-se na literatura brasileiŕa por causa de um único livro, O Ateneu, publieado em 1888, no qüal äsšimilou e integrou todas as lendencias literá-rias de seu tempo. Avido de novida-des, o eseritor fez de O Ateneu um romance que surpreende pelajing^gem peculiar^ c jiova. As diferentes classificayôes alribuídas á obra, tais como realista, naturalista, psicologista,' parnasiana, evidenciám sua corrjjslexidadc e singularidade. Narrado em primeira pessoa, o romance inicia-se com as palavras do pai de Sérgio, o protagonista: "Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai. á ut" de Itííil porta do Ateneu. Coragem para a luta". O que segue a isso säo situacöes e cxpcriéncias vividas pelo adolescente Sergio no internato Ateneu, reconstituidas, selecionadas e comumcadas jsob_o jxmto de vista subjetivo de Sergio adulto., Misturando alcgrias e tristczas, decepcöes e entusiasmos, Sergio, entre irönico, decepcionado, indignado e ressentido, pacientemente reconstrói, por meio da memoria, a adolescéncia vivida e perdida entre as paredes do famoso internato Ateneu. Essa reconstituicäo compreende uma descricäoi expressionista1 de pcssoas e ambientcs, em que o_narrador desnuda cruelmente qs_colegas, os professores e o diretor, reduzindo-os a caricaturas grotescas, nas quäis se jpercebe a intencäo ďe~deformar, como se Sergio estivesse vingando-se de todos. Por outro lado, as situacöes c experiéncias vividas pelo narrador-personagem se apóiam na memoria e säo recriadas de mancira-impressio-nista, o que confere á narrativa um ritmo impreciso, subjetivo e nervoso. Os textos selecionados para estudo deserevem Aristarco Argolo de Ramos, o diretor do colégio Ateneu, em duas situagoes: o momento em que ele, no primeiro dia de aula, recebe os alunos que chegam acompanhados de seus responsáveis; e o trecho em que o narradoi o desereve partieipando tle uma recepcao. Texto I Abriam-se as aulas a 15 de fevereiro. De manha, á hora regulamentar, compareci. O diretor, no eseritório do estabelecimento, ocupava uma cadeira rotativa junto á mesa de trabalho. Sobre a mesa, um grande livro abria-se em colunas macigas de escrituraeao e linhas encarnadas. Soldavam-se nele o educador e o empresário com uma perfeicao rigorosa de acordo, dois lados da mesma medalha: opostos, mas justapostos. Quando meu pai entrou comigo, havia no semblante de Aristarco uma pontinha de aborrecimento. Decepgäo talvez de estatística; o numero dos estudantes novos näo compensando o numero dos perdidos, as novas entradas näo contrabalancando as despesas do fim do ano. Mas a sombra dc despeito apagou-se logo, como o resto de tunica que apenas tarda a sumir-se numa mutagäo á vista; e foi com uma explosäo de contentatnento que o diretor nos acolheu. Sua diplomacia dividia-se por escaninhos numerados, segundo a categoria de rcccpcäo que queria dispensar. Elc tinha manciras de todos os graus, segundo a condigáo social da pessoa. As simpatias verdadeiras eram raras. No ämago de cada sorriso morava-lhe urn segredo de frieza que se percebia bem. E duramente se marcavam distincôes politicas, distingöes fmanceiras, distingöes baseadas na crônica escolar do discípulo, baseadas na razäo discreta das notas do guarda-livros. As vezeš, uma crianga sentia a alfinetada no jeito da mäo a beijar. Saía indagando consigo o motivo daquilo, que näo achava em suas contas escolares... O pai estava dois trimestres atrasado. Por diversas causas a minha recepcäo devia ser das melhores. Efetivamente; Aristarco levantou-se ao nosso encont.ro e nos conduziu á sala especial das visitas. (Säo Paulo, Ática, s. d. p. 18-9.) Texto TT Nas ocasiôcs dc aparato é que se podia tomar o pulso ao homem. Näo só as condecoragôes gritavam-lhe do peito como uma couraca de grilos: Alencu! Ateneu! Aristarco todo era um anúncio. Os gestos, calmos, soberanos, eram de um rei - o autoerata excelso dos silabários; a pausa hierática do andar deixava sentir o csforgo, a cada passo, que ele fazia para levar adiante, de empurräo, o progresso do ensino publico; o olhar fulgurante, sob a crispacäo áspera dos supercílios de monstro japonés, penetrando de luz as almas cireunstantes - era a educacäo da inteligencia; o queixo, severamente escanhoado, de orelha a orelha, lembrava a lisura das consciéncias limpas - era a educacäo moral. A propria estatura, na imobilidade do gesto, na mudez do vulto, a simples estatura dizia dele: aqui está um grande homem... näo véem os côvados de Golias?!... Retorga-se sobre tudo isto um par de bigodes, volutas macigas de fíos alvos, torneadas a capricho, cobrindo os lábios fecho de prata sobre o silencio de ouro, que täo belamente impunha como o retraimento fceundo do seu espírito -, teremos esbogado, moralmente, materialmcnte, o perlil do ilustre diretor. (Idem, p. 9.) ! 1. Indique as atitudes de Aristarco que traduzem o educador e o empresário. 2. No texto II, Aristarco é deserito objetiva ou subjetivamente? Justifique. 3. Indique, no texto II, os tragos caricaturais de Aristarco destacados pelo narrador. í 4. "Desenhe" na sua imaginagäo o pcrfil físico e psicológjco de Aristarco. a) Que "idéia" de Aristarco voce formou? b) Com que possível intengäo o narrador o descreve täo grotescamente? i j^JsSlKlJ Jf J j slI Jf Jot -ll'.l l-lí. :l ■ Ji f 1 "> llľ.l'lil-* .•l:r1--I -■i.l.íi.íl-'ilíl-M'. Diferenteraente do Reabsmo e do Naturalismo, que se voltavam para o exame da realidade, o Parnasianismo representou na poesia o retorno a orientacao classica, ao principio do belo na arte, a busca do equilibria e da perfeicao formal. Os parnasianos acreditavam que o sentido maior da arte reside nela mesma, em sua perfeicao, e nao no mundo exterior. ( ~1 I examinarmos a scquéncia histórica da arte e da literatura, veremos que elas se constroem a partir de ciclos. O homem está sempre rompendo com aquilo que considera ultrapassado c propondo algo "novo". Contudo, esse novo, muitas vezes, näo passa de algo ainda mais velho, revestido de uma linguagem diferente. Assim foi o Parnasianismo no flrasil, na década de 80 do século XIX. Depois da revolucäo romäntica, que impôs novos parämetros e valores artísticos, surgiu em nosso país um grupo de poetas parnasianos que desejava restaurar a poesia clássica, desprezada.pd Os parnasianos achavam que certos princípios romänticos, como a busca de uma poesia mais acessível, da paišágčm nacionál, de urna língua brasileira, dos sentimentos, ťudo isso leria leito perder as verdadeiras qualidades da poesia. Em seu lugar propôem, entäo, urna poesia objetiva, de elevadp íiivel vocabiilar, racionalista, perfeita do ponto de vista formal e voltada a temas universais. A "arte pela arte" láíň,. fflmwml Apcsar de contemporäneos, o Parnasianismo difere profundamente do Realismo ejio Naturalismo. Enquanto esses movimentos se propunham a analisar e compreender a rcaUdade_SiKÍ.al.e humana, o Parnasianismo se dištancia da realidade e "se volta para si mesmo. DéTendendo o princípio da "arte pela arte", os parnasianos achavarň~qué cTobjetivo maior da arte näo é Iratar dos problemas humanos e sociais, mas alcancar a "perfeicao" em sna cqns-trugäo: rimas, métrica, imagens, vocabulário seíeto, equilíbrio, controle das emocôes, etc. A influencia clässica A origem da palavra Parnasianismo associa-se ao Pjumaso_grego, segundo a lenda, um nionte da Foeida, na Grecia central, consagrado a Apolo e äs musas. A escolha do nome ja comprova o interesse dos parnasianos pela Iradicäo clässica. Acreditavam que, assim, estariam combatendo os exageros de emogäo e fantasia do Romantismo e, ao mesmo tempo, garantindo o equilibrio desejado, por se apoiarcm nos modelos cUissicos. Contudo a presenca dcdemejaXQS_cl_assico.s na poesia parnasiana näo ia alem de algumas referencias a personagens da mitologia e de um enorme esforco de equilibrio formal. Pode-se afirmar que näo passava de umj^crniz, que revestiu artificialmente essa arte, como forma de garantir-lhe prestigio entre as camadas letradas do publico consumidor brasilciro. 1 MSTÍT I "mi A "Batalha do Parnasu" As idéias parnasianas já vinliam sendo difundidas no Brasil desdc os anos 70 do séculcOÍIX. Contudo foi no Finál dessa década que se travou no jornal Diano do Rio de Janeiro uma polémica literána"qůe reunm, de um lado, os adeptos do Romantismo e, de outro, os adeptos do Realismo e do Parnasianismo. O saldo dajDolemica, que ficou conheeida como Batalha do Parnaso, foi a ampla divulgacáo das ideias do Realismo e do Parnasianismo nos meios artísticos e intelectuais do pais. A primeira publicacáo considerada parnasiana propnamente dita é a obra Fanfarras (1882), de Teófilo Dias. Entretanto cabería a Alberto de Olivcira, Raimundo Correia, Olavo Bilac, Vicente de Carvalho e Francisca Julia o papel de implantar e solidificar o movimento entrc nós, bem como defmir melhor os contornos de seu projeto estélico. iJBll mm* smm, WB: ■ um ■JHJH MttĚmm HflHH HhhhH 13331 íl íl- i "•:---' ' * fll I )1«íl 1 1« i K i 'i/' T ''ritPElMi! i,w Wi I 31 A linguagem da poesia parnasiana . A poesia parnasiana pretende ser universal. Por isso utiliza uma linguagem objetiva, que busca a contencao dos scntimcntos e aTpcrfcicao formal. Seus temas sao, igualmente, universais: a nalureza, o tempo, o amor, objetos de arte e, principaimente, a propria poesia. O poema que segue, dc Olavo Bilac, represent;) uma espécie de plataforma teórica do Parnasianismo no Brasil, embora o movimento já estivessc implantado cm nosso pais quando de sua publicagäo. Nele pode ser encontrado o projeto estético de seu autor e dos parnasianos cm gcral. Profissäo de fé Invcjo o ourives quando escrevo: Imito o amor Com que ele, em ouro, o alto-relevo Faz de uma flor. Imito-o. E, pois nem de Carrara A pedra liro: O alvo cristal, a pedra rara, O ônix prefiro. .: Por isso, corre, por servir-me, Sobre o papel A pena, como em prata firme Corre o cinzel. Corre; desenha, enfeita a imagcm, A idéia veste: Cinge-lhe ao corpo a ampla roupagem Azul-celeste. force, aprimora, alteia, lima A frasc; c, cnfim, No verso de ouro engasta a rima, Como um rubim. Quero que a estrofe cristalina, Dobrada ao jeito Do ourives, saia da oficina Sem um defeito: E que o lavor do verso, acaso, Por täo sutil, Possa o lavor lembrar de um vaso De Becerril. í :irriir:i: i ,il:-dľ il. Imii;. f.uiMS.i pel., qualidadc do mármorc branco que priidti'. cinzel: instrumente de corte usado por escultores e graviidores. Becerril: noiiw de um famoso nrtesiio. E horas sem conla passo, mudo, O olhar atento, A trabalhar, longc dc tudo O pensamento. Porque o escrever - tanta pcricia, Tanta requer, Que oficio tal... nem hä noticia De outro qualquer. Assim procedo. Minha pena Segue esta norma, Por tc scrvir, Deusa sercna, Serena Forma! (Em Poesia. Rio de Janeiro, Agir, 1957. p. 39-40.) 1. Já na primeira estrofe, o poeta comega a definir sua "profissäo de fé", isto é, os seus princípios artísticos. a) A quem se compara o poeta? Por que? b) Ao longo do texto, o material do poema (a palavra) é comparado a materiais da escultura e da ourivesaria, como ônix, ouro, rubim, etc. Considerando a qualidade desses materiais, que concepgäo revela ter o poeta a respeito do valor da poesia? c) De acordo com a 6a, 93 e 10* estrofes, qual é o fundamente maior do projeto poético parnasiano? 2. Relacione o princípio da "arte pcla arte" defendido pelos parnasianos com a 8a estrofe do poema. 3. O introdutor do Romantismo no Brasil, Goncalves de Magalhäes, assim se refere á criagäo dos poemas romänticos: "Quanto á forma, isto é, a construcäo [...] nenhuma ordem seguimos; exprimindo as idéias como elas se apresentaram, para näo destruir o acento da inspiracäo [...] cada paixäo requer sua linguagem propria [...]". Discuta as diferengas entre os princípios poéticos|do Romantismo e os do Parnasianismo, com base em dois aspectos: a forma do texto e a expressäo dos sentimentos do artista. Características da linguagem parnasiana Como sintcsc, podcmos esquematizar as características da poesia parnasiana do seguinte modo: liusca da poiieigfit) l'i>riu;. palidu de e^p.iiiln .. Ii conversamos toda a noitc. enquanto A via láctea, como um pálio aberto, Cintila. F, ao vir do sol, saudoso e em pranlo, Inda as procura pelo céu deserto. Dircis agora: "Tresloucado amigo! Qi..1 i.iui\cr-. i..>m elas? Que sentido Tern o que dizem, quando estiio contigo?" E cu vos dirci: ;'Amai para entende-lasl Pois so quern amapode terouvido ( apa/ dc i-ii'.u > de entender estrelas." (Em Poesia, p. 47-8.) 1. Há, no texto, uma situacäo de diálogo, Identifique os interlocutores. 2. Esse poema situa-se entre certas produ9Öes de Olavo Bilac que fogem aos procedimentos tipicamente parnasianos. t a) De acordo com a ultima estrofe, qual é a condifäo necessária para a "comunicapäo cósmica"? b) Destaque do texto um exemplo de predomínio da emoeäo sobre a razäo. c) Conclua: que estética literária influenciou a cria9äo desse soneto? Raimundo Correia: a pesquisa da linauaciem Raimundo Correia (1860-1911) é um dos poetas que, juntamente com Olavo Bilac e Alberto de Oliveira, forma a chamada '^triade_|>axnas_iana''. .Majankense, estudou Direitp.emSäp, Paulo e foi magistrado em váríos Estados brasileiros. Sua poesia, dentro do movimento parnasiano, representa um momento de descontraeäo e de investigacao. Nela se verificam pelo menos^ tres_fases: ) • a/ase romänticci: com influéncias de Casimiro de"ÄBreü*e Fagundes * Varel a, representada por Primeiros sonhosjl 879); • a fase parnasiana propriamente dita: representada pelas obras Sinfonias (r883) e Versos e versöes (1887) e marcada pelo r^simismo de Schorjenhftijěr •' pensääor' álémao que defendia a idéia de que todas as dores e males do mundo prověm da vontade de viver - e por reflexoes de ordern moral e social; | • a fase_jpré-simbolista: nela, o pessirnijmc^jiiante da condicjio humana bušča refúgS na metafísica e na religiäo, enquanto älmgüagem apiesenta uma pesquisa em musicalidade e sinestesia. O texto que segue e um dos mais conhecidos poemas de Raimundo Correia e um bom exemplo das qualidades tecmcas do autor como sonetista. Observe como os versos, as imagens c a lingua sao empregados com fluencia e naturalidade. As puiiilias Vai-sc a priraeiru pomba despertada... Va.-se ojlia r.iui»,.. lr.ais ouliv.... cnlim dj-'.-n,^ De pombas väo-se dos pombais, apenas Raia sanguinea e fresca amadrugada... Ii ;i lardc, quando a rigida nortada Sopra, aos pombais denovo elas, Serenas, Ruflando as asas, saeudindo as penas, Vollam todas em bando e em revoada... Tambem dos cora9Öes onde abotoam, Os sonhos, um por um celeres voam, Como voam as pombas dos pombais; No azul da adolescencia as asas soltam Fogem... Mas aos pombais as pombas vollam, K eles aos coravöes nüo voltam m:iis (Cm Benjamim Abdala Jr., org. Antalagia da poesia hrasileira -kvatemo e Pamasianlsmo. Säo Paulo, Ätlca, 1985. p. 35.) o 1. O soneto está organizado em duas partes. Nas duas quadras, o cu lírico descreve o revoar das pombas; nos terectos é estabelecida uma compara9äo. a) A que é comparado o revoar das pombas? b) Qual é a diferen9a essencial, segundo o texto, entre os elémentos comparados? 2. De acordo com os termos dessa compara9äo, identifique a que correspondem, no piano da vida: a) a madrugada e a tarde; b) a nortada, que as pombas encontram, á tardc, fora dos pombais. 3. Rclcia a ultima cstrofc do soncto. Que visäo sobrc a vida c sobre a condÍ9äo humana o eu lírico expressa nessa estrofe e no poema como um todo? 4. Destaque do soneto trés caracteristicas que comprovem a filia9äo do texto ao Parnasianismo. Olavo Bilac A uui poeta Longe do estcril turbilhäo da rua, Beneditino, escreve! No aconchego Do claustro, na paciencia e no sossego, Trabaiha, e leima, e Iima, e sofre, e sua! Mas que na forma se disfarce o emprego Do esforgo; e a trama viva se construa De tal modo, que a imagem fique nua, Rica mas söbria, como um templo grego. Näo se mostre na fäbrica o suplicio Do mestre. E, natural, o efeito agrade, Sem lembrar os andaimes do edificio: Porque a Beleza, gemea da Verdade, Arte pura, inimiga do artificio, E a forga e a graca na simplicidade. (Em Benjamim Abdala Jr., org. Op. cit., p. 92.) Nel mezzo del cainiii... Cheguei. Chcgastc. Vinhas fatigada E triste, e triste e fatigado eu vinna. Tinhas a alma de sonhos povoada, E a alma de sonhos povoada eu tinha... E paramos de súbito na estráda Da vida: longos anos, preša á minha A tua mäo, a vista deslumbiada Tive da luz que teu olhar continha. Hoje, segues de novo... Na partida Nem o pranto os teus olhos umedece, Nem te comove a dor da despedida. E eu, solitário, volto a face, e tremo, Vendo o teu vulto que desaparece Na extrema curva do caminho extremo. (Idem, p. 56.) Alberto de Oliveira Vaso chinés Estranho mimo, aquele vaso! Vi-o Casualmente, uma vez, de um perfumado Contador sobre o mármor luzidio, Entre um leque e o comego de um bordado. Fino artista chinés, enamorado, Nele pusera o coragao doentio Em rubras flores de um sutil lavrado, Na tinta ardente, de um calor sombrio. Mas, talvez por contraste á desventura -Quem o sabe? de um velho mandarim Também lá estava a singular figura: Que arte, em pmtá-la! A gente acaso vendo-a Sentia um näo sei que com aquele chim De olhos cortados á feigäo dc amčndoa. (Em Poesia. Rio de Janeiro, Agir, 1959. p. 24.) 'řr-A_!l>iiH ylinU ' ' I ' ť M< ' iM't - l!ľí í í , i n '.Iv i i ii. . . in i 1. (Fuvest-SP) Em 1881 foram publicados dois romances importantes no Brasil, com os quais se inicia um novo movimento literário na prosa brasileira. a) Quais sao esses romances? b) Com que movimento literário eles rompem? 2. (UFCE) Assinale a única afirmativa que nao é vcrdadeira em relagao ao romance Dom Casmurro. a) Dom Casmurro pode ser considerado um romance psicológico, no qual o narrador se revela, sc denuncia, se analisa. b) Em passagens como: "Deus é o poeta. A música é de Satanáš...", frequentes em Dom Casmurro, Machado rcvcla o homem como um ser dual, buscando sempře caminhos opostos. c) Escobar é o personagem que, em Dom Casmurro, responde pelo chrna dúbio que conduz narrador e leitor á suspeita de um possivel adultério. d) Como pano de fundo para ressaltar o terna maior dc scu romance, Machado de Assis retrata, em Dom Casmurro, com pinceladas de um artifice-artista, usos, ritos, credos e crengas da sociedade do II Império. e) A narratíva machadiana em Dom Casmurro obedece aos cánones da lincaridade romanesca, na qual o leitor avisado observa, no relato da vida de um personagem qualquer, a evolugáo de seu nascimento, vida e mortc. (Covest-PE) Nas questoes 8 e 9, assinale V para verdadeiro e F para falso. 3. Esta questáo refere-se ao Parnasianismo e seus represenlantes. a) Alberto de Oliveira, Olavo Bilac e Raimundo Corrcia těm em comum a preocupagao com a forma, com o verso bem acabado. b) Alberto dc Oliveira foi o poeta parnasiano que mais se deixou prender aos rigores formais da Escola. c) Alphonsus de Guimaraens é parnasiano, mas apresenta tragos da poesia simbolista. d) Os versos: " 'Ora (direis) ouvir estrelas! Certo / Perdeste o sensof E eu vos direi, no entanto, / Que, para ouvi-las, muita vez desperto / E abro as janelas pálido deespanto..." fazem parte do conjunto de poemas a que Olavo Bilac deu o nome tle Via Láctea. e) A poesia de Castro Alves aborda vários temas, que vao do lirismo amoroso até a preocupagao social, o que é bem típico do Parnasianismo. 4. Sobre o Realismo/Naturalismo brasileiro. a) Pode-se dizer que uma das maiores ínfluéncias sofridas foi a do Positivismo. b) Por razoes de dependéncia cultural, nosso Realismo apresenta, de modo geral, as tnesmas características do Realismo francěs. c) Uma das principals diferengas entre o Romantismo e o Realismo brasileiros 6 que o Realismo tem uma visao idealizada da realidade e o Romantismo tenta deserever a realidade tal qual é. d) Os naturalistas mostram, cm seus romances, que o homem é determinado pelo meio e pelo momento historko. e) O regionalismo, iniciado com "O Sertanejo" de José de Alencar, é um exemplo típico do Naturalismo brasileiro. 5. (Covest-PE) Leia com atengao: I) "- Náo me mates de felicidade, Aurélia! Que posso eu mais desejar nesse mundo do que viver a teus pés, adorando-te, pois que és minha divindade na terra (...) Estes lábios nunca tocaram a face de outra mulher, que náo fosse minha máe. O meu primeiro beijo de amor, guardei-o para minha esposa..." II) "Ele tinha 'paixa' pela Rita, e ela, apesar de volúvel como toda mestiga, náo podia esquecé-lo por uma vez, metia-se com outros, é certo, de quando em quando, e o Firmo entao pintava o caneco, dava por paus e por pedras, enchia-a dc bofetadas..." Dc cima para baixo, os textos sao representatives dos seguintes movimentos estéticos: a) Romantisme- / Impressionismo d) Pré-Modernismo / Realismo b) Romantismo / Parnasianismo e) Modernismo / Realismo ' c) Romantismo / Naturalismo 6. (Osec-SP) Publicado em 1854, esse romance, escrito por um jovem jornalista de vinte e dois anos, descreve um anti-herói, "filho de uma piscadela e de um beliscao", e os tipos e costumes do Rio de Janeiro do tempo de D. Joao VI. ' O romance e o autor a que o texto se refere sao, respectivamente: a) Memórias de um Sargento de Milícias e Manuel Antonio de Almeida. b) Memorial de Aires e Machado de Assis. c) Memórias Sentimentais de Joao Miramar e Oswald de Andrade. d) Memórias do Sobrinho de meu Tio e Joaquim Manuel de Macedo. e) Memórias do Cárcere e Graciliano Ramos. 7. (PUCC-SP) Identifíque o trecho em que o narrador de Dom Casmurro introduz o romance e considera seu sentido profundo. a) "Horas inteiras eu fřco a pintar o retrato dessa máe angelica, com as cores que tiro da imaginacáo, e vejo-a assim, ainda tomando conta de mim, dando-me banhos e me vestindo. A minha memória ainda guarda detalhes bem vivos que o tempo náo conseguiu destruir." b) "O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na vclhice a adolescéncia. Pois, senhor, nao consegui recompor o que foi nem o que fui. Em tudo, se o rosto 6 igual, a fisionomia é diferente. É o que vais entender, lendo." c) "Faz dois anos que Madalena morreu, dois anos difíceis. E quando os amigos deixaram de vir [' discutir poliliea, isto se tornou insuportável. Foi ai que me surgiu a idéia csquisita de, com o auxilio de pessoas mais entendidas que eu, compor esta história." d) "Suposto o uso vulgar scja comecar pelo nascimento, duas consideracoes me levaram a adotar , diferente metodo: a primeira é que nao sou propriamente um autor defunto, mas urn defunto autor; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo." e) "Sua história tem pouca coisa de notável. Fora Leonardo algibebe em Lisboa, sua pátria; aborrecera-se porém do negócio, e viera ao Brasil. Aqui chegando, náo se sabe por protecáo de quern, alcancou o emprego de que o vcmos empossado." 8. (ITA-SP) Assinale o texto que, pela linguagem e pelas idéias, pode ser considerado como representante da corrente Naturalista. a) "... essa noite estava de veia para a coisa; estava inspirada; divina! Nunca dancara com tanta graca e tamanha lubricidade! Também cantou. E cada verso que vinha de sua boca [...] era um arrulhar choroso de pomba no cio. E [...], bébado de volúpia, enroscava-se todo ao violao; e o violao e ele gemiam com o mesmo gosto, grunhindo, ganindo, miando, com todas as vozes de bichos sensuuis, num desespero de luxúria que penetrava até ao tutano com linguas finissimas de cobra." b) "Na planicic avcrmelhada dos juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos, Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe, através dos galhos pelados da caatinga rala." c) "Vivia longe dos homens, só se dava bem com anhnais. Os seus pes duros quebravam espinhos e náo sentiam a quentura da terra. Montado, confundia-se com o cavalo, grudava-sc a cle. E falava uma linguagem cantada, monossilábica e gutural, que o companheiro entendia." d) "Do seu rosto irradiava singela expressáo de encantadora ingenuidade, realcada pela meiguice do olhar sereno [...] Ao erguer a cabeca para tirar o bnico de sob o lencol, descera um nada a camisinha de crivo que vestia, deixando nu um colo de fascinadora alvura, em que ressaltava um ou outro sinal de nascenca." e) "Hercules-Quasimodo, reflete ao aspecto a fealdade tipica dos fracos. A pé, quando parado, rccosta-se invariavclmcnte ao primeiro umbral ou parede que encontra; a cavalo, se sofreia o > animal para trocar duas palavras com um conhecido, cai logo sobre um dos estribos, descansando sobre a espenda da sela." 9. (Covest-PE) Leia atentamente: "Quando novamente abria os olhos e a carta, a letra era clara e a notícia claríssima. Escobar vinha assim surgindo da sepultura, do seminário e do Flamengo para se sentar comigo á mesa, receber-me na escada, beijar-me no gabineto dc manha, oti pedir-me á noite a béncao do costume. (...) Quando nem mae nem filho estavam comigo, o meu desespero era grande, e eu jurava matá-los a ambos, ora de golpe, ora devagar..." Ndo é correto afirmar cm relacáo ao texto acima: a) foi extraido do romance "D. Casmurro" de Machado de Assis; b) mostra o sofrimentn de Bentinho, que, a cada dia, vé mais semelhancas entre o filho e o provável amantc de Capitu; c) é fragmento do único romance em que Machado de Assis nao se aprofunda na análise psicológica das personagens; d) faz parte de um romance típico da fase realista do autor; e) é narrado em terceira pessoa. 10. (Covest-PE) Relacione a coluna I com a coluna II. Co luna I (1) Valorizou o indianismo com intuito nativista. (2) Idealizou a vida campestre como verdadeiro estado de poesia. (3) Analisou o momento histórico, revelando-o em sua misória moral e económica. Coluna II ( ) Realismo ( ) Romantismo ( ) Arcadismo A seqiiéncia correta, de cima para baixo, é: a) 3, 1, 2; d) 2, 1, 3; b) 3, 2, 1; e) 1, 3, 2. c) 2, 3, 1; 11. (FAAP-SP) Pela desericao das personagens femininas a seguir, identifíque o romance de que elas fazem parte: a) (Luisinha) - Era a sobrinha de Dona Maria já muito desenvolvida, porem que, tendo perdido a gráfa do menina, ainda nao tinha adquirido a beleza de moca, era alta, magra, pálida, andava com o queixo enterrado no pcito, trazia as pálpebras baixas e olhava a furto. b) Ela saltou em meio da roda, com os bracos na cintura, rcbolando as ilhargas e bamholeando a cabeca, ora para a esquerda, ora para a direita, como numa sofreguidao de gozo carnal num requebrado luxurioso que a punha ofegante; ... ninguém conio a Rita; só ela, só aquele demónio, tinha o mágico segredo daqueles movimentos de cobra amaldicoada. 12. (Fatec-SP) "(...) é uma grande mancha pardacenta que se alonga aos nossos olhos; cinza como o cotidiano do homem burgués, cinza como a eterna rcpetieao dos mecanismos de seu comportamento; cinza como a vida das cidades que já entao se unifícava em todo o Ocidente. E a moral cinzenta do fatalismo que se deštila..." a) Identifíque a estética literária a que se refere o texto anterior. b) Fxemplifíque a referenda de Alfredo Bosi, comentando uma obra iluslrativa desse periodo. 13. (FGV-SP) A respeito do autor de O Ateneu, disse Mario de Andrade: "Raul Pompéia, inconscientemente, foi a última e derradeiramente legitima expressáo do barroco entre nós". Referia-se, com essas palavras, ao: a) tema nilidamente barroco desenvolvido no romance. b) fato do que Raul Pompéia viveu no fim da era barroca. c) requinte verbal da linguagem de Pompéia. d) espřrito religioso da obra. o) caráter memorialista da narracáo. -v Para saber mais sobre o Simbolismo e a arte do final do século XIX, sugerimos: I ASSISTIR: ao fllme Sonhos, de Akira Kurosawa, uma coletanea de historias dentre as quais uma I e destinada ao plntor pos-lm- ' pressionista Van Gogh. CONHECER: aobrade pintores impressionistas e pos-impres-sionistas, como Renoir, Manet, Cezanne, Van Gogh, Gauguin Toulouse-Lautrec e Klimt. OUVIR: a música de Debussy. PESQUISAR: sobre as relacöes entre o Simbolismo e o Romantismo, inclusive quanto ä tendencia gótica. Í.-Í-../" • 4 j ^- ^5 --ví-^ C>L ■ Os simboUstas, insatisfeitos com a onda de cientificisrao e materialismo a que esteve submetida a sociedade industrial europeia na segunda metade do seculo passado, representam a reacao da intuiyao cuntra a logica, do subjetivismo contra a objetividade cientifica, do misticismo contra o materiatismo, da sugcstao sensorial contra a explicacao racional. I cnhuma artc é inteiramente objetiva. Até urna fotografia, por exemplo, que se aproxima bastante da realidade, depende da selegäo que o fotógrafo faz: o que fotografar, de que ängulo, a que dištancia, com que luz, em que momento. Ľssas variantes estäo sujeitas ás intencôes do fotógrafo; säo, portanto, subjetivas e podem modificar o resultado final, a foto. Os simbolistas näo acreditavam na possibilidade de a arte e a literatúra poderem fazer um retrato total da realidade. Duvidavam também das explicacôes "positivas" da ciéncia, que julgava poder explicar todos os ľenômcnos que envolvcm o homem e conduzi-lo a um caminho dc progrcsso e fartura materiál. Assim, o£_sirnboJisjasj^r^_entjmi trmgrupo social que ficou a margcm do cientificismo do seculo XIX e que procurou resgatar certos valores romanticos varridos peloTtealismo, tais como o espiritualismo, o desejo de trahscendencia e de ihtegracao com o unive"fsb7 6 mistefio, o misticismo, a morte, a dor existencial (sem, contudo, cair na afeta9ao sentimental romantica). Essa reacao antimaterialista situa-se num contexto mais amplo vivido pela Europa no ultimo quarto do seculo XIX, a forte crise espiritual a que se tem chamado decadenlismo do final do seculo. ' "ľ r>]i:jí>-i kX t'A Como movimento ajrdrriaterialista _e anti-raciona-lista, o Simbolismo buscou uma linguagem que fosse capaz de sugerir a realidade, e nao retrata-la objetiva-menle, como queriam os realistas. Para isso, faz uso de jjmbolos, imagens, rnetaforas, sinestesias, alem de recursos sonoros e cromaticos, tudo.com a fmalidade de cxprimir o mundo interior, intuitivo, antilogico e anli-racional. Para Charles Baudelaire, poeta frances pos-roman-tico e precursor do movimento simbolista, a poesia e a expressao da correspondencia que a linguagem e capaz de estabelecer entre o concrete e o abstrato, o material e o ideal. Em seu famoso poema 'Correspondents', laire escreve: Baude- Como longos ecus que de longe se confundem numa tencbrosa c profunda unidade, vasta como a noite e como a claridadc, os perfumes, as cores e os sons sc correspondent. Essas correspondéncias entre os campos sensorial e espiritual envolvem obrigatoriamente a sinestesia. Sinestesia é o cruzainento de campos sensorials diferentes: por exemplo, tato e visäo, como nas imagens "noite de veludo", "amarclo qucntc", "cinza frio". 'j i 1 .''Dl--, h:'.''M t ' 1 ; ' 1 . Ill-li »1 ••l.(J' ' I i'1 V í Vi 'II íl O texto que segue e um dos mais belos poemas de Cruz e Sousa, o principal poeta simbolista brasileiro. Ao ler o texto, Pique atento ä musicalidade das palavras e das construgoes. Yifllfil's l|llc oIlDI'illll... Ah! pltingentcx violöes dormentes, mornos, S lhnv- .10 lu ir. Jioio.s, o m-.iIii . Tristes perfis, os mais vagos contornos. liln-I', II.IIIIIIIICI.'lllCI dc l.n.ie .In. Noites dc alem, rcmotas, que cu rccordo, No I'1- d.. miIhI.iii. iioiies .viiii'l.i-que nos azuis da Fanlasin hordo, Vou constelando de visöcs ignotas. Sutis palpitagöes ä luz da lua, Anseio dos momentos mais saudosos, : Quando 14 choram na deserta rua • • .«w As cordas vivas dos violöes chorosos. Quando os sons dos violöes väo solucando, ' Quando osisons dos violöes nas cordas gemern,' I ■. ii' ii lacerando c deliciando, kasgando as almas que nas sombras tremem. ••'' . Ilarmonias que pungem, que laceram, i Dedos nervosos e ägeis que percorrefn Cordas e um mundo de dolencias geram Gcmidos, prantos, que no espago morrem... K sons soturnos, susplradas mägoas, Mägoas amargas e raelancolias, No sussurro monotono das dguas,_ Noturnamente, entre ramagens frias. Vozes velada's, veludosas vozes, Volüpias dos violöes, vozesjssladas, Vagam nos velhos vörticeswelozes Dos ventos, vivas, vasiwulcanizadas. I Tudo nas cordas dos violöes ecoa E vibra e se contorce no ar, convulso... e Tudo na noite, tudo clama e voa Sob a febril agilacäo de um pulso. Que esses violöes nevoentos e tristonhos Säo ilhas de degredo atroz, funereo, , 1 r<;.y/»i-;> «•», .- •w.'.Vi Para onde väo, fatigadas do sonho, is ■ :[" '<•"<"! •• Almas que se abismaram no misterio. i '':|':' 11 • '■' ' (Em Poesias completas. Rio de Janeiro, Ediouro, s.>d; p. 50-1.) 1. A linguagem simbolista caracteriza-se por ser vaga, fluida, imprecisa. Por isso, emprega abundantemente substantivos abstratos e adjetivos. Destaque das duas primeiras estrofes: a) alguns substantivos e adjetivos responsáveis por essa fluidez; b) alguns versos que conotem algo indefinido, vago. 2. Ao invés de nomear ou explicar objetivamente, a linguagem simbolista procura sugerir. a) O que sugere a aliteraeäo do fonema /v/ da sétima estrofe? b) Com base na primeira e na quinta estrofes e no título do poema, explique o que sugerem, na visäo do eu lirico, os sons do violäo. 3. Para os sinibolistas, uma das formas de expressar as sensacöes interiores por meio da linguagem verbal é a aproximagäo ou o cruzamento de campos sensorials diferentes. Neste ultimo caso, temos a sinestesia. a) Que campos sensorials o poeta aproxima nas trés estrofes iniciais? b) Destaque da sétima estrofe um exemplo de sinestesia. 4. Contrapondo-se á visäo "positiva" e equilibrada do pensamento científico, os simbolistas manifestam estados de dilaceraeäo da alma e uma profunda "dor de existir". Justifiquc a presenga desses sentimentos no poema em estudo, tomando por base sua ultima estrofe. Características da linguagem simbolista As características da linguagem simbolista podem ser assim esquema-tizadas: • Linguagem vaga, fluida, que prefere sugerir a nomear • Presenga abundante de metáforas, comparagöes, aliteragôes, assonäncias, paronomasias, sinestesias • Subjelivismo • Antimaterialismo, anti-racionalismo • Misticismo, religiosidade » Pcssimismo, dor de existir • Desejo de transcendencia, de integraeäo cósmica @ Interesse pelo noturno, pelo mistério e pela morte © Interesse pela exploracäo das zonas desconhecidas da mente humana (o inconsciente e o subconsciente) e pela loueura O movimento simbolista surge no ultimo quarto do seculo XIX, na Franga, e representa a reaeäo artistica ä onda de materialismo e cientificismo que envolvia a Europa desde a metade do seculo. Tal qual o Romantismo, que reagira contra o racionalismo burgues do seculo XVIII (o Iluminismo), o Simbolismo rejeita.as solugöes racionalistas, empiricas e mecanicas trazidas pela ciencia da epoca e busca valores ou ideais de outra ordem, ignorados ou desprezados por ela: o espirito, a transccndcncia cösmica, o sonho, o absoluta, o nada, o bem, o belo, o sagrado, etc. A origem dessa tendencia espiritualista e até mística situa-se nas camadas ou grupos da sociedade que ficaram á margem do processo de avanco tecnológico e cientifico do capitalismo do século XIX c da solidifica9ílo da burguesia no poder. Säo setores da jiristocracia decadente e da classe, média que, näo yiyendo a eufória do progrcsšomäterial, da mércaddria e do objeto, reagcm contra ela. Propöem a volta da suprcmacia do sujeito sobre o objeto, rejeitando desse modo o desmedido valor dado ás coisas materials. Assim, os simbolistas procuram resgatar a relacäo do hörnern com o sagrado, com a liturgia e com os símbolos. Buscam o sentiment o de totalidade, que se daria numa integracäo da poesia com a vida cósmica, como se ela, a poesia, fosse uma religiäo. Sua forma de tratar a rcalidade é radicalmente difercnte da dos realistas. Näo aceilam a separacjäo entre sujeito e objeto ou entre objetivo e subjetivo. Partem do principio de que é impossível o retrato fiel do. objeto; o papel do artista, no caso, seria o de sugeri-Io. por meio de tentativas, sem querer, esgotá-lo. Desse modo, a obra de arte nunca é perfeita ou acabada, mas aberta, podendo sempře ser modificada, ampliada ou refeita. i ........«r*, Os niulilitos I --s i coneep^äo da realidade e da arte trazida pelos si rkuVias suscita reafôes entre setores positivistas da sou-dide. Chamados dc malditqs: oudeegdentes, os Mii.holľ-ias ignoram a opiniäo publica, desprezam o picii'io social e literário, fechando-se numa quase n Ii -i.iu da palavra e suas capacidades expressivas. O Simbolismo - com as propostas de Jnovafäo, opi e pesquisa trazidas pela gerafäo de Verlaine, Ii n ki id e Mailarme näo sobrevive muito. O mundo piľ-iiiu.. a eufória capitalista, o avanco científico e ico. A burguesia vive a belie époque, um oc u J.i de prosperidade, de acumulafäo e de prazeres mjicii.i s que só terminaria com a eclosäo da Primeira ( m. li i Mundial, em 1914. e contexto, o Simbolismo desaparece. Mas di \ i 10 mundo um alerta sobre o mal-estar trazido nela cmliza9äo moderna c industrializada, além de i.i\lig.ľ- literários novos, que abriräo campo para as iľii.'iik"! artísticas do século XX, principalmente o I ipu^ionismo e o Surrealismo, também preocupados (.on- .1 „'\pressäo e com as zonas inexploradas da mente iiM'ii.m.i. como o inconsciente c a loueura. WĚmWĚaĚĚlImmĚĚĚř- l'l s- modernista brasileirqrAugušto dčTAnjojyjuz _e Sousa apresenta uma das poéticas dc maior ^profundidacle" em lingua portuguesa, quanto á investigacäo filosófica e á angústia metafísica. O drama da existencia, em sua obra, revela urna provável influéncia das idéias pessimistas do filósofo alemäo Schopenhauer, que marcaram o final do sčculo passado. Além disso, certas posturas de sua poesia - o dosejo de fugir da realidade, de transcender a matéria e.integrar-se espiritualmente no cosino -parecem originar-se näo apenas do sentimento de opressäo e mal-estar trazido pelo capitalismo, mas também do drama racial e pessoal que vivia. A trajetória de sua obra parte da consciéncia e da dor de ser negro, em Broquéis, á dor de ser homem, em busca da transcendencia, cm Faróis e Últimos sonetos, obras póstumas. Observe a dor existencial nestes versos de 'Cárcerc das Almas': Ah! Toda a alma num cáreere anda preša Solucando nas trevas entrc as grades Do calabouco olhando imensidades, Mares, estrelas, tardes, natureza. Ó almas presas, mudas e fechadas Nas prisôes colossais e abandonadas, Da Dor no calabouco atľoz, funéreo! (Em Poeslas compietas, p. 94.) BBS As características mais importantes da poesia de Cruz e Sousa säo: o no piano temátko: a morte, a transcendencia espiritual, a integracäo cósmica, o mistério, o sagrado, o conflito entre matéria e espírito, a angústia e a sublimacäo sexual, a escravidäo e urna verdadcira obsessäo por brilhos e pela cor branca. ® no piano formal: destacam-se as sinestesias, as imagens surpreendentes, a sonoridade das palavras, a predominäncia de substantivos e a utilizacäo de maiúsculas, com a finalidade de dar um valor absoluto a certos termos. O texto a scguir é uma das melhores realizagoes da poesia filosófica dc Cruz e Sousa, que questiona a razao e o fundamento da existéncia humana. Cavador do Infinito Com a lámpada do Sonho desce aflito E sobe aos mundos mais impondcráveis, Vai abafando as queixas implacáveis, Da alma o profundo e solucado grilo. . Ansias, Desejos, tudo a fogo escrito Seate, em redor, nos astros inefáveis. Cava nas fundas eras insondáveis O cavador do trágico Infinito. E quanto mais pelo Infinito cava Mais o Infinito se transforma em lava E o cavador se perde nas distancias... Alto levanta a lámpada do Sonho E com seu vulto pálido e tristonho Cava os abismos das etemas ansias! (Em Poesias compiétás, p. 109.) 1. O eu lírico do texto vive um drama existencial, representado pela acäo de cavar o infinito. A propósito da primeira estrofe do soneto: a) Que verbos sugerem a acáo de cavar? b) Que instrumente o eu lírico utiliza para cavar o infinito? De acordo com o texto, o eu lirico, enquanto cava, abafa queixas c gritos da alma. Observe que, na escavacao do infinito, o eu refere-se a "ansias", "desejos", "sonho" e, na ultima estrofe, diz cavar "os abismos das eternas ansias". a) O que se supoe ser o "infinito" cavado? b) O que provavelmente o eu lirico busca encontrar? c) Dc acordo com a terceira estrofe, pode-se dizer que o eu lirico tenha encontrado o que procura? A!f»h' «ii .1 k. i liiimamens Alphonsus de Guimaraens (1870-1921) nasceu em Ouro Preto, estudou Direito em Sao Paulo e foi durante muitos anos juiz em Mariana, cidade histórica, vizinha de Ouro Preto. Marcado pela mortc da prima Constanca - a quem amava e que contava apenas 17 anos -, sua poesia e quase toda voltada ao tema.da morte da mulitcr amada. Todos os outros temas que explorou, conio natureza, arte e religiao, cstao de alguma forma relacionados áquele. A exploracäo do terna da morte abre ao poeta, por um lado, o vasto campo da literatura gólica ou macabra dos eseritores ultra-romänticos, recuperada por alguns simbolistas; por outro lado, possibilita a criacäo de uma atmosféra mística e litúrgica, em que abundam referéncias ao corpo morto, ao esquife, ás oracôes, ás cores roxa e negra, ao sepultamento, conforme exemplifica a estrofe a seguir: Mäos de fŕnada, aquelas mäos de neve, De tons marfíneos, de ossatura rica, Pairando no ar, num gesto brando e leve, Que parece ordenar mas que suplica. O conjunto da poesia de Alphonsus de Guimaraens e uniforme e equilibrado. Temas e formas se repetem e se aprofundam, no decorrer de quase trinta anos de producao literaria, consolidando uma de nossas poeticas mais misticas e espiritualistas. O critico Alfredo Bosi considera que "de Cruz e Sousa para Alphonsus de Guimaraens sentimos uma descida de torn", isso porque a universalidade, a dor da existencia e as sensacoes dc voo c vertigem que caraetcrizam a linguagem simbolista de Cruz e Sousa ganham limites mais estreitos na poesia de Alphonsus de Guimaraens, presa ao ambiente mistico da cidade de Mariana e ao drama sentimental vivido na adolescencia. Formalmente o poeta revela influencias arcades e renascentistas, sem, contudo, cair no formalismo parnasiano. Embora preferisse o verso decassilabo, Alphonsus chegou a explorar outras metricas, particulamiente a redondilha maior, de longa tradicao popular, medieval e romantica. O poema que segue e o mais popular de Alphonsus de Guimaraens. O texto situa-se na parte de sua obra que busca algumas sugestoes de forma e conteiido na tradicao poetica medieval. Isiiiália Quando Ismália cnlouqucccu, na Innv .1 sc 1111:11-. V'.ii 11,11:. ,ia i.ii c.'-i.. Viu oulni lun no mar. No sonho cm que se pcrdcu, Banhou-sc toda em luar... Queria subir ao céu, Qiicria descer ao mar... E, no desvario seu, Na lorre pôs-se a canlar... Estava pcrto do ecu, Estava longc do mar... E como um anjo pendeu As asas para voar... Queiia a lua do ceu, queiiii a Ina do mar... •\s .i^ ii qi.c Wu- llic de.i Kul'.u.ir.i kk- p.n cm pa:... Sun almu subiii 110 ceu, Seu corpo desceu 110 mar... (Em Ohm r.nmpteto. Rio dB Janeiro, Aguilar, 1900. p. 467.) 1. Todo o poema é construído com base em antíteses: As antíteses articulam-se em torno dos desejos contraditórios de Ismália. a) Destaque dois pares de antíteses do texto. b) O que deseja Ismália? 2. O Simbolismo, por ser um movimento antilógico e anti-racional, valoriza os aspectos interiores e pouco conhecidos da alma e da mentě humana. Retire do texto palavras ou expressôes que comprovem essa caracteristica simbolista. 3. Tal qual no Barroco e no Romantismo, o poema estabelece relacôes entre corpo e alma ou matéria e espírito. Com base no desfecho do poema: a) Céu e mar relacionam-se ao universo materiál ou espiritual? b) Ismália conscguiu realizar o desejo simbolista de transcendencia espiritual? c) Pode-se afřrmar que, para os simbolistas, sonho c loucura levam á libertacäo? Justiíique. Cruz e Soiisa Anliloiiu O Formas alvas, braneas, Formas ciaras De luarcs, de neves, de neblinas!... Ö Formas vagas, fluidas. cristalinas... Incensos dos turibulos das aras... Formas de Amor, constelarrriente puras, De Virgens e de Santas vaporosas... Brilhos errantes, madidas frescuras E dolencias de liriös e de rosas... Indefiniveis mfisicas suprcmäs, Hannonias da Cor e do Perfume... Horas do Oeaso, trSmulas, cxtrcmas, Requiem do Sol que a Dor da Lu/. resume... Visöes, salmos e canticos serenos, Surdinas de örgäos flebeis, solucantes... Dormencias de volüpicos venenos Sutis e suaves, rnorbidos, radiantes... Infinitos espiritos dispersos, Inefäveis, edenicos, aereos, Fecundai o Mistcrio destes versos, com a cliama ideal de todos os mistcrios. Do Sonho as mais azuis diafancidades Que fuljam, que na Estrofc se levantem E as emoyöes, tod as as castidades Da alma do Verso, pclos versos cantcm. Que o polen de ouro dos mais finos astros Fecunde e inflame a rima clara e ardente... Que brühe a correcäo dos alabastros Sonoramente, luminosamente. For9as oríginais, esséncia, gra9a De carnes de mulher, delicadezas... Todo esse efhivio que por ondas passa Do Éter nas róscas c áurcas correntezas... Cristais diluidos de claroes alacres, Desejos, vibra9Öes, änsias, alentos, Fulvas vitórias, triunfamentos acres, Os mais estranhos cstrcmccimentos... Flores negras do tédio e flores vagas De amores väos, tantálicos, doentios Fundas vermelhidoes de velhas Chagas Em sangue, abertas, eseorrendo em rios... Tudo! vivo e nervoso e quente e forte, Nos turbilhčes quiméricos do Sonho, Passe, cantando, ante o perffl medonho E o tropei cabalístico da Mořte... (Em PoesÍBŠ campletaa, p. 13.) Tristeza do Infim'to Anda em mim, soturnamente, Uma tristeza ociosa, Sem objetivo, latente, Vaga, indecisa, medrosa. Como ave torva e sem rumo, Ondula, vagueia, oscila E sobe em nuvens de furno E na miiih'alma se asila. Uma tristeza que eu, mudo, Fico nela meditando E meditando, por tudo E em toda a parte sonhando. Tristeza de näo sei onde, De näo sei quando nem como... Flor mortal, que dentro esconde Sementes de um mago pomo. Certa tristeza indizivel, Abstrata, como si fosse A grande alma do Sensível Magoada, mística, doce. Ah! tristeza imponderável, Abismo, mistério aflito, Torturante, formidável... Áh! Tristeza do Infiníto! Odem, R. 80-1.) eooueref/iz N 5EMTIRI5S0, ) Alphonsus de Guimaraens A eubcťsi de corvo Ao Dr, Edmundo Lins Na mesa, quando em meio á noite len ta Escrevo antes que o sono me adormeca, Tenho o negro tinteiro que a cabeca De um corvo representa. A contemplá-lo mudamente fico E numa dor atroz mais me concentro: E entreabrindo-lhe o grande e fmo bico, Meto-lhe a pena pela goela a dentro, E šolitariamente, pouco a pouco, Do bojo tiro a pena; rasa em finta... E a minha mSo, que třeme toda, pinta Versos própríos de um louco, E o aberto olhar vidrado da funesta Ave que representa o meu tinteiro, Vai-me seguindo a mao, que corre lesta, Toda a tremer pelo papel inteiro. Dizem-me todos que atirar eu devo Trevas em fora este agoirento corvo, Poís dele sangra o desespero torvo Destes versos que escrevo, (Em obra completa, p. 54,) >.í »111 WĚĚĚĚwŘ r I.....mmm ú ('• WMíSm 11». ^mSKĚĚĚĚ ... v|HIL ^^^^^^^» fsásmmi WĚtwĚ ^Jpllf'"'li* iilipl hi . —,lm.^V".'«'»:Tt.J""-: Assim como a poesia e a ficcjo, o teatro ťoi bastante expressivo no Roraantismo brasileiro. A época do Realismo, o teatro nacionál entrou em crise, cedendo lugar a generös importados, Tanto no Romantismu quanto no Realismo, entretanto, sobressaiu um teatro crítico, divertido e moralizante - a comédia de costumes. ' lo Romantismo, Goncalves Dias, Joaquim Manuel de Macedo, José de Alencar, Castro Alves, Casimiro de Äbreu, Alvares de Äzevedo, entre outros, dedicaram-se ao teatro. Contudo, a .qualidade de suas obras dramáticas é inferior á das que produziram no campo da poesia e da prosa. O mais original e talentoso escritor dramático deste período é Martins Pena (1815-1843), o fundador da nossa comédia de, costumes e o principal responsável pela criacäq do verdadeiro teatro nacional, naquilo que ele teni de mais auténtico. Iniciou-se o teatro romäntieo brasileiro em marco de 1838, com a representacäo, pela companhia do ator Joäo Caetano, da tragédia Äntônio José ou O poeta e a Inquisipäo, de Goncalves de Magalhäes. Nesse ano, em 4 de outubro, a mesma companhia estreou a primeira comédia escrita por Martins Pena - O juiz de paz na ropa , que criticava os costumes do interior á época do Império, evidenciando a ignorancia dos pequenos magistrados roceiros. De feitio popular e desambicioso, O juiz de paz na ropa atingiu profundamente o publico, näo só por sua natureza objetiva e imediata, mas também por sua comicidade e satira. J O teatro de costumes manteve até o initio do século XX a mesma vitalidade, tanto do ponto de vista literário, como criagäo, quanto em termos de popularidade, como espetáculo. No Realismo, Franca Junior (1838-1890) e Artur Azevedo (1855-1908), dedicadošT riomens de teatro, contribuíram decisivamente para a sobrevi-věncia do género, ameacada durante certo periodo em que o publico carioca progressivamente abandonava os costumes provincianos e passava a preferir a opereta, o teatro de revista, a ópera-bufa, importacöes parisienses. O teatro desses dois autores, crítico, satírico, genuinamente nacionál, retratou sensível e fielmcntc a sociedade brasilcira do periodo histórico cm que tem lugar a corte de Pedro II e que vai até a República, Numa linguagem tipicamente brasileira, expressou tipos desconhecidos até entäo, evidenciou hábitos, reproduziu tramas familiäres, mostrou a vida do Império e da burguesia nascente, constituindo assim um valioso documento sociológico da vida brasilcira na segunda metadc do século XIX. O teatro román ti co Martins Pena e a comédia de costumes Martins Pena fundou uma tradigao teatral brasileira que ele mesmo aprofundaria e que faria escola na hístória do teatro nacionál. Admirável observador, soube fixar os costumes e ambientes da época, formando, segundo Silvio Romero, o paincl histórico da vida do pais na primeira metade do século XIX. O Rio de Janeiro e arredores, com seus ciganos e traficantes, contrabandistas e escravos, caixeiros e guardas-nacionais, ladroes e parasitas, caipiras e negociantes, estrangeiros, recrutas, meninas namora-deiras e rapazes atrevidos, aparecem cheios de vida e colorido nas pegas de Martins Pena, geralmente curtas, mas bastante movimentadas e curiosas. Isso fez com que pegas como A familia e a festa na ropa, Judas em sábado de Alehda, Os dois ou o inglés maquinista, O novipo, Os irmaos das almas, As desgrapas de uma crianpa recebessem aplausos na época em que foram encenadas e atravessassem os anos com igual sucesso. Martins Pena criou uma linguagem teatral simples: o desenvolvimento da trama, a caracterizagáo dos numerosos tipos sociais, a conversa das personagens, tudo acontece espontaneamente, com vivacidade e fluidez. Escreveu para o riso imediato da platéia. O publico envolve-se na intriga das pegas com simpatia e cumplicidade, pois as peripetias, para chegarem ao desfecho, sao maquinadas á sua vista. Franca Junior: uma comédia exemplar Como jornalista, Franga Junior brilhou com suas crónicas, reunidas sob o título de Folhetins, obra que constitui verdadeira tradugäo dos costumes cariocas durante o Segundo Império. Entrctanto, é na comédia que Franga Junior revela seu maior talcnto. Verdadeiro continuador de Martins Pena na fixagäo dos costumes, Franga Junior explorou vários tipos humanos do Brasil imperial, tais como o fazendeiro paulista, o comerciante portugués, o estrangeiro espertalhäo. No tcrreno politico, fixou, mclhor do que ninguém, certos tipos ridículos de brasileiros. De suas imimeras pegas teatrais, estäo mais próximas de nós, pelo sabor realista, Como se fazia um deputado, Caiu o ministérioi e As doutoras. Artur Azevedo: a crítica aos costumes Um dos fortes de Artur Azevedo foi o teatro de revista, que explorou ora sozinho, ora em colaboragäo. Se essa produgäo do autor perdeu hoje , quase todo o interesse, em razäo de ter sido construída com base em episódios da época, o mesmo näo aconteceu com suas coniédias e burletas, nas quais é retomada a tradigäo fundada por Martins Penä. Em pegas como A capital federal, O mambembe, O retrato a óleo, O dote, O badejo, etc., Artur Azevedo foi um talentoso expositor dos costumes brasileiros de seu tempo e um ferino crítico social. Em cerca de quarenta anos de atividade teatral, alem da obra jornalística, de contos e versos ) humorísticos, deixou mais de 120 obras teatrais, entrc comedias, revistas, burletas, operetas e cenas cömicas oríginais, tradugöes, adaptagöes e paródias. Como Franga Junior, Artur Azevedo também ocupou-se de um teatro voltado á rcalidade e aos costumes brasileiros. Segundo Sábato Magaldi, crítico teatral e ensaísta, a Franga Junior cabe o título de o melhor comediógrafo do Brasil; e a Artur Azevedo, o de maior figura da história do teatro brasileiro. j A comédia Como se fazia um deputado, eserita em 1882, é uma das pegas mais significativas de Franga Junior. A agäo, transcorrida no interior da provincia do Rio de Janeiro, mostra a ascensäo de um recém-formado bacharel em Direito, Henrique, ao posto de deputado. Passa-se em cena a votagäo, em que näo faltam defuntos eleitores. O apoio ao jovem bacharel é tramado pessoalmente pelo tio, Limociro, rico fazendeiro, que inclui no negócio o casamento com a fílha de outro chefe politico, o tenente-coronel Chico Bento. Limociro, liberal, represenla o poder econômico; Chico Hento, conservador, reprcseiita a influôneia política. Assim, o poder ľica em familia. Os textos para estudos säo fragmentos de cenas dessa época. O texto I é um diálogo entrc Limociro c o sobrinho acerca das pretensôes profissionais deste. No texto II, Limoeiro e Chico Bento däo continuidade aos entendimentos para o apadrinhamento da carreira de Henrique. é. Texto I henrique - Como se está bem aqui! Disse um escritor que a vida da toga arredonda a barriga e estreita o cérebro. Que amargo epigrama contra esta natureza grandiosa! Eu sinto-me aqui poeta. limoeiro - Toma tenéncia, rapaz. Isto de poesia näo dá para o prato, e é preciso que te ocupes com alguma coisa séria. henrique - Estou äs suas ordens. limoeiro - Que carreira pretendes seguir? henrique - Tenho muitas diante de mim... a magistratura... i.imoeiro - Podes limpar as mäos ä parcdc. Henrique - A advocacia, a diplomacia, a carreira administrativa... limoeiro - E esqueceste a principal, aquela que pode elevar-te as mais altas posiföes em um abrir e fechar de olhos. Henrique - O jornalismo? limoeiro - A politica, rapaz, a political Olha, para ser juiz municipal, e preciso um ano de prätica; para seres juiz de direito, tens de fazer um quatrienio; andaräs a corrcr montes e vales por todo esle Brasil, sujeito aos caprichos de quanto potentado e mandäo ha por at, e sempre com a sela na barriga! Quando chegares a desembargador, estaräs velho, pobre, cheio de achaques, e sem esperan^a de subir ao Supremo Tribunal de Justipt. Considera agora a politica. Para deputado näo e preciso ter prätica de coisa alguma. Comecas logo legislando para o juiz municipal, para o juiz de direito, para o desembargador, para o ministro do Supremo Tribunal de JusÜ9a, para mim, que sou quase teu pai, para o Brasil inteiro, em suma. henrique - Mas para isso e preciso... limoeiro - Näo e preciso coisa alguma. Desejo somente que me digas quais säo as tuas opiniöes politicas. henrique - Foi coisa em que nunca pensei. limoeiro - Pois olha, es mais politico do que eu pensava. E preciso, porem, que adotes um partido, seja ele quäl for. Escolhe. henrique - Neste caso set'ei do partido do meu tio. limoeiro - E por que näo seräs conservador? henrique - Näo se me dä de se-lo, se for de seu agrado. limoeiro Bravo! Pois fica sabendo quo seräs ambas as coisas. henrique - Mas isto e uma indignidade! limoeiro - Indignidade e ser uma coisa so! (Em O teatro de Franca Junior. Rio da Janeiro, SNT/Fundacäo de Arte, 1980. v. 2, p. 133-4. Clässicos do Teatro Brasilelro.) Texto II chico bento -[...] Eu achava melhor que ele aceitasse, por ora, um partido - o que está no poder, por exemplo, e que mais tarde, conforme o jeito que as coisas tomassem, ou ficasse naquele, ou fosse para o outro que tivesse probabilidade de subir. limoeiro - Tá, tá, tá. chico bento - Na sua circular ele tem que apresentar um programa. Neste programa há de deímir as suas idéias... limoeiro - E o que tém as idéias com o programa, e o programa com as idéias? Náo misture alhos com bugalhos, tenente-coronel, e parta děste princtpio: o programa é um amontoado de palavras mais ou menos bem combinadas, que těm sempre por fim ocultar aquilo que se pretende fazer. chico bento - Porém cada partido tem a sua bandeira... limoeiro - Aqui para nós, que ninguém nos ouve, tenente-coronel, qual é a bandeira do seu? chico bento - A bandeira do meu é... Sim... Quero dizer... limoeiro - Ora eis aí! Está o tenente-coronel com um tió na garganta. Meu amigo, eu näo conhcfo dois entes que mais se assemelhem que um liberal e um conservador. Säo ambos filhos da mesma mäe, a Senhora Dona Conveniéncia, que tudo governa neste mundo. O que näo pensar assim deixe a politica, vá ser sapatciro. cnico bento - O major fala como um pregador ex-cathedra! limoeiro - O rapaz portanto, näo se apresentando nem por um lado, nem por outro, fica '/ no meio. Do meio olha para a direita e para a esquerda, sonda as conveniéncias, e no primeiro partido que subir ericaixa-se muito sorrateiramente, até que, caindo este, ele possa escorregar para o outro que for ao poder. chico bento - Sim, senhor. [...] (Idem, p. 167-62.) 1. Characterize Henrique e indiquc o que revelam suas aspiracöes profissionais. 2. Limoeiro diz a Henrique que toda carreira e problemätica no Brasil, salvo a politica. Considerando a carreira politica: a) O que e preciso para scr deputado? b) O que scr deputado representa em rela9äo äs outras carreiras? 3. Ante a pergunta de Limoeiro, Henrique diz que as coisas politicas säo "coisa em que nunca pensei". O que Limoeiro quer dizer com "Pois olha, es mais politico do que eu pensava"? 4. Que semelhati9as e dessemelhan9as hä entre o partido liberal e o conservador? 5. Qual e o partido mais conveniente para Henrique, segundo Limoeiro e Chico Bento? 6. O que e um programa politico, segundo Limoeiro? 7. O titulo dessa pc9a era, inicialmente, Como se faz um deputado. Por problemas de censura, Fran9a Junior foi obrigado a mudä-lo para Como sefazxa um deputado. Tendo em vista a permanencia da obra literdria no tempo, se voce tivesse que optar por um dos dois tttulos, qual escolheria? Por que? O texto a seguir pertence á pe9a A família e a festa na ropa (1837), de Martins Pena, que tem o seguinte argumento: o fazendeiro Domingos Joäo prometera cm casamento sua filha Quitéria a Antonio do Pau dAlho, homem rústico e desajcitado, mas proprietário de um sítio, portanta um bom partido. Enlretanto, chega da corte o Juca, estudante de Medicina, e apaixona-se por Quitéria c : é correspondido. Quitéria, para desobrigar-se do compromisso assnmido pelo pai, arma junto com Juca um piano: ela deve fingir-se doente diaute do noivo e da família. Os amantes executant o piano: Quitéria Simula um ataque; Angelica, a curandeira, a benze, mas seu remédio näo faz efeito; e Juca é chamado para sacorré-la. Eis o que acontece: joana Senhor doutor, minha fílha está pra morrer. juca chega-se para Quitéria e toma-lhe o pulso e diz - Näo é nada: inaiiditvir um copo com água. (Sai Joana.) j juca, para Domingos - Quando digo que näo é nada, tälto um poueo á verdade, porque sua filha tem uma inf!ama9äo de carbonato de pntassa. domingos JOÁo, muito espantado - Inflamacao de que? juca - De carbonate de potassa. antonio - E isLo é perigoso, senhor doutor? juca - Muito; náo só para ela, como para a pessoa com quern ela se case. antonio, á parte - Mau! (Entra Joana com um copo de água.) joana - Aqui está a água. {Juca torna o copo de água, faz que tira uma coisa da v algibeira e a deita dentro do copo.) juca - Este remédio vaí curá-la řmediatamente. (Dá a Quitéria, que logo que bebe o primeiro gole abre os olhos.) domingos joao - Viva o senhor licenciado! quitéria, levantando-se - Minha mae... joana - Minha filha, o que tern? juca - Esta menina é preciso ter muito cuidado na sua saúde, e eu acho que se ela casar com urn homem que nao etttenda dc medicína, está muito arriscada a sua vida. domingos joao - Mas isto é o diabo; já prometi-a ao senhor... (Apontando para Antonio.) antonio - Mas eu... juca - Arrisca assim a vida de sua fdha. domingos joao - Já dei minha palavra. (Juca copa a cabepa.) quitéria Ai, ai, eu morro! (Cai na cadeira.) todos - Acuda, acuda, senhor doutor! | juca, chegando-se — Agora é outra doenga. domingos JOÁo - Entao o que é agora? juca - É um eclipse. domingos joao, admirado - Ah (Juca esfrega as mdos epassa-aspela testa de Quitéria.) quitéria, abrindo os olhos - Já estou melhor. juca - Vé, Sr° D. Joana, se sua filha náo tiver sempře quem tratě dela, morrerá certamente. Nao é assim, Sr4 Angelica? (Quando diz estas ultimas palavras dá, as , escondidas, a Angelica, uma bolsa com dinheiro.) Angelica - Senhor doutor, tern razao, a menina morre. domingos JOÁO - Entáo o que havemos dc fazer? juca - Se eu náo cstivesse estudando... joana O senhor licenciado bem podia... juca - Se meu pai... domingos JOÁO - Tenho uma boa fazenda, e o marido de minha filha fica bem aquinhoado. juca - Se o Sr. Domingos quisesse... domingos joao - Explique-se. juca - Conhecendo as boas qualidades de sua filha, e estimando muito a sua familia, me ofereco... joana, com presteza - E o consentimentode seu pai? juca - Esse, o terei. domingos joao - Mas, a palavra que dei ao Sr. Antonio? Antonio - Náo se aflija, pois nao desejo mais casar-me com uma mulher que tem eclipses. juca Visto isto, cede? antonio - De boa vontade. JOANA - Sr. Domingos Joao, diga ao senhor que sim! Angelica - Olhe que sua filha morre! inacinho - Meu pai, case-a, com os diabos! O senhor licenciado é boa pessoa. ; domingos JOÁo -Já que todos o querent, .vá feito. (Para Juca:) Minha filha será sua : f mulher. (Quitéria levanta-se.) juca - Como consente, quisera que se efetuasse isto o mais breve possivel. domingos joäo - Iremos agora mesmo falar ao vigário, e de caminho podemos ver a festa. joana - Diz bem. domingos joäo - Väo se vestir. (Saem as duas.) juca - Quando eu acabar meus estudos voltarei para ajudar meu pai. domingos joäo - Dč-me um abraco. (Para Jnacinho:) Já agora näo irás amanhä para a cidade. Quem havia dizer que o Sr. Juca séria meu genro! Angelica - Deus assim o quis. . domingos joäo - E o quebranto, näo? Dizia esta mulher, Sr. Juca, que minha filha tinha quebranto, diabo no corpo, espinhela caída, quando ela näo teve senäo um carbonato de eclipse. juca, rindo-se sem se poder conter - É verdade! domingos joäo, desconfiando - De que se ri? juca - Da asneira da senhora. (Em Comédlas de Martina Pena. Ed. critica de Darcy Damasceno. Rio de Janeiro, Ed. de Ouro, s. d. p. 93-5.) A comédia A capital federal, eserita em 1897, mostra uma família de roceiros de Säo Joäo dc Sabará, Minas Gerais, de hábitos rigidos e vída simples, que viaja para o Rio de Janeiro, a capital federal, á procure de um janota, o Gouveia, que pedira em casamento a filha moca, Quinota, e nunca mais dera notícia. No trecho u seguir, Eusébio, o pai de Quinota, pede a Lola, uma cortesä, que abandone o noivo da filha. Eis o que sucede entäo: eusébio - Cumo minha fia anda munto desgostosa pru via da madama, eu me alembrei de vi na sua casa para sabé... sim, para sabé sc c possive a madama se separá de seu Gouveia. Se fô possive, muito que bem; se näo fô, paciéncia: a gente arruma as mala, e amanhä memo vorta pra fazenda. Minha fia é bonita e é rica: näo há de sé defunto sem choro!... lola - O senhor quer que eu dcixe o Gouveia porque sua filha o ama e é amada por cic, näo é assim? Pois bem: é seu o Gouveia; dou-lho, mas dou-lho de graca, näo exijo a menor retribuicäo! eusébio - Mas o que vinha propô á madama näo era um pagamento, mas uma... Cuma chama aquilo que sc falou cando foi o 13 de Maio? Uma... Ora, sinhô! (Lembrando-se.) - Ah! uma indenizacäo! O caso muda muito de figura! Lola - Näo! - nenhuma indenizacäo pretendo! Mas de ora em diante fecharei o meu coraíjäo aos mancebos da capital, e só amarei (Enquanlo f ala vai arranjando o lapo da gravata e abarba de Eusébio.) algum homem sério... de meia-idade... filho do campo... íhgénuo,;. smceŕo... incapaz de um embustc... (Alisando-lhe o cabelo.) - Oh! Näo exigirei que eleseja belo... Quanto mais feio for, menos ciúmes terei! (Eusébio cai como desfaleädo nitma cadeira, e Lola seuta-sé no colo dele.) - A esse hei de amar com frenesi... com dcíírio!... (Em he o dc beijos.) eusébio: (Resistindo e gritando.) - Eu quero i rne embora! (Ergue-se.) lola - Cala-te,xrianca louca!... eusébio - Crianca louca! TJél... : lola (Gom veeménciä) — Desde quetranspusesteaquela porta, senti que uma forca misteriosa e magnética me impelia para os leus braeos! Ora ó Gouveia! Que me importa a mim o Gouveia se és meu, se estás preso pela tun Lola, que näo te dcixará fugir? eusľuio - Isso tudo é verdade? i oi.A bstes sentimentos náo sc fingcni! Eu adorn ic! |...| (A capital federal. Hio de Janeiro, SNT/MEC, 1972, p, 52-5.). 5. (Fuvest-SP) Assinale a alternativa que preenche corretamenle as lacunas. 1. (PUC-SP) O Forraas alvas, brancas, Formas claras de luares, de neves, de neblinas! ó Formas vagas, fluidas, cristalinas... Incensos dos turibulos das aras... (Cruz e Sousa) O poeta francés S. Mallarmó, referindo-se ao Simbolismo, afírma: "Nomear um objeto é suprimir trés quartos do prazer do poema, que é feito da felicidade em adivinhar pouco, sugeri-lo, eis o sonho... deve haver sempře enigma em poesia, e é o objetivo da literatura - c näo há outro - evocar os objetos." a) Demonstre neste trecho de Cruz e Sousa como esta afirmacäo se eonfirma. b) Que recurso estilístico o poeta usa para criar a sugestäo? 2. (FAAP-SP) Da estrofe: A Música do Norte, a nebulosa, estranha, imensa música sombria, passa a tremer pela minh'alma e fria gela, fica a tremer, maravilhosa... a) D6 a escola a que pertence. b) Dé uma característica da escola presente no texto. 3. (Cesesp) É considerado uma das traves-mestras da literatura nacionál. Nos primeiros livros, retlete a luta interior entre a condicäo social e a racial e o desejo de superá-la, consubstancian-do-o no emprego contínuo do vocábulo "bianco" e outros com ele relacionados. Em trabalhos posteriores, a revolta diminui, levando-o a transmitir uma verdadeira resignacáo crista, uma serenidade de espírito, a despeito dos grandcs dramas familiäres que o envolveram nos Ultimos anos da exisléncia. A dor passa a ser algo que purifica a alma humana: "Vě como a Dor te transcendentaliza". Esses coneeitos correspondem ao mundo poético de: a) Machado de Assis b) Castro Alves e) Cruz e Sousa d) Goncalves Dias e) Alphonsus de Guimaracns 4. (Covest-PE) Assinale: a) se apenas a informacao I for correta; b) se apenas a II for correta; c) se apenas a I e a II forem corretas; d) se apenas a II e a 111 forem corretas; e) se todas estiverem corretas. Infinites espiritos diversos, Inefaveis, edenicos, aereos, Fecundai o Misterio destes versos Com a chama ideal de todos os misterios. I - Pelas caracteristicas que apresenta e um texto simbolista. II - Opoe-se ao Naturalismo e ao Parnasianismo, valorizando uma realidade subjctiva, metafisica, espiritual. Ill - Possui em comum com o Parnasianismo o apuro formal. i)6- Suspiros Poéticos e Saudades está para o A assim como A está para o Simbolismo. a) Romantismo - Broquéis h) Arcadismo - Cartas chUenas c) Modernismo - Paulicéia desvairada d) Parnasianismo - Poemas e canpôes e) Realismo - A cinza das hor as 6. (UFBA) No Simbolismo, o poeta cria cenärios espiritualizados, que sugcrem dimensbes estranhas ä realidade terrena. Assinale a proposicäo ou proposicöes que comprovam a afirmativa acima. a) "Quando por mim passaste / Pela primeira vez, / Como eu sorrisse, tu coraste. / O sol estava abrasador. / E eu dissc cntäo: 'Talvez, talvez / Fosse o calor'." b) "Tarde louca de abril; gemem ave-marias / Pelas naves; o luar o mundo inteiro enfeixa / Num ramalhete de ouro estelar: nostalgias / Que o ocaso em funeral pelo infinite deixa." c) "Nasci em leito de rosas / E morro em leilo de espinhos... / O mäes que sois caridosas, / Velai por vossos filhinhos!" d) "Quando chegaste, os violoncelos / Que andam no ar cantaram hinos. / Estrelaram-se todos os castelos, / H ate nas nuvens repicaram sinos." e) "A dor de quern recorda os tempos idos / Fere como um punhal envenenado. / Säo vozes mudas, Ultimos balidos / do cordeiro angustioso do passado." f) "Na äurea correspondencia estelar das esferas/ A tua Alma nupcial hä de passar triunfante. / Ü ten olhar reflete, entre vagas quimeras, / O Inferno, o Purgatörio c o Paraiso de Dante." 7. (Covest-PE) A musicalidade e caracteristica do Simbolismo. Para consegui-la, os poetas usam väiios recursos, um deles a aliteragäo (que consiste na repeticäo de fonemas para sugerir um som). Assinale a alternativa em que esse recurso näo foi empregado: a) "Pedro pedreiro penseiro esperando o trem..." b) "Cada pingo de Maria cnsopava o men domingo..." c) "Toda gente homenageia Januäria na janela..." d) "As palavras transcendem o significado..." e) "... Ate o mar faz mare cheia para chegar..." 8. (Covest-PE) "O Formas alvns, brancas, Formas claras De luares, de neves, de neblinas!..." a) Por sua tematica e pelo tratamento das imagens, sao tipicamente parnasianos. b) Pelas caracteristicas, pertencem ao Simbolismo. c) A obsessao pcla cor branca, o carater vago e impreciso ajudam a identificar a autoria de Cruz e Sousa. d) Foram escritos por Olavo Bilac, que foi grande incentivador do patriotismo, com sua poesia. e) A preocupacao com a forma e tipica de Raimundo Correia, sendo ele o autor dos versos. 9. (PUCC-SP) Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens sao poetas identificados com um movimento artistico cujas caracteristicas sao: a) o jogo de contrastes, o tenia da fugacidade da vida e fortes inversoes sintaticas. b) a busca da transcendencia, a preponderancia do simbolo entre as figuras e o cultivo de um vocabulario ligado as scnsacoes. c) a espontaneidade coloquial, os temas do cotidiano e o verso livre. d) o perfeccionismo formalista, a recuperacao dos ideais classicos e vocabulario precioso. e) o jogo dos sentimentos exacerbados, o alargamento da subjetividade e a enfase na adjetivacao. ' iJl 10. (Fuvest-SP) No fragmento aciraa Cruz e Sousa utiliza-se de sinestesias. a) Em que consiste a sinestesia? b) Exemplifique com o texto. A música da morte, a nebulosa, estranha, imensa música sombria, passa a tremer pela minh'alma c fria gela, fica a tremer, maravilhosa... IS. (F. Objctivo-SP) A ncgacpao do Positivismo, do Materialismo e das estéticas neles fundamentadas; a cria9Žo poética como fruto do inconsciente, da intuifäo, da sugestäo, da associafäo de imagens e idéias; o tom vago, imprcciso, ncbuloso; o uso accntuado de sinestesias e inlensa musicalidade sä o caracteristicas do: a) Rcalismo b) Simbolismo c) Naturalismo d) Romantismo c) Parnasianismo 11. (PUC-RS) Häo de cliorar por ela os cinamomos, Muichando as fiores ao tombar do dia Dos laranjais häo de cair os pomos, Lembrando-sc daquela que os colhia. Uma das linhas temáticas da poesia de Alphonsus de Guimaraens, como se observa no exemplo, : é a: a) amada morta b) religiosidade profunda c) transfigurafäo do amor d) atmosféra litúrgica e) paisagem mariana i 12. (Fuvest-SP) I) "Longe do estéril turbilhäo da rua, Beneditino, escreve! No aconchego Do claustro, na paciéncia e no sossego, Trabalha, e tcima, c lima, c sofrc, e sua!" II) "O Formas alvas, brancas, Formas claras De luares, de neves, de neblinas! O Formas vagas, lluidas, cristalinas... ( Incensos dos turibulos das aras..." As estrofes acima säo, respectivamente, dos poetas: a) Manuel Bandeira e Olavo Bilac b) Vinicius de Moraes e Fagundes Varela c) Olavo Bilac e Cruz e Sousa d) Cruz e Sousa e Castro Alves e) Castro Alves e Alphonsus de Guimaraens 13. (Fuvest-SP) Encontre a alternativa em que há erro na correla£äo estética/característica: a) Romantismo/sentimentalismo b) Naturalismo/determinismo c) Patnasianismo/descritivismo d) Simbolismo/materialismo c) Moderntsmo/nacionalismo 14. (Fuvest-SP) É fria, fluente, frouxa claridade flutua como as brumas de um letargo Nestes versos de Cruz e Sousa, encontra-se um dos tracos caracteristicos do estilo simbolista: a) utiliza9äo do valor sugestivo da música e da cor b) rima aproximativa:'uso de alitera9Öes c) presen9a de onomatopcia d) uso de antinomia e) emprego de expressöes arcaicas -L_. Para conhecer mais sobre as origens da arto modorna e seu jontexto historico-cultural, suge-rimos: -ST I!?: aos filmes Tempos inadernos (1936), de Charles Chaplin; Novecento (1976), de Bernardo Bertolucci, que des- :reve a vlda dos trabalhadores ilalianos nas primeiras decadas io seculo; O encouragado Po-temkin (1925), de Sergei Eisens-lein, que retrata uma rebeliao popular na Russia antes da Re- 'olucao de 1917; Reds (1981), de JVarren Beatty, que trata da Re- rolucao Russa; Sacco e Vanzetti (1971), deGiuliano Montaldo, quo trata do movimento anarquista italiano. Conheca também os filmes de Luis Buňuel, o principál cineasta surrealista, tais como O cäo andaluz, O fantasma da liberdado, O discreto charme da burguesia, A bela da tarde e outros. O filme The wall, de Alan Parker, também apresen-ta tracos expressionistas e sur-realistas. Metropoles, de Fritz Lang, dá uma boa visäo do inicio do século. Os filmes Gaijin, de Tisuka Yamasaki, e P agu, de Norma Benguell, retratam o Brasil no comego do século. ' K. a obra A confissäo de Lúcio, do escntor modernista portugués Mano de Sá-Carnei-ro, que tem relagöes com o Fu- turismo, o Expressionismo e o Surrealismo. OUVIR: a música moderna do compositor francos Charles Debussy e do brasileiro Heitor Villa-Lobos. PE$.QUI$AR: em museus e en-ciclopédias, sobre as artes plás-ticas do infcio do século, a fim de aprofundar seus conhecimentos sobre a obra de artistas como Picasso, Gauguin, Marcel Du-champ, Magritte, Salvador Dali e de artistas brasileiros como Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Dí Cavalcanti e Portinari. CONHECER: a móda e a vida cotidiana nas primeiras decadas do século. O professor poderá fazer sugestôes de bibliografia para consulta. '.íířr í■#"í?'^!'^^C*,■,ff^",,,''-'I > lil Iii i'-' ),' A literatura brasilcira atravessa um periodo de transic^o nas primeiras décadas do século XX. De um lado, ainda há a influcncia das tendéncias artísticas da segunda metade do século XIX; de ontro, já come9a a ser preparada a grande renovacäo modernista, que se inicia em 1922, com a Semana de Arte Moderna. A esse periodo de transicäo, que näo chegou a constituir um movimento literário, chamou-se Pré-Modernismo. linguagem e de ideologia. Esse periodo, que representou um verdadciro cruzamento de ideias e formas literärias, e chamado de Pre-Modernismo. As novidades Embora os autores pre-modernistas ainda estivessem presos aos modelos do romance realista-naturalista e da poesia simbolista, ao menos duas novidades essenciais podem ser observadas em suas obras: • o interesse pela realidade brasilcira: os modelos literärios realistas-natu-ralistas eram essencialmente aniversalizantes. Tanto na prosa de Machado de Assis c Aluisio Azcvcdo quanto na poesia dos parnasianos e simbo-listas, näo havia interesse em analisar a realidade brasileira. A preocupaeäo central desses autores era abordar o hörnern universal, sua condicäo e seus anseios. Aos escritores pre-modernistas, ao contrario, intcressavam assuntos do_dia-a-dia dos brasileiros, originando-se, assim, obras de nitido caräter social. Graca Aranha, por exemplo, retrata em scu romance Canaä a imigraeäo alemä no Espirito Santo; Euclides da Cunha, em Os sertöes, aborda o tema da guerra e do fanatismo religioso em Canudos, no sertäo da Bahia; Lima Barreto detem-sc na anälise das populacöes suburbanas do Rio de Janeiro; e Monteiro Lobato descreve a miseria do caboclo na regiäo decadente do Vä1e do Paraiba, no Estado de Säo Paulo. A excecäo estä na poesia de Augusto dos Anjos, que foge a esse interesse social, a a busca de uma linguagem mais simples e coloquial: embora näo se verifique essa preocupajäo na obra de todos os pre-modernistas, ela e explicita na prosa de Lima Barreto e representa um importante passo para a renovacäo modernista de 1922. Lima Barreto procurou "escrever bra-sileiro", com simplicidade. Para i'ssö, feve de ignorar muitas vezes as normas gramaticais e de estilo, provocando a ira dos meios academicos conservadores e parnasianos. Wtvmi'i-f ir i n ran t fflBj li! LßEIai SllfiW f'l I I II I ll. ■% as duas primeiras décadas do século, nosso pais passou por várias transformacoes que apontavam para uma modernizacao de nossa vida política, social e cultural. Politicamente, vivia-se o periodo de estabilizacáo do regime republicano e a chamada "política do café-com-leite", com áhegemonia de dois Estados da federacao: Sao Paulo, em razáo de seu poder económico, e Minas Gerais, por possuir o maior colégio eleitoral do pais. Embora nao tivesse absorvido toda a máo-dc-obra negra disponível desde a Abolicao, o pais recebeu nesse periodo um grande contingente de imigrantes para trabalhar na lavoura do café e na indústria. Os imigrantes italianos, que se concentraram na indústria paulista, ttouxeram consigo idéias anarquistas e socialistas, que ocasionaram o aparedmehío de gre-ves, de crises políticas e a formacáo de sindicatos. Do ponto de vista cultural, o periodo foi marcado pela convivéncia entre várias tendéncias artísticas ainda nao totalmente superadas c algumas novidades de Euclides da Curihü: a i lei esa d< Oaiiud«« Euclides da Cunha (1866-1909) naseču no Rio de Janeiro, estudou na Escola Militär e fez curso de Engenharia. Republicano conviclo, de formaeäo po-sitivista, Euclides sempře mostrou grande interesse por ciéncias naturais e por filosofia. Viveu durante algum tempo em Säo Paulo e, em 1897, foi enviado como correspondente ao sertäo da Bahia, pelo jornal O Estado de S. Paulo, para cobrir a guerra de Canudos. Na condicäo de ex-militar, Euclides pode informar com precisäo os movimentos de guerra das trés ultimas semanas do conflito. r ( Juazeiro • Patarnoté Uauá. ^JBrejinho \ Canudo; f.frnfr 1, jdónfe / Jeremcal Santo Massaeáré Cumb8 ^____ Tixaiir Natuba'V, Itapicun BAHIA • Bom-; ><-<^ , !?oňsaIhcP P'"3tl?l Salvador Suas mensagens, transmitidas pelo telégrafo, permitiram que o Sul do pais acompanhasse passo a passo a campanha, mobilizando e dividindo a opiniäo publica. Seis anos depois, o autor lancou Os sertöes, obra que narra e analisa os acontecimentos de Canudos á luz das teorias científicas da época. Euclides deixou também vários outros escritos - tratados, cartas, arti-gos -, todos relacionados ao pais, ás suas características regionais, geográlicas e culturais. SMI lW«llfr»Ttl»ř:l^liTiI»r»g»Tf ■Mil HBfflSBB| ■SSSEfflSE it I ! ''[ {' 1 l.l li Canudos: miséria, fanatismo e violéncia A guerra de Canudos, ocorrida entre 1896 e 1897, foi um dos conflitos mais violentos da história brasileira, ocasionando a morte de 15 mil pessoas, entre sertanejos e militares. O Nordeste brasileiro vivia nas ultimas décadas do século XIX uma de suas piores crises econômicas c sociais. Entre 1877 e 1880, só em Fortaleza morreram 64 mil pessoas vitimadas pela seca. Quando foi proclamada a Republica, em 1889, uma nova seca ameacava a populacao, cuja média de vida näo ultrapassava os 27 anos. i -vi : .J Canudos era inicialmente uma fazenda abandonada, no sertao da Bahia, na qual se instalou o fanátíco religioso Antonio Maciel, conhecido como Conselheiro. Em pouco tempo, em torno do lídcr religioso formou-se uma cidade de pessoas miseráveis e abandonadas á propria sortě. A cidade, que passou a chamar-se Belo Monte, chegou a contar com cerca de 15 a 25 mil habitantes, populacao superada apenas pela de Salvador na época. Isolados, alheios a pagamentos de impostos e á oficializacáo da cidade junto ao Estado, logo o povoado passou a ter problemas com a Igreja e com aš leis locais, o que originou o conflito. Alem disso, os sermoes de Conselheiro nao tratavam apenas da salvacao das almas, mas também de problemas coneretos, como a miséria e a opressáo politica. Talvez sem ter completa clareza do que falava, Conselheiro fazia críticas á República nascente, acusando-a de responsável pela condicáo do povo nordestino. Em todo o pais o movimento foi identificado como monarquista e considerado uma ameaca á soberania nacionál, sem que suas verdadeiras causas fossem diseutidas. a0" li1' >V • is Os sertöes: dcnúncia da violéncia Durante o conflito, os militares mantiveram os jornalistas sob censura. O pais recebia apenas a versao oflcial da guerra: a luta da Republica contra focos monarquistas no sertao baiano. Terminada a gucrra, as verdadeiras acoes dos vencedores - degola de prisioneiros, tortura, prostituicao, estupros e comercio de criancas — continuaram sendo encobertas. A obra Os ser toes, de Euclides da Cunha, publicada cinco anos depois do termino do conflito, e uma tentativa de rever a versao oficial da guerra de Canudos. ■■B i-.. i liln 1 -í r i I -1! < "iii u i i * i Ik ides pretendia näo apenas i l.i 'I'k. i - ui. lira no sertäo. Munido das • i.-1! in n.'i.lilii !■> MUiiiles - determinismo, positi-iii 1 j'l I\l n iiiii^ de sociológia e geografia i m u I li i n m.i pit |.;ndia também compreender v i4pli..n il.iiiuu m i sntificamente. \ ' ii pill, ni constitui uma experiencia n k.i -i i 1HS-..I I u i .i i . : é uma narrativa com estilo In -Mim i ľ lull-In Iiimi iico (apcsar do fato recente) i di 11 -m 11- m il i o \i i I i u'v o i milí .i determinista, segundo o homem, a obra organiza-se ĺ ľ Ik-n ".in.. ' \ iiii.i as condiijôes geográfícas do .i 'i > imiii i i ľ.escriijäo dos costumes do v. n |n • \ I i .i i descricäo dos ataques a l 1 1 lili-s Pi ,i - i. ^Mlllväo. ' riente a favor do sertanejo, I u li li da ( mil mi i o fcnômcno de Canudos i m i i i m .vulili m,i si n d, decorrente do isolamcnto pi li .i- * A-iiiiH n i I-) Nordeste em relacäo ao us i- ,|o p i - \--iin * i lesmitificou a versäo oficial iii I v i.i-H .cnu .1 i a qual o movimento pretendia ,i . .1 i K.-piihli. ,i A seguir, voce lerá trés fragmentos de Os sertves, um de cada parte da obra. O texto I é uma descricäo da^caatinga; o texto II desereve o sertanejo; e o III trata da guerra e de seu significado. Texto I Entao, a travessia das veredas sertanejas é mais exaustiva que a de uma eslepe nua. Nesta, ao menos, a viajante tem o desafogo de um horizonte largo e a perspectiva das planuras francas. Ao passo que a caatinga o afoga; abrevia-lhe o olhar; agride-o e estonteia-o; enlaca-o na trama espinescente e náo o atrai; repulsa-o com as folhas urticantes, com o espinho, com os gravetos estalados em lancas, e desdobra-se-lhe na frente léguas c leguas, imutável no aspecto desolado: árvore sem folhas, de galhos estorcidos c secos, revoltos, entreeruzados, apontando rijamentc no espaco ou estirando-se flexuosos pelo solo, lembrando um bracejar imenso, de tortura, da flora agonizante... (Sao Paulo, Círculo do Livro, 1975. p, 38.) Texto II O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Näo tem o raquitismo exaustivo dos mestizos neurasténicos do literal. A sua apaiéncia, entretanto, ao primeiro laňce de vista, revela o contrario. Falta-lhe a plastica impecável, o desempenho, a estrutura corretíssima das organizacöes atléticas. [...] Este contraste impoe-sc ao mais leve exame. Revela-se a todo o momente, em todos os pormenores da vida sertaneja - caracterizado sempře pela intercadéncia řmpressionadora entre extremos impulsos e apatias longas. (Idem, p. 92-3.) Texto III Deoididamente era imlispensável que a campanha de Canudos tivesse um objetivo superior A fimeäo estúpida e bem pouco gloriosa de destruir um povoado dos sertoes. Havia um inimigo mais sério a combater, em guerra mais demorada e digna. Toda aquela campanha seria um crime inútil e barbaro, se näo se aproveitassem os caminhos abertos á artilharia para uma propaganda tenaz, contínua e persistente, visando truzer para o nosso tempo e incorporar á nossa existéncia aqueles rudes compatriotas retardatários. (Idern, p. 405.) 1. Com base no texto T, como se caracteri/a a natureza onde vive o sertanejo'.' 2. De acordo com o texto II, o sertanejo mostra-se contraditörio. Por que? 3. No texto III, o autor critica a guerra em si. Afirma que outra "guerra mais demorada c digna" deveria ser travada. Qual e essa guerra? 4. O relato de Euclides da Cunha revela influencias da ciencia da epoca e, ao mesmo tempo, o desejo de chegar ä verdade dos fatos. a) Destaque do texto II um trecho que comprove as influencias de tcorias raciais existentes no comeco do seculo XX. b) Por que se pode afirmar que a estrutura da obra, dividida em tres partes, prende-se aos pressupostos naturalistas de anälise do comportamento humano? c) Euclides näo aeeila a versäo oficial do Exercito, segundo a qual Canudos era um foco monarquista. Concluindo: na visäo do autor, quais säo as causas dessc fenomeno social? Lima Barreto: oitwda u-mc^rd* o crítíco marginal Lima Barreto (1881-1922) nasceu no Rio de Janeiro. Embora filho de pais humildes e mulatos, sob a prote-gäo do Visconde de Ouro Preto, conseguiu fazer o curso secundário no Colégio Pedro II e cursar Engenharia até o 3s ano. Contudo, com a doenca mental do pai, aban-donou os estudos para trabalhar e garantir o sustento da família. Ba rjiil'lfiU' SuEIľ iL "'4 -í'ÍJs Os desgostos domesticos, a revolta contra o precon-to de cor de que foi vitima, somados a vida inomicamente dificil de pequeno funcionärio da .1 _ Sn.retaria da Guerra e colaborador da imprcnsa, äs istantes crises de depressäo e ao alcoolismo, fizeram de '■ I una Barreto um critico social severo, äs vezes lflctärio. O escritor tambem foi um dos poucos em nossa ii -ratura que lutaram contra o preconceito racial e a :riminagäo social do negro e do inula to. Essa irdagcm csta presente, por exemplo, nos romances ira dos Anjos, Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sä e quase autobiogräfico Recordapöes do escriväo Isaias mKBKRRmMKEm Caminha. Lima Barreto foi um escritor do seu tempo e de sua terra. Anolou, registrou, fixou e criticou asperamente quase todos os acontecimentos da Repüblica. Em sua obra, encontram-se os cpisödios da insurreicäo antiflorianista, a campanha contra a febre amarela, a polilica de valorizagäo do cafe, o governo do Marechal Hermes da Fonseca, a participacäo do Brasil na Primcira Guerra Mundial, o advento do feminismo. Junlam-se a isso a paixäo de Lima Barreto por sua cidade, o Rio de Janeiro, com seus subürbios, sua gente pobre e seus dramas humildes, e a critica a politicos da epoca, sarcasticamente retratados por sua mania de ostcntacäo, pelo vazio intelectual e pela ganäncia. Triste fim de Policarpo Quaresma: entre o ideal e o real Esse é o principal romance de Lima Barreto. Contcxtualizado no final do século XIX, no Rio de Janeiro, a obra narra os ideais e a frustracäo do funcionärio publico, Policarpo Quaresma, hörnern metódico e nacionalista fanático. Sonhador e ingénuo, Policarpo dediča a vida a estudar as riquezas do pais: a cultura popular, a fauna, a flora, os rios, etc. Sua primcira decepcäo se dá quando sugere a substituicäo do portugués, como lingua oficial, pelo tupi. O resultado é sua intcrnagäo em um hospício. Aposentado, dedica-se ä agricultura no sitio Sossego, acreditando na fertilidade do solo brasileiro. Contudo, depara com uma dura realidade até entäo desconhecida: a esterilidade do solo, o ataque das saúvas, a falta de apoio ao pequeno agricultor. Por fim, com a eclosäo da Revolta da Armada, no Rio de Janeiro, Quaresma apóia o entäo presidente, Marechal Floriano Pcixoto, e como voluntärio participa do conflito. Assumindo o cargo de carcereiro, critica as injustigas que vé scrcm praticadas contra os prisioneiros. Como conse-qüencia, é preso e condenado ao fuzilamento por ordern do proprio Floriano, seu idol o. Alem da descrigäo política do pais iiesse início da República, a obra traca um rico paincl social e humano dos subúrbios cariocas na virada do século. Aposentados, profíssionais liberais, mogas casadoiras, carreiristas, músicos, donas de casa, o mulato - esse é o universo retratado por Lima Barreto em Triste fim... . Destacam-se, nesse conjunto, as personagens Isménia, moga formada para o casamento que enlouquece quando Itfjándonada pelo noivo; Olga, sobrinha de Policarpo, que difere da maioria das mulheres por ser mais independente; e o violonista e cantor de modinhas, amigo de Policarpo, Ricardo Coragäo-dos-Outros. O fragmento abaixo situa-se entrc as primeiras paginas de Triste fim de Policarpo Quaresma, dedicadas a descrever o protagonista. Como de habito, Policarpo Quaresma, mais conhecido por Major Quaresma, bateu em casa as quatro e quinze da tarde. Havia mais de vinte anos que isso acontecia. Saindo do Arsenal de Guerra, onde era subsecretario, "x/ngava pelas confeitarias algumas fratas, comprava um queijo, as vezes, e sempre o pao da padaria francesa. Nao gastava nesses passos nem mesmo uma hora, de forma que, as tres e quarenta, por ai assim, tomava o bonde, sem erro de um minuto, ia pisar a soleira da porta de sua casa, numa rua afastada de Sao Januario, bem exatamente as quatro e quinze, como se fosse a aparicao de um astro, um eclipse, enfim um fendmeno matemalicamente determinado, previsto c prcdito. A vizinhanca ja lhe conhecia os luibitos e tanto que, na casa do Capitao Claudio, onde era costume jantar-se ai pelas quatro e meia, logo que o viam passar, a dona gritava a criada: "Alice, olha que sao horas; o Major Quaresma ja passou". E era assim todos os dias, ha quase trinta anos. Vivendo em casa propria e tendo outros rendimentos alem do seu ordenado, o Major Quaresma podia levar um trcm dc vida superior aos seus recursos burocraticos, gozando, por parte da vizinhanga, da consideragao e respeito de homem abnslado. Nao reccbia ninguem, vivia num isolamento monacal, em bora fosse cortes com os vizinhos que o julgavam esquisito e misantropo. Se nao tinha amigos na redondeza, nao tinha inimigos, e a unica desafeicao que merecera, fora a do doutor Scgadas, um clinico afaniado no lugar, que nao podia admitir que Quaresma tivesse livros: "Se nao era formado, para que? Pedantismo!" Logo aos dezoito anos quis fazer-se militar; mas a junta dc saude julgou-o incapaz. Des-goslou-se, sofreu, mas näo maldissc a Patria. O ministério era liberal, ele se fez conservador e 1 continuou mais do que nunca a amar a "terra que o viu nascer". Impossibilitado de cvoluir-se sob os dourados do Hxército, procurou a administragäo e dos setts raraos escolheu o militar. Era onde estava bem. No meio de soldados, de canhôes, de vctcranos, de papelada injada de quilos de pólvora, de nomcs de fuzis c tcrmos técnicos de artilharia, aspirava diariamente aquele hálito de guerra, de bravura, de vitória, de triunfo, que é bem o hálito da Patria. Durante os lazeres burocráticos, estudou, mas estudou a Patria, nas suas riquezas naturais, na sua história, na sua geografia, na sua literatúra e na sua política. Quaresma sabia as cspécics dc mincrais, vcgetais e animais que o Brasil continha; sabia o valor do ouro, dos diamantes exportados por Minas, as guerras holandesas, as batalhas do Paraguai, as nascentes e o curso de todos os rios. Havia um ano a esta parte quč sc dcdicava ao tupi-guarani. Todas as manhäs, antes que a "Aurora com seus dedos rosados abrisse caminho ao louro Febo", ele se atracava até ao almoyo com o Montoya, Arte y diccionario cle lu lengua guarani ó más bien tupí, e estudava o jargäo caboclo com afinco e paixao. Na repartigäo, os peqttenos empregados, amanuenses e escreventes, tendo notícia desse estudo do idioma tupiniquim, deram näo se sabe porque em chamá-lo - Ubirajara. Čerta vez, o escrevente Azevedo, ao assinar o potito, distraido, sem reparar quem Ihe estava ás costas, disse em tom chocarreiro: "Voce já viu que hoje o Ubirajara está tardando?" Quaresma era considerado no arsenal: a sua idade, a sua ilustracäo, a modéstia e honestidade do seu viver impunham-no ao respeito de todos. Sentindo que o alcunha lhe era diľigido, näo perdeu a dignidade, näo prorrompeu em doestos e insultos. Endireitou-se, eonsertou o pince-nez, levantou o dedo indieador no ar e respondeu: - Senhor Azevedo, näo seja leviano, Näo queira levar ao ridículo aqueles que trabalham em siléncio, para a grandeza e a emancipa9äo da Patria. (8? ed., Säo Paulo, Brasiliense, 1970. p. 21-6.) bnngava: procurava, buscava. um trem de: expressao popular com fungao de advérbio de intensidade. abustado: rico. monacal: dc mongc. misantropo: solitário, que tem aversao á vida em sociedade. incada: coberta por, cheia dc. umamicnsc! eserevenle, copista. doestos: instiltos. injúrias. Monteiro Lobato: o moderno antimodernista Monteiro Lobato (1882-1948), paulista de Taubaté, foi um dos escritores brasileiros de maior prestigio, por causa de sua atuacäo como intelectual polémico e autor de histórias infantis. Sua a9äo, alem do círculo literário, estende-se também ao piano da luta política e social. Moralista e doutrinador, aspirava ao progresso material e mental do povo brasileiro. Com sua personagem Jeca Tatu, por exemplo -um tipico caipira acomodado e miserável do interior paulista -, Lobato critica a face de um Brasil agrário, atrasado e ignorante, chcio de vicios e vermes. Seu ideal dc pais era um Brasil moderno, estimiilado pela ciéncia e pelo progresso. De fazendeiro, f,obato passou ao ramo editorial, sendo um de seus funda-dores em nosso pais. Criou a Monteiro Lobato & Cia., a primeira editora nacionál, e mais tarde a Companhia Editora Nacionál e a Editora Brasiíiense. Na década de 30, envolveu-se na luta pela defesa das reservas naturais brasileiras, que vinliam sendo ineseru-pulosamente exploradas por grandes empresas multinacionais. Com a pu-blica9äo de O escändalo do petróleo (1936) denuncia o jogo de interesses que envolve a extracäo do petróleo e o envolvimento das autoridades brasileiras com os interesses internacionais. Em 1941, já durante a ditadura de Vargas, foi preso por ataques ao governo, provocando uma grande como9äo no pais inteiro. A obra Policarpo Quaresma ó um hörnern nacionalista. a) Aponte algumas características da personagem que comprovem essa afirtna9äo. b) O que esse tra9o de Quaresma provoca nas pessoas? Com base no fragmente em estudo, observe o recorte social feito pela obra. a) Que classe social é retratada? b) Há algum indício de preconceito social na obra? Explique. O idealismo de Quaresma é persistente. Somente ao longo de vários anos será abalado por causa de sucessivas frustrasôes. Apesar disso, já nas primeiras páginas da obra, é possivel prever o "triste fim" da personagem. Que episódio do trecho possibilita antever o desfecho da obra? Como eseritor literário, Monteiro Lobato situa-se entre os autores regionalistas do Pré-Modernismo e destaca-se no género conto. O universo retratado geralmente säo os vilarejos decadentes e as popula9Ôes do Vale do Paraíba, quando da crise do plantio do café. Comenta o professor Alfredo Bosi a rcspcito dc suas principals obras: Em Vrupés, predomina a preocupa9äo de desenlaces deprimentes e chocantes: Lobato quis mesmo intitulá-lo Dez histórias trágicas. Já em Cidades mor tas, o desejo de reproduzir cenas e tipos vistos nos vilarejos decadentes do Vale do Paraíba forca.a nota da satira local, emergindo caricaturas que těm lá a sua comicidade. Por fim Negrinha, que torna o título do conto iniciál, é um livro heterogéneo onde reponta com maior insistěncía o dooumento social acompa-nhado do costumeiro sentimente polěmico e"dá costumeira vontade de doutrinar e reform a r. (O Pré-Modemismo. Säo Paulo, Cultríx, 1973. p. 68-9.) Escritor sem qualquer pretensäo de promover reno-va9äo psicolögica ou estetica, Lobato foi antes de tudo um conlador de histörias, de easos interessantes, preso ainda a certos modelos realistas. Dono de um estilo cuidadoso, näo perdeu a oportimidade para criticar certos häbitos brasilciros, como a cöpia de modelos estrangeiros, nossa subserviencia ao eapilalismo internacional, o carncirismo das massas eleitorais, o nacionalismo ufanista cego, etc. Apesar de sua abertura ideologica, do ponto de visla artistico mostrou-se conservador quando comecaram a surgir as primeiras manifestacöcs modernistas cm Säo Paulo. Ficou famoso o seu polemico artigo intitulado "Paranoia oumistificacäo?", publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 1917. Nele Lobato criticou violentamente a exposicäo de pintura expressionista de Anita Malfatti, pintora paulista recem-ehegada da Europa, considerando seu trabalho resultado de uma deformaeäo mental. Alem de ter escrito literatura "adulta", Lobato foi tambem um dos primeiros autores de literatura infantil em nosso pais e em toda a America Latina. Personagens como Narizinho, Pedrinho, Emilia, Rabicö, Visconde de Sabugosa, Dona Beiita e a negra velha Tia Nastäcia ficaram conhecidas por inümeras geracöes de criancas, de värios paises, c chegaram ä televisäo brasileira, na decada de 60, com o seriado O Sitio do Picapau Amarelo. Tal qua] no conjunto de suas obras, tambem nessa parte infantil Lobato aproveita para transmitir äs criancas valores morais, conheeimentos sobre nosso pais, nossas tradicöes, nossa lingua, etc. O lexto que segue é um fragmente da crônica Urupés, na qual Monteiro Lobato traga o perlil do caipira, o Jeca Tatu, que ele imortalizou em nossa literatura. Jeca Tatu é um piraquara do Paraíba, maravilhoso epitome de carne onde se resumem todas as características da espécie. Ei-lo que vem falar ao paträo. Entiou, saudou. Seu primeiro movimento após prender entre os lábios a palha dc milho, sacar o rolete de fumo e disparar a cusparada ďesguicho, é , sentar-se jeitosamente sobre os calcanhares. Só cntäo destrava a lingua e a inteligencia. - "Näo vé que..." De pé ou sentado as idéias se lhe enlramam, a lingua emperra e näo há de dizer coisa com coisa. De noite, na choga de palha, acocora-se em frente ao fogo para "aqnentá-lo", imitado da mulher e da prole. Para comer, negociar uma barganha, ingerir um café, tostar um cabo de foice, fazé-lo noutra posigäo será desastre infalível. Há dc ser de cócoras. Nos mereados, para onde leva a quitanda domingueira, é dc cócoras, como um faquir do Bramaputra, que vigia os cachinhos de brejaúva ou o feixe de trés palmitos. /..; ,. Pobrc Jeca Tatu! Como és bonito ňo romance e feio na realidade! Jeca mereador, Jeca lavrador, Jeca filósofo... Quando comparece ás feiras, todo mundo logo adivinha o que ele traz: sempre coisas que a natureza derrama pelo mato e ao homem só custa o gesto de espichar a mäo e colher - cocos de tucum ou jissara, guabirobas, bacuparis, maracujás, jataís, pinhôes, orquídeas; [...] Seu grande cuidado é espremer todas as conseqúéncias da lei do menor esforgo - e nisto vai longe. Comega na morada. Sua casa de sapé e lama faz sorrir aos bichos que móram em toca e gargalhar aq joäo-de-barro. Pura biboca de bosquimano. Mobília, nenhuma. A cama é uma espipada esteira de peri posta sobref o chäo batido. Nenhum talher. Näo é a munheca um talher completo - colher, garfo e faca a um tempo? No mais, umas cuias, gamelinhas, um pote esbeigado, a pichorra e a panela de feijäo. Nada de armários ou baús. A roupa, guarda-a no corpo. Só tem dois parelhos; um que traz no uso e outro na lavagem. [...] Seus remotos avós näo gozaram maiores comodidades. Seus netos näo meteräo quarta perná ao banco. Para qué? Vive-se bcm sem isso. Se pelotas de barro caem, abrindo seteiras na parede, Jeca näo se move a repô-las. Ficam pelo reste da vida os buracos abertos, a entremostrarem nesgas de céu. Quanto á palha do teto, apodrecida, greta em fendas por onde pinga a chnva, Jeca, em vez de remendar a tortura, limita-se, cada vez que chove, a aparar mima gamelinha a água golejante... Rcmcndo... Para que? se uma casa dura de/, anos e faltam "apenas" nove para que ele abandone aquela? Esta fílosofia cconomiza reparos. Um terreirinho descalvado rodeia a casa. O mato o bcira. Nem árvores frutiferas, nem horta, nem ľlores - nada revelador de permanéncia. Há mil razôes para isso; porque näo é sua a terra; porque se o "tocarem" näo ficará nada que a outrem aproveite; porque para frutas há o mato; porque a "criacäo" come; porque... - "Mas criatura, com um vedozinho por ali... A madeira está á mäo, o cipó é tanto..." Jeca, interpelado, olha para o mono coberto de moiroes, olha para o terreiro nu, coga a cabega e cuspilha. - "Näo paga a pena." Todo o inconsciente filosofar do caboclo grulha nessa palavra atravessada de fatalismo e modorra. Nada paga a pena. Nem culturas, nem comodidades. De qualqucr jeito se vive. (22? ed. Säo Paulo, Brasiliense, 1978. p. 147-50.) i Versos íntimos 1. O texto descreve Jeca Tata em ires papeis: o de mercador, o de lavrador e o de filösofo. Como se sai Jeca nesses tres papeis? 2. Que eomporlamentos de Jeca comprovam esta afirma9äo do narrador: "Seu grande cuidado e espremcr todas as conseqiiencias da lei do menor esforgo"? 3. De acordo com o texto, a a9äo de Jeca sobre a natureza e minima, "nada revelador de permaneneia". Alem da indolencia desse tipo regional, que outro grave problema social se deprcende dessa quase indiferen9a de Jeca em reUt9äo ä terra? 4. Explique o fatalismo presente nestas palavras do caboclo: "Näo paga a pena". ■IIIIíIímS i» <ú ''3 c> h ,;m íf-i Augusto dos Anjos (1884-1914) nasceu na Paralba, estudou Direito em Recife e viveu no Rio de Janeiro e em Minas Gerais. Exerceu a profissäo de advogado, promotor e professor de literatura. Čomo poeta, sua obra é jie_graijde_.crriginali_dade. Considerado por alguns como poeta simbolista, Augusto dos Anjos apresenta na verdade uma experiéncia unica na literatura universal: a uniäo do Simbolismo com o cientiftcismo naturalista. Por isso, dado o carátcr sincrético de sua poesia, convém situá-lo entre o grupo pré-modernista. Os poemas de sua única obra, Eu (1912), chocam pela agresjäividade do vocabulário c pela visäo dramaticamente "angustiante da matéria, da vida e do cosmos. Integram a linguagem termos até entäo considerados antipoéticos, como escarro, verme, germe, etc. Os temas, igualmente, säo inquietantes: a prostituta, as substäncias quimicas que compoem o corpo humano, a decrepitude dos cadáveres, os vermes, o sémen, etc. Além dessa "camada cientifica" de sua poesia, verifica-se, por outro lado, a_dor_de ser dos simbolistas, a poesia de anseios e angústias existenciais, provável influéncia do pessimismo do filósofo alemäo Arthur Schopenhauer. Para o poeta näo há Deus nem esperan9a; há apenas a supremacia da ciéncia. Quanto ao homem, as substäncias e energias do universo que o geraram, c_ a matéria de que ele é fcíto - carne, sangue, instinto, células -, tudo fatahnente se arrasta para a podŕidäo e para a decomposÍ9äo, para o mal e para o nada. Em síntese, a poesia de Augusto dos Anjos é mareada pela uniäo de duas concep9Ôes de mundo distintas: de um lado, a objetividade do átomo; de outro, a dor cósmica, que busca o sentido da existencia hutnana. Observe alguns desses procedi-mentos neste soneto: Ves?! Ninguem assistiu ao formidävel Enterro de lua ultima quimera. Somente a Ingratidäo - esta pantera Eoi tua companheira inseparävel! Acostuma-te ä lama que te espera! O Homem, que, nesta terra miserävel, Mora, entre feras, sente inevitävel Necessidade de tambem ser fera. Torna um fosforo. Acende teu cigarro! O beijo, amigo, e a vespera do escarro. A mäo que afaga 6 a mesma que apedreja. Se a alguem causa inda pena a tua chaga, Apedreja essa mäo vil que te afaga, Escarra nessa boca que te beija! (Em Eu e outros poemas. 30? ed. Rio de Janeiro, Livraria Säo Jose, 1965. p. 146.) Augusto dos Anjos, com sua poesia antilirica, abre a discussäo sobre os coneeitos de "boa poesia", preparando o terreno para a grandc rcnova9äo modernista. Vários artistas modernos retomam, mais tarde, essa tradÍ9áo do antilirismo ou da antipoesia. E o caso, por exemplo, de Joäo Cabral de "Mělo Neto, que busca pór fím ao eu lírico e á poesia dita profunda. Na MPB atual, Joäo Bosco e Aldir Blanc também exploram aspectos grotescos da realidade, como o submundo urbano do Rio de Janeiro, com siias carěncias e decrepitude moral. '/ lllhíirto j ISlB dl. MESBrnEmm Psicologia de um vencido Eu, filho do carbono e do amoníaco, Monstro de escuridäo e rulilänuia, Sofro, desde a epigénesis da infäncia, A influéncia má dos signos do zodíaco. Profundissimamente hipocondriaco, Este ambiente me causa repugnäncia... Sobe-me á boča uma änsia analoga á änsia Que se escapa da boca de um cardiaco. Já o verme - este operário das ruínas -Que o sangue podre das carni Heinas Come, e á vida em geral declara guerra, Anda a espreitar meus olhos para roě-los, E há-de deixar-me apenas os cabelos, Na frialdadc inorgänica da terra! (Em Eu e ouiros poemas, p. 60.) 1. A linguagem do poema surpreende e modifica uma tradicao poetica brasileira, constituida em grande parte com base em sentimentalismos, delicadezas, sonhos e fantasias. a) Destaque do texto vocabulos empregados pocticamcnte por Augusto dos Anjos que tradicionalmente seriam considerados antipoeticos. b) Indique de que area do conhecimento humano provem esses vocabulos. 2. O poema pode ser dividido em duas partes: a primcira, que trata do proprio eu lirico, e a segunda, que trata da morte. a) Como o eu lirico encara a vida e a si mesmo, nas duas primeiras eslrofes? b) Com que enfoque a morte e tratada, nas duas ultimas estrofes? 3. O titulo e uma especie de sintese das ideias do poema. Justiflque-o. 4. O poema e centrado no eu. Apesar disso, pode-se dizer que suas ideias sao universalizantes? Justifique. 5. Indique ao menos uma caracteristica naturalista e outra simbolista presentes no texto. Antipassadismo cultural e liberdade de criafäo säo as marcas principals da arte moderna. Ao mesmo tempo que desejavam demolir os padrôes e a ideológia realista-naturalista vigentes, os artistas modernos näo queriam se prender a normas rígidas e valoiizavam o ilogismo e a subjetividade. — ; a Europa näo houve uma arte moderna uniforme. Houve, sim, um conjunto de tendéncias artísticas, muitas vezeš prove-nientes de países diferentes, com propostas espccíficas, embora as aproximassem certos tracos mais ou menos comuns, como o sentimento de liberdade eriadora, o desejo de romper com o passado, a expressäo da subjetividade c certo irracionalismo. Paris era o grande centro cultural europeu da época, de onde as novas idéias artísticas se irradiavam para o resto do mundo ocidental. Essas tendéncias, que surgiram na Europa antes, durante e depots da Primeira Guerra Mundial, receberam o nome de correntes de vangtiarda. As vanmiardas ,mopéias O Cubismo O movimento cubista teve início na Franca, em 1907, com o quadro Les demoiselles ď Avignon, do pintor espanhol Pablo "Picasso. A partir de entäo, em torno de Picasso e do poeta francos Apollinaire formou-se um grupo de artistas que cultivaria as técnicas cubistas até o término da Primeira Guerra Mundial, em 1918. A convivéncia entre escritores e artistas plásticos desse grupo favoreceu uma rica troca de idéias e técnicas, de modo que os poetas assimilavam técnicas pictóricas, e os pintores, idéias filosóficas e poéticas. Os pintores cubistas opöem-se á objetividade e á linearidade da arte realista e da renascentista. Buscando novas cxperiěncias com a perspectiva, os cubistas procuram decompor os objetos representados em difcrentes pianos geométricos e ängulos retos, que se interceptam e se sucedem, de tal forma que o espectador, com o seu olhar, possa remontá-los e ter uma visäo do todo, de face e de perfil, como se tivesse dado uma volta em torno deles. Na literatura, essas técnicas da pinlura correspondent á fragmentaeäo da realidade, á superposicäo e simultaneidade de pianos (por exemplo, mistura de assuntos, espacos e tempos diferentes). A literatura cubista apresenta, assim, caracteristicas como ilogismo, humor, antiintelectualismo, instantaneismo, simultaneidade, linguagem predominantemente nominal e" rnäis ou menos caótica. As principals expressöes do Cubismo europeu foram: na pintura, Picasso, Braque, Picabia, Léger, Mondrían; na literatura, Apollinaire, Cendrars e outros. Entre os modernistas brasileiros da década de 20 podem ser notadas certas influěncias cubistas. Observem-se, como exemplo, neste poema de Oswald de Andrade, certos tracos do movimento, como a fragmentaeäo da realidade, a predominäncia de substantivos e os flashes clnemätögräficos: hipica Saltos records Cavalos da Penha Correm jóqueis de Higieiiópolis Os magnatas As meninas E a orquestra toca Cha Na sala de cocktails (Poesfas reunidas. 5? ed. Rio de Janeiro, civilizaQäo Brasilelra, 197B, p, 129.) O Futurismo Em ,1909, no jornal parisiense Le Figaro, o italiano Filippo Tommasio Marincftí publica o Manifesto Futurista, que surpreende os meios culturais europeus pelo carater yiolento e radical de suas propostas. Muito mais do que por obras, o movimento difunde-se por meio de manifestos (mais de trinta) e conferéncias, tendo sempre á frente a figura de seu líder, Marinetti. Eis algumas das propostas do primeiro manifesto, de 1909: 1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito á energia e á temeridade. 2. Os elementos essenciäis de nossa poesia seräb a coragem, a audácía e a revolta. 3. Tendo a literatúra até aqui enaltecído a imobilidade pensatíva, o éxtase e o sono, nós queremos exaltar o movimento agŕessívo, a ínsônia febril, o passo gŕnástico, o salto mortal, a bofetada e o soco. 4. Nós declaramos que o esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova: a bclcza da velocidade. Um automóvcl de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de fôlego explosive.. um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais belo que a Vitória de Samotrácia. ( 9. ,Nós queremos glorificar a guerra - única higiene do mundo -, o militarismo, o patriotísmo, o gesto destrutor dos anarquistas, as belas idéias que mátam, e o menosprezo á mulher. (lÔJNós queremos demolir os museus, as bibliotecas, combater o moralismo, o feminismo e todas as covardias oportunistas e utilitárias. 11. Nós cantaremos as grandes multidöes movimentadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela revolta; as marés multicoloridas e polifônicas das revolugócs pas capitais modernas; a vibragäo noturna dos arsenais e dos estaleiros sob suas violéntas luas elétricas; as estagöes glutonas comedoras de serpentes que fumam; as usinas suspensas nas nuvens pelos barbanles de suas fumagas; as pontes para pulos de ginastas langadas sobre a cutelaria diabólica dos rios ensolarados; os navios aventureiros farejando o horizonte; as locomotivas de grande peito, que escoucinham os trilhos, como enormes cavalos de ago freados por longos tubos, e o vôo deslizante dos aeroplanos, cuja hélice tem os estalos da bandeira e os aplausos da multidäo entusiasta. (Apud Gilberto Mendonca Teles. Vanguardas europélas e Moder-nísmo brasileiro. Petrópolis, Vozes, 1983. p. 91-2.) Ode ao burgués Eu insulto o burgués! O burgués-níquel, o burgués-burguěs! A digestäo bem-feita de Säo Paulo! O homem-curva! o homem-nádegas! O homem que sendo francés, brasileiro, italiano, é sempře um cauteloso pouco-a-pouco! Eu insulto o burgués-funesto! O indigesto feijäo com toucinho, dono das tradigöes! Fora os que algarismam os amanhäs! Olha a vida dos nossos setembros! Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio! Mořte ao burgués de giolhos, chcirando rcligiäo c que näo cre cm Dcus! Ódio vermelho! Ódio feeundo! Ódio ciclico! Ódio fundamento, sem perdäo! Fora! Fu! Fora o bom burgués!... (Mario de Andrade. Poesias completas. Säo Paulo, Círculo do Livro, s. d., p. 45-7.) Após o primeiro manifesto, que delineia o perfil ideologico do movimento, Marinetti lanca, em 1912, o Manifesto Técnico da Literatúra Futurista, cujas pröpostäs representam uma verdadeira revolupäo literária. Dentre elas, destacam-se: a destruicäo da sintaxe e a disposicäo das palavras "em liberdade"; o emprego de verbos no infínitivo; a abolÍ9äo dos adjetivos e dos advérbios; o substantivo duplo, em lugar dc substantivo acompanhado por adjetivo ("praca-funil", "mulher-golfo", por exemplo); a abolicäo da pontuacäo, que séria substituída por sinais da Matemática (+, :, =, >, <) e pelos sinais musicais; a destruicäo do eu psicologizante, Apesar de se lancar na Franca, Marinetti visa principal-mente á Itália. Por meio da exaltacäo á máquina e á velocidade e da rejeicäo aos cänones do passado, procura romper com a estagnaeäo cultural e econômica de seu, pais e promo ver um espírito de modernizacäo industrial que levasse a Itália ao desenvolvimento. Marinetti era, no fundo, um nacionalista. Embora a area de maior penetraeäo do Futurismo seja a literatura, o movimento também encontra ecos rta pintura, particularmente nas obras dc Carlos Carrá, Umberto Boccioni, Luigi Russolo e Giacomo Balla. Nas telas futuristas säo comuns elementos que sugerem a velocidade e o mecanicismo da vida moderna. As propostas técnicas do Futurismo italiano tiveram adeptos na literatúra brasileira. Elas podem ser encontradas na maior parte da produyäo dos escritores dos anos 20. Observe-se, como exemplo, este fragmento do violento poema 'Ode ao burgués', de Mario de Andrade: O Expressionismo O Impressionismo era uma corrente da pintura que valorizava a impressäo, isto é, um movimento do exterior para o interior, forma subjetiva de perceber a realidade. No comeco do século XX, tanto na Franca quanto na Alemanha, surgem grupos de pintores que desejam alterar o enfoque da pintura imprešsionista, percorrendo o cami-nho contrario, isto é, partindo da subjetivi-dade para o mundo exterior. Esses pintores, chamados de expressionistas na Alemanha e de fauvistas na Franca, buscam fazer da obra de arte um reflexo direto de seu mundo interior. Há uma valorizaeäo da expressäo, isto é, do modo como forma e contcúdo livremente se unem para dar vazäo ás sensacöes do artista no momento da criaeäo. Essa liberdade da expressäo assemelha-se á das "palavras em liberdade" dos futuristas. Durante e depois da Primeira Guerra, o Expressionismo assumiu um caráter mais social e combativo, interessando-se pelos fiorrores da guerra, pelas condicöes dc vida desumanas das populacöes carentes, etc. Dentre as principals propostas do Expressionismo, destacam-se: » A arte näo é imitacäo, mas criacäo subjetiva, livre. A arte é expressäo dos sentimentos. ©' A realidade que circunda o artista é horrível, por isso ele a deforma ou a elimina, eriando a arte abstrata. « A razäo se torna objeto de descrédito. e A arte é criada sem obstáculos convencionais, o que representa um repúdio á repressäo social, e Ä intimidade e a vivéncia da dor derivam do sentido trágico da vida e causam uma deformacäo signifícativa, torturada. » A arte se desvineula do conceito de belo e feio, torna-se uma forma de contestacäo. Na literatura, especificamente, o Expressionismo apresenta estas características: linguagem fragmentada, elíptica, constituída por frases nominais (basicamente aglomerados de substantivos e adjetivos), sem verbos, sem sujeito; despreocupacäo formal: sem rimas, sem estrofes,'sem musicalidade. Tdeologicamente, os poetas expressionistas visam combater a fome, a inércia e os valores do mundo burgués. Destacam-se, dentre os artistas ligados ao Expressionismo: na pintura, Kandinski, Paul Klee, Chagall, Munch; na arquitetura, Erich Mendelsohn; na literatura, August Štramm, Kasimir Edschmid e, mais tarde, Herman Hesse e Thomas Man; no teatro, Kayser e Brecht (fase iniciál); na música, Schoemberg; e, no cinema, Wiene. O Dadaísmo Durante a Primeira Guerra Mundial, u Suíca mantém-se neutra. Para ela acorrem artistas e intelectuais de todos os pjontos da Europa, abrigando-sc cm Zurique. Alguns desses ''fugidos de guerra" reúnem-se no Cabaret Voltaire, ponto de encontro c cspaco cultural onde nasce o movimento dadaísta. Criado a partir do clima de instabilidade, medo e revolta provocado pela guerra, o movimento dadapretende" ser uma resposta á nitida decadéncia da civilizacäo que o conflito representa."Dai provém a irreveréncia, o deboche, a agressividade e o ilogismo dos textos e manífestacoes dadaístas. Os dadás entendem que, enquanto a Europa se banha em sangue, o cultivo da arte näo passa de hipoerisia e prcsuncäo. Por isso é preciso ridicularizá-la, agredi-la, destruí-la. Muitas säo as atitudes demolidoras dos artistas dadaístas a partir de 1916: noitadas cm que predominavam palhacadas, declamacöes absurdas, exposicöes inusitadas, alem dos espetáculós-relampago que faziam de improviso nas ruas, em meio a urros, vaias, gritos, palavröes e á total in-compreensäo da platéia. Quanto ás obras artísticas, especificamente, épequena a producao do Dadaísmp suíco. Mas o movimento será reforcado pelas experiencias análogas do americano Marcel Duchamp, que ridicularizam o mito mercantilist:! da civilizacäo norte-ameri-cana. com os seus ready-mades. A técnica do ready-made consiste em extrair um objeto \ jjí do seu uso cotidiano e, mm • nenhuma ou pequenas alu-.1- BH| .J-2 . j cöes, atribuir-lhe um valoi ar- j '. í tístico.Ficaramfamososccll.,- objelos. como o urinol ou uiii.i ' roda de bicicleta enxer , d.t 1 ) W ' numa cadeira. clevados á cm--dicäo de objetos i'c .i.tc pi 1 DuilKinip I Na literatura, o dadaísmo caracteriza-se pela agressividade, pela improvisaeäo, pela desordem, pela réjcicao a qualquer lipo de racionalizacfio e equilíbrio, pela livre associaeao cle palavras (técnica da "eserita automática", que seria mais tarde aproveitada pelo Surrealismo) c pela inveii9äp de palavras com base na cxploracäo apenas do seu significante. Um exemplo dessas propostas é o poema fonético "Die Schlacht' ('A batalha'), de Ludwig Kassak: Berr... bum. bumbum, bum... Ssi... bum. papapa bum, bumm Zazzau... Dum. bum, bumbumbum Prii, prii, prä... ra, hä-hä, aa... Hahol... {Apud Gilberto Mendonca Tetes. Op. cň., p. 113.) Destacam-se ainda, envolvidos com as propostas dadaistas, os seguintes artistas: Max Ernst, Francis Picabia, Philippe Soupault, André Breton e outros. A orientagäo anarquista e niilista do movimento, bem como a falta de um programa de arte, näo Ihe permite longa duragäo. Tristan Tzara.e André Breton desentendem-se, Com o término da guerra já havia alguns anos, era hora de reconstruir o que for.a demolido: a Europa e a arte. Tzara insiste cm manter a linha original do movimento; Breton, rompendo com o Dadaismo, abandona o grupo para criar o movimento surrealista, uma das mais importantes correntes artísticas do século XX. O Surrealismo O movimento surrealista tem início na Franca a partir da publicagäo do Manifesto do Surrealismo (1924), de André Breton. Diversos pintores "aderem ao movimento, interessados nas propostas artisticas de Breton, ligadas ao subconsciente e á psicanálise (Breton tinha sido psicanalista). Dois säo os aspectos que marcam o Surrealismo em seu início: as experiéncias criadoras automáticas e o imaginário extraído do sonho. Frcud, na psicanálise, e Bergson, na filosofia, já haviam destacado a importáncia do mundo interior do ser humano, as zonas desconhecidas ou pouco conhecidas da mentě humana. Encaravam o inconsciente, o subconsciente e a intuigäo como fontes inesgotáveis e superiores de conhecimento do hörnern, pondo assim em segundo piano o pensamento sensível, racional c consciente. O automatismo artistico consiste em extravasar diretamente os impulsos criadores do subconsciente, sem nenhum controle da razäo ou do pensamento. Significa pôr na tela ou no papcl os desejos interiores profundos, sem se importar com cocrcncia, significados, adequacäo, etc. Na literatura, esse princípio recebeu o nome de "escrita automática". A outra linha de atuagäo surrealista, a onírica, busca a transposicäo do universo dos sonhos para o piano artistico. O sonho, na concepcäo de Freud, é a manifestaeäo das zonas ocultas da mentě, o inconsciente e o subconsciente. Os surrealistas pretendiam criar uma arte livre da razäo, que fosse a expressäo direta dessas zonas ocultas, como se o artista, ao criar, estivesse sonhando acordado. Nessas duas linhas de pesquisa e trabalho, säo freqüentes certas atitudes surrealistas, como o ilogismo, o devaneio, o sonho, a loucura, a hipnose, o humor negro, as imagens violentas, o impacto do inusitado, etc. O Surrealismo tem repercussäo em vários domínios da arte. Na literatura, destacam-se André Breton, Louis Aragon, Antonin Artaud; nas artes plásticas, Salvador Dali, Max Ernst, Joan Miró, Jean Harp; no cinema, Luis Buňuel. A rejcicäo do Surrealismo ao mundo burgues, racional, mercantil e moralista levaria alguns membros do grupo a ter ligagöcs com o comunismo. Para alcangar o objetivo maior do movimento - amor, liberdade e poesia -, eles aereditavam ser necessária uma transformagäo radical da sociedade, por meio da qual se pusesse fim ao modo de produeäo capitalista e á estrutura de classes sociais. A adesäo desses membros, particularmente de André Breton, ás idéias socialistas provoca no movimento uma cisäo interna, que se agrava com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), e colabora para a desarticulagäo do grupo. Embora o Surrealismo tenha oficialmente desaparecido com a Segunda Guerra, resquicios do movimento ou tentativas de recuperá-lo säo vistos até os dias de hoje, o que comprova sua forca eriadora e a contemporaneidade de suas propostas. No Brasil, vários eseritores foram influenciados pelas idéias surrealistas, tais como Mario e Oswald de Andrade, Murilo Mendes, Jorge de Lima, jj dentre outros. EuuEE ■■i Observem-se, como exemplo, estes versos de Murilo Mendes: Pre-historia Mamae vestida de rendas Tocava piano no caos. Uma noite abriu as asas Cansada de Uinto som, Eqnilibrou-se no azul, Dc tonta nao mais olhou Para mini, para ninguem! Cai no album de retratos. (Em Antonio Candido e J. A. Castello. Presanga da literatura brasileira. T. ed. Sao Paulo/Rio de Janeiro, Difel, 1979, p. 185.1 Ä linguageui > 1- rnista Pela diversidade e amplitude dos aspectos que compöem a arte e a literatura modernas, e muito dificil caracterizä-las com a mesma objetividade adotada para caracterizar movimentos anteriores. Na vcrdade, tanto na Europa quanto no Brasil, em vez de um movimento uniforme, o que houve no inicio do seculo foram correntes artisticas que se caracterizaram pela quebra dos vaiores artisticos tradicionais e pela busca de tecnicas e meios de expressäo capazes de traduzir a nova realidade do seculo XX. No Brasil, a todas essas tendencias chamou-se Modernismo, movimento que equivale ao Futurismo, para os italianos, e ao Expressionismo, para os alemäes. Somerite a partir da Semana de Arte Moderna, em 1922, e que o movimento de renovacäo, em nosso pais, tomou rumos mais definidos, com propostas consistentes e conseqücntcs. Apesar disso, e possivel observar algumas caracteristicas basicas que marcam a literatura brasileira dos anos 20. O poei A jue, de Manuel Bandeira, embora publicado apenas em 1930 (portanto oito anos após a Semana de Arte Moderna), é uma espécie de plataforma teórica tardia da poesia modernista brasileira. Poética Estou farto do lirismo comedido Do lirismo bem comportado Do lirismo funcionário publico com livro de ponto expediente protocolo e manifestagöes de apreco ao sr. diretor. Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o cunho v rnácui;-. de um vocábtilo Abaixo os puristas Todas as palavras sobretudo os : u barfamos universais Todas as construgoes sobretudo as sintaxes de excegáo Todos os ív..':íos sobretudo os inumeráveis Estou farto do lirismo namonidor Politico Raquítico Sifilítico De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo. Dc resto náo é lirismo. Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferenles maneiras de agradar ás mulheres, etc. Quero antes o lirismo dos loucos O lirismo dos bébados O lirismo dificil e pungente dos běbados O lirismo dos clowns de Shakespeare - Nao quero mais saber do lirismo que nao é libertagán. (Estreía da vida Intelra. 2? ed. Rio de Janeiro, J, Olympio, 1970. p. 108.) vernneulo: relativo á lingua genuína, ptira. barbarismos: erros gramaticais de pronúncia, grafia, de significagäo, estrangeirismos. litino: empregado aqui tämbém com o seutido de métrica. clowns: palhagos. ř 1. Neste poema, Manuel Bandeira, ao mesmo tempo, propôe uma nova poética e critica a poesia traclicional, ainda vigente. Idcntifíquc as cstrofes do texto que formulam erítieas e as que fazem propostas. 2. Quanto ás criticas: a) O que o poeta critica nas duas primeiras estrofes? b) Que movimento literário apresenta essas caracteristicas eritieadas por Bandeira? 3. Manuel Bandeira, ao mesmo tempo que propôe uma nova poética, realiza-a, na prática. Destaque do poema um verso que exemplifique as seguintes propostas: a) "Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis"; b) "Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais". 4. A síntesc do poema encontra-se nas duas ultimas estrofes. a) Por que Manuel Bandeira prefere o lirismo de bčbados, loucos e palhagos ao lirismo tradicional? b) Qua! é, enfim, a concepgäo do autor de lirismo para uma poesia moderna? 5. O emprego do verso livre e a ľalta de uma pontuagäo mais rigorosa, como no tereciro verso, associam o poema a que correntes de vanguarda? Características da linguagem modernista Alem das características da linguagem da poesia modernista já estudadas, outras, que servem lanlo ä poesia quanto á prosa modernista, merecem ser lembradas: • fragmentacäo e flashes cinematográflcos: marcada pelo dinamismo da vida moderna e pela sobreposicäo de imagens e pianos trazida pelo cinema, a linguagem modernista procura ser ágil e captar simultaneamente diferentes pianos da realidade, como se houvesse uma "colagem" de vários recortes dela. O leitor, ás vezeš, tem a sensacäo de näo compreender á primeira leitura do que o texto trata, porque näo consegue de imediato unir suas partes. Observe como Oswald de Andrade desereve esta briga: r . . _ -ju ■:'> ■ O capucirn .....Quě apanhá sordado'.' - O qué? - Qué apanhá? Pernas e cabegas na calgada v'* 4r .v ĚĚ" a síntese: a linguagem modernista em geral é contrária á adjetivagäo abundante, que caracterizou a poesia parnasiana e simbolista, e busca a frase curta, sintética, suprimindo termos desnecessários ou facilmente subentendidos. O menor poema da lingua, por exemplo, é do modernista Oswald de Andrade; alem do lítulo, possui apenas uma palavra, com duas sílabas: AMOR Humor busca de uma lingua brasileira: desprezando o rigor das regras gramaticais, principalmente aquelas ditadas pela gramatica lusitana mas distantes da realidadc brasileira, os modcrnistas aproximam a lingua literaria escrita da lingua falada pelo povo brasileiro. Observe como Manuel Bandeira se refere a essa postura nestes versos: A vida nao me chegava pelos jornais nem pelos livros Vinha da boca do povo na lingua crrada do povo Lingua ccrta do povo Porque ele e que fala gostoso o portugues do Brasil Ao passo que nos O que fazemos E macaquear A sintaxe lusiada nacionalismo: os primeiros modernistas interessam-se por temas brasilei-ros, buscando valorizar nossas tradicôes e cultura, bem como nosso passado histórico-cultural. Observe essa preocupacäo neste poema de Cassiano Ricardo: Metamorfose Meu avo foi buscar prata mas a prata virou indio. Meu avo foi buscar indio mas o indio virou ouro. Meu avo foi buscar ouro mas o ouro virou terra. Meu avö foi buscar terra e a terra virou fronteira. Meu avö, ainda intrigado, foi modelar a fronteira: E o Brasil tomou forma de haipa. (Em Martim CererS. Rio de Janeiro, J. Olympio, 1974. p. 127.) irónia, humor, piada, paródia: os modernistas procuram ser eríticos e bem-humorados. Zombam da arte tradicional e das figuras eminentes de nosso passado histórico. A paródia - como recriagäo crítica e irônica de outro texto é utilizada com freqüencia por eles. Observe como Oswald de Andrade reúne estas e quase todas as características anteriores neste poemeto: senhur feudal Se Pedro Scgundo Vier aqui Com história Eu boto ele na cadeia tcmas extraidos do cotidiano: os modernistas acreditam na possibilidade de a arte ser extraida das coisas simples da vida c nao apenas dos grandes temas universais. Ha, portanto, uma dcssacralizacao da arte, que passa a participar do dia-a-dia das pessoas. Observe as acoes do cotidiano nestes versos do 'Roema so para Jaime Ovalle', de Manuel Bandeira: Enläo me levantei, Bebi o café que eu mesmo preparei, Depois me deitci novamcnte, acendi umcigarro e fiquei pensando... - Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei. urbanismo: nas duas primeiras decadas do seculo XX, os modernistas, influenciados pelo Futurismo, apreciam os temas relacionados a cidade e suas modernidades. Observe como o paulista Mario de Andradc descreve sua cidade no comeco do seculo, nestes versos de 'Paisagem n° 4': Os caminhoes rodando, as carrocas rodando, rapidas as ruas se desenrolando, rumor surdo e rouco, estrepitos, cstalidos... E o largo coro de ouro das sacas de cafe!,,. Como sintese, podemos assim esquematizar as principals caracteristicas da iinguagcm modernista: QUANTO Ä FORMA QUANTO ÄS IDÉIAS e Versos livres • Liberdade na escolha de palavras » Sintese na linguagem * Fragmentacäo, flashes cinemato-gráficos » Busca de uma lingua brasileira » Pontuagäo relativa « Nacionalismo • Revisäo de nosso passado histó-rico-cultural o Irónia, humor, piada « Valorizagäo de temas ligados ao cotidiano • Urbanismo Do texto ao contexto histórico As duas primeiras décadas do seculo XX representant, para a maior parteclo mundoi'ocidenlal, um momento contraditório, cheio de conflitos e rupturas em relagäo a muitos dös valores e idéias do século anterior. Todos os setores da vida humana - social, politico, econömico, cultural, científico e tecnológico - sofrem mudancas que alteraräo profundamente a visäo de mundo do hörnern moderno. A belle ěpoque: luxo, prazeres e lutas sociais A ciéncia e a técnica, que já contavam com algumas conquistas desde a mefaae do século XIX - como o transporte ferroviário (com a locomotiva a vapor), o barco a vapor eji_eletnädadeapresentam na transicäo para o século XX conquistas e invengôes que daräo maior dinamismo á vida moderna: as transmissôcs radiofônicas, o aeroplano, o automóvel e o cmematógrafo, dentre outralT Muitas dessas conquistas favorecem diretamente ojsetor industrial, propiciando a criagäo de capitais e de novos investimentos e possibilitando, assim, urna farta produgäo de produtos manufaturados. Vive-se um clima dc eufória e confianca entre as classes dominaiitcs. As burguesias industrial e finunceira e a classe média gozam os prazeres matériais que a vida moderna Ihes pode oferecer. Tem-se a sensagäo de conforto e de seguranca, como se nada pudesse abalar a "docura de viver". Culturalmente, vive-se a chama-da belie époque, que se caractcriza por uma intcnsa atividade artística, princřpalmeiiíe em Paris e Viena. Para essas cidades acorrem artistás de toda a parte da Europa, atraídos por seu ritmo intenso de vida, pelos modismos, pela vida noturna, pelos bares e cabarés e pelas novidades artísticas introduzidas por correntes de vanguarda. Contudo, ao lado do espíritp eufórico que envolve as camadas jinvilegiadas da sociedade dessa época, ablasse_opcrária continua á margcm dcT progresso material (fenoména que ocorre desde a Revolucäo Industrial, no século XVIII). Empenha-se na defesa dc idéias socialistas c anarquistas, fun-da ássociacoes e sindicatos, fa: greves e luta por melhores condi coes de vida e de trabalho. TiieLadirsIíome Journal Ti II. ÍT'.RSONALNUMBER A guerra e o fim da belle époque Em 1914 esloura a Primeira Guerra Mundial, por razöes de ordem política é econômica, dentre as quais o nacionalismo extremo de algumas nacôes e a necessidade cada vez maior da existencia de colônias fornecedoras de matčrias-primas e consumidoras de produtos manufaturados. A Primeira Guerra Mundial pôe fím ao excesso de otimismo da Jyelle époque. A sensacäo de equilíbrio é primeiramcntc quebrada pelas tentatiyas fru^tradas^.de_evitar a guerra, empreendidas por meio de aliangas que "permitiriam o equilíbrio de forgas entre as nagôes européias (Tríplice Alianga: Império Austro-Húngaro: Tríplice Entente: lnglatcrra, Franga e Russia). Posteriormente o conflito viria a confirmar a fragilidade dessas nagôes e o sentido ilusórío dos valores da belle époque. A Reyfilugao Russa, em 1917, conduz a classe trabalhadora ao poder. A "ameaga" do comunismo alastra-se pelo mundo, e a sensagäo dc paz dcixa de existir - mesmo após o fim da guerra. Terminada a guerra, em 1918, um clima de incerteza domina toda a década de 20. Os países envolvidos, que antes euforicamente disputavam mercados'cönsumidores, vívem agora crises econômicas e sociais., A Europa está endividada; a Alemanha, derrotada; a Itália, humilhada. Os prpblemas que levaram á guerra näo haviani sido resolvidos, mas apenas adiados até a Segunda Guerra Mundial, iniciaďa em 1939. As correntes de vanguarda e sen contexto Ao lado desse quadro politico-economico conturbado que caracteriza o inicio do seculo, surgem por toda a Europa, durante a belle epoque e depots del a, diversas correntes artislicas que reflctcm o espirito caotico e violento da epoca. Sao as chamadas "vanguardas europeias", movimentos de carater agressivo e experimental que rompem radicalmente os padroes de arte traditional, provocando polcmicas e debates apaixonados nos meios cm que se difundem. Como uma clara reacao ao racionalismo e ao objetiyismo das correntes cientificas e literarias ainda predominantes na cultura desde a segunda metade do scculo XIX, as vanguardas defendem o irracionalismo, valorizando o decadentismo simbolista, os estudos psicologicos de Freud e a teoria intuicionista de Bergson, ambos pensadores que rejeitam a analise posTtivista e buscam uma compreensao mais subjetiva e interior do homem e de sous problemas. Trata-se, portanto, da implantacao de uma nova estetica, de uma outra ordem de valores artisticos, ao mesmo tempo subjetiva e moderna, atualizada em relacao as grandes conquistas da era da maquina e da velocidade. Por isso, quase todas as correntes de vanguarda europeias assumem, num primeiro momcnto, uma postura destruidora em relacao ao passado, o que nao as impede, contudo, de realizar importantes conquistas, dado seu carater experimentalista, tais como intcgracao maior entre os varios dominios da arte e busca de novas tecnicas e linguugens comuns a musica, a litcratura c as artes plasticas. Apesar de as primeiras decadas deste scculo se terem caracterizado pelo clima de caos e destruicao trazido pela guerra c pclo carater demolidor das correntes de vanguarda, no Futurismo, Cubismo, Expressionismo, Dadais-mo e Surrealismo, principalmente, se encontram os elementos que constituirao uma nova arte, a arte do seculo XX. Einbora as primeiras manifestacoes modcrnistas já viessem surgindo em Sao Paulo desde 1911, é somente na década de 20, principalmente a partir da Semana de Arte Moderna (1922), que o Modernismo se difunde e se solidifica em nosso pais. O debate em torno das questoes estéticas aos poucos ganha caráter ideológico, o que prenuncia a literatura de fundo politico dos anos 30. 'is renovagöcs no campo da arte e da literatura brasileiras já ensaiavam seus primeiros passos, ainda timidos, desde o inicio do século XX, com os pré-modernistas. Contudo, até a realizacäo da Semana de Arte Moderna, cm 1922, a mentalidade oficial que predominou em nossa cultura era essencialmente acadômica e parnasiana. Nessas duas primeiras décadas do século, vários fatores de ordem social, politica, econômica e cultural atuaram nos rumos da vida brasileira, apontando mudancas profundas que se dariam dai em diante. Mario de Andrade, em 1942, ao fazer uma avaliacäo do que fora a Semana de Arte Moderna, realizada vinte anos antes, comenta: O movimento de inteligencia que representamos, na sua fase verdadeira-mente "modernista", näo foi o fator das mudancas politico-sociais posteriores a ele no Brasil. Foi essencialmente um prepaiador; o criador de um estado de espirito revolucionário e de um sentimento de arrebentaeäo. (Aspectos da literatura brasileire, 5? ed. Säo Paulo, Martins, 1974. p. 241.) Antecedentes da Semana Compare os dois textos: ůe Arle Moderna A Semana de Arte Moderna, realizada em 1922, em Säo Paulo, representa um divisor dc agims na cultura brasileira, tal a profnndidade das transfonnlíýoes que gerou. Contudo, a Semana näo foi o comeco das mudangas. Foi o ponto culminante de um processo que se iniciara na década anterior, quandó um conjunto de episódios, tais como publicacöes de artigos polemicos na imprensa, publicacöes dc obras, cxposÍ90cs c confcrcncias, come50U a minar as bases sólidas da cultura acaděmica nacionál. Eis alguns dos principais acontecimentos que precederam e prepararam o espírito da Semana: 1911 - Oswald de Andrade e Emilio de Menezes fundam ajevista de artes O Pirralho. Participa do jornal o engenheiro Alexandre Marcondes Machado (Juó Bananěre), que satirizava nomes consagrados da poesia brasileira. 1912 - Oswald de Andrade volta da Europa trazendo a novidade do verso livre, intluencia do futurismo italiano e da poesia de Paul Fort. 1913 -Q pintor russo Lasar Segall, posteriormente naturalizado brasileiro, faz uma exposicäo de pintura expressionista, sem "grande fepercussäo. 1914 - A pintora Anita Malfatti regressa da Europa, ondc desde 1912 ' estudava pintura expressionista, e faz uma exposicäo na Casa Mappin, sem maior destaque. Em 1915 a pintora parte para Nova Iorque. 1915 - Ronald de Carvalho (futuro partieipante da Semana de Arte Moderna) e o poeta portugués Luis de Montalvor integram a revista luso-brasilcira Orplieu, marco iniciál do Modernismo em Portugal. Neste mesmo ano, Olavo Bilac, o mais famoso poeta brasileiro da época, declama em Säo Paulo alguns de seus Ultimos poemas. O aeonteeimento teve largo destaque na imprensa. Juó Bananěre (italianizacäo de Joäo Bananeiro, apelido muito populär na época), com muitas ironias, também comenta o fato na revista O Pirralho c, cm seguida, transcreve sua paródia ao soneto 'Ouvir estrelas', que permite avaliar o tom de zombaria e provocaeäo da revista em rclacäo á cultura aeademica. SRO C/1UI O. 13 Ouvii- estrelas "Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las muila vez desperto E abro as janelas, pälido de espanto... E conversamos toda a noite, enquanto A via läctea, como um pälio aberto, Cintila. E, ao vir o sol, saudoso c em pranto, Inda as procuro pelo ceu deserto. Direis agora: "Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando estäo contigo?" E eu vos direi: "Amai para entende-las! Pois so quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas". (Em Poesia, 8? ed. Rio de Janeiro, Agir, 1957. p. 47-8.) Uvi strella Che scuitá strčila, né mcia strčila! Vucé stá maluco! e io ti diró intanto, Chi p'ra iscuitalas moltas veiz livanto, l v5 dá una spiada na gianella. I passo as notte acunversáno c'oella, Inguanto che as otra lá ďun canto Stó mi spiano. I o sol come um briglianto Nasce. Oglio p'ru ecu: - Cadč strčila?! Direis intó: - O' migno inlustre amigo! O clii é chi as strellas ti dizia Quano illas vicro acunvcrsá contigo? E io ti diró: - Studi p'ra intendela, Pois só chi giá studó Astrolomia, E capaiz de intends istas strella. (Em La divina inerenca. Sáo Paulo, Folco Masucci, 1966. p. 30.) 1917 - Vat'ios cscritores, futuros modernistas, publicam obras com algumas inova9oes de linguagem. E o caso de Mario de Andrade, que, ainda com o pseudonimo de Mario Sobral, lan9a Ha uma goto de sangue em cada poema;.Manuel Bandeira, com A cinza das fiords; Menotti del Picchia; com Juca Mulato: e Guilherme de Almeida, com Nos. Ainda neste ano, Anita Malfatti regressa dos Estados Unidos, onde realizara experienclas de nu cubista. Por insislencia de amigos (dentre eies o pintor Di Cavalcanti), a pintora faz uma exposijao de suas obras, que provoca uma violenta rea9ao por parte do escritor e critico do jornal O Estado de S. Paulo, Monteiro Lobato. Com o artigo intitulado 'Paranoia ou mistificagao?', Lobato divide os artistas e o publico. Oswald PI ■t. i. X I de Andrade defende a pintora no Jornal do Comércio. O confronto de idéias tem seu primeiro impacto. Eis um fragmento do artigo de Lobato: Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que véem normalmente as coisas e em conseqíiéncia disso fazem arte pura, guardando os ctcrnos ritmos da vida, e adotados para a concretizacäo das emocoes estéticas, os processos clássicos dos grandes mestres. [...] A oulra espécie é formada pelos que véem anormalmcntc a naturcza, e interpretam-na á luz de teorias efémeras, sob a sugestäo estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. Säo produtos do cansaco e do sadismo de todos os períodos de decadéncia: säo frutos dc fins de estacäo, bichados ao nascedouro. [...] Estas consideracôes säo provocadas pela exposi-9äo da Sra. Malfatti, onde se notám accntuadíssimas tendéncias para uma atitude estética for$ada no sentido das extravagäncias de Picasso e companhia. [...] 1921 Oswald de Andrade, ao ler os originais da obra Paulicéia desvairada, de Mário de Andrade (editada somente no ano seguinte), publica um artigo em que chama Mário de "meu poeta futurista". O evento, com a resposta de Mário no mesmo jornal, deu oportunidade a uma discussäo em torno da poesia moderna. Mário de Andrade sai deíinitiva-mente da obscuridade ao herdar a coluna de Oswald de Andrade no Jornal do Comércio, na qual publica, entre agosto e setembro, uma série de artigos intitulada 'Mestres do passado', em que avalia as conseqúéncias pernicio-sas do Parnasianismo na literatura brasileira. Essa série de artigos teve grande valor para a crítica literária da época. Di Cavalcanti expôe em Säo Paulo uma série de desenhos e caricaturas intitulada Fantoches da meia-noite e, scgundo alguns, teve a idéia da realizacäo de urna "semana de arte moderna". Os franceses, desde 1921, já haviam programado para marco de 1922 um Congresso do Espírito Moderno. No Brasil, a aproximafao do centenário da Independéncia agufou em nossos artistas o desejo ďefazer tiniá grande mosťrá de arte moderna. O congresso francěs nao se realizou, mas a nossa Semana ocorreu em fcvcrciro de 1922. Näo se conhece ao certo de quem partiu a idéia de se realizar uma mostra de artes modernas em Säo Paulo. Contudo, sabe-se que, já em 1920, Oswald de Andrade promctcra para 1922 Independéncia - uma acäo dos artistas novos "que fizesse valer o Centenário!", Talvez a realizacäo de uma Semana de Arte Moderna fosse a oportunidade cspcrada por ele. O certo é que em 1921 o grupo modernista que realizaria a Semana estava completamente organizado e amadurecido para o evento. No mesmo ano, chegou da Európa o consagrado cscritor, membro da Academia Brasileira dc Letras, Gra9a Aranha. O eseritor pré-moder-nista, havendo tido contato com as vanguar-das artísticas européias, apoiou o grupo paulista. Era o impulso que faltava. ano do centenário da 5řflAr1A«irr^ _K Senianajde Arte Moderna ocorreu entre 13 e 18 de fevereirq de 1922, no Teatro Municipal de Sáo Paulo, com a participa$ao de artistas do Rio e de Sáo Paulo. Durante toda a semana o saguao do teatro esteve aberto ao publico. Nele se encontrava mrm expjjsj^aoj^ com obras de Anita Malfatti, Vicente do Rego Monteiro, Zina Aita, Di Cavalcanti, Harberg, TJřecKěret, Ferrignac e Antonio Moya. Nas noites dos dias 13, 15 c 17 realizaram-sc saraus com apresentapao de conferencias, leituras de pqemas, danca e música. A primeira noite foi aberta com uma conferéncia de Graca Aranha intitulada 'A emocáo estčtica na arte moderna', na qual o eseritor pré-modernista, em lingua-gem tradicional e académica, manifesta seu apoio á arte moderna. Seguiram-se á conferéncia declamacao de poemas, por Guilherme dc Almeida c Ronald dc Carva-iho, e execugáó de můsicas de Ernáni Braga e Villa-Lobos. Contrastando com o comportamento da platéia na primeira noite, a segunda foi a mais importante e a mais tumultuada das trés noites da Semana. Foi aberta por Menotti del Picchia, com uma conferéncia em que era negada a flliacao do grupo modernista ao futurismo de Marinetti, mas defendida a integracáo da poesia com os tempos modernos, a liberdade de criaciio e, ao mesmo tempo, a criafao de uma arte genuinamente brasileira. zSISSJBBKĚKKtKm Quando se den inicio a leitura de poemas e fragraentos de prosa, a platcia tcvc rcacocs surpreendentes, ora vaiando, relinchando, latindo, gritando, ora aplaudindo. No rntefvalo eiitre uma parte e outra do programa, na escadaria que da para o hall do teatro, Mario de Andrade fez, em meio a cacoadas e ofensas, uma pequena palestra sobre as artes plasticas ali expostas. Na segunda parte do programa, um numero de danca e o concerto de Guiomar Novaes acalmaram os animos da plateia. A impoi tancia da Semana A Semana de Arte Moderna, vista isoladamente, näo deveria merecer tanta atencäo. Os jornais,da época, por exemplo, näpjübic_dcdicararn mais dp que aUumuis poiicas eoltmas, e a opiniäo publica ficou distante. Seus participantes näo tinham sequer um projeto artístico comuni; unia-os apenas o sentimento de liberdade de criacäp e o desejp de romper com a. cultura tradicional. Foi, portanto, um acontecimento bastante rest rit o a os meios artísticos, principalmente de Säo Paulo. Apesar disso, a Semana aos poucos foi ganhando uma enorme importäncia historica. Primeiramente porque representou a confluéncia das värias tendencias de renovacao que vinham ocorrendo na arte e na cultura brasileira antes de 22, etijo objetivo era combatcr a arte tradicional. Mario de Andrade, em 1942, em uma conferéncia comemorativa dos vinte anos da Semana de Arte Moderna,.afirmou; "O Modernismo, no Brasil, foi uma ruptura, foi um abandono de princípios e de técnicas conseqüentes, foi uma revolta contra o que era a lnteligéncia nacionál". Em segundo lugar, a Semana conseguiu chamar a atencäo dos meios artísticos de todo o pais e, ao mesmo tempo, aproximar os artistas com idéias modernistas, que até entäo se encontravam dispersos. A partir dai, em Säo Paulo e em várias outras cidades de todo o pais, formaram-se grupos de artistas e intelectuais, que fundaram revistas de arte e literatura, publicaram manifestos, enfim levaram adiante e aprofundaram o debate acerca da arte moderna. AJcmjdisso, a Semana, ao aproximar artistas de diferentes campos - escritores, poetas, pintores, escultores, arquitetos, řnúsicos e bailarinos -, permitiu a troca de idéias e de técnicas, o que ampliaria os cUversos ramos artísticos e os atualizaria em relagäo ao que se fazia na Europa, . Os reflexos . da Semana. fizeram-se sentir em todo o decorrer dos anos 20, atravessaram os anos 30 e, de alguma forma, estäp relacionados com a arte que se faz hoje. Abaixo segue o poema 'Os sapos', de Manuel Bandeira, declamado por Ronald de Carvalho no segundo sarau da Semana, sob vaias e gritarias. O publico, durante a leitura, gritava em unissono: "Foi, nao foil". Os sapos Enfunando os papos, Saem da penumbra, Aos pulos, os sapos. A luz os deslumbra. Em ronco que atcrra, Berra o sapo-boi: - "Meu pai foi a guerra!" "Nao foi!" - "Foi!" - "Nao foi!' O sapo-tanoeiro Parnasiano aguado, Diz: "Meu cancioneiro E bem martelado. Vede como primo Em comer os hiatos! Que arte! E nunca rimo Os termos cognatos. O meu verso e bom Frumento semjoio. Faco rimas com Consoantes de apoio. Vai por cinqiienta anos Que lhes dei a norma: Reduzi sem danos A formas a forma. Clame a saparia Em criticas ceticas: Nao ha mais poesia, Mas tu'i artes poeticas..." Urra o sapo-boi: - "Meu pai foi rei" - "Foi!" - "Näo foi!" - "Foi!" - "Näo foi!' Brada em um assomo O sapo-tanoeiro: - "A grande arte é como Lavor de joalheiro. Ou bem de estatuário. Tudo quanto é belo, Tudo quanto é vário, Canta no martelo". Outros, sapos-pipas (Um mal em si cabe), Falam pelas tripas: - "Sei!" - "Näo sabe!" "Sabe!" Longe dessa grita, Lá onde mais densa A noite inftnita Verte a sombra imensa; Lá, lugido ao mundo, Sem gloria, sem fé, No perau profundo E solitário, é Quc soukáš tu, Transido de frio, Sapo-cururu Da beira do rio... (Em Estrela da vida inteira, p. 61-2.) Os primeiros modermstas empregam com frequěncta a íronta, o deboche e a crítica á cultura oficial. a) Aponte um exemplo de ironia ou deboche. b) Que movimento literáno, visto como representante da cultura oficial, é satirizado? Comprove sua resposta com elementos do texto. c) A fala do sapo-tanoeiro, dehmitada pelas aspas, veicula o princípio básico do movimento literátio satirizado. Qual é esse princípio? II 2. Explique a oposicäo existente entre poesia e artes poéticas, referida na sétima estrofe. 3. Faga uma pesquisa, recorrendo ao dicionário ou ao seu professor de Biológia, sobre os quatro tipos de sapo que aparecem no poema: sapo-boi, sapo-tanoeiro (ou ferreiro), sapo-eururu e sapo-pipa. Em seguida: a) Expliquc dc que modo o pocta sugcre o som caractcristico do sapo-boi, do sapo-tanoeiro e do sapo-pipa. i b) Explique como se coloca o sapo-cururu entre os de sua espécie no Brasil. e) Con fron limdo a condigäo precária ("Sem glória, sem fé") do sapo-cururu á condigäo privilegiada dos outros tipos de sapo, explique o que pode simbolizar o sapo-cururu no cenário cultural brasileiro. Do texto ao fontexto histórico As trés primeiras décadas do sécido XX säo decisivas para os rumos que nosso pais tomaria nas décadas seguintes. A política do café-com-leite c o espírito de mudancas A virada do século encontra o pais no início da República Velha (1894-1930). Esta, representando os interesses das oügarquias rurais, caraeterizava-se pela política do café-com-leite, isto é, a aíternáncia no poder de repre-sentantes dos dois Estados mais fortes da Uniäo: Säo Paulo, pela riqueza advinda do cultivo do café, e Minas Gcrais, por possuir o maior colégio eleitoral nesse periodo. Entre 1871 e 1920, o pais recebe mais dc 3 milhetes de imigrantes, que se !'/ fixam na lavoura do café ou na indusTřii" paulistana. Uestacam-se as I imigracöes italiana e japonesa. Com o creseimento urbano e industrial do pais, verificado principal-mente no Estado de Säo Paulo, as condicöes da sociedade brasileira tornam-se criticas. Concomitantemente á marginalizafäo dos antigos escravqs e á forma9äo de uma pequena classe média, tem vez a formaeäo de um proletariado e de um subproleiariado, constituidos basicamentc dc mäo-de-obra estrangeira. A par desse incha90 dos grandes centros urbanos, a cultura canavieira do Nordeste, prejudicada pelas secas e näo podendo competir com o café, sofre forte decadencia, gerando mais tarde os fluxos migratórios para os Estados do Sudeste. Com a eclosäo da Primcira Guerra Mundial (1914), se dá um pequeno surtp industrial no pais, em virtude da impossibilidade de importa9äo de produtos estrangeiros. Em 1917, cresce a agita9äo política entre o operariado, difundem-se idéias anarquistas e socialistas, por meio de publicaföes e jornais operários. É importante, nesse contexto, a experiéncia anarco-sindical trazida pelos imigrantes italianos. Em junho desse ano é realizada a primeira grew geral, que praticamente pára Säo Paulo, obrigando o governo a negociar com os grevistas. Säo muitas as prisöes e as perseguÍ90cs a lidercs do movimcnto. A Revolu9äo Russa, ocorrida em outubro de 1917, repercule nos meios operários paulistas. No campo da cultura, o ano de 1917 tarnbem e marcado por aconte-cimentos importantes, como publica9oes, exposi9oes e polemicas, dinami-zando um processo de renova9ao artistica e cultural que culminaria com a Semana de Arte Moderna, em 1922. Tal processo cultural, sem se ligar diretamente aos acontccimentos politicos do pais, permite concluir que o Brasil como um todo vivia transforma9oes profundas. O tenentismo e a Revolugäo de 30 | I EmJ922, ano da Semana de Arte Moderna, cclcTde, em várias fileiras do Exército brasileiro, particularmcnte entre os tenerrtes, um movimento revoltosö contra a eleigäo de Artur Bernardes. mais um candidato apon-tado pela política do café-com-leite. Vários "Estados do pais, apoiados pelos tenentes, formám a._.Rfiaoäo Republicana, que apresenta Nilo Pe9anha como candidato opositor a Bernardes. _ * Ji. „.tu -Kti^. vJ^Szjr ..... , "BSi. — « _ No processo da campanha cleitoral, aumentam as tensöes políticas. Bernardesjyence, e as frustra9Öes acumuladas pelos setores militares mais baixos eclodcm na chamada Revolta do Forte dc Copacabana, no Rio de Janeiro, que vem a scr"désb¥ratada_. No~mesmo~äno7 é fundado no Brasil o Partido Comunista. ü movimento tenentisla tem desdobramentos politicos em toda a década de 2a_Em 1924, em homenagem a revolta de 1922, estoura uma revolu9äo na cidade de Säo Pjrulo, controlada pelos militares por vários dias. Em 1925, os ^mtes_pa^stos, agregados a outros revoltosos de várias partes do pais, formám a Coluna Prestes, que chegou a contar com maisjde mil homens e a percorr^24J)0Tncmrcöm o objetivo de insuflar as massas contra o governo federal. Em 1929, com a estagna9äo economica do capitalismo international e o track da Bolsa de Nova Iorque, a economia brasileira sofre violentas crises, pois vč abalado o scu principal produto dc exportactío, o café. Conseqüen-temente, a vida política nacionál passa a viver outra vez um periodo dc profundas dificuldades. Ao lado da erise econömica, coloca-se o problema da sucessäo presidencial. O entäo presidente Washington Luis, em vez de indicar um sucessor mmeiro, conforme o acordo vigente, indicou o paulista Júlio Prestes como candidato á Prcsidéncia. Minas, aliada ao Rio Grande do Šul, lan9a como candidato de oposÍ9ao (icltiiio Vargas, que empunhava a bandeira das reformas políticas: instituipäo'do voto secreto, anistia política, criacáo de leis trabalhistas, etc. A candidatura de Vargas ganha apoio dos tencntcs. O candidato oficial, Júlio Prcstes, věnce as eleieoes, provocando forte descontentamento nos melosTčíviré mililares. A 3 de outubro de 1930, toda a oposicao sc unc. No Rio Grande do Sul tem início um movimento militar; no Nordeste, comeca a rebeliao que dá origem á vitoriosa Revolu^áo de 30. Inicia-se um novo periodo na vida nacionál, a era de Vargas (1930-1945), que representa uma mudanija de orientaeuo da vida política e económica do pais. A burguesia industrial, agora representada no poder, define uma política económica voltada para a indústria. A arte moderna brasileira náo interferiu diretamente nesse processo histórico vivido pelo pais nas trčs primeiras décadas do nosso século, nem foi resultado direto dele. Mas originou-se e solidificou-se nesse quadro de contradicóes e rupturas que levaram o pais a cortar as amarras que ainda o prendiam ao século XIX e a adentrar-se no espírito de modernidade do século XX. A primeíra tase do Moderni;.;mo O movimento modernista no Brasil contou com duas fases: a primeíra entre 1922 e 1930, a segunda entre 1930 e 1945. A primeira fase caracterizou-se pelas tentativas de solidificacäo do movimento renovador e pela divulgacäo de obras e idéias modernistas. Apesar da diversidade de correntes e de idéias, pode-sc dizer que, de modo geral, os eseritores de maior destaquc dessa fase defendiam estas propostas: reconstruir a cultura brasileira sobre bases nacionais; promover uma revisäo crítica de nosso passado histórico e de nossas tradicôes culturais; eliminar de vez o nosso complexo de colonizados, apegados a valores estrangeiros. Portanto, todas elas estäo relacionadas com a visáo nacionalista, porém crítica, da realidade brasileira. Mario de Andrade, na conferéncia que fez em 1942 sobre a Semana de Arte Moderna, assim se referiu a esse periodo: "E vivemos uns oito anos, até perto de 1930, na maior orgia intelectual que a história artística do pais registra". Várias obras, grupos, movimentos, revistas e manifestos ganharam o cenário intelectual brasileiro, numa investigaeäo profunda e por vezeš radical de novos conteúdos e de novas formas de expressäo. Os rcsultados dcixados por esse periodo de pesquisas foram a implantacäo definitiva do movimento modernista e a maturidade e autonómia de nossa literatura. A orgia intelectual O periodo a que Mario de Andrade chama de "orgia intelectual" e rico em publicacoes de obras literarias, revistas e manifestos. Muitos autores, participantes ou nao da Semana dc Arte Moderna, publicam nessa primeira fase do Modernismo obras de alguma forma comprometidas ou relacionadas com as ideias defendidas em 1922. Dentre eles, destacam-se: Mario de Andrade, com Pauliceia desvairada (1922), Amar, verbo intransitive (1927) e Macunaima (1928); Oswald de Andrade, mens de derm • í. IP 13 com Memories sentimentais de Joäo Miramar (1923) ; Manuel Bandeira, com Rilmo dissolute) (1924) ; Cassiano Ricardo com Vamos cacar papa-gaios (1926) e Martini Cereré (1928); Plinio Salgado, com O estrangeiro (1926); Alcantara Machado, com -Bras, Bexiga e Barra Funda (1927). Várias revistas säo fundadas por todo o pais, como forma de divulgacäo das idéias modernistas. A primeira delas, criada em Säo Paulo, em 1922, logo após a Semana, é a revista Klaxon, mensário de arte moderna. Contando com a partieipaeäo de elementos de variadas tendéncias, a revista torna Claras as divergéncias estéticas e ideológicas que já se verificavam na Semana. Klaxon faz várias inovacöes no campo gráíico, visual e propagandis-lico. Teve apenas nove números e contou com a colaboraeäo de eseritores como Mario e Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Guilherme de Almeida, Sérgio Milliet, alem dc alguns colabora-dorcs europeus sem grande prestigio em seus países. No Rio de Janeiro, em 1924, é lancada a revista Estética, por Prudente de Moraes e Sergio Buarque 1' — "11 -de Hollanda. Em Minas, em 1925, o Modernismo tem início com A Revista, de Belo Horizonte, da qual partieiparam Carlos Drummond de Andrade, Emilio Moura, Pedro Nava e outros, No Rio Grande do Sul, também em 1925, surge a revista Madrugada. O ano de 1927 é ínarcado pela presenca de trés revistas: Terra Roxa e Outras Terras, de Säo Paulo; a revista Verde, de Cataguazes (MG); e Festa, do Rio de Janeiro. Em 1928, Oswald de Andrade funda a Revista de Antropofagia, porta-voz das idéias de seu movimento antropofagista. Simultaneamcnte á publicaeäo de obras e á fundaeäo dc revistas literárias, säo lancados vários manifestos e movimentos, os quais, alem de divulgar as propostas modernistas, permitem a troca de experiéncias entre seus participantes e até mesmo explicam ou justificam as obras dadas a publico, fomentando o debate de idéias. Desses movimentos, deslacam-se quatro, que representant, na verdade, duas tendéncias estético-ideológicas: de um lado os movimentos Pau-Brasil e Antropofagia; e, dc outro, o Vcrdc-Amarclismo c a Escola da Anta. no rte m TSSSeSeBSSSE/KKEE A Anta e o Tamanduá: a luta ideológica Quatro movimcntos marcaram a cultura brasileira nos anos 20. Na verdade, clcs representaram duas tendéncias ideológicas: de um lado os movimentos Pau-Brasil e Antropoťagia, cujo símbolo era o tamanduá, liderados por Oswald de Andrade; e, de outro, o Verde-Amarelismo e a Escola da Anta, cujo símbolo era a anta, liderados por Plínio Salgado. Ks Mm [fflrnrMii ■i '- 'Ii .ir,i'i I _j ■ 11 ii Pau-Brasil: a poesia de exportacäo Em 1924, estando em Paris, Oswald de Andrade lanca o Manifesto da Poesia Pau-Brasil. Tal qual a madeira pau-brasil fora o primeiro produto de exportacäo do Brasil-Colônia, Oswald desejava criar a primeira poesia de exportapäo brasileira, a poesia pau-brasil. Demonstrando revolta c irreveréncia contra a cultura académica e contra a domiiiacäo cultural européia em nosso pais, o movimento defendia a criacäo de urna poesia primitivista, construída com base em uraa revisäo critica de nosso passado histórico e cultural e na aceitacäo e valorizacäo das riquezas e contrastes da realidade e da cultura brasileiras, como ilustra este fragmento: Toda a história bandeirante e a história comercial do Brasil. O lado doutor, o lado citacôes, o lado autores conheeidos. Comovente. Rui Barbosa: urna cartola na Sencgämbia. Tudo revertendo em riqueza. A riqueza dos bailes e das frases feitas. Negras de jóquei. Odaliscas no Catumbi. Falar dificil. Do ponto de vista técnico, o manifesto propôe: a criapäo dc urna lingua brasileira ("A lingua sem arcaísmos, sem erudicäo"; "A contribuicäo milionária de todos os erros"); a síntese; o cquilíbrio; e a surpresa. No penúltimo parágrafo do texto, já se encontra o germe da idéia que daria origem, quatro anos mais tarde, á publicapäo do Manifesto Antropófago, do mesmo autor: a idéia da devora§äo e da digestäo cultural: Apenas brasileiros de nossa época. O necessário de química, dc mccänica, de economia e de balística. Tudo digeridó. Sem meeting cultural. Práticos. Experimentais. Poetas. Sem reminiscôncias livrescas. Sem comparacôes de apoio. Sem pesquisa etimológica. Sem ontológia. (Idem, p. 10.) Verde-amarelo e Anta: a reacäo Como reacäo ao tipo de nacionalismo defendido por Oswald de Andrade no Manifesto da Poesia Pau-Brasil e aos matizes anarquistas de seu autor, surge em Säo Paulo o grupo Verde-Amarelismo, constituído por Menotti del Picchia, Plínio Salgado, Guilherme de Almeida e Cassiano Ricardo. Dcfcndendo um nacionalismo ufanista, com evidenle inclinacao para o nazi-fascismo (conforme ficaria comprovado mais tarde, com a adesao de Plinio Salgado ao integralismo), o grupo alegava que o movimento Pau-Brasil era "afrancesado". Em 1927, tomando a anla e o indio tupi como simbolos da nacio-nalidadc primitiva, o grupo verde-amarelo transforma-se na Escola da Anta. A Antropofagia: a degluticáo cultural Revidando com sarcasmo o primitivismo xenó-fobo da Anta, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral c Raul Bopp lancam o mais radical de todos os movimentos do periodo: a Antropofagia. O movimento foi inspirado no quadro Abaporu ("antropófago", em tupi), que Tarsila oferecera a Oswald como presente de aniversário. I" c-'..Win r EEyQQHB ffľľffflf Partidarios de um primitivismo critico, os antropófagos propunham a d.-'.i i.i.. n -Ii cultura estrangeira. Em contraposicäo á anta, os antropófagos tomam o tamanduá como símbolo de seu movimento. As idéias do grupo těm como porta-voz a Revista de Anlropafagia, da qual também participam Antonio Alcantara Machado, Geraldo Costa e outros. Contrariamente á xenofóbia da Escola da Anta, os antropófagos näo negam a cultura estrangeira, mas também näo a copiam nem a imitam. Assim como os índios primitivos devoravam sen ininiigo, acredilando que assim assimilavam suas qualidades, os artistas antropófagos propoem a "devoracao simbólica" da cultura estrangeira, aproveitando dela suas movapocs artísticas, porém sem perder nossa propria identidade cultural. Trata-se, portanto, de um aprofundamento da idéia da "digestäo cultural" já proposta no Manifesto da Poesia Pau-Brasil. m ■BlIillIS ■p-, .r mm íliiSIl tfWjJHn ' í!-,i.i' lt?Tl»illllBHfitn« li E WEM WS i. H UM mí Söll fMfír í • ..ni WĚĚĚĚě BSnIIIIíÍ ■ŠBili WSěěěěěm Abaixo segucm dois tcxtos: o primeiro c constituído por alguns fragmentos do Manifesto Antropófago, e o segundo säo trechos do Nhenguagu Verde-Amarelo. Texto I So a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. Unica lei do mundo. Expressao mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religioes. De todos os tratados de paz. Tupy, or not tupy, that is the question. Contra todas as catequeses. E contra a mae dos Gracos. So me interessa o que nao e meu. Lei do homem. Lei do antropofago. Estamos fatigados de todos os maridos catolicos suspeitosos postos em drama. Freud acabou com o enigma mulher e com outros sustos da psicologia impressa. Nunca fomos catequizados. Fizemos foi Carnaval. O indio vestido de Senador do Imperio. Fingindo de Pitt. Ou figurando nas operas de Alcncar cheio de bons sentimentos Portugueses. Ja tinhamos o comunismo. Ja tinhamos a lingua surrealista. A idade de ouro. Catiti Catiti Imara Notiá Notiá Imara Ipejú. Lua nova O lua nova Assopra em Fulano Lembrancas de mim Contra a realidade social, vestida e opressora, cadastrada por Freud - a realidado sem complexos, sem loucura, sem prostituicöes e sem penitenciárias do matriareado de Pindorama. Oswald de Andrade Em Piratininga Ano 374 da Deglutigäo do Bispo Sardinha. {Apud Gilberto Mendonca Teles. Op. cit, p. 353-60.) Tambem näo conhecemos preconeeitos religiosos. O nosso catolicismo c demasiadamente tolerante, e täo tolerante, que os pröprios defensores extremados dele acusam a Igreja Brasileira de ser uma organizagäo sem forca combativa (v. Jackson Figueiredo ou Tristäo de Ataide). Näo hä tambem no Brasil o prcconccito politico: o que nos importa e a administraeäo, no que andamos acertadissimos, pois so assim consultamos as realidades nacionais. O grupo "verdamarelo", cuja regra e a liberdade plena de cada um ser brasileiro como quiser e puder; cuja condigäo e cada um interpretar o scu pais e o seu povo atraves de si mesmo, da propria determinaeäo instintiva; - o grupo "verdamarelo", ä tirania das sistematizacöes ideolögicas, responde com a sua alforria e a amplitude sem obstaculo de sua agäo brasileira. Nosso nacionalismo e de afirmagäo, de colaboragäo coletiva, de igualdade dos povos e das ragas, de liberdade do pensamento, de crenca na predestinaeäo do Brasil na humanidade, de fe em nosso valor de construeäo nacional. Aceitamos todas as instituigöes conservadoras, pois e dentro delas mesmo que faremos a inevitävel renovagäo do Brasil, como o fez, atraves de quatro seeulos, a alma da nossa gente, atraves de todas as expressöes historicas. Nosso nacionalismo e "verdamarelo" e tupi. O objetivismo das instituigöes e o subjetivismo da gente sob a atuagäo dos fatores geogräfico e histörico. Correio PauHstano, 17 de maio de 1929. (Idem, p. 360-7.) 1. Com base nos textos, comente em que se diferenciám os movimentos Antropofagia e Verde-Amarelismo/Anla quanto ao enfoque que däo: a) á religiäo; b) ao índio; c) ás instituigôes sociais. 2. Ambos os movimentos säo nacionalistas; contudo há diferengas de postura perante o país. O que significa "ser brasileiro" para cada um dos movimentos? Texto II Nhenguagu Verde-Amarelo (Manifesto do Verde-Amarelismo, ou da Escola da Anta) A filosofia tupi tem de ser forgosamente a "näo fŕlosofia". O movimento da Anta * baseava-se nesse princípio. Tomava-se o índio como símbolo nacional, justamente porque ele significa a auséncia de preconceito. Essa expressao de nacionalismo tupi, que foi descoberta com o movimento da Anta (do qual resultou um sectarismo exagerado c perigoso), é evidente em todos os lances da vida social e política brasileira. Nao há entre nós preconceitos de ragas. Quando foi o 13 de Maio, havia negros ocupando já altas posigoes no pais. E antes, como depois disso, os filhos de estrangeiros de todas as procedéncias nunca viram os seus passos tolhidos. -■i'.Tí1, I BIÉIÍHP n' O-j iXuílrad&i)} i\ŕ L*' "<"i.!ií '.i. ' ' ' Mi r-'!i<"'"i i n i'iir-l I..L I.J; .-I -ľr ■ . ii'ľ , I ■ . 'i- l-|i(-i ;.|! ľ, -II ]'víí' ' J, i -1 ''k- •-'(. n''.-' Hilt.'fýl-'M ''í í f ľl :;- Diferentes um do outro em quasc tudo - ideológia, partido politico, religiäo, postura artistka, cstilo literário, relacäo com o passado Oswald e Mário de Andrade formám as pilastras do Modernismo brasileiro. Foram os que com maior consisténcia realizaram o projeto maior do primeiro momente modernista: destronar a cultura académica e parnasiana e definir as bases de uma nova literatura brasileira, cujos reflexos ainda hoje se fazem sentir. swald e Mano dc Andradc representam a principal lidcranca no processo de implantaeäo e definicäo da literatura modernista no Brasil. Sem nenhum parentesco, conhecem-se ein 1917 e se tornám amigos afé 1929, quando, por razäo desconhecida, se separam para sempře. Embora muito diferentes quanto ao estilo, á ideológia e á forma de atuagäo na cultura brasileira, cada um deixou, ao seu modo, eontribuicôes decisivas. que se completaram. Paulo Mendes de Almeida, crítico de arte e amigo de ambos, comenta: Esses dois tipos täo diversificados de intelectual completavam-se admiravelmente. Mário era ruminante. Desconfiava do fácil e da propria ťacilidade. Era hörnern de pensar e repensar. A ele, pois, se adequava, pcrfcitamcutc, o papcl dc tcorista documcntado. Oswald, ao contrario, sc entregava ás primeiras idéias, quando ainda elas eram mais propriamente sensagôes ou sentimentos do que idéias. Era uma inteligencia a jato, com admirável poder de síntese [...] O poder da síntese pois e o poder da análise se conjugaram, nesse encontro dos Andrades de Säo Paulo [...] E foram cles, assim, o elemento de coesäo de todo o grupo, ao qual transfundiam audácia, seguranga e entusiasmo. (Apud Neids Rezende. A Semana de Arie Moderna. Säo Paulo, Ática, 1993. p. 13.) Oswald de Andrade: o an tropo (ago clo Modernismo A obra de Oswald de Andrade (1890-1954) representa um dos cortes mais profundos do Modernismo brasileiro cm relacäo á cultura do passado. Paulista, de família rica, Oswald cursa Direito e ingrcssa na carreira jornalística. Em 1911 funda a rcvista scmanal O PirraUio, que, com Alcantara Machado e Juó Bananére, dirige até 1917, quando é fechada. Nesse mesmo ano, em sua coluna no Jornal do Comévcio defende Anita Malfatti das críticas de Monteiro Lobato. Viaja frequentemente á Európa, onde faz várias amizades nos meios artísticos, o que Ihe permite estar a par das novidades introduzidas pelas correntes de vanguarda e, no Brasil, assumir um papel de lideranca. Em 1926, casa-se com Tarsila do Amaral. Em 1929, sofre um terrível abalo financeiro com a crise do café. Em 1930, casa-se pela quarta vez. Com sua esposa, a escritora comunista Patrícia Galväo (a Pagu), milita nos meios operários e, em 1931, ingressa no Partido Comunista, no qual pcrmanccc até 1945. Desse periodo säo as obras mais marcadas ideologicamente, como o Manifesto Antropófago, o romance Serafim Ponte Grande e a peca tcatral O ret da vela. Tal qual a obra que escrcveu, Oswald sempře foi debocha-do, irônico c crítico, pronto para satirizar os meios academie"" ou a propria burguesia, classe de que se originava. Seu conceito de nacionalismo era diferente daquele pregado pelos romänticos e mesmo por certos grupos modernislas, como o Verde-Amarelo e o Anta. Sem ser ingénuo e ufanista, Oswald defendia a valorizacäo de nossas origens, de nosso passado histórico-cuttural, mas de forma erítica, isto č, recuperanď* parodiando, ironizando e atualizando nossa história de colonizacäo, como faz neste poema: as meninas da gare Eram trés ou quatro mocas bem [mogas e bem gentis Com cabelos mui pretos pelas [espáduas E suas vergonhas täo altas e täo [saradinhas Que de nós as muito bem [olharmos Näo tínhamos nenhuma vergonha {Em Poesies reunidas. 5? ed. Rio de Janeiro, Civilizacäo Brasileira, 1978. p. 80.) Hei ■mm ■y? BQ3H8I WĚĚĚ ■BIS mmSm mE!3EmĚ Sua visao do Brasil, ao mesmo tempo que procura captar a natureza c as cores proprias do pais, flagra igualmente as contradicoes moderno-primitivas de nossa realidade. Essas duas posturas podem ser observadas, respectivamcnte, nestes poemas: bucólica Agora vamos correr o pomar antigo Bicos aereos de patos selvagens Telas verdes entre folhas E uma passarinhada nos vaia Num tamarindo Que decola para o anil Arvores sentadas Quitandas vivas de laraujas maduras Vespas (Idem, p. 99.) cidade Foguetes pipocam o ecu quando em quando Ha uma nioja magra que entrou no cinema Veslida pela ultima fita Conversas no jardim onde crescent bancos Sapos Olha A ilumina9ao e de liulha branca Mamaes estito chamando A orqucstra rabecoa na mata (Idem, p. 106.) Uma das propostas mais importantes do projeto artistico de Oswald e a ruptura com os padroes da lingua literaria culta e a busca de uma prosodia brasilcira, que incorporasse todos os "erros" gramaticais, vistos por ele como verdadeiras contribuicoes para a definigao da nacionalidade. O poema abaixo ilustra essa proposta: pronominais Dě-me um cigarro Diz a gratnática Do professor e do aluno E do mulato sabido Mas o bom negro e bom branco Da Nacäo Brasileira Dizem todos os dias Deixa disso camarada Me dá um cigarro (Idem, p. 125.) Quanto á construsao dos textos, Oswald eria uma linguagem nova entre nós, que se caracteriza pela síntese, pelas rupturas sintáticas e lógicas, pelas imagens bruscas, pela fragmentacao e, ás vezeš, pela técnica dadaísta do ready-made. Esta pode ser observada neste poema, eriado a partir da linguagem estereotipada dos convites: maturidade O Sr. e a Sra. Amadeu Participam a V. Exa. O feliz nascimento De sua filha Gilberta (Idem, p. 161.) Reconhecido por muitos mais como intelectual ativista e demolidor do que propriamente como escritor construtivo, Oswald de Andrade e sua obra sempre foram olhados com reserva por parte da critica e do publico. Alguns criticos importantes, contudo, tem-se empenhado nas ultimas decadas em lhe atribuir o devido valor. A poesia Toda a poesia de Oswald de Andrade pode atualmente ser encontrada num unico volume, intittilado Poesias retmidas, no qual cstao incorporados os livros Pau-hrasil, Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade, Poemas menores, Cäntico dos cánticos para flauta e violäo e O escaravelho de ouro. Em toda essa produfäo podem ser encontradas as atitudes permanentes que singularizaram a poesia oswaldiana na primeira fase do nosso Modernismo: o humor misturado ao lirismo, a piada e a imaginacao, os lugares-comuns usados poeticamente, a concisäo, a fala popular, a caricatura da retórica, a ironia, os flashes cinematográfícos, além de outros aspectos já citados, como as rupturas sintáticas c a fragmentapäo. brasil O Zé Pereira chegou de caravela E preguntou pro guarani da mata virgem - Sois cristao? - Náo. Sou bravo, sou forte, sou fílho da Mořte Teteré tetě Quizá Quizá Quecé! Lá longe a 0119a resmungava Uu! ua! uu! O negro zonzo saído da fornalha Tornou a palavra e respondeu - Sim pela graga de Deus Canliem Babá Canhem Babá Cum Cum! E fizeram o Carnaval {Em Paeaias reunidas, p. 169.) 1. Buscando únia revisäo de nosso passado histórico-cultural, o poéma faz referencia a trés ragas: a) Qual é a raca representada po r Zé Pereira? Justifique. b) Qua! a importáncia dessas trés ragas para a cultura brasileira? 2. Os versos "Sou bravo, sou forte/sou fílho do norte" pertencem ao poéma 'I-Juca Pirama', do poeta romäntico Gongalves Dias. a) Que novo sentido ganha o verso com a alteracäo de norte para morte? b) Qual o nomc dcssc procedimento, frcqúcntcmcntc cmpregado pelos modernistas da primeira geracäo? 3. Identifique no texlo elementos que comprovem seu tom de piada e irónia. 4. Historicamente, as trés ragas mencionadas fazem parte de nossa formacäo étnica e cultural. No entanto, no poéma, é com irónia e humor que Oswald a elas se refere. a) De acordo com o texto, a que deiam origem essas tres ragas? b) Identifique qual é o signifieado do carnaval para a cultura brasileira, na visäo do autor, expressa no poéma acima, e neste trecho do Manifesto da Poesia Pau-Brasil: "O Carnaval no Rio é o acontecimento religioso da raga. Pau-Brasil. Wagner submerge ante os cordôes do Botafogo. Bárbaro e nosso. A íbrmagäo étnica rica". Divida a classe em quatro grupos. Čada grupo deve falar ritmadamente, em voz alta, primeiro isoladamente, depois todos juntos, várias vezeš, os seguintes versos do texto: grupo 1: "Sou bravo, sou forte, sou filho da Mořte"; grupo 2: "Tctcré teté Quizá Quecé!"; grupo 3: "Uu! Ua! Uu!"; grupo 4: "Canhem Babá Canhem Babá Cum Cum!". Justifíque o tílulo do poema, considerando o resultado musical obtido e seu conteúdo. A prosa e o teatro O romance foi o gčnero da prosa que mais despertou o interesse de Oswald de Andrade. O autor estreou na prosa em 1922, com o romance Os condenados, primeiro volume da intitulada Trilógia do exilio, que incorpora ainda os volumes Estrela do absinto (de 1927, mas eserito antes de 1922) e Escada vermelha (1934). Contudo, a principal expressäo em prosa do eseritor säo os romances Memórias sentimenlais de Joäo Miramar (de 1924, mas eserito desde 1916, segundo o autor) e Serafim Ponte Grande (1933), umbilícalmente ligados ás idéias dos movimentos Pau-Brasil e Antropofagia. Essas obras representam o amadurecimento c a radiealizacao do emprego de certas técnicas ainda incipientes na Trilógia do exilio, tais como mescla de prosa e poesia, estrutura fragmentária, estilo elíptico e telegráfico, satira paródica, linguagem jornalística, aproveitamento de lugarcs-comuns da linguagem cotidiana, como discursos, bilhetes, anotagóes, cartas, etc. Memórias sentimentais é um romance fragmen-tário, formado por 163 capítulos-relampago, sem preocupagäo com seqiiéncia logica. Baseada em muitas das experiěncias do autor, a obra narra a história de um paulista de família burguesa que trilha os caminhos comuns á classe, na época: estudos, viagem á Európa, casamento, aventuras amorosas, erise financeira, falěncia, etc. A título de exemplo, transerevem-se dois capítulos da obra: Gare do infinito Papai estava doente na cama e vinha um carro e um homem e o carro ficava esperando no jardim. Levaram-me para uma casa velha que fazia doces e nos mudamos para a sala do quintal onde tinha uma figueira na jane]a. No desabar do jantar noturno a voz toda preta de mamae ia me buscar para a reza do Anjo que carregou meu pai. Férias Dezembro deu á luz das salas enceradas de tia Gabriela as trés mogas primas dc óciilos bem falados. Pantico norte-americava. oswald de andrade Memorias Sentimentaes dc Joäo Miramar Foi no campo do teatro que Oswald de Andrade estreou na literatura, em 1916, com as pegas Leur dme e Mon coeur balance, eseritas em francés com a colaboracao do poeta modernista Guilherme de Almeida. Entretanto, a verdadeira contribuigáo do eseritor ao teatro nacionál ocorreu apenas na década de 30, com o langamento de třes importantes textos dramáticos: O homem e o cavalo (1934), O rei da vela (eserita em 1933 e publicada em 1937) e A morta (1937). O ret cla vela é, sem dúvida, a mais significativa das trés pegas, 'anto pelas inovagoes técnicas ipte apresenta em relacao á jpoca, quanto pelo retrato e pela crítica que faz da sociedade jrasileira dos anos 30. Eis o enredo de O rei da vela: [...] a decadencia da economia cafeeira, os dramas da incipiente industria nacional sem mercado interno, a luta de classes e dentro das proprias classes no poder: - a burguesia industrial vinda da agiolagem que se deixa envolver e absorver pelo imperialismo nortc-amcricano para conseguir sobreviver. Entre a usura e as traficancias do mundo dos negocios, a decadencia do amor burgues e da propria sociedade capitalista. (Mario da Silua Brito. Apud Maria Augusta Fonseca, Oswald de Andrade. Sao Paulo, Brasiltense, 1982. p. 70-1.) Apesar de sua importancia, a peca foi levada ao palco do Teatro Oftcina apenas em 1967-8. Fazendo parte do surto tropicalista que promoveu uma releitura das obras de Oswald, a montagem da pe9a causou grande rcpcrcussao na cpoca, contribuindo para o clima de cfcrvcsccncia cultural que caracterizou os anos 60. vanguarda e tradigao Mario de Andrade (1893-1945) nasceu em Sao Paulo, cidadc que amou intensamcnte c que retratou em varias de suas obras. Estudou musica no Conservatory Musical de Sao Paulo e cedo iniciou sua carreira como critico de arte, em jornais e revistas. Com apenas 20 anos e com o pseudonimo de Mario Sobral, publicou seu primeiro livro, Hd uma goto de sangue em cada poema, no qual fazia criticas a carnificina produzida pela Primeira Guerra Mundial e defendia a paz. As inovacoes formais da obra desagradaram aos criticos de orientacao parnasiana. O autor teve um papcl decisivo na implanta9ao do Modernismo no Brasil. Homem de vasta cultura, pesquisa-dor paciente, Mario soube dar a substantia teorica de que necessitava o movimento em alguns momentos decisivos: em 1922, meses apos a Semana, publica o seu Prefdcio interessanttssimo; e em 1925, momcnto cm que se articula-vam revislas e movimentos por todo o pais, langa o ensaio A escrava que nan e Isaura, no qual retoma e aprofunda suas consideragoes iniciais sobre arte moderna. mmm Autor de uma frase como "o passado e ligäo para se meditar e näo para se reproduzir", o que mais impressiona em Mario de Andrade e a capacidade de conciliar, em plena euforia da "destnÜ9äo" dos primeiros embates modernistas, as Ü9Öes do passado e as conquistas do presente. Ja eiri 1921, Mario aceitava värias das propostas formais do futurismo italiano, mas rejeitava-lhe a postura radicalmcnte destruidora. E foi com cssa sere-nidade e equilibrio que Mario conduziu toda a sua obra. Essa mesma postura de rever o passado, e näo ncgä-lo radicalmente, levaria Mario a escrever ensaios de critica literaria de inestimävel valor, que chegaram a alterar a visäo da critica vigente sobre certos autores do passado. A par da literatura, Mario tambem revelou interesse pela musica, pelo folclore, pela antropologia, pela etnografia, pela psicologia e por outras areas do conhecimento humano que podiam contrtbuir com suas atividades essenciais de escritor e müsico (pianista, professor de müsica e compositor). Empreendeu värias viagens pelo Brasil, inicialmente como mero "turista aprendiz" e depois como pesquisador. Passou pelas cidades hisloricas mineiras, pelo Norte e pelo Nordeste do pais, recolhcndo materiais e anotando informa9oes de interesse cultural, tais como poemas e can90es populäres, modinhas, ritmos, festas religiosas e de folia, lendas e musicas indigenas, objetos de arte, etc. Mario foi ainda diretor do Departamento de Cultura da Prefeitura de Säo Paulo, funcionärio do Servi90 do Patrimonio Historico, do Ministerio da Educagäo e professor universitärio,^ sempre prestando servi90s de grande valor na area da cultura e da educa9äo. Muito mais do que como mera satisfa9äo pessoal, Mario encarava sua intensa atividade cultural como missäo, isto e, queria ser ütil no processo de reconstrugäo de um Brasil que mudava social, politica, economica e culturalmente. Esse compromisso com o seu tempo e com o seu pais -que fez de Mario um homem publico e um dos nacionalistas mais saudäveis que o Brasil conheceti - certamente Ihe trouxe compensa9Öes c decepgöes (muitas foram as decep-göes colhidas no trato com os govemantes, em especial durante a ditadura de Vargas). E e com a mesma humildade, auto-exigencia e senso critico, que sempre lhe foram peculiares, que Mario avalia, em 1942, tres anos antes de sua morte, o rcsultado de seus esfor90s: Näo tenho a minima reserva ém atirmar que toda a minha obra representa uma dedieagaö felíz a problemas do meu tempo e minha terra. Ajudei coísaš, maquinci coisas, fiz coisas, muita coisa! E no entanto mé sobra agora a sentenga de que fiz muito pouco, porque todos os; ineus feitos derivaram duma ilusäo vasta. Eeu que sempre me pensei, me senti mesmo, sadiamente banhadö de amor humano, chego no declínio da vida A conviegäo de que faltou humanidade em mim. Meu aristoeracismo me puniu, Minnas intengöes me enganaram. Vitima do meu individualismo, procurö em väo nas minhas obras, e também nas de muitos companheiros, uma paixäo mais temporánea, uma dor mais viril da vida. Näo tem. Tem mais é uma antiquada auséncia de realidade em muitos de nós. A poesia: um canto de amor a Säo Paulo e ao pais Já tendo publicado Há uma gota de sangue em cada poema, sua primcira obra modernista, de tato, foi Pauiicéia desvairada (1922). Vista hoje como uma obra que näo aleaucou um estágio mais elevado de poesia, na época ela agradou ao grupo modernista, pois cumpriu o seu papel de destruir os padrôes literários vigentes e propor uma nova linguagem poética baseada no verso livre, nas rupturas sintáticas, nos flashes cincmatográficos, nos neologismos, na clisäo e na fragmenlacäo. O poema de abertura da obra, 'Inspiraeäo', ilustra bem o emprego desses procedimentos formais, ao mesmo tempo que lanca a cidade de Säo Paulo, cidade natal do poeta, como uma de suas mais importantes fontes temáticas. Inspiracao Sao Paulo! comocao de minha vida... Os meus amores sao flores feitas de original... Arlequinal!... Traje de losangos... Cinza e ouro... Luz e bruma... Forno e inverno morno... Elegancias sutis sem cscandalos, sem crimes... Perfumes de Paris... Arys! Bofetadas liricas no Trianon... Algodoal!... Sao Paulo! comojao dc minha vida... Galicismo a berrar nos desertos da America! (Em Poesias completas, p. 39.) Em 1926, Mario publica Losango cáqui, uma obra de poemas eseritos em 1922 e que, portanlo, segue a orientaeäo dos poemas "desvairistas". Em Cla do jabuti (1927) e Remote de males (1930), obras eseritas entre 1923 e 1930, Mario emprega o resultado das pesquisas folclóricas que empreendeu pelo Brasil entrc 1924 e 1927, iniciando um periodo de grande feeundidade, do qual nasceria Macunaima. Buscando o conhecimento e o registro do Brasil e de suas manifestacoes culturais, Mario introduz nessas obras as lendas, os costumes e o modo de falar regionais, os ritmos e as dancas populäres: samba, coco, toada, modinha. A partir de 1930, a poesia de Mario de Andrade sofre uma mudanca de orientaeäo, possivelmente iníluenciada pela Revolucäo de 1930. Esse fato näo é isolado: definitivamente implantado o Modernismo, toda a literatura se volta para a reflexäo, a análise e a denúncia dos problemas nacionais. A poesia de Mario entäo persegue duas diregöcs: de um lado a poesia intimista c introspectiva, serena ou conflitante, de que é exemplo a obra Poesia (1942); de outro, a poesia política, de combate ás injusticas sociais, fazendo uso de uma linguagem agressiva e explosiva, de que säo exemplo as obras O carro da miséria e Lira paulistana (1946). Este fragmento do belo poema 'Meditacao sobre o Tieté', que integra a obra Lira paulistana, ilustra esse misto de lirismo e crítica sociál: É nořte. E tudo é noite. E o meu coracao devastado K um rumor de germes insalubres pela noitc insonc c humana. Meu rio, mcu Tieté, onde me levas? Sarcástico rio que contradizes o curso das águas E te afastas do mar e te adentras na terra dos homens. Onde me queres levar?... Por que mc proíbes assim praias e mar. por que Me impedes a fama das tempestades do Atlántico E os lindos versos que falam em partir e nunca mais voltar? ■ Rio que fazes terra, humus da terra, bicho da terra, Me induzindo com a tua insisléncia turrona paulista Para as tempestades humanas da vida, rio, meu tio!... Porque os homens näo me eseutam! Por que os governadores Näo me eseutam? Por que näo me eseutam Os plutoeratas e todos os que säo chefes e säo fezes? Todos os donos da vida? Eu lhes daria o impossível e lhes daria o segredo, Ku lhes dava tudo aquilo que líca pra cá do grito Metálico dos números, c tudo O que está além da insinuacäo eruenta da posse. ............................................. Rio, meu rio... mas porém há de haver com certeza Outra vida melhor do outro lado de lá Da serra! E hei de guardar silôncio! O que eu posso fazer!... hei de guardar siléncio Deste amor mais perfeito do que os homens?... (Idem, p. 358-69.) BI i A prosa: cxperimentalismo e crítica social A atividade literária em prosa do autor foi ampla. Cultivou o conto: Primeiro andar (1926) e Contos novos (1946); a crónica: Os filhos da Candinha (1945); o romance: Amav, verbo intransitivo (1927); e a rapsódia: Macunjuma_ "Em quase todas essas obras se destaca a preocupacäo do autor em descobrir e explorar novas técnicas narrativas e, ao mesmo tempo, sondar o universo social e psicológico do ser humano nas grandes cidades. Contos como 'Primeiro de maio', 'Peru de natal', 'Vestida de preto' e outros conciliam com perfeicäo a análise das relacöes familiäres e sociais com a introspccfäo psicológica, fundada em teorias de Freud. c }.< it. O romance Amar, verba intransitivo causou impacto quando publicado. Desafiando preconeeitos, a obra tematiza a descoberta do amor entre Carlos e Fräulein, uma governanta oficialmcnte contratada pelo empresário Souza Costa para ensinar alemäo e piano a seus filhos, mas na verdade - segredo que só existia entre a professora e o empresário - ela deveria iniciar Carlos, o filho adolescente, na vida sexual. De todas as obras em prosa, foi Macunaima a obra-prima do autor e, provavelmente, a mais importante^ reaüzaeäo da_ primeira fase do Modernismo. A obra representa näo apenas o resultado das pesquisas e das qualidades do autor como poeta, prosador,_musico_e^a^onsta, mäš também a plena realiza9äo do ^projeto nacionalista dos eseritores que formaram a sua gcra9äo. O ponto de partida da obra foi a leitura que Mario fez da obra Vom Roraima zum Orinoco, do etnógrafo alemäo K och-Grünberg, £ue TOlheujrra_ Amazônia (Brasil e Venezuela), entre I9T1 e 1913, mri ciclo de Íenďas_dos jndios tauhpangues c areeunái."MáriTjTlž~algTrmas modifica9Öes na lenda original,_acrescentou-lhe_outras lendas, de origens diversas, mcluiu angdotas da história ferasfleira,. aspectos äajviHa urjjana e rural do pais, introduzm" personagens reais e fíctícias, sem deixar de fóra a řeiticaria, o erotismo e o absurdo surrealista. No nívcl da ljuj^JLjaíjibém se verifica uma verdadeira nuscelánea, formada por vocábulos indígenas, africanos, frases feitas, expressôes e jjrovérbiosjopuiares, gírias, tudo isso formando um estilo narrativo dinämico e irônico, como num delicioso painel antropofágico da cultura brajfllélŕa. Mario de Andrade relata que, ao criar a obra, näo desejava inventár Mmbolos nem urna personagemque rcprcscniassc todos os brasilciros. No entanto, á medida que dava vida ao herói da lenda colhida por Grünberg -curiosamente,_herói por suas "desqualidades" de preguÍ9oso, mentiroso, covarde, etc. -, foi percebendo inúmeras semelhancas entre ele e ós~ brasileiros ou os latino-americanos em geral, que säo, segundo o autor, povos "sem nenhum caráter": Com a palavra caráter näo determino apenas a realidade moral näo, em vez entendo a entidade psíquica permanente, se mamfeslando pur tudo, nos / costumes na aeäo exterior no sentimento na lingua na História na andadura, v-> tanto no bem como no mal. O brasileiro näo tem caráter porque näo possui nem civilizacäo propria nem consciéncia tradicional. Perseguindo a tradifäo das can9Öes de gesta, das epopéias, das novelas picarescas e dps cóntos populäres - enfim, perseguindo a tradÍ9ao oral da literatura —, Macunaima foi com propriedade chamada de rapsódia por Mário, que emprestou esse nome da música, por designar composÍ9ao que" envolvc uma variedade de motivos populäres. Contudo, a designa9äo de romance näo lhe é de todo inadequada, já que a obra apresenta semelhan9as com os romances medievais. A seguir, voce lerá um fragmento do capítulo VIII de Macunaima. Suas circunstäncias säo estas: depois de Macunaima, persoiiagem, ter nascido ás margens do mitico rio Uraricoera e simbo-licamente matado a mäe, parte com os irmäos Maanape e Jigué em busca de aventuras. Na viageni Macunaima encontra Ci, Mäe do Mato, rainha das indias amazonas e, com a ajuda dos irmäos, consegue dominá-la e tš-la como esposa, tornando-so assim o imporador da Mata-Virgem. Com Ci, Macunaíma tem um filho (quebrando, portanto, pela segunda vez, as tradicôes da tribo das amazonas), o qual vem a morrer; em seguida Ci igualmente morre, virando estrela. Antes de morrer, porém, Ci lhe dá a muiraquitä, um amuleto, que vai parar nas mäos do vi läo da história, o gigante comedor de gente Venceslau Pietro Pietra. A exemplo das epopéias, em que o herói é um eterno viajante em busca de um ideal, Macunaima c seus irmäos dirigem-se a Säo Paulo, onde mora o gigante, dando continuidade a uma série de viagens e aventuras. No episódio a ser lido, o herói so encontra no Rio de Janeiro, depois de ter ido a um terreiro de maoumba encomendar um "trabalho" contra Venceslau, Macunaíma tremia que mais tremia e o urubu sempře fazendo necessidade em riba dele. Era por causa da pedra ser muito pequetitinha, Vei vinha chegando vermelha e toda molhada tle suor. E Vei era a Sol1. Foi muito bom pra Macunaíma porque lá em casa cle sempře dera presentinhos de bolo-de-aipim pra Sol lamber secando. Vei tornou Macunaíma ua jangada que tinha uma vela cor-de-ferrugem pintada com muruci2 e fez as trés fílhas limparem o herói, catarem os uarrapalos e examinarem si as unhas dele estavam limpas. E Macunaíma tícou alinhado outra vez. Porém por causa dela estar velha vermelha e tao suando o herói nao maliciava que a coroca3 era mesmo a Sol, a boa da Sol poncho dos pobres4. Por isso pediu pra ela que chamasse Vei com seu calor porque estava ele lavadinho bem mas tremendo de tanlo frio. Vei era a Sol mesmo c andava matinaudo fazer Macunaíma genro dela. Só que ainda nao podia aquentar ninguém nao, porque era cedo por demais, nao tinha forga. Pra distrair a espera assobiou dum jeito e as tres fílhas dela fizeram muitos cafunés e cosquinhas no corpo todo do herói. Ele dava risadas chatas, se espremendo de cócegas e gostando muito. Quando elas paravam pedia mais estorcendo já de antegozo. Vei pós reparo na senvergonhice do herói, teve raiva. Foi ficando sem vontade de tirar fogo do corpo e esquentar ninguém. Kntao as eunhatas agarraram na máe, amarraram bem ela e Macunaíma dando muitos munhecaeos na barriga da bruaca5, saiu que saiu um fogaróu por detrás c todos sc aquentaram. Principiou um caloráo que tornou a jangada, se alastrou nas águas e dourou a face limpa do ar. Macunaíma deilado na jangada lagarteava numa quebreira6 azul. E o silčncio alargando tudo... - Ai... que preguiga... O herói suspirou. Se ouvia o murmurejo da onda, só. Veio um enfaro feliz su-bindo pelo corpo de Macunaíma, era bom... A eunhatá mais moca batia o urucungo7 que a mác trouxera da Africa. Era vasto o páraná c nao tinha uma nuvem na grupiara elevada do céu. Macunaíma cruzou as munhecas no alto por detrás fazendo um cabeceiro com as máos e enquanto a filha-da-luz mais velha afaslava os mosquiíos borrachudos em quantidade, a terceira chinoca8 com as pontas das trancas fazia cstrcmcccr dc gosto a barriga do herói. E era sc rindo em plena felicidade, parando pra gozar de estrofe em estrofe que ele cantava assim: Quando eu morrer nao me chores, Deixo a vida sem sodade; - Mandu sarará, Tive pro pai o desterro, Por mae a infelicidade, - Mandu sarará, Papai chegou e mc disse: - Nao hás de ter um amor! - Mandu sarará, As notas seguřntes foram extraídas do Roteiro de Macunaíma, de M. Cavalcanti Proenca, ou tomaram por base indicacöes nele presentes. Na lenda taulipangue o sol é masculino, porém Mario de Andrade o fez feminino - a Sol - por influéncia da forma tupi - Coaraci -, cnja desinčncia ci quer dizer mäc. 2 muruci: planta. 3 coroca; termo de origem tupi. Significa louco, caduco pela idade. poncho dos pobres: o sol. A expressäo é de grande beieza poética, pois poncho é o agasalho típico dos gaúchos e das populacöes andinas. bruaca: niulher velha, feia, repelenle. quebreira: prostraeäo, fadiga, moleza. urucungo: espécic dc bombo grosseiro usado pelos negros. chi/wca: diminutivo de china (mulher) no linguajar do pampa. Era bom... O corpo dele relumeava de ouro cin/ando nos cristaizinhos do sal e por causa do cheiro da marcsia, por causa do remo pachorrento de Vei, e com a barriga assim mexemexendo com cosquinhas de mulher, ah!... Macunaima gozou do nosso gozo. ah!... "Puxavante!9 que filha-duma... de gostosura, gente!" exclamou. E cerrando os olhos malandros, com a boca rindo num riso moleque safado de vida boa, o heröi gostou gostou e adormeccu. Quando a jacumä10 de Vei näo embalou mais o sono dele Macunaima acordou. La no longe se percebia mais que tudo urn arranhaceu cor-de-rosa. A jangada estava abicada na caicara da maloca sublime do Rio de Janeiro. Ali mesmo na beira d'ägua tinha um cerradäo comprido cheinho da ärvore pau-brasil e com paläcios de cor nos dois lados. E o cerradäo era a avenida Rio Branco. Ai que mora Vei a Sol com suas tres filhas de luz. Vei queria que Macunaima ficassc genro dcla porque afinal das contas ele era um heröi e tinha dado tanto bolo-de-aipim para ela chupar secando, falou: - Meu genro: voce carece de casar com uma das minhas filhas. O dote que dou pra ti e Oropa Franca e Balua". Mas porem voce tern de ser fiel e näo andar assim brincando com as outras cunhäs12 por ai. Macunaima agradeceu e prometeu que sim jurando pela memoria da mäe dele. Entäo Vei saiu com as tres filhas para fazer o dia no cerradäo, ordenando mais uma vez que Macunaima näo saisse da jangada para näo andar brincando com as outras cunhäs por ai. Macunaima tornou a prometer, jurando outra vez pela mäe. Nem bem Vei com as tres filhas cntram no cerradäo que Macunaima ficou cheio de vontade de ir brincar com uma cunhä. Acendeu um cigarro e a vontade foi subindo. L;i por debaixo das ärvores passavam muitas cunhäs cunhe cunhe se mexemexendo com talcnto c formosura. - Pois que o fogo devore tudo! Macunaima exclamou. Näo sou frouxo agora pra mulher me fazer mal! E uma luz vasla brilliou no cerebro dele. Se ergueu na jangada e com os bracos oscilando por cima da pätria decrelou solene: - POUCA SAUDE E MUITA SAÜVA, OS MALES DO BRASTL SÄO!13 Pulou da jangada no sufragante, foi fazer continencia diante da imagem de Santo Antonio que era capitäo de regimento e depois deu em cima de todas as cunhäs por ai. Logo topou com uma que font varina14 Id na tertinha do compadre chegadinho-chegadinho e inda cheirava no-mais! urn fartum bem de peixe. Macunaima piscou para ela e os dois vieram na jangada brincar. Fizeram. Bastante eles brincaram. Agora estäo se rindo um pro outro. (Ed. erftica de Tela Porto A. Lopez. Rio de Janeiro/Säo Paulo, Livros Teenicos e Cientiticos/Secretaria da Cultura, Ciencia e Tecnologia. p. 65-8.) Puxavante: empuxäo, puxar com forca. E tambcm amasia, conctibirta. Jacumä: lerne, timäo. Oropa Franpa e Balua: "Ele me dava de dote/Oropa, Franca e Bahia", versos sertanejos. Cunhä: mulher mestica e jovem; fetnea de qualquer animal, mulher. POUCA SAUDE...: o distico prende-sc äs referencias de todos os cronistas ao estrago feito por essas formigas nas lavotiras dos colonizadores e ä celebre fräse de Saint-Hilaire: "Ou o Brasil acaba com a sauva ou a saliva acaba com o Brasil". O pouca saude vem de outra frase celebre, do prof. Miguel Pereira: "O Brasil e urn vasto hospital". Varina: vendedora ambulante de peixe, do norte de Portugal. 1. Mario de Andrade buscava criar em Macunaima uma lingua brasileira, sintesc da lingua portuguesa falada no Brasil, com todas as variances regionais, as influéncias estrangeiras e as alteraföes da criatividade popular, O proprio autor deixa suas marcas ao empregar si, milhtir, e siquer, por entender que é assim que o brasileiro pronuncia essas palavras. Com o auxilio do professor e da classe, indique a procedencia destes varios registros de lingua presentes no texto: a) "aipim", "muruci", "cunhäs"; b) "urucungo"; c) "senvergonhice", "mexemexendo"; d) "em riba". 2. A cultura popular e o folclore säo o material que serviu de base para a construgäo da obra Macunaima. Ideritifique no texto elementos que justiftquem essa afirmacäo. 3. Destaque do texto uma situacäo que exemplifíque o contraste primitivo x civilizado, constante na obra. 4. Caractcrize a personagem Macunaima a partir de suas ai^oes ao longo do texto. 5. Macunaima trai o pacto feito com Vei e, por isso, perde a imortalidade e a oportunidade de iniciar uma grande civilizacäo tropical, filha da luz, como a indiána, a chincsa c a astcca. a) O que esse fato revela sobre o caráter de Macunaima? b) Se tomarmos Macunaima como representante do homem brasileiro, que crítica Mario faz sobre nossas relates com o estrangeiro? c) Considerando as caractcristicas de Macunaima, voce acha que ele simboliza a alma nacionál? Justifiquc. Por raeio de Manuel Bandeira e Alcantara Machado, o Modernismo, em sua primeira fase, pode alargar sens horizontes e diversiiicar suas experiěncias. Com Bandeira, porque sua poesia conseguiu resgatar o lirismo pqético, quase abandonado pejosjJemais modernistas na fase de luta antiacadřmica. E com Alcantara Machado porque sua prosa conciliou as inovacócs tccnicas c a linguagem jornalistica com a fala coloquial dos meios italojaulistas. C Manuel Bandeira (1886-1968) compoe, juntamente com Oswald e Mario de Andrade, a triade maior da primeira fase modernista, responsável pela divulgacäo e pela solidiltcagáo do movimento em nosso pais. O poeta nasceu em Recife, fez estudos secundários no Rio e iniciou o curso de Arquitetura em Säo Paulo, mas foi obrigado a abandoná-lo, cm virtude de uma crisc da tuberculose que nele se manifestara em 1904. 'l'rata-sc cm várias cidades do pais e, inclusive, na Suica, entre 1916 e 1917, onde » conhece o jovem e mais tarde famoso escritor frances Paul Eluard, internado na mesma clinica. UHIIH! fflfwSl Eluard coloca Bandeira a par das inovacôes artísticas que vinham ocorrendo na Europa e discute com o nosso poeta as possibilidades do verso livre na poesia. Esse aspecto técnico já fazia parte das préóčupacoéV'a'e Bandeira, que mads tarde será considerado o mestre do verso livre no Brasil. Inicialmente interessado por music a ^ ju-qtijtejjtr a.. o proprio Bandeira confessa tcr descoberto a poesia (näo como leitor, mas como poeta) por acaso, na condiväo de doente em repouso. distante da vida prática e cheia de aventuras dos outros adolescentes. Os temas mais comuns de sua obra. marcada pela jsxperiencia da doen9a e do isolamento advindo dela, säo, dentre outros, §_pjüxao pela vida, a morte, o amor e o erotismo, _a. solidäo, a angústia existencial, o cotidiano e a infäncia. Embora pressentísse a chegada _da_ morte a qualquer instante e vivesse cada dia apaixonadamente, como se fosse o tiltimo, Bandeira viveu 82 anos, e sua obra é um rico testemunho da poesia.brasileira do ultimo século, envolvendo criacôes que väo de um gós-Parnasianismo_ c de urn^poVŠimbolismo ás expe-riéncias côňcŕetistas das décadas de 50 e 60 do século XX. Bandeira e o Modernismo Em 1922, Bandeira morava no Rio de Janeiro e estava, porlanto, dis-tanciado do grupo paulista que centralizava os ataques á cultura oficial e propunha mudan9as. Embora tivesse conhecido Mário de Andrade - de quem séria grande amigo ^em^ľ921^no Rio. Bandeira buscou sempre urna jaiua^äojraijs Jsolada. j^_Semana de Arte Moderna, por exemplo, pre-jeriujiäoir pessoalmente e enviou o famoso poema 'Os sapos', que, lido por R^naJdiÍ£.CÍarva:]lioLtum q Teatro Municipal. Essa parttcipa9äo distanciada é explieada pelo proprio Bandeira em sua obra em prosa Itinerário de Pasárgada, uma espécie de autobiografia lírica: Também näo quisemos, Ribeíro Couto e eu, ir a Säo Paulo por ocasiäo da Semana de Arte Moderna. Nunoa atacamos publicamente os mestres parnasianos e simbolistas, nunca repudia-mos o soneto nem, de um modo geral, os versos metrifieados e rimados. Pouco me deve o movimento; o que eu devo a ele é enorme. Alem disso, quando se realizou a Semana de Arte Moderna, Bandeira já publicara dois livros, A cinza das horas (1917) e Camaval (\919), em que se verificam influéncias pós-simbolistas. Sua adesäo jk_técnicas modernistas deu-se gradativamente, á medida queJvííT_naJřerwya^ao ji t u5ica alternativa a siiia poesia","qüe näo se cbnformava mais ás antigas fórmulas de expressäo. Mais do que modismo ou oporttmismo, o Modermsmo impunha-se como condÍ9ao á continuidade de sua poesia. E, assim, o poeta que em 1918 eserevera 'Os sapos' publicaria em 1924 0 ritinojdlssoIutoLobm de transjgäo^ e_eniJ930 Libertinagejn, obra de plena rňaturidade modernista, das "paiavras em liberdade". É de Libertinagem, por exemplo, o poema 'Poética', estudado no capítulo 26. Desse modo, diferentemente dos jovens rcbeldes, que em grande parte tinliam uma postura mais radical ante a cultura do passado, Bandeira veio a ser um dos trés mais importantes eseritores da primeira fase e um dos pontos mais altos da poesia lírica nacionál, embora tivesse 36 anos em 1922 (mqtivo pelo qual foi chamado de "o Säo Joäo Batista" do Modernismo) e nunca tenha abandonado sua admira9ao por certos eseritores do passado,. como. Camoes, Gongalves Dias, Musset e outros. Após IM^tinágem, amdá~ senám publicadas, em poesia, as obras Estrela da manfia (1§36*), Lim^os_cjnqüent'0WJ-(^^4S)^J£lo belo (1948), Opus 10 (1952) e Mafuá do malungo (1954) — todas incluídas em Estrela da vida inteira, de 1965. Infäncia e saudade A experiencia pessoal assume papcl de rclcvo na obra dc Manuel Bandeira. Dessa experiencia, marcada principal-mente pela doenga e pela solidäo, sobressai _a_ infäncia. Especie de_ "garaiso perdido", que pode de novo ser alcan9ado por mcio da memoria, a infäncia rcprcscnta urn ponto de equilibrio para as inquieta90es do eu, uma välvula de escape para as agruras da vida. Em Itlnerärto de Pasärgada, Bandeira comenta: Dos seis aos dez anos, nesses quatro anos de residencia no Recife [...] construiu-se a minha mitologia, e digo mitologia porque os seus hpos, um Totônio Rodrigues, uma D. Aninha Viegas, a preta Tomásia, velha cozinheira da casa de \j\"f, meu avô Costa Ribeiro, tém para mim a mesma consisténcia heróiea das personagens e dos pocmas homérieos. [...] Quando compare esses quatro anos de minha meninice a quaisquer outros quatro anos de minha vida de adulto, lico espantado do vazio destes ultimos em cotejo com a densidade daqtiela quadra distante. O poema a seguir integra a obra Liberlinagem. Ao mesmo tempo que tcmatiza a infancia, o poema faz uma descricäo da cidade de Recife, no fim do século XIX. Nesse livro, Manuel Bandeira incorpora vários temas ligados á cultura popular e ao folclore. Evocacäo do Recife Recife Näo a Veneza americana Näo a Mauritsstad dos armadorcs das Indias Ocidcntais Näo o Recife dos Mascates Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois - Recife das revolucoes libertárias Mas o Recife sem história nem literatura Recife sem mais nada Recife da minha infäncia A Rua da Uniäo onde eu brincava de chicote-queimado e partia as vidracas da casa de dona Aninha [Vicgas Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pinceně na ponta do nariz Depois do jantar as familias tomavam a calcada com cadeiras, mexericos, namoros, risadas A gente brincava no meio da rua Os meninos gritavam: Coelho sai! Näo sai! A dištancia as vozes macias das meninas politonavam: Roseira dá-me uma rosa Craveiro dá-me um botäo (Dessas rosas muita rosa Terá morrido em botäo...) De repente nos longes da noite Uma pessoa grande dizia: Fogo em Santo Antonio! Outra contrariava: Sáo José! Totónio Rodrigues achava sempře que era Sáo José. Os homens punham o chapéu saíam fumando E eu tinha raiva de ser menino porque náo podia ir ver o fogo Rua da Uniáo... Como eram lindos os nomes das ruas da minha infáncia Rua do Sol (Tenho medo que hoje se cháme do Dr. Fulano de Tal) Atrás de casa ficava a Rua da Saudade... ...onde se ia fumar escondido Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora... ...onde se ia pescar escondido Capiberibe - Capibaribc ■ La longe o sertaozinho de Caxanga Banheiros de palha Um dia cu vi uma moca nuinha no banho Fiquei parado o coracao batendo Ela se riu Foi o meu primeiio alumbramento Cheia! As cheias! Barro boi morto arvores destrocos redomoinho sumiu E nos pegoes da ponte do trem de ferro os caboclos destemidos em jangadas de bananeiras Novenas Cavalhadas Eu me deitei no colo da menina e ela comecou a passar a mao nos meus cabelos Capiberibe - Capibaribe Rua da Uniao onde todas as tardes passava a preta das bananas Com o xale vistoso de pano da Costa E o vendedor de roletes de cana O de amelidoim que sc chamava midubim e nao era torrado era cozido Me lembro de todos os pregoes: Ovos frescos e baratos Dez ovos por uma pataca Foi ha muito tempo... A vida nao me chegava pelos jornais nem pelos livros Vinha da boca do povo na lingua errada do povo » Lingua certa do povo Porque ele é que fala gostoso o portuguěs do Brasil Ao passo que nos O que fazcmos E macaquear A sintaxe lusiada A vida com uma porcflo de coisas que eu nao entendia bcm Terras que náo sabia onde ficavam Recife... Rua da Uriiao... A casa dc mcu avó... Nunca pensci que ela acabasse! Tudo lá parecia impregnado de eternidade Recife... Mcu avó morto. Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro como a casa de meu avó (Em fsfre/a da vida inteira, p. 114-7.) I 1. Recife e evocado no poema lido. Ao eu lirico nao interessa o Recife historico nem o Recife cultural. a) Qual e o Recife que evoca? Destaque um verso que justifica sua resposta. b) O cu lirico, portanto, tern uma postura objetiva ou subjetiva, ao descrever sua cidade natal? > 2. Ao relembrar o passado e descrever Recife, o cu lirico se coloca no texto como adulto ou como crianca? Justifique sua resposta com elementos do texto. 3. Identifique, no texto, o aproveitamento de elementos poeticos da cultura popular e do cotidiano. 4. Manuel Bandeira nunca aderiu as novidades modernistas como modismo. Ao contrario, empregava-as com criterio, sabendo extrair efeitos dela. Observe a irregularidade mctrica e a pontuacao destes versos: "Os homens punham chapeu saiam fumando" c "Cheia! As cheias! Barro boi morto arvores destrocos redomoinho sumiu". O que sugere a falta de pontuacao dos dois versos e o tamanho do segundo? 5. Assim como Mario e Oswald de Andrade, Bandeira tambem se prcocupou com a necessidade de criar uma nova lingua literaria. De acordo com o texto: a) Qual e a "lingua ccrta do povo"? b) A qucm possivelmente se refere o pronome nos dos versos "Ao passo que nos / O que fazemos..."? c) E possivel afirmar que Bandeira pos em pratica no poema essa concepcao de lingua? Justifique. 6. Releia o comentario de Bandeira que precede o poema e tambem os tiltimos versos do texto. Com base neles: a) explique por que o eu lirico afirma: "Mcu avo morto. / Recife morto..."; b) indique que tipo de scntimento revela o eu lirico em relacao ao Recife de sua infancia. Pasargada: a liberdade conquistada Ao lado da infancia e muito mais do que ela, Pasargada e a realizacao dc todos os sonhos e fantasias que a vida cruelmente negou ao poeta. E ele qucm explica, em seu Itinerdrio de Pasargada, a gestacao de um de seus mais conhecidos poemas: Vou-me emborn pro Pasargada foi o poema de mais longa gestacao em toda a minha obra. Vi pela primeira vez esse nome de Pasargada quando tinha os metis dczesseis anos e foi num autor grego. [...] Esse nome de Pasargada, que significa "campo dos persas", suscitou na minha imaginacao uma paisagem fabulosa, um pais de delicias [...] Mais v'l-de vinte anos depois, quando eu morava so na minha casa da Rua do Curvelo, num momenta de fundo desanimo, da mais aguda sensacao dc tudo o que eu nao tinha feito na minha vida por motivo da doenca, saltou-me de subito do subconsciente esse grito estapafiirdio: "Vou-me embora pra Pasargada!" Send na redondilha a primeira celula de um poema, e tentei realiza-lo, mas fracassei. [...] Alguns anos depois, em identicas circunstancias de desalcnto e tedio, me ocorreu o mesmo desabafo de evasao da "vida besta". Desta vcz o poema saiu sem esforgo, como se ja estivesse pronto dentro dc mim. Voii-me embora pra Pasárgada Vou-me embora pra Pasargada Lá sou amigo do rei Lá tenho a mulher quc cu quero Na icama que escolherei Vou-me embora pra Pasárgada Vou-mc embora pra Pasárgada Aqui eu näo sou feliz Lá a existencia é uma aventura De tal modo incunseqüente Quc Joana a Louca dc Espanha Rainha e falsa demente Vem a ser contraparente Da nora que nunca tive E como farei ginástica Andarei de bicicleta Montarei em burro brabo Subirei no pau-de-sebo Tomarei banhos de mar! E quando estiver cansado Deito na beira do rio Mando cíiamar a mäe-d'água Pra me contar as histórias Que no tempo de eu menino Rosa vinha me contar Vou-me embora pra Pasárgada Em Pasárgada tem tudo E outra civilizaíäo Tem um processo seguro De impedir a concepcäo Tem telefone automático Tem alcalóide ä vontade Tem prostitutas bonitas Para a gente namorar E quando eu estiver mais triste Mas triste de näo ter jeito Quando de noite me der Vontade de me matar - Lá sou amigo do rei -Terei a mulher que eu quero Na cama que escolherei Vou-me embora pra Pasárgada. (Estreia da vida /níe/ra, p. 127-8.) A negacao do mundo conereto e a idealizacáo de uma realidade melhor lembram diretamente a postura escapista de alguns eseritores do Romantismo. Alias, a oposÍ9ao entre o aqui e o lá, em torno da qual se constrói o poema, também faz lembrar a 'Cancao do exílio', do romántico Goncalves Dias. Observe: Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá; As aves, que aqui gorjeiam, Nao gorjeiam como lá. Minha terra tem primores, Que tais näo encontro eu cá; Em cismar — sozinho, á noite - Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tom palmeiras, Onde canta o Sabiá. a) A que espagos se referem o cá e o lá em cada um dos poemas? b) Em que se assemelham o cá c o lá de cada um? 2. Na terceira eslrofe, o poema faz men9ao a um conjunto de a9oes comuns na infáncia. Levando em conta os dados biográficos do autor, por que essas a9oes sao supervalorizadas? 3. Destaque ou aponte aspectos lingůísticos e formais do texto que revelam a preocupa9ao do autor em incorporar em sua poesia elementos da cultura popular. 4. Pasárgada é um mundo de liberdadc, onde se pode fazer de tudo. Porém ele nao existe, a nao ser na imagina9ao do eu lírico. Para alcan9ar esse mundo, é necessário pór fim á logica e á razao. Há, no texto, um trecho de non sense, isto é, de loucura, de irracionalismo, que justifica a liberdade plena de Pasárgada. Identiftque esse trecho. 5. Levando em conta os versos "E quando eu estiver mais triste/ Mas triste de nao ter jeito/ Quando de noite me der/ Vontade de me matar", explique a importáncia e o significado de Pasárgada para o eu lírico do texto. Manuel Bandeir.i: <> liiiniilili- e u Mihliiiit- Dentre as inúmeras contril Bandcira, duas se destacam: o poesia de orienta9äo moden (verso livre, lingua coloquial, in ■ o" alargamento da (Sirica nacioiia poesia das coisas aparentemente banais do cotidiano. Partifido de~temas até ěntáo óonsiderados "baixos" Ud.lJO u.U. para a cria9äo da "grande poesia", tais como ajrópria doenja^ q quarto,^as_ aefles mecanicas do cotidiano, o jornal, a cultura pqpirlar, etc., Baňdeíra eria uma poesia ricä cm constru9äo c significa9äo, apesar dc sua aparčncia quase prosaica. Veja-se, por exemplo, como ele concilia, nestes versos^ajarítica socia^ a condicäo liumana com as oposÍ90es formais e a coloquialidade lingiiistica: I ÍUiMIUřlllS Poema tirádo lie umsi nofícin de jornal Joáo Gostoso era carregador de feira-lívre e morava no [morro da Babilónia num barracao sem numero Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro Bebeu Cantou Dan90u Depots se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu lafogado. (Em Esttůla da vida inteíra, p. 117.) F.ste título foi tornado de empréstimo ao ensaio 'O humilde e o sublime', de Davi Arrigucci Jr., publicado na Folha de S. Paulo de 20/4/86. Folhetim n? 480. *yyi!i!jjisj& EHäSÍSi ' li ■„ i i' i i i Ou amda a simplicidade e o despojamento com que sao trabalhados certos temas, como a reflexao existencial, a soli-dao, o amor, a vida e a natureza: Poema só para Jaime Ovalle Quando hoje acordei, ainda fazia escuro (Embora a manha já estivesse avancada). Chovia. Chovia uma triste chuva de resignacao Como contraste e consolo ao calor tempestuoso da noile. Entáo me levantei, Bebi o café que eu mesmo preparei, Depois me deitei novamente, acendi um cigarro e fiquei pensando... - Humildemente pensando na vida e nas nmlheres que amei. (Idem, p. 183.) Retomando certos motivos já explorados por poetas romänticos - a saudade, a infäncia, a solidäo - e procurando estreitar os la90S cntre poesia e cultura popular, Manuel Bandeira mantém, de fato, alguns pontos dc con tato com o Romantismo, mas é um poeta essencialmente modernistu. Jamais cai, por exemplo, num sentimcntalismo piegas ao lembrar-se da infäncia. A infáncia que evoca é urna experiéncia vivida e concreta, näo idcalizada, que, contrastada com o presente, acentua-lhe a condÍ9äo trágica. A solidäo, que levava os poctas ultra-romänticos a buscarem na morte a saida para os problemas da existencia, em Manuel Bandeira tonia outra dire9äo - a da paixäo do poeta pela vida: O que eu adoro em tua natureza, Náo é o profundo instinto maternal Em teu flanco aberto como uma feiida. Nem a tua purcza. Nem a tua impureza. O que eu adoro em ti - lastima-me e consola-me! O que eu adoro em ti, é a vida. Manuel Baudeira, que se dizia "poeta mcnor", mostrou ser na verdade um grande poeta; o poeta capaz de transformar o humilde no sublime. Akátí tan d os italo achado: a voz U-H-í-j: i > ^il J^Sí25í2_^£_^lSSSÍfiíS^fe-PÍSds (1901-1935) nasceu em Sao Paulo e proveio de uma farnília tradi_ciqriaL._ Formado elit Ďireito, iniciou-se na literatura como crítico teatral, noí-it ■ gfljll fill ;ílír . [. bií lil JJTFj Suas histórias säo um importante documento da vida urbana e operária da cidade de Säo Paulo das primeiras décadas do século. Juntamente com o satírico Juó Bananěre e com o desenhista Voltolino, Alcantara Machado é uma das trcs principals expressôes desse recortc ítalo-paulista ou ítalo-brasileiro de nossa realidade. O conto a seguir, 'Gaetaninho', pertence á obra Brás, Bexiga e Barra Funda, que, segundo seu autor, "tenta fixar täo-somente alguns aspectos da vida trabalhadeira, íntima e quotidiana desses novos mesticos nacionais e nacionalistas. É umjornal. Mais nada. Notícia. Só. Näo tempartido nem ideal. Näo comenta. Näo diseute. Näo aprofunda".* - Xi, Gaetaninho, como é bom! Gaetaninho ticou banzando bem no meio da rua. O Ford quase o derrubou e ele näo viu o Ford. O carroceiro disse um palavräo e ele näo ouviu o palavräo. - Eh! Gaetaninho! Vem pra dentro. Grito materno sim: até filho surdo eseuta. Virou o rosto täo feio de sardento, viu a mäe e viu o chinelo. - Subito! Foi-se chegando devagarinho, devagarinho. Fazendo beieinho. Estudando o terreno. Diante da mäe e do chinelo parou. Balaucou o corpo. Recurso de campeäo de ľutehol. Fingiu tomar a direila. Mas deu meia volta instantänea e várou pela esquerda porta adentro. Eta saláme de mestre! Ali na Rua Oriente a ralé quando muito andava de honde. De automóvel ou carro só mesmo em dia de enterro. De enterro ou de casamento. Por isso mesmo o sonho de Gaetaninho era de realizacäo muito difícil. Um sonho. O Beppino por exemplo. O Beppino naquela tarde atravessara de carro a cidade. Mas como? Atrás da Tia Peronetta que se mudava para o Aracá. Assim também näo era vantagem. Mas se era o único meio? Paciéncia. Gaetaninho enfiou a cabeca embaixo do travesseiro. Que beleza, rapaz! Na frente quatro cavalos pretos empenachados levavam a Tia Filomena para o cemitério. Depois o padre. Depois o Savério noivo dela de lenco nos olhos. Depois ele. Na boléia do carro. Ao lado do cocheiro. Com a roupa inarinheira e o gorro branco onde se lia: ENCOURACADO SÄO PAULO. Näo. Ficava mais bonito de roupa marinheira mas com a paliictteha nova que o irmäo lhe trouxera da fábrica. E ligas pretas scgurando as mcias. Que beleza, rapaz! Dentro do carro o pai, os dois irmäos mais velhos (um de gravata vermelha, outro de gravata verde) e o padrinho Seu Salomone. Muita gente nas calcadas, nas poitas e nas janelas dos palacetes, vendo o enterro. Sobretudo admirando o Gaetaninho. Mas Gaetaninho ainda näo estava satisfeito, Queria ir carregando o chicote. O desgragado do cocheiro näo queria deixar. Nem por um inslaniinho só. Gaetaninho ia beriai mas a Tia Filomena com a mania de cantar o "Ahi, Mari!" todas as manhäs o acordou. Primeiro ficou desapontado. Depois quase chorou de ódio. Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho dc Gaetaninho. Täo forte que cic sentiu remorsos. E para sosscgo da família alarmada com o agouro tratou logo de substituir a tia por outra pessoa numa nova versäo de seu sonho. Matutou, matutou, e escolheu o acendedor da Cornpanhia de Gas, Seu Rubino, que uma vez lhe deu um cocre danado de doido. Os irmäos (esses) quando soubcram da história resolveram arriscar de sociedade quinhentäo no elefante. Deu a vaca. E eles ficaram loucos de raiva por näo have rem logo adivinhado que näo podia deixar de dar a vaca mesmo. O jogo na calgada parecia de vida ou morte. Muito embora Gaetaninho näo estava ligando. - Voce conhecia o pai do Afonso, Beppino? - Meu pai deu uma vez na cara dele. - Entäo voce näo vai amanhä no enterro. Eu vou! O Vicente protestou indignado: - Assim näo jogo mais! O Gaetaninho está atrapalhando! Gaetaninho voltou para o seu posto de guardiäo. Täo cheio de responsabilidades. O Nino vcio correndo com a bolinha de meia. Chegou bem perto. Com o tronco arqucado, as pemas dobradas, os bracos estendidos, as mäos abertas, Gaetaninho ficou pronto para a defesa. - Passa pro Beppino! Beppino deu dois passos e metcu o pé na bola. Com todo o muque. Ela cobriu o guardiäo sardento e foi parar no meio da rua. - Vá dar tiro no inferno! - Cala a boca, palestrino! - Traga a bola! Gaetaninho saiu correndo. Antes de alcancar a bola um bonde o pegou. Pegou e matou. No bonde vinha o pai do Gaetaninho. A gurizada assustada espalhou a notícia na noite. - Sabe o Gaetaninho? - Que é que tem? - Amassou o bonde! A vizinhanca limpou com benzina suas roupas dominguciras. As dezesseis horas do dia seguinte saiu um enterro da Rua do Oriente e Gaetaninho näo ia na boléia de nenhum dos carros do acompanhamento. Ia no da frente dentro de um caixäo fechado com ílores pobres por cima. Veštia a roupa marinheira, tinha as ligas, mas näo levava a palhetinha. Qucm na boléia de um dos carros do cortejo mirim exibia soberbo terno veimelho que feria a vista da gente era o Beppino. [Novelas paulistanas. 6? ed, Rio de Janeiro, José Olympio, 1979. p. 11 -3.) * Apud Luis Toledo Machado. Antonio de Alcantara Machado e o Modernismo. Rio de Janeiro, J. Olympio, 1970. p. 77. boléia: cabina do motorista, palhetinlin: chapéu de palha. E riam Ao pé das fogueiras acesas? 1. Esse conto está dividido em cinco partes on cenas. De urna cena para outra, há um corte narrativo quc introduz uma nova situacäo num tempo c num espaco também novos. Essa superposicäo de cenas vai compondo o todo como uma colagem, como se o narrador estivesse de posse de uma teleobjetiva e fosse fotografando cena por cena. Que tipo de linguagem se utiliza desse recurso técnico? I 2. Indique o parágrafo em que, ao descrever uma agäo da personagem, o narrador, como um locutor esportivo, se utiliza da linguagem radiofônica. 3. O ambiente é reconstituído cm tracos lcvcs, dcmonstrando uma preocupacäo jornalística. Apesar disso, o autor consegue magistralmente identificar a condicáo sócio-econômica das personagens. a) Que elenientos do texto confirmam que Gaetaninho e sna família säo italianos? b) Indique alguns fatos que demonstram a condicáo sócio-cconômica da personagem. 4. Alcántara Machado preocupa-se näo só em reproduzir os tracos rítmicos e melódicos da linguagem coloquial, como também em mostrar a influéncia do elemento imigratório italiano na fala paulistana. a) Identifiquc nos diálogos pelo menos um erro gramatical. b) Retire do texto palavras italianas. 5. Que valor social está presente no desejo de Gaetaninho dc andar de automóvel e de ser admirado pelas pessoas? 6. O final do conto é surpreendente, tanto pela rapidez com que se dá a morte de Gaetaninho quanto pela ambiguidade causada pela frase "Amassou o bonde". Considerando o sentido do verbo arnassar em portugués e sabendo que ammazzare, do italiano, significa "matar", explique a ambiguidade contida nessa frase. Manuel Bandeira Prořundamente Quando ontem adormeci Na noite de Sáo Joáo Havia alcgria c rumor Estrondos de bombas luzes de Bengala Vozes cantigas e risos Ao pé das fogueiras acesas. No meio da noite despertei Náo ouvi mais vozes nem risos Apenas baloes Passavam crrantes Silenciosamente Apenas de vez em quando O ruído de um bonde Cortava o siléncio Como um tunel. Onde estavam os que há pouco Dangavam Cantavam - Estavam todos dormindo Estavam todos deitados Dormindo Pro fundamente "A" Quando eu tinha seis anos Náo pude ver o lim da festa de Sáo Joáo Porque adormeci Hoje náo ouco mais as vozes daquele tempo Minha avó Meu avo Totónio Rodrigues Tomásia Rosa Onde estáo todos eles? - Estáo todos dormindo Estáo todos deitados Dormindo Profundamente. (Em Esíre/a da vida inteira, p. 121.) Pneuinotórax Fcbrc, hcmoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que náo foi. Tosse, tosse, tosse. Mandou chamar o médico: - Diga trinta e trés. - Trinta e trés... trinta e trés... trinta e trés... - Respire. - O senhor tern uma escavagao no pulmao esquerdo [e o pulmao direito infiltrado Entiio, doutor, nao e possivel tentar o pneumotorax? - Nao. A unica coisa a fazer e tocar um tango argentine (Idem, p. 107.) O bicho Vi ontem um bicho Na imundicie do patio Catando comida entte os detritos. Quando achava alguma coisa, Nao cxaminava nem cheirava: Engolia com voracidade. O bicho nao era um cao, Nao era um gato, Nao era um rato. O bicho, meu Deus, era um homcm. (Idem, p. 196.) i 1. (Fuvest-SP) a) Em que obra brasileira se narra a campanha de Canudos? Qual é o seu autor? b) Quais as partes em que se divide a obra? 2. (Fuvest-SP) No capítulo "O Boqueiräo", de Triste fim de Policarpo Quaresma, a personagem '< principal vive uma experiěncia decisiva, que faz mudar radicalmente seu ponto de vista quanto ao processo de consolidacäo do regime republicano no Brasil. a) Descreva essa mudanga de ponto de vista pela qual passou Quaresma. i b) Aponte, no capítulo citado, a experiěncia decisiva que determinou essa mudanga e identiflque ; o que tal experiěncia veio revelar á personagem. (UFRJ) Texto para as questôes 3 a 5: i Poema tirádo de uma notícia de jonwl Joäo Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracäo [sem numero Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro < Bebeu Cantou ( Dancou i Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu aľogado. j Bandeira, Manuel. Poesia Compieta e Prosa, José Agullar Editora, Rlo de Janeiro, 1974. 3. Qual a característica do Modernismo indicada pelo título do poema acima? I 4. No verso 2 ocorre um desvio da norma culta da lingua portuguesa, Identifíque-o, reeserevendo o verso. 5. O poeta escolheu um nome para o personagem do poema que contrasta com o desfecho. Explique. 6. Antonio de Alcantara Machado é um autor singular no contexto modernista da primeira geracäo. Assinale a alternativa falsa em relagäo a ele. a) Foi o maior retratista dos bairros italianos da cidade de Säo Paulo no início do século. b) Sua prosa, como a de Oswald de Andrade, possui um caráter experimental, com os flashes cinematográfícos, as elipses, etc. Porém é uma obra bastante comunicativa e espontítnea. c) Seu terna de inleresse säo os imigrantes italianos, particularmente os mais abastados, que se dedicaram ao comércio e á indúslria. d) Seu livro mais conhecido é Brás, Bexiga e Barra Funda. e) Foi participante da Revista de Antropofagia. 7. (PUC-SP) O título da obra Macunaima é especificado com "Herói sem nenhum caráter". A alternativa que näo é verdadeira em relagäo á especificacäo é: a) O caráter do herói é ele näo ter caráter definido. b) O protagonista assume várias esťeras de acäo, daí ser simultaneameute herói e anti-herói. i c) A fragilidade de caráter do protagonista faz com que este perca, no decorrer da obra, sua característica de herói. d) O herói se configura com suas qualidades paradoxals: ele é ao mesmo tempo preguigoso c ,j esperto, irreverente c simpático, valente e covarde. e) O caráter do herói é contraditório, pois ele sc caracteriza como um "sonso-sabido". 8. (Fatec-SP) Assinale o que for errado quanto ao Modernismo. a) Nele tudo cabe, ate o poema-piada. b) A brasilidade foi um traco marcante. c) Apesar de Manuel Bandeira defender o verso livrc, muitos modernistas poetaram em versos rigorosamente metrificados. d) Foi um movimento exclusivamente literario e exclusivamente de poetas, por isso Monteiro Lobato o repudiou. e) A narrativa procura ser documental. 9. (FGV-SP) A Gucrra de Canudos, acontecimenlo de conseqiiencias tragicas no processo de aniquilagao dos "fanaticos" de Antonio Conselhciro, ocorrida no interior da Bahia em fins do seculo XIX, deu origem a varias obras fundamentals para um melhor conhecimento do pais e de seu interior. Dentre as seguintes, assinale a de maior ressonancia: a) Pelo Sertao - de Afonso Arinos. b) Os Set toes - de Euclides da Cunha. c) O Rei dos Jagunpos - de Manuel Benicio. d) Sertao - de Coelho Neto. e) Grande Sertao; Veredas - de Guimaraes Rosa. 10. (Covest-PE) Associe os tracos da poesia de Manuel Bandeira, relacionados a seguir, aos versos em que estao prescntcs: (A) reminiscencias da infancia; (B) ironia na auto-apresentagao; (C) solid ao; (D) doenga e morte. ( ) "A vida inteira que podia ter sido e que nao foi". ( ) "Entao me levantei, bebi o cafe que eu mesmo preparei". ( ) "Provinciano que nunca soube escolher uma gravata". ( ) "A casa de meu avo... Nunca pensei que ela acabasse! Tudo la parecia impregnado de eternidade," De cima para baixo, o item que apresenta a resposta correta 6: a) A- B - C - D b) D - C - B - A c) B - A - C - D d) C - D -A - B e) A- C - D - B 11. (FESP) Em todos os seus romances, percebe-se um trago_: suas experiencias aparecem Iranspostas em alguns personagens, principalmente negros e mestigos, que softem o _. Alcm de seu valor como romancista,_nos oferece um perfeito retrato dos subürbios_e de suas populagöes..." Assinale a alternativa que preenche satisfatoriamente as lacunas da afirmagäo acima: a) pessoal desprezo paterno - Machado de Assis - reeifenses b) autobiogräfico - abandono natural Manuel Bandeira - nordestinos c) politico - desprezo pessoal - Cruz e Sousa - reeifenses d) autobiogräfico - preconeeito racial - Lima Barreto - cariocas e) individual - abandono materno - Gregörio de Matos - reeifenses 12. (F. C. Chagas-SP) Estä estruturada em tres partes - A terra, O hörnern, A lata -, a obra: a) Os sertöes, de Euclides da Cunha. b) Velhos marinheiros, de Jorge Amado. c) Sagarana, de Guimaräcs Rosa. d) Vila dos Confins, de Mario Palmerio. e) O sertanejo, de Jose de Alencar. 13. (Covesl-PE - adaplada) Assinale a alternativa correta. \ Esta questäo tem, como base, a seguinte atirmagäo: "Só a Antropofagia nos tine. Socialmente. ! Economicamcntc. Filosoficamentc". ! a) Sáo palavras de Goncaives Dias, em defesa do indio brasileiro. ; b) Foi escrita por Jose de Alencar, no prefácio de Iracema. \ c) Sao palavras de Mario de Andrade, que mostram a necessidade de incorporar valores estrangeiros á eultura brasileira. i d) Foi escrita por Oswald de Andrade no Manifesto Antropófago. \ e) Refere-se á deglutigäo do Bispo Sardinha. { 14. (Covest-PE - adaptada) Assinale a alternativa falsa. Esta questäo refere-se a Oswald de Andrade. a) Sua obra é uma das mais variadas do Modernismo brasileiro: abordou värios generös, como poesia, romance, teatro, critica. b) Escrcveu Macunaima, inspirado em sua propria vida. c) Com Memórias sentitiieiilais de Joäo Maximal- e Serafim Ponte Grande, torna-se um dos precursores do romance de vanguarda no Brasil. d) Hscreven um artigo célebre, intitulado "Meu poeta futurista", em que apresentava Mario de t Andrade como o exemplo do que seria a poesia modernista. e) O rei da vela e O hörnern e o cavalo fazem parte do seu repertório teatral, vinculado á rcalidade brasileira. 15. (Covest-PE - adaptada) 'i Nao permita Deus que eu morra Sem que volte pra Sao Paulo Scm que veja a Rua 15 E o progresso de Sáo Paulo. a) Sáo versos escritos por Goncaives Dias, no exilio, em Portugal. | b) Sáo uma paródia de Oswald de Andrade ao poema dc Goncaives Dias. c) Revelam dois tracos típicos do Modernismo brasileiro: a paródia e a exaltacáo da cidade. } d) Fazem parte de Macunaima, de Mario de Andrade. e) Percebe-se que é manifestacao da poesia romántica, pela religiosidade e pelo patriotismo do autor. | 16. (UFPA) Em fevereiro de 1909 Marinetti publicou na Europa um manifesto cujas ídéias i desencadearam o: i a) Dadaísmo d) Romantismo b) Futurismo e) Simbolismo i c) Surrcalismo 17. (Mackenzie-SP) Assinale a alternativa incorreta: a) Mariím Cereré, dc Cassiano Ricardo, Macunaima, de Mario de Andrade, e Cohra Norato, de Raul Bopp, constituem uma trindade de obras que vai buscar o tema nas raizes folelóricas do pais. b) Em 1922, sui-ge a revista Klaxon, uma espécic dc porta-voz da Semana de Arte Moderna, centralizando sua materia principalmente na arte. c) Mario de Andrade é o principal representante da corrente desvairista, apregoando seus ideais renovadores no "Prefácio Tnteressantissimo" de Paulicéia desvairada. d) A eriacao artística da primeira fase do Modernismo fundamenta-se, exclusivamente, na poesia, e tem como propósito ridicularizar a arte académica, substituindo-a pela liberdade j absoluta e anarquia. I e) O Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade, reforcado pela arte da pintora Tarsila do Amaral, visa á desvinculacao da cultura brasileira da arte estrangeira, através de um retorno aos valores primitivos. 18. (Fatec-SP) Assinale a alternativa incorreta: a) O Modernismo rejeita os modelos rígidos de corregáo técnica parnasiana, tais como a métrica rigorosa, o vocabulário de elite, com palavras eruditas. Kxemplificam essa rejeigäo os versos da Poética, dc Manuel Bandeira: Estou farto do lirismo comedido Do lirismo bem comportado (...) Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o eunho vernáculo dc um vocábulo. (...) Abaixo os puristas (...) b) Defendendo a presenca do nacionál, do brasileiro, nos temas, no vocabulário e na gramática, Oswald de Andrade propôe uma "poesia de exportacäo", a poesia Pau-Brasil, de que säo exemplos os versos de "Relicário": No baile da Corte / Foi o Conde d'Eu queju disse / Pra Dona Benvitida / Que farinba de Suruí / Pinga dc Parati / Fumo de Baependi / E comé bebě pitá e caí. c) No grupo modernista da Semana dc 22, apesar das divergéncias estéticas e ideológicas das várias correntes, reconhece-se uma proposta comum: levar o homem brasileiro a integrar-se á sua terra, libertando-se da influSncia estrangeira, na lingua, nos costumes e nos valores. d) Autor destacado entre os modernistas, Manuel Bandeira apresenta obra que permite acompanhar a evolugäo poética brasileira do século XX, desde os poemas de características pós-simbolístas até as experiéncias do Concretismo. e) A Semana de Arte Moderna - Semana de 22 -, embora sacudisse as artes nacionais na época, foi um movimento com propostas que marcaram táo-somente sua época; tais propostas, principalmente as referentes ao tratamento da linguagcm, sc restringiam á duragäo do Movimento Modernista (de 1922 a 1930). 19. (UFPA) As idéias de Marinetti influenciaram muito os nossos autores. Dele os eseritores brasileiros seguiram: a) a exacerbagäo do nacionál e a sintaxe tradicional, b) a paixäo pela metafora, intelectualista e rebuscada, e pelas frases de efeito. c) a negagäo do passado e o uso de palavras em liberdade. d) o conceito de felicidade na vida em contato com a natureza, e a fé na razäo e na ciěncia. e) o gosto pelo psicologismo na fícgáo e a supervalorizacäo da natureza. 20. (Cescem) A Semana de Arte Moderna representou, no panorama cultural da época: a) a ruptúra total com o passado artístico mais recente, no qual nada permitia prevé-la; daí a comogäo que causou. b) o rcsultado da condcnsagäo dc aspiragôcs vagas, ainda informes até entäo, mas perceptívcis nas preferéncias do publico em geral. c) a congregacäo de tendéncias que, sob formas várias e nas várias artes, se vinham delineaudo desde a década anterior. d) a reacäo aos ataques que os últimos parnasianos dirigiam contra a obra incipiente dos primeiros modernistas. e) a decorréncia de reelaboragäo de reeursos estilísticos presentes tanto na poesia parnasiana quanto na simbolista. 21. (Fuvcst-SP) "Estou farto do lirismo comedido / Do lirismo comportado / Do lirismo funcionário publico com livro de ponto / expediente protocolo e manifestacôes de aprego / ao sr. diretor." Complete: Os versos de Manuel Bandeira revelam uma atitude de protesto contra A, e se enquadram no movimento A da Literatura Brasileira. 22. (Fuvest-SP) "Säo Paulo! comogäo de minha vida... Galicismo a berrar nos desertos da America!" lndique: a) o autor desses versos; b) o título de urna obra, de prosa ou poesia, do mesmo autor. li líh t f II il\;'t < i i . lit.) . i«l(iti( í MTH'- ' ,.i.|[i( Jl L ,.|t li'li II I % il.ifť^-ulfi ni- ,'| "i i|IMIil i :i : i i 11.. i ni;;j| .iiilim!QKrgmffl9 K" ii i ill I ■ i [«: I'J' (•> if Hi""': m(i "U í ''l ■!ll,'M H"i,' : K\ iilh?,l|[»il,i.-| ^Mioo'jlut lilitc i). ij:«ľ it.:'|Mlilľ- i i i Uli':. ill.'-'i D i< íK!"«n Uv 10I ri si. \< C1111 Para saber mals sobre a década de 30 e a prosa da segunda fase do Modernismo brasllelro, sugerimos: LElí: alguns dos romances da prosa modernista de 30. Parq isso, veja as sugestôes de leitura dadas nos próximos capftulos. ÁSSiSTIR; aos filmes Säo Ber- . nardo, de Leon Hlrszman; Vidas secas e Memórlas do cárcere, de Nelson Pereira dos Santos; Men/no de engenho, de Walter Lima Junior; Dona Flor e seus do/s maridos, de Bruno Barreto. iíi v r,; os oompositores de música popular brasileira da épo-ca, como Noel Rosa, Ari Barroso, Ataulfo Alves, J. Cascata, Leonel Azevedo, Heitor dos Prazeres, Ismael Silva, Orestes Barbosa, etc. e outros compositores que tratam especificamente de temas nordestinos, como Luis Gonza- ga, Elomar, Domlnguinhos, etc. I a obra dos pin- tores Portinari e Di Cavalcanti. í ' a história do Brasil na década de 30: o crack da Bolsa de Valores de Novu lorque (1929) e seus efeitos na economla brasileira, a Revolucäo de 30, a crise cafeeira, a Intontonn Comunista, o Estado Novo, etc. C'OM.f».Af? Ail: com base na literatúra e na música popular, as dlferencas de tratamento dad.- ■ ao hörnern brasileiro. 9-A • X II rit fr H'Ml'lt1 Ii II IllfiMiM ŽyMMiMI Cwi'l Nas décadas de 30 e 40, o romance, mais do que a poesia e o conto, predominou na literatura brasileira, enveredando-se piincipalmente pelo regionalismo e pela abordagem psicológica. Romance de SO foi a denominayao dada a essa fic?ao, cujo marco iniciál é o romance A bagaceira, de José Américo de Almeida, publicado em 1928. Semana dc Arte Moderna, cm 1922, fez brotar um periodo de profundas renovacöes na literatura brasileira. A prosa, nesse momento re-presentada por Macunaíma, Memórias sentimentais de Joäo Miramar e Brás, Bexiga e Band~Fünda, rompe com uma forma tradicional de "contar his-"töriäs" e abre caminho para uma nova forma de ler e narrar o cotidiano brasileiro, eriando uma técnica calcada na linguagem cinematográfica, que apresenta a realidade em fragmentos breves e incisivos. Ao contrario dos participates da Semana de Arte Moderna, os in-tegrantes da segunda geragäo do Modernismo, ou Modernismo de 1930, näo chegaram a produzir impacto, dado o relevo social que a revolueäo ocorrida em outubro daquele ano assumiu na vida brasileira. Os abalos sofridos pelo povo brasileiro.em torno dos aeonteeimentos de 1930 - a crise econömica provocadä pela quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque, a crise cafecira, a Rcvolucäo dc 1930, o acelerado declinio do Nordeste -condicionaram um novo estilo ficcional, notadamente mais adulto, mais I f '.1 ■i 1 ■ I i amadurecido. mais moderno, que se marcaria pela rudeza, por uma linguagem mais brasileira, por um enfoque direto dos fatos, por uma retomada do naturalismp, principalmente nq piano da narrativa documental. O maior momento da ficgäo de 30 dá-sc com o advento do romance norďestmpTque correspondeu como nenhum outro aos anseios de liberdade temática e rigor estilístico. O romajice jegionalista nordestino, cujas raízes advém de Franklin Távora, Rodolpho Teófilo e Domtngos Olímpio, entra numa nova fase em (1^928) com a publicagäo de °'3ra ultrapassa os limites do pessoal para se tornar um seno" uepolmento da realidade brasileira, denunciando nosso atraso cultural e as injusticas do Estado Novo. i ) Em liberdade, após onze meses de cárcere, ftxou residéncia no Rio de Janeiro. Em 1945^ingressou no Partido Comunista Brasüejro,, Em 1951, foi eleito presidente da Associaeäo Brasdeira de Ěscritores. No ano segmnte, viajou para a Russia e os países socialistas. ^Como romancista, Graciliano Ramos estreou em 1933, com Caetés, uma narrativa da vida provinciana de Palmeira dos índios, um exercício de técnica literária com características naturalistas, como severamente o autor reconhecia. Mas éJiM^Berthjrdti (1934) o seu primeiro romance, verdadeira obra-prima da literatura brasileira. Nessa obra, Graciliano apresenta uma notável evolueäo de técnica e estilo e um significativo aprofundamento na análise psicológica das personagens, cujo resultado c a criaeäo de Paulo Honório, uma das mais marcantes personagens brasileiras. A Sao Bernardo seguiram-se Angústia (1936), em que o romancista acentua a preocupacao psicológica, .scrvihdó^šěTIčlivanvados recursos ex-pressivos, c Vidas secas i'..^38). scu único romance em terceira pessoa, uma grande obra pelo poder de fixar figuras subumanas vivendo sob o fatalismo das secas da regiao do Nordeste. Graciliano Ramos näo foi apenas romancista: escreveu, ainda, contos (Histórias incompletus, Insónia, Alexandre e outros heróis), crónicas (Linhas tortas, Viventes das Alagoas) e impressöcs de viagens (Viagem). O autor de Vidas secas sobressai dentre os demais de sua época pelas suas qualidades universalistas e, sobretudo, pela linguagem enxuta, rigorosa c conscientemente trabalhada, no que se mostra o legítimo continuador de Machado de Assis na trajetória do romance brasileiro. mm ■|i'jiiilliii-i,i,»7.-i.-'.i:;.i.-i:i ;<:>U,h:::'.»!!'ii'íl: y'}'~ ' '[ i I'M II I ill 1. I |-j!:.)"i" Sao Bernardo O romance Sao Bernardo e narrado em la pessoa, por Paulo Honorio, que se propoe a contar sua dura vida, dc guia de cego a proprietario da Fazenda Sao Bernardo. Dotado de muita vontade e ambicao, depois de uma vida de lutas c brutalidades, Paulo Honorio realiza seu sonho de se tornar fazendeiro, adquirindo a propriedade Sao Bernardo, onde fora trabalhador de enxada. Casa-se aos 45 anos com a professora Madalena, que, boa e compassiva por indole, passa a se interessar pela vida de miseria e agruras dos empregados da fazenda e a interceder por eles junto a Paulo Honorio. Iniciam-se os desentcndimentos entre eles. As discussoes se intensificam. Nem a gravidez de Madalena poe fim aquela situacao. Angustiada pelo despotismo e pelo ciume doentio de Paulo Honorio, Madalena suicida-se. l.ifil$>3-:..i-TiSi;Ja=M.-i Segundo o critico Antonio Candido, todo grande escritor é dotado de pelo menos uma destas trěs preocupacöes: .Ojjcrusc^j*^ senso, jcciológico_e o sensq estético. Na obra dc Gxaciliano Ramos, esses trés aspectos se coirlpletařnTšě~fAiriSlem, alcancando raro equilíbrio. Em Sao Bernardo, por cxemplo, a exploracäo psicológica de Paulo Honorio - que nos permite conhecer o processo vivido pela personagem de tomada de consciěncia sobre si mesma e sobre o mundo que criou näo se dá isoladamente, mas é amparada pelo enfoque político-sociológico do autor, donde se extraem as causas que teriam levado a personagem a um processo neuro tico de coisificacäo das relaeöes humanas e de autodestruigäo. A par desses aspectos, o senso estético da obra é apurado. Aopcäo do autor jDeJo_loco narrativo em 1« pessoa,.possibilita qu^..o.jarrador-_ personagem, elŕtavTil i s l a ň ei a d o'ČTôs Fatos, relate o universo de experiéncias que resultaram em seu fracasso e se veja criticamente a par'tir de seu proprio relato, tomando consciôncia de sua condicäo. Na obra ressaltamľtämbém a concisäo c a secura da linguagem do narrador, um hörnern de poucas pa-lavras e ressecado pela vida agreste e pela luta em busca de riqueza e poder. Faz dois anos que Madalena morreu. Os amigos deixaram de freqiienlar a casa. Concrelizando uma anliga idéia de compor um livro com auxílio de pessoas mais cntendidas, Paulo Honório entrcga-sc á tarcfa dc contar a sua história. Sou um hörnern arrasado. Doenca? Näo. Gozo pcrfeita saúde. Quando o Costa ßrito, por causa de duzentos rail-réis que nie queria abafar, vomitou os dois artigos, chamou-mc doente, aludindo a crimes que me imputam. O Brito da Gazeta era uma besta, Até hoje, gracas a Deus, nenhum médico me entrou em casa. Näo tenho doenca nenhuma. O que estou é velho. Cinqüenta anos pelo S. Pedro. Cinqüenta anos pcrdidos, cinqüenta anos gastos sem objeli vo, a maltratar-me e a maltratar os outros. O re-sultado é que endurcci, calejei, e näo é um arranhfio que penetra esta casca espessa e vem ferir cá dentro a sensibilidade embotada. Cinqüenta anos! Quantas horas inúteis! Consumir-se uma pessoa a vida inteira sem saber para que! Comer e dormir como um porco! Levantar-se cedo todas as manhäs e sair correndo, procurando comida! E depois guardar comida para os ftlhos, para os netos, para muitas geragöes. Que estupidcz! Que porcaria! Näo é bom vir o diabo e levar tudo? As janelas estäo fechadas. Meia-noitc. Nenhum rumor na casa deserta. Levanto-me, procuro uma vela, que a luz vai apagar-se. Näo tenho sono. Deitar-me, rolar no colchäo até a madrugada, é uma tortura, Prefiro ftcar sentado, coh-cluindo isto. Amanhä näo terei com que me entreter. Ponho a vela no castigal, risco um fósforo e acendo-a. Sinlo um airepio. A lembranga de Madalena persegue-me. Diligencio afastá-la e caminho em redor da mesa. Aperto as mäos tie tal forma que me firo com as unhas, e quando caio em mim estou mordendo os beicos a ponto de lirar sangue. De longe em longe sento-me fatigado c cscrevo uma linha. Digo em voz baixa: - Hslraguei a minha vida, estraguei-a estupidamente. A agitagäo diminui. - Estraguei a minha vida estupidamente. Penso em Madalena com insistencia. Sc fosse possivel recomegarmos... Para que enganar-me'.' Se fosse possivel recomegarmos, aconteceria exatamente o que aconteceu. Näo consigo moditicar-me, é o que mais me aflige. A molecoreba de Mestre Cactano arrasta-se por ai, lambuzada, farniiita. A Rosa, com a barriga quebrada de tanto parir, trabalha em casa, trabalha no campo e tra-balha na cama. O marido é cada vez mais molambo. E os moradorcs que me restam säo uns cambembes como ele. Para ser franco, declaro que esses infelizes nfto me inspiram simpatia. Lastimo a situagäo em que se acham, reconhego ter contribuido para isso, mas näo vou além. Estamos täo separados! A principio estáva-mos juntos, mas csta desgragada profissäo nos dištanciou. Madalena entrou aqui cheia de bons sentimentos e bons propósitos. Os sentimentos e os propositus es-barraram com a minha brutalidade e o meu egoismo. Creio que nem sempre fui egoista e brutal. A profissäo é que me deu qualidades täo ruins. E a desconfianga terrivel, que me aponta inimigos em toda a parte! A desconfianga é também conseqüencia da profissäo. Foi este modo de vida que me inutilizou. Sou urn aleijado. Devo ter um coragäo miúdo, lacunas no cé- Sofii í( íl .■4"' EKB [ I, l.J, ||.-(/.i/n ^BBHJSgEIJ~_ _________ fr In I *1 l'llbir I V II ,|l 1 Irl. Ei . Ii- 1[V'ji _ •(•u j't í' • i iii< i" ii if jkf IWlnWtB (IHM.. ^»mt^^M >ifj.i^>..i;i. t I *"m(U . I 'ť "í.- ľ •v.'V '' ■■r mm 4,r ■ť-.- rebro, nervos diferentes dos nervos dos outros homens. E um nariz enorme, uma boča enorme, dedos enormes. Se Madalena me via assim, com certeza me achava extraordinariamente feio. Fecho os olhos, agito a eabeca para repelir a visäo que me exibe essas deformi-dades monstruosas. A vela está quase a extinguir-se. Julgo que delirei e sonhei com atoleiros, rios cheios e uma figura de lobisomem. Lá fora há uma treva dos diabos, um grande silěncio. Entretanto o luar entra por uma janela fechada e o nordeste furioso espalha folhas secas no chäo. E horrível! Se aparecesse alguém... Estäo todos dormindo. Se ao menos a crianca cliorasse... Nem sequer tenho amizade a meu filho. Que miséria! Casimiro Lopes está dormindo. Marciano cstá dormindo. Patifes! E eu vou ficar aqui, ás escuras, até näo sei que hora, até que, morto de fadiga, encnste a eabeca a mesa e descanse uns minutos. (13? ed. Martins Fontes, S8o Paulo, 1970. p. 241 e 246-8.) 1. Paulo Honorio elevou-se a grande fazendeiro, respeitado e temido,. graijas a uma tenacidade inabalavel, com a qual suplantou todos os obstaculos para atingir seus objetivos, agindo ate inescrupulosamente. Retire do texto trechos que demonstrem a "inutilidade do esfor9o violento de sua vida". 2. Paulo Honorio, no final da vida, admite ter sido bruto, egoista, feio e insensivel. De acordo com o texto, de que resultaram essas caracteristicas? 3. Se fosse possivel recomecar sua vida com Madalena, por que tudo aconteceria do mesmo modo? 4. Paulo Honorio, numa linguagem seca e bruta, vai costurando fatos, presentes e passados, a uma analise fria de sua pessoa. Nesse processo de ir e vir, que conceito Paulo Honorio faz do si mcsmo? 5. Considerando a trajetoria de vida de Paulo Honorio, indiquc o significado que assumem estas palavras: "Cinquenta anos! Quantas horas inuteis! Consuniir-se uma pessoa a vida inteira sem saber para que! Comer e dormir como um porco! Levantar-se cedo todas as manhas e sair correndo, procurando comida! E depois guardar comida para os filhos, para os netos, para muitas geragoes. Que estupidez! Que porcaria! Nao e bom vir o diabo e levar tudo?" 6. Retire do texto um trecho que comprove ser Sao Bernardo um livro de recorda9oes. Fabiano, ia satisfeito. Sim senhor, arrumara-sc. Chegara naquele estado, com a familia morrendo de fome, comendo raizes. Caira no fim do patio, debaixo de um juazeiro, depois tomara conta da casa deserta. Ele, a mulher e os filhos tinham-se habituado a camarinha escura, pareciam ratos - e a lembran9a dos sofrimentos passados esmorecera. Pisou com firmeza no chao gretado, puxou a faca de ponta, esgaravatou as unhas sujas. Tirou do aio um peda90 de fumo, picou-o, fez um cigarro com palha de milho, acendeu-o ao binga, pos-se a fumar regalado. - Fabiano, voce e um homem, exclamou em voz alta. Conteve-se, notou que os mcninos cstavam porto, com certeza iam admirar-sc ouvindo-o falar so. E, pensando bem, ele nao era homem: era apenas um cabra ocupado em guardar coisas dos outros. Vermelho, queimado, tinha os olhos azuis, a barba e os cabelos ruivos; mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais alheios, descobria-se, encolhia-se na presen9a dos brancos e julgava-se cabra. Olhou em torno, com receio de que, fora os meninos, alguem tivesse percebido a frase imprudente. Corrigiu-a, murmurando: - Voce e um bicho, Fabiano. Isto para ele era motivo de orgulho. Sim senhor, um bicho, capaz de veneer dificuldades. Chegara naquela situa9ao medonha - e ali estava, forte, ate gordo, fumando o seu cigarro de palha. - Um bicho, Fabiano. Era. Apossara-se da casa porque nao tinha onde cair morto, passara uns dias mastigando raiz de imbu e sementes de mucuna. Viera a trovoada. E, com ela, o fazendeiro, que o expulsara. Fabiano fizera-se desentendido e oferecera os seus prestimos, resmungando, co9ando os coto-velos, sorrindo aflito. O jcito que tinha era ticar. E o patrao aceitara-o, entregara-lhe as marcas de ferro. Agora Fabiano era vaqueiro, e ninguem o tiraria dali. Aparecera como um bicho, entocara-se como um bicho, mas criara raizes, estava plantado. Olhou as quipas, os mandacarus e os xique-xiques. Era mais forte que tudo isso, era como as catingueiras e as baraunas. Ele, Sinha Vitoria, os dois filhos e a cachorra Baleia cstavam agarrados a terra. Chape-chape, As alpercatas batiam no chao rachado. O corpo do vaqueiro derreava-se, as pernas faziam dois arcos, os bra9os moviam-se desengoii9ados. Parecia um macaco. Entristeceu. Considerar-se plantado em terra alheia! Engano. A sina dele era correr mundo, andar para cima e para baixo, a toa, como judeu errante. Um vagabundo empurrado pcla seca. Achava-se ali de passagem, era hospede. Sim senhor, hospede que demorava demais, tomava amizade a casa, ao curral, ao chiqueiro das cabras, ao juazeiro que os tinha abrigado uma noite. {Vidas secas. 27? ed. Sao Paulo, Martins Fontes, 1970. p. 53-5.) 7. Tente explicar os motivos conscientes e inconscientes que levaram Paulo Honório á "idéia esquisita de [...] compor esta história". ■"""t' ;; y V -lítí ■ ll * V < -^ f .5 . • >V ~. •' ,! í*, v-1 0 romance regionalista de 30 ganha novo impulso com Rachel de Queiroz, cuja obra, especialmente O Quinze, documenta a bruta realidade da seca, da fome e da migracäo, e com Jose Lins do Rego, cuja fic^äo retrata a decadéncia dos engenhos de cana-de-acucar. Analisando o hörnern nordestíno e suas relacöes com o meio natural e social, esses autores produzem uma ficcäo de caráter documental, mas sem perder de vista a introspeccjo psicológica. Rachel de Queiroz e o drama da seca no Nordeste Rachel de Queiroz nasceu em Fortalcza, Ceará, em 1910. A instabilidade advinda da seca de 1915 fez com que ela e sua família migrassem para o Rio de Janeiro em 1917. Logo em seguida retornam para o Nordeste, passando por Bělém, no Pará, antes de se ftxarem em Fortaleza. Em 1927, formada no curso Normal, comecou a colaborar no jornal O Ceará, publicando poemas e crónicas. Tornou-se conhecida, entretanto, com a publicapäo de O Quinze, em 1930. Nos anos seguintes, militou no Partido Comunista Brasileiro, e em 1937 foi presa por defender idéias esquerdistas. Publicou nesse periodo também os romances Joäo Miguel, Caminho de pedras e As trés Marias. Dedicou-se, em seguida, ao teatro e á cronica jornalística. Foi a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras. Seus quatro romances exprimem intensa preocupagäo social. Nos dois primeiros, O Quinze e Joäo Miguel, Rachel trata do problema da seca, do coronelismo e dos impulsos passionais. Entretanto, o enfoque psicológico acaba se sobrepondo ao social, uma vez que o hörnern nordestino é mos-trado sob dupla ótica: a pressäo das forcas atávicas c a accitacao do seu proprio destino. Em Caminho de pedras e As trés Marias, a paisagem nordestina deixa o primeiro piano, dando lugar á abordagem de agitacöes políticas, métodos de educaeäo e problemas ligados á emaneipapäo feminina, tanto no piano amoroso quanlo no social. O diálogo nos seus romances é vivo e dinámico, noladamente nos re-gionalistas, lembrando a novelística popular, que mais tarde atrairia a es-eritora, levando a se dedicar ao teajro de raízes folclóricas e regionais (Lampiäo, A beata Maria do Egiio). Rachel de Queiroz dedicou-se também á literatura infantil, em que se destaca a obra Andira. Em 1992, seu publico foi surpreendido com a pu-blicacäo de mais um romance, Memorial de Maria Moura. O romance O Quinze, cujo título rcfcrc-sc á grande seca de 1915, narra a história do retirante Chico Bento, Paralelamente a esse eixo narrativo, desenvolve-se o terna do amor impossível entre Vicente, um jovem proprietário rural, e Conceicäo, uma moea culta da cidade. O primeiro eixo narrativo é social: apresenta os efeitos da seca sobre o sertanejo. O segundo, é individual: Conceigao procura sua identidadc numa sociedade patriarcal, recusando o amor de Vicente. Diante da situacäo de miséria provocada pela seca, Conceicäo auxilia os retirantes e adota uma das eriancas de Chico Bento. O texto a seguir narra as desventuras de Chico Bento e sua família durante a viagem de retirada. Kles linham saído na véspera, de manhä, da Canoa. Eram duas horas da tarde. Cordulina, que vinha quase cambaleando, sentou-se numa pedra e falou, numa voz que-brada e penosa: - Chico, eu näo posso mais... Acho a té que vou morrer, Dá-me aquela zoeira na cabeca! Chico Bento olhou dolorosamcntc a mulher. O cabelo em faliiitas sujas, como que gasto, acabado, caía, por cima do rosto, envesgando os olhos, rocando na boca. A pele, empretecida como uma casca, pregueava nos bracos e nos peitos, que o casaco e a camisa rasgada desco-briam. No colo da mulher, o Duquinha, também só osso e pele, levava, com um gemido abafado, a mäozinha ímunda, de dedos ressequidos, aos pobres olhos doentes. E com a outra tateava o peito da mäe, mas num movimento täo fraco c täo tristc que era mais uma tentativa do que um gesto. Lentamente o vaqueiro Voltou as costas; cabisbaixo, o Pedro o seguiu. E foram andando á toa, devagarinho, costeando a margem da caatinga. De repente, um bél, agudo e longo, > na calma. E uma cabra ruiva, nambi, de focinho quase preto, estendeu a cabeca por entre a - de galhos secos do caminho, agucando os rudimentos de orelha, evidentemente procurando ouvir, naquela distensäo de sentidos, uma longínqua resposta a seu apelo. Chico Bento, perto, olhava-a, com as mäos trěmulas, a gargarita áspera, os olhos afo-gueados. O animal sollou novamente o seu clamor aflito. Cauteloso, o vaquciro avancou um passo. E de súbito em trés pancadas secas, rápidas, o seu cacete de zuniu; a cabra entonteceu, amunhecou, e caiu em cheio por terra. Chico Bento tirou do cinto a faca, que de täo velha e täo gasla nunca achara quern lhe desse um tostäo por ela. Abriu no animal um corte que foi de debaixo da boca até separat' ao meio o ubere branco de tetas secas, escorridas. Mas Pedro, que fttava a estráda, o interrompeu: - Olha, pai! Um hörnern de mescla azul vinha para eles em grandes passadas. Agitava os bracos com fúria, aos berros: - Cachorro! Ladräo! Matar minha cabrinha! Desgracado! Chico Bento, tonto, desnorteado, deixou a faca cair e, ainda de cócoras, tartamudeava explicacöes confusas. O horném avancou, arrebatou-lhe a cabra e procurou enrolá-la no cottro. Dentro da sua pcrturbacáo, Chico Bento compreendou apenas que lhc tomavam aquela carne em que seus olhos famintos já se regalavam, da qual suas mäos febris já tinham sentido o calor confortante. E lhe veio agudamente á lembranya Cordulina , ; - na pedra da estráda... o Duquinha täo morto que já nem chorava... Caindo quase de joelhos, com os olhos vermelhos cheios de lágrimas que lhe corriam pela face áspera, suplicou, de mäos juntas: - Meu senhor, pelo amor de Deus! Me deixe um pedaco de carne, um taquinho ao menns, que dě um caldo para a mulher mais os meninos! Fot pra elcs que cu matei! Já caíram com a fome!... - Näo dou nada! Ladräo! Sem-vergonha! Cabra sem-vergonha! A energia abatida do vaqueiro náo se estimulou nem mesmo dianie daqtiela palavra. Antes se abateu mais, e ele ficou na mesma atitude de súplica. E o hörnern disse afinal, num gesto brusco, arrancando as tripas da criagäo e atirando-as para o vaqueiro: - Tome! Só se for isto! A um diabo que faz uma desgraca como voce fez, dar-se tripas é até demais!... A faca brilhava no chäo, ainda ensangiientada, e atraiu os olhos de Chico Bento. Veio-llie um ímpeto de brandi-la e ir disputar a presa; mas foi ítnpeto confuso e rapide Ao gesto de estender a máo, faltou-lhe o ánimo. O homem, sem se importai com o sangue, pusera no ombro o animal sumariamente en-volvido no couro e marchava para a citsa cujo telhado vermelhava, la alcm. Pedro, sem perdcr tempo, apanhou o fato que ficara no chao e correu para a mae. Chico Bento ainda esteve uns monientos na mesma postura, ajoelhado. E antes de se erguer, chupou os dedos sujos de sangue, que lhe deixaram na boca um gosto amargo de vida. (Rio de Janeiro, J. Olympio, s/d. p. 72-5.) falripas: cabelos muito ralos na cabega. esiriduloii: soon agudo e penetrante, orla: borda, beira, margem. jucá: pau-ferro. exänime: desfalecida. i 1. Retire do texto trechos que demonstrem: a) que Chico Bento e sua família säo relirantes; b) o eslado de degradacäo tisica das personagens. 2. Descreva o lugar onde Chico Bento e sua família estäo. 3. O dono dít cabra xinga o sertanejo duas vezes. a) Qual é a atitude de Chico Bento na primeira vez? b) Por que näo reagiu ao ser xingado pela segunda vez? 4. Considerando a célebre frase de Euclides da Cunha: "O sertanejo é antes de tudo um forte", como podemos interpretar o trecho final desse texto? Jose Lins do Rego: realidade e ficcäo no engen h o O periodo de transicäo da cconomia ca-íiavieira íiordestina na regiäo da Paraíba e de Pernambuco encontrou sua maior expressáo literária na ficcäo de Jose Lins do Rego. Jose Lins do Rego (1901-1957) nasceu no engenho Corredor, no municipio de Pilar, na Paraiba, Orfäo de.mäe, foi criado no engenho por seu avô ma terno. Fez Direito em Recife, e data dessa época sua integracao ao grupo modernista de Recife, do qual faziam parte José Américo de Almeida, Olivio Montenegro c Gilberto Frcire. Formado, foi para Minas Gerais, como promotor publico, c depois para Maceió, onde permaneceu por nove aii9s e escreveu setts primeiros livros, tendo convivido com üraciliano Ramos, Jorge de Lima e Rachel de Queiroz. Em 1935 passou a viver no Rio de Janeiro. Colaborou em jornais e exerceu cargos diplomáticos. Pouco antes de sua morte, foi cleito para a Academia Brasilcira dc Letras. Jose Lins do Rego teve até os doze anos uma educacao livrc, num mundo dividido entre os cuidados de sua tia Maria e as experiěncias com os primos e os moleques do engenho. O centro desse mundo era a figura pa-triarcal do avö. Associando suas vivéncias de menino de engenho e de adolescente ä sua extraordinária capacidade para contar histórias, Jose Lins consegue, numa linguagem fluida, solta, livre, popular, captar a vida nordestina por dentro e rcgistrá-la num momento cm que se operavam no Nordeste transformacöes de ordern social e econömica, fruto da decadencia do engenho, logo subs-tituido peia usina moderna. A obra de Jose Lins do Rego, segundo indicacöes dele proprio, se divide, pela temática, em: ciclo da cana-de-acúcar, com Menino de engenho, Doidinho, Bangui, Fogo morto c Usina; ciclo do cangago, do misticismo e da seca, com Bedra bonita e Os eangaeeiros; obras independentes, com O mo-leque Ricardo, Pureza, Riacho doec (vineuladas também aos ciclos in-dicados), Agua-mäe e Euridice. [...] contando a história da sua terra, Jose Lins do Rego nos pöe diante dos olhos, como documentário auténtico, toda a vida do Nordeste: o mandonismo dos coronéis, o conflito dos patriarcas rurais com os jovens bacharéis fra-cassados, a luta do progresso da industriatizaeäo contra o^traso feudal (a usina devorando o bangiiě); o espetáculo dramático do fariäfismo populaT e as tropelias heróicas dos bandoleiros sol tos a Tazer justica com as próprias mäos, truculentos e brutais; as intrigas miúdas da política municipal; e por cima, e mais do que tudo isso, o dorn de uma infinita poesia - na paisagem, nas coisas, nas eriaturas, em tudo. [...] e deu-nos, com o Ciclo da Cana-de-Agúcar, um levantamento complete - econömico, ecológico, psicológico e social da vida dos bangües, dos engenhos e das usinas - naqucla dramática panfagia em que os engenhos devoravam os bangües - e as usinas, poderosas e avassaladoras, devotavam tudo - homens e coisas, engenhos e bangües. Uma cpopóia rural do Brasil - pobre, melaneólica, dolorosa - como a propria vida infra-humana daquela gente que se move nos partidos de canas, nos engenhos e nas bagaceiras e até nas casas-grandes do Nordeste. (Peregrino Junior. José Lins do Rego. Rio de Janeiro, Agir, 1975. p. 17. Nossos Clássicos.J Fogo morto e o ciclo da cana-de-acúcar Em sua primeira obra, Menino de engenho, Jose Lins do Rego pretendia cscrcvcr, segundo ele proprio, a biografia de seit avö Jose Paulino, uma figura das mais representativas da tradicäo Fundamentada no sistema pa-triarcalista, escravoerata e latifundiário. A obra deveria, também, conter cenas autobiográficas de sua infäncia. Entretanto, o Jose Lins biográfico foi superado pela imaginacäo criadora do Jose Lins romancista. Desse modo, Menino de engenho inicia cm torno do menino de engenho Carlos dc Melo uma trilógia em que se incluem também .Doidinho e Bangiii. Ao mesmo tempo, as tensöes sócio-econômicas do engenho de acúcar apontadas pelo menino narrador-personagem teräo continuidade e dinamismo nos outros romances que inlegram o ciclo da cana-de-acúcar, principalmente em Fogo morto - romance-síntese do ciclo -, que marca a parte mais significativa das producôes do autor. (Fogo morto se apresenta dividido em trěs partes, Na primeira, 'O mestre José Amaro', José Lins enfatiza o destino c o drama humano de uma per-sonagem que tem orgulho de ser seleiro, de possuir uma profissäo independente, passada de pai para filho. A segunda, 'O engenho de seu Lula', é a história da ascensäo, do apogeu e da decadencia do engenho Santa Fé, arruinado no final por seu proprietário, o Coroncl Lula de Holanda, auto-ľitário, prepotenle e incapaz. Na terceira, 'O Capitäo Vitorino', o autor dá énfase á figura do Capitäo Vitorino, o Papa-Rabo, alvo das chacotas da molecada e até dos adultos, uma espécie de D. Quixote nacionál, que anda de engenho em engenho sempre cm defesa dos injustieados, grandes ou pe-quenos. As relacóes que se estabelecem entre as personagens costuram esses trés fios narrativos e, ao mesmo tempo, fixam urn momento de grandes mu-dangas sócio-econômicas na regiäo nordestina. A visäo nostálgica do autor, marca principal dos outros romances que integrant o ciclo da cana-de-agňear, cede lugar em Fogo morto a um pro-ftmdo sentimento de inconformismo social e de tristeza. I O texto a seguir, extraido do romance Fogo morto, pertence ao capitulo que narra a chegada do i cangaceiro Antonio Silvino e seu bando ao engenho do coronel Lula de Holanda. Tal invasao é uma I represália contra o coronel Lula, uma vez que Mestre Amaro, informante dos cangacciros, fora cxpulso do engenho por ele. O bando também quer encontrar um possível "tesouro" que Lula teria herdado de seu sogro, quando o engenho era ainda próspero. Nunca mais que o cabriole de Seu Lula enchesse as estradas com a música de suas campainhas. A familia do Santa Fé náo ia mais á missa aos domingos. A principio correra que era doenea no velho. Depois inventaram que o carro náo podia mais I rodar, de podre que estava. Os cavalos nao agiicntavam mais com o peso do corpo. Na casa-grande do engenho do Capita o Tomáš a tristeza e o desánimo haviam tornado i conta até de D. Amelia. Náo tinha coragem de sair de casa com aquela afronta, ali a i dois passos, com um morador atrevido sem levar em conta as ordens do senhor de I engenho. Todos na várzea se acovardavam com as ordens do cangaceiro. O governo i mandava tropa que maltratava o povo, e a forca do bandido náo se abalava. Pobre de seu marido, que nao pudera contar com a ajuda dos outros proprietários. Estivera no Santa Rosa e o conselho que lhe deram fora para que nao tomasse providéncia nenhuma perante as autoridades. Todos temiam as represálias. Lula nao lhe dizia nada, mas só aquilo de nao querer mais botar a cabega de fora, de fugir até das 1 obrigagócs dc sua devogao, dizia da mágoa que lhe andava na alma. Náo lhe tocara no assunto, mas teve vontade de tomar o trem e ir valer-se do Presidente. Nao faria isto para nao humilhá-lo. Era o fim que ela nao esperava que chegasse assim. O engenho se arrastava na safra de quase nada. Mas ainda moia. [...] Tudo se calara c D. Amelia parccia que havia saido de um sonho. Agora, a casa Í silenciava. [...] O gado do engenho vinha chegando para o curral. Pobre gado, meia i dúzia de reses. O molcque que o pastoreava gritava para os bois velhos. I [...] Foi acender o candeeiro da sala de jantar. E quando trcpou na cadeira para S cortar o pavio viu na porta dc frcntc uns homens parados na calgada. Acendeu a luz e i saiu para saber o que era aquilo. [...] ill c > U fiľ (• 14 llll Era o Capitäo Antônio Silvino no Santa Fé. Os cangaceiros cercaram a casa e o negro Floripes, amarrado, cho-rava dc mcdo. F.stendido no marquesäo, o senhor do engenho arquejava, A mulher perto dele chorava, enquanto os cabras já estavam no quarto rebulindo em tudo. Foi quando se ouviu um grito que vinha de fora. Apareceu o velho Vitorino, aeompanhado de um cangaceiro: - Capitäo, este velho apareceu na estráda, dizendo que queria falar com o senhor. - Quem é vocé, velho? - Vitorino Carneiro da Cunha, um criado ás ordens. - E o que quer de mim? Que respeite os homens de bem. - Näo estou aqui para ouvir lorotas. - Näo sou loroteiro. O Capitäo Vitorino Carneiro da Cunha näo tem medo de ninguém. Isto que estou dizendo ao senhor disse na focinheira do Tenente Maurício. O que é que quer este velho? - Tenho nome, capitäo, fui batizado. - Deixa de prosa. - Estou falando como hörnern. Isto que o senhor está fazendo com o Coronel Ltila de Holanda é uma miséria. - Cala a boca, velho. Um cangaceiro chegou-sé para perto de Vitorino. - ülha, menino, estou Palando com o teu chefe. Ainda näo cheguei na cozinha, - Deixa ele comigo, Beija-Flor. - O que eu lhe digo, Capitäo Antonio Silvino, é o que digo a todo mundo. Eu, Vitorino Carneiro da Cunha, näo me assusto com ninguém. - Pára com isto, senäo eu te mando dar um ensino, velho besta. - Tenho nome. Sou inimigo politico do Coronel Lula, mas estou com ele. - Está com ele? Pega este velho, Cobra Verde. Vitorino lez sinal de puxar o punhal, encostou-se na parede e gritou para o cangaceiro: - Venha devagar. Uma coronhada de rifle na cabega botou-o no chäo, como um fardo. Mas quando ia mais adiantada a destruigäo das grandezas do Santa Fé, parou um cavaleiro na porta. Os cangaceiros pegaram os rifles. Era o Coronel José Paulino, do Santa Rosa. O chefe chegou na porta. - Boa noite, Coronel. - Boa noite, Capitäo. Soube que estava aqui no engenho do meu amigo Lula e vim até cá. E olhando para o piano, os quadros, a desordem de tudo: - Capitäo, aqui estou para saber o que quer o senhor, do Lula de Holanda. E vendo D. Amelia aos solugos, e o velho estendido no marquesäo: - Quer dinheiro, Capitäo? A figura do Coronel José Paulino encheu a sala de respeito. - Coronel, este velho se negou ao meu pedido. Eu sabia que ele guardava muito ouro velho, dos antigos, c vim pedir com todo o jeito. Negou tudo. - Capitäo, me desculpe, mas esta história dc ouro é conversa do povo. O meu vizinho näo tem nada. Soube que o senhor estava aqui e aqui estou para receber as suas ordens. Se é dinheiro que quer, eu tenho pouco, mas posso servir. Vitorino apareceu na porta. Corria sangue de sna cabega branca. - Estes bandidos mc pagam. - Cala a boca, velho malcriado. Pega este velho, Cobra Verde. - Capitäo, o meu primo Vitorino näo é hörnern de regular. O senhor näo deve dar ouvido ao que ele diz. - Näo regula, coisa ncnhuma. Vocés däo protcgäo a estes bandidos e é isto que eles fazem com os homens de bem. - Coronel, eu me retiro. Aqui eu näo vim com o intento de roubar a ninguém. Vim pedir. O velho negou o corpo. - Pois eu lhe agradego, capitäo. A noite já ia alta. Os cangaceiros se alinharam na porta. Vitorino, quase que se arrastando, chegou-se para o chefe e lhe disse: - Capitäo Antônio Silvino, o senhor sempre foi da cstima do povo. Mas deste jeito se desgraga. Atacar um engenho como este do Coronel Lula, é mesmo que dar surra num cego. Cala a boca, velho. - Esta que está aqui só se cala com a morte. Quase que näo podia falar. E quando os cabras se foram, o Coronel José Paulino voltou para a sala para confortar os vizinhos. D. Amelia chorava como urna menina. Toda a casa-grande do Santa Fé parecia revolvida por um furacäo. [...] Agora já tinha chegado gente. O dia clareava a desgraga da sala revolta. O Coronel José Paulino despediu-se dos amigos e preparava-se para sair. - Vitorino, vamos para casa. - Está muito cnganado. Daqui saio para a estagäo. Vou telegrafar ao Presidente para lhe contar esta miséria. O Rego Barros vai saber disto. Este merda do Antônio Silvino pensava que me fazia correr. De tudo isto, o culpado é voce mesmo. Deram gás a este bandido. Está aí. Um hörnern como Lula de Holanda desfeiteado como um camumbembe. Eu näo tenho dinheiro na burra, sou pobre, mas um cachorro deste näo pisa nos meus calos. (17? ed. Rio de Janeiro, J. Olympio, 1977. p. 249-261.) 1. Orgulhoso, senhor de terras, Lula de Holanda lutava para manter a digmdade e as aparéncias, apesar da decadcncia de sua situagäo econômica. a) Que fatos demonštrant a perda de autoridade do senhor de engenho? b) Que conseqüencias essa perda de autoridade traz para ele e sua família? c) Retire do texto trechos em que é mostrada a decadéncia material do engenho. 2. O cangago faz parte da paisagem nordestina. a) Como as pessoas reagem ás atitudes do cangaceiro Antônio Silvino e seu bando? b) Com que autoridade o coronel José Paulino aborda o cangaceiro Antônio Silvino? c) Em que consiste a indignagäo do capitäo Vitorino diante das afrontas do cangaceiro? 3. Indique tragos quixotescos nas atitudes do Capitäo Vitorino. 4. Em um depoimento a Medeiros Lima, em Polítkas e Letras (1948), José Lins do Rego aiirma: "Näo cuido da forma porque a minha forma é a coisa mais natural deste mundo. Ordern direta, oragäo principal com o sujeito claro, pronomes colocados de ouvido e, sobretudo, adotando solugôes que säo solugôes da lingua do povo". Retire do texto trechos que cxcmplifiquem a utilizagäo, de fato, da lingua do povo. ■NHBH H ■h -SSh -iŕífe. "■í*iv 'VŽJBJff''' 'ffiflSf*1 'OSě^Í ■HHHBIHI A Bahia e o Rio Grande do Sul também estáo presentes na ficcáo da década de 30: a Bahia, por meio de Jorge Amado, que mclhor soube capfár as contradicoes, os problemas e a riqueza cultural de seu Estado natal; o Rio Grande do Sul, por meio de Érico Veríssimo, que, numa fase, recriou com habilidade o cotidiano da cidade grande e, em outra, reconstituiu epicamente os episódios da lormacao social de seu Estado. orge Amado e Érico Veríssimo säo autores cuja ficcäo mantém pontos em comum: ambos, fixando o cenário de seus romances em regiöes brasileiras opostas, fazem de snas personagens agentes de transformacäo do mundo em que vivemTJorge Amado, em Terras dö sem-fim, narra a acäo de homens ambiciosos e violentos que ocupam, na Bahia, terras nas matas da orla atlántica para instalarem a moderna lavoura capitalista. Érico Veríssimo, em O tempo e o ve«řo,apresenta um amplo painel da formacäo do patriarcado rural no Rio Grande do Sul. Eseritores regionalistas, ambos esereveram .obras cuja ambientaeäo é urbana. Erico Veríssimo registra o cotidiano da cidade grande pelo ángulo de visäo das personagens; Jorge Amado traz para a ficcäo a gente pobre da cidade de Salvador - homens do cais do porto, menores abandonados, pais-de-santo, prostitutas, mascates, capoeiristas, malandros, os costumes pro-vincianos e as festas populäres. Tanto um quanto outro adotaram um modo de narrar que alia o lirismo ao documento, á crítica social, e earacterizam-se pela simplicidade dc lin-guagem c pelo tom coloquial e popular, o que lhes assegurou grande éxito de publico. Jorge Amado: as mil faces da Bahia Jorge Amado nasceu em Pirangi, no Estado da Bahia, em 1912. Trabalhou na imprensa e es-tudou Dheuajím 1931, transferiu-se para o_Rio de^aneiroe se tornou conhecido com a pubíicacäo do romance O pah do Camaval. Alcancou noto-riedadej entretanfo, com- dois romances pu-blicados logo em seeuida- ftfflfft e Suor. Politicamente comprometido com idéias so-cialistas, participou do movimento de frente popular da Aiianc>i Nacionál libeiUulnra, tendo sido preso em i'936. Líberťado em 1937, morou em Buenos Aires, onde publicou a biografia de ^Preste£.jDe volta ao Brasil, em 1945,, foi eleito deputado federal, mas teve cassado seu mandato politico. Dekou novamente o pais e residiu na Franca, na Uniäo Soviética e em países ďas cha-madás Démócracias Populäres, até que cnťP952!. retornou ao Brasil. Nessa ocasiäo já se tornara mundialmente conhecido. Em 1959, ingressou na Academia Brasileira de Letras4 e seus livros estäo hoje traduzidos para mais de trinta línguas. TO II . ip i ■ i.....n i A maior parte de suas obras, principalmente as de sua fase iniciál, apresentam preocupaeäo politico-social, denunciando, num tom seco, lírico e participante, a miséria e a opressäo do trabalhador rural e das classes populäres. Com o amadureeimento do autor, sua forca poética voitou-se para os ppb.res,. para a infäncia abandonada e delinqíicnte, para a miséria do negro, para o cais de sua terra natal, para a seca, o cangago, a exploracäo do trabalhador urbano c rural e para o coronelismo latifundiário. Vista no conjunto, a obra de Jorge Amado apresenta altos c baixos, uma vez que revela certo descuido formal, abuso de cliches c lugarcs-co-muns, lirismo ás vezeš piegas, o que a impede de atingir o nivel que se esperaria do mais conhecido romancista brasileiro. Jorge Amado iniciou sua carreira de eseritor com obras de eunho regionalista e dc denúncia social e passou por diferentes fases alé chegar á atual, voltada para a cronica de costumes. ■BHNHBHHMHBHIIHIHHI if> So1 '1 r »•"'1 i ''i < m >' i(i«a.;i> -ii: ijiin -i m "i&riiW n. iiiii ■ ií)."i ■ Iii n u i i ní-1 ■ ■]«,■' ■■" ľ ľ«?isr «ik JKfiArt, (ig otl JtJL,"- nf* I ' ~ Sos, e nada pode contra sua ciôncia e nem contra si mesma. O agudo olfato, o agudo olhar, a mäo, livre de encantos, se destroem no sonho da existencia. :: (Em Reunläo, p. 165.) ingaia ciSncin: neologismo uritido pelo autor a parlir dahegacSo degaia ciéncia; arte de poetar entre os provencais da ldade Média. Nietzsche; filósofo do século passaďo; também cscrcvcu um livro intitulado Oaia Ciéncia, ao qual reflete sobre questóes como a moral, a necessidade de cteocay o sentimento de potencia, etc. prenda: presente. estela: túmulo, marco; cm latim, "estrela". ócios: descansos, preguicas. qucliruntns: ľcitÍ90S, encantamentos, maus-olhados. É 1 Está sem mulher, Com a chave na mäo cstá sem discurso, quer abrir a porta, está sem carinho, näo existc porta; já näo pode bcber, quer morrer no mar, já näo pode fttmar, mas o mar secou; ctispir já näo pode, quer ir para Minas, a noite esfriou, Minas näo hä mais. o dia näo veio, Jose, e agora? o bonde näo veio, 0 t'iso näo veio, Sc voce grilasse, näo veio a utopia se voce gcmcsse, e tudo acabon se voce tocasse e tudo fugiu a valsa vienense, e tudo molou, se voce dormisse, e agora, José? se voce cansassc, se voce morresse... E agora, José? Mas voce näo morre, sua doce palavra, voce e duro, Jose! seu instante de febre, sua gula e jejuni, Sozinho no escuro sua biblioteca, qual bicho-do-mato, sua lavra de ouro, sem teogonia, seu terno de vidro, sem parede nua sua incoeréncia, para se encostar, seu ódio - e agora? sein cavalo preto que fuja a galope, voce marcha, Jose! Jose, para onde? (Em Reuniäo, p. 70.} Congresso internacionál do medo Provisoriamente näo cantaremos o amor, quc se refugiou mais abaixo dos subterräneos. Cantaremos o mcdo, que esteriliza os bragos, näo cantaremos o ódio porque esse näo existe, existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro, o medo grande dos scrtôes, dos mares, dos desertos, o medo dos soldados, o medo das mäes, o medo das igrejas, cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos demoeratas, cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte, depois morreremos de medo e sobre nossos túmulos nasceräo flores amarelas e medrosas. (Idem, p. 49.) Maos dadas Näo serei o poeta de um mundo cadueo. Também näo cantarei o mundo futuro. Estou preso á vida e olho meus companheiros. Estäo taciturnos mas nutrem grandes esperancas. Entre eles, considero a enorme realidade. O presente é täo grande, näo nos afastemos. Näo nos afastemos muito, vamos de mäos dadas. Näo serei o cantor de uma mulher, de uma história, näo direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela, näo distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida, näo fugirei para as ilhas nem serei raptado por scrafms. O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente. (Idem, p. 55.) Sea ptiesiada década de 30buscou caininhosque essencialniente refletissem a condicäo do lioiiicm em seu estar-no-mundo, sem dúvida essa trajeíoria encontrouna poesia deMtiríloiMendes, bem como na de seu amigo Jorge de Lima, urna de suas saídas naturals: a poesíä metafísica e religiosa. os anos 30, no Rio de Janeiro, formou-se um grupo de artistas e intelectiiaiš católičos dě grande expressäo. Participávám dele os eríticos lí-"terários de renome Jackson de Figueíredo e Tristäo de Ataíde, o pinlor e poeta carismátieo Ismael Nery, os poetas NtadoJMendes e Jorge de Lima e ,«■ outros. Vínícíus de Moraes e Cecília Meireles, embora näo fízessem parte diretamente desse grupo, acabaram sendo envolvidos pelo espiritualismo que cle difundia. Influencíados pelas idéias do filósofo católico Jacques Maritain e por toda uma série de eseritores catóííčos europeus, o grupo caríoca defendia umaj^nqvacäo do catolicismo e a criacäo de urna arte crista conibativa. P Naquele moměňto de eríse ecoriôŕnicu, de apatecimenlo do nazi-fascis-mo e de expansäo do comunismo, os católičos julgavam que o cristíanismo era a única ideológia capaz de trazer a justica, a igualdade social e a paz entre os homens. Mas defendiam um cristianismo mais proximo, mais po-litizado e envolvido com os problemašmundanos; ás vezes chegava até a se - confundir com idéias socialistas^ como neste poema de Jorge de Lima: A dlvisäo de Cristo Dividamos o Mundo em duas partes iguais: uma para Portugueses, outra para espanhöis: Vem quinhentos mil eseravos no bojo das naus: a metade morrcu na viagem do oceano. Dividamos o Mundo entre as pätrias. Vem quinhentos mil eseravos no bojo das guerras: a metade morreu nos eampos de batalha. Dividamos o mundo entre as mäquinas: Vem quinhentos mil eseravos no bojo das fäbricus, a metade morreu na eseuridäo, sem ar. Näo dividamos o mundo. Dividamos Cristo: todos ressuscitaräo iguais. {Jorge de Lima. Em Poesia campleta. 2? ed. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1980. v. 1, p. 200.) Desse grupo católico, interessam á literatúra a obra de JMmilo Mendes e a de Jorge de Lima, dois dos principals re-presentanfes da poesia religiosa cultivada na sej^djt_gcracäo do Modernismo brasileiro. Aniigos, com umaldeologia e urna carreira muito parecidas, desenvolveram uma obra poética com vários pontos de contato. Chegaram até mesmo a fazer i junjtos experiénciasi comJJojBmontagens e a escrevcr em par-I čeria a obra Tempo e eternidade~{\9'i5). Poetas de cxpcriéncia variada, cultivaram a poesia meta-Jtóico-religiosa, ajjoesia social c a poesia de jnfluénciäsur-reajista, porém algTinT"äspectos os dištanciám e merecem tra-tamento específico. Murilo Mendes (1901-1975) nasceu em J'uiz de Fora, Minas Gerais, onde fez os estudos secundários. Foi bancário, inspetor de ensino e serventuário da jus-ticä, antes de se mudar para a Eui-opa, em 1953. Ali trabalhou como pjrofessor de Jiteratura brasileira, lecionando em vários países-Bélgica, Holanda, Itália, Espanha e Portugal onde conheceu artista s de quase todo o mundo. No Brasil, visto como eseritor difícil, lem.sido es-queciďo ao longo dos anos. Mais do que difícil, porém, a poesia de Murilo Mendes _é_ surpreendente. O estra-nhamento que provoca deve-se á sua linguagem frag-mentada, ás suas imagens insólttas, á sua visao messiánica do mundo e á suÉrsImbologia própria. Partindo de uma concepcäo de que o mundo é o proprio'caos) sua poesia busca o tempo toďcTdestruif para "fečonstruir, subverter a ordern das coisas instituídas para reorganizá-las de acordo com leis próprias. Considerado por alguns como o principál representante da poesia surrealista no Brasil, a obra de Murilo Mendes está longe de receber qualquer classificagäo taxa-liva. Ela é o resultado das múltiplas experiéncias pelas quais passou o autor: o eristianismo, o surrealismo, a poesia social, o neobarroquismo e o experimentalismo línguístico. Tentando conciliar realidades díspares, o proprio autor comenta: "um grande artista deve conciliar os opos-tos", que säo "grandes temas centrais da arte e da vida humana: a idéia da transgressäo da ordern - a saudade do_ jparaiso perdido - e a volta á unidade". (Apud Lais C. de Äraujo. Murilo Mendes. 2- ed. Petrópolis, Vozes 1972.) A obra Murilo Mendes comecou sua carreira como autor mo-v dernista, fazendo publicacôes esparsas nas revistas paulistas da 1} década de 20. Sua obra de estréia, Poemasi veio a publico somente em 1930 e nela já se notavam alguns dos tracos que iriam marcar sua poesia futura:ji dilaceracäo do eu em con-flito, a presenca constante de meľäforas c símbolos, a in-clinacäo para o surrealismo e os contrastes abstea^c^oiicrelg, « lucidez/delírio, reálidade/niito. J ' \No início da década de 30, suas experiéncias foram múl-' tiplas: tomou contato com o marxismo, de que resultou a obra Bumba-meu poetu (eserita em 1930 é piiblicada em 1959), que demonstra solidariedade para com a classe operária. Em 1932, publicou História do Brasil, uma obra de fundo nacionalista, que retrata nossa história sob uma visäo ufanista-irônica. Ao mesmo tempo esereveu O visionário, em qué se observa um acentuadoelima onírico e muitas sugestôes surrealistas. Em 1934, tendo-se convertido com profundo fervor ao (catolioismo,_escreyeu cm parceria com Jorge de Lima a obra Tempo e eternidade. Sem romper com nenhuma das posigôes anterióŕmente tomadas, Murilo concilia a poesia religiosa com as comradicôcs do cu, com a preocupagäo social e com o so-brenaturaliSurrealista. Cria, assim, um conceito particular de religiosidade, unido á arte e a um senso prático da vida -erotismo, democracla é socialismo. Em sm concepgäó religiosa, 6élementos contrastanféš? tais como finito/infinilo, visível/invisível, matéria/'espírito, näo se excluem. Pára ele, essäs polaridades confundem-se nosCorpo ( Místicó^em Deus, e apenas passam por uma experiéncia terrestre. Q 0UMt<*ď Até o final de sua carreira, Murilo Mendes trilliou^outros caminhos, como a busca do formalismo clássico, na década dé^40y'quando piiblicou Contemplapäo de Oliro Preto, e asexperiéncias com a linguagem substantiva, concreta, nos"ános 50 - momento em que já vivia na Europa, e no Brasil se iniciava o Concretismo. Em suas ultimas obras - Sicilicma, Tempo espanhol, Convergéncia - säo freqüentes ps neologismqs, os sinak gráficps, a expjoragäo do espaco da gágina, a construcäo assintática, a oposicäo fonético-scmäntica e outros procedimentos de pesquisa lingíiística, como ilustratn estes versos: Astron ave Astroneve Astronive Astronovo Astronuvem Astronável Mais do que mera adesäo ás propostas do Concretismo, convém encarar essa producäo final do poeta como o resultado natural de todas as suas experieneias e inquietudes diante da poesia. M^rjlonao, gostava de pertencer a grupos fechados, como ele mesmo explica: "Eu tenho sido toda a vida um "franco-atirädör. Procuro obedecer a uma espécie de logica interna, de uni-dadc apcsar dos contrastes e dilaceracoes e mudancas: e sempře evitei programas e manifestos". (Apud Lais C. Araújo. Op. cit., p. 33.) O texto n seguir integra a obra A poesia em pánico, uma das mais importantcs de Murilo Mendes. Poéma cspiritual Eu nie sinto um fragmente de Deus .- Como sou um resto de raiz Um pouco da água dos mares O braco desgarrado de uma constelacäo. A matéria pensa por ordcm de Deus, Transforma-se e evolui por ordem de Deus. A maléria variácia e bcla E uma das formas visíveis do invisível. Cristo, dos fiflios do homem és o perfeito. Narlgreja mipernas; seios,-: ventres:e cabelos « ~ r~ Em toda parte, até nos allares. Há 'grandes forcas de matéria na terra no mar e no.ar Que so entrelacam e se casam reproduzindo : Mil versôes dos pensanientos divinos; A matéria é forte e absoluta Sem cla näo há pecsia. (Em i jľs c. de Araújo. Op. cit.j p. 128-9.) ILUSTRAQAO: VIM DESENHOS 1. De acordo com a primeira estrofc do poéma, como se sente o eu lírico perante Deus e perante o universo? 2. A propósito da scgunda estrofe do texto: a) Como voce entende os versos "A matéria variada e bela / K uma das formas visíveis do invisível"? b) Qual o papel de Deus diante do universo? 3. De acordo com a terceira estrofc do poéma: a) Em que a concepcäo religiosa expressa pelo eu lírico diferc da concepcäo tradieional? b) Qual a importäncia da matéria para a criagäo, no universo? 4. O texto intitula-se 'Poéma espirituaľ. De uma cxplicacäo possível ao título, levando em conta a importäncia que a matéria assume no texto. Jorge de Lima (1893-1953) nasceu cm Aja^pagf onde fez os primeiros estudos. Posteriormente mudou-sc para Salvador e ali iniciou.o_cursp dc Medicína, concluído no Rio de Janeiro. Já formado, regressou aJMapeió em 1915, onde fez uma brilhanle carreira como tnédico, além de in-gressar na vída pôlíjica"como_deputado estadual e se firmar como poeta. Desde 1910 seu nome vinha sendo difundido como poeta, em virtudc do sucesso que fizera seu poema parnasiano 'Acendedor de lampiöes'. Em 1930, mudou-se para o Rio de Janeúp, onde permaneceu até a morte. Seu consultório, si-tuado na Cinclandia, era também um atelié de arte e um ponto de eňcontro de inúmeros artistas e intelectuais que ali se reuniam, no timda tarde, para discussôes e, ás vezes, até para uma rápida consulta. Jorge de Lima é mais eo-nheeido como poeta, porém sua obra apresenta amplos Horizontes. Foi tambéňi _pintor, Jjp,-tógrafpj, cnsaísta, biógrafo^Jiis-toriador e prosador. Na (prosa, esereveu alguns contos.ji.novela de influéncia surrealistá~0 Anjo "(1934)"e os romances Salomäo e as mulheres (1927), Calunga (1935), A mulher obscura (1939) e Guerra dentro do beco (1950), uma pro-jlucäo ainda hoje quase totalmente desconhecida. Lanoadas numa' cpocä cm que pŕedominava o romance regionalista, essas obras chamam a ateneao por certas caracteristicas que apresentam, ás vezes simultaneamente, como o cn§tiariis_niq, p surrealismo, o regionaJismo, a urbanidade, a critica social, a rŕeflexäo filosófíca, a fragmentacäo narratTva e as referencias bíbíicas aos 1 mitos da criacäo, da queda e do apocalipse. A obra poética Jorge de Lima estreou em nossa literatura com XIV alexandrinos (1914), obra de feiflp nepparnasiana. Contudo, na decada de 20, aderiu ás pro-postas modernistas, passando a cultivar temas relacionados á paisagem nordestina, como o folclore, a fauna e a flora locais, o reencontro com a Infäncia, a miséria do povo e a consciéncia social. Säo dessa fase as obras O mundo do menino impossivel (1925), Poemas (1927), Poemas negros (1937) c outras. Este poema é um exemplo da preocupaeäo social do autor: Mulher proletária Mulher proletária - única fábrica que o operário tem, (fabi'ica de iilhos) tu na tua superprodueäo de máquina humana forneces anjos para o Senhor Jesus, forneces bracos para o senhor burgués. Mulher proletária, o operário, teu proprictário há de ver, há de ver: a tua produeäo, a tua superpiodufäo, ao contrario das máquinas burguesas salvar teu proprietário. (Em Poesia completa, v. 1, p. 152.) Outro aspectomarcante dessa fase da poesia de Jorge de Lima e a presenca do^ negro?) Essa experiencia, o poeta a colheu nos anos de sua jnfancja,, vividos ho Nordcstc, cm convivencia direta com meninos negros e com ex-escravos. Sua poesia, ao mesmo tempo que denuncia a condicao de exploracao e marginalizacao a que sempre foram submctidos os negros ho pais, cbrisegue tambem captar sua linguagem, sua alma, seu modo de pensar e agir. Estes versos dc 'Madorna de Iaia' ilustram esses tracos: Iaia esla na rede de tucum. A mucama dc Iaia tange os piuns, balanca a rede, canta um lundum, tao bambo, tao molengo, tao dengoso, que Iaia tem vontade de dormir. Com quem? Ram-rem. 4 A partir de^g35lttendj3.o autor se conyertidp ao ,ca-tolicismo. sua obra se volta para a detesa da causa crista. 'Tempo e eternidade (1935), escrita em parceria com Murilo Mendes, é a obra que inicia essa fasCj Nessa obra, que tem por subtítulo a frase "restauremos a poesia em Cristo", se verifica o aproveitamento da simbologia biblica, um jorte peMimismo perante qs destines do mundo e um sentimento He fraternidade para com os oprimidos, sempre de acordo com uma perspectiva mística e transcendente. Essas posturas säo aprofundadas nas obras sub-sequentes - A túnica inconsútil e Anuneiapäo e encontro de Mira-Celi -, que passam a fazer constante uso de imagens paradisíacas e apocalípticas, referéncias ao pecado original c á queda do paraíso, tuáo isso em meio a um misticismo exaTtado e embriagante, que almeja a concilíacäo dos "čôntrários, num verdadeiro neobarroquismo. O Livro de sonetos introduz jifase. final da poesia de Jor'gc de Lima, que conta também com sua obra maxima,: uma epopéia modernista,! Invenpäo de Orfeu (1952).! No Livro de sonetos o poeta retorna á disciplina niétrica e ao soneto, mas a atmosféra mística já näo. cqntém ps excessos da fase anterior; retorna também aos velhos temas db "Nôrdéšte, da infäncia e do colidianp. ' x>. ~~ Entrctanto, é Invenpäo de Orfeu o principal em-preendimento da obra de Jorge de Lima, espécie de síntese de toda a sua expenéncia artística, como poeta, romancísta ou pintor. Concebida em„ verdadeiro estado de transe, a obra é constituída portdez cantoš5com versos regulares e variados, e propôe-se a ser uma biografia"épíča do'próprip Tiomem ém busca de sua plenitude sensível e espiritual. Tal qual ocorre no Livro de sonetos, säo riquíssimas as imagens dos textos de Invenpäo, como se pode perceber nestes versos: Era um cavalo todo feito em lavas recoberto de brasas e de espinhos. Pelas tardes amenas ele vinha e lia o mesmo livro que eu folheava. Depois lambia a página, e apagava a memória dos versos mais dtuidos; entäo a escuridäo cobria o livro, e o cavalo de fogo se encantava. Bern se sabia que ele ainda ardia na salsugem do livro subsistido e transformado em vagas sublevadas. Bem se sabia: o livro que ele lia era a loucura do homem agoniado em que o ínciibo cavalo se nutria. doridos: tristes, doloridos. salsugem: lodo, detritos quo flutuam proximo das praias. ineubo: que se deita sobre algo; dc acordo com a crenca popular, demönio masculino que copula com as mulheres, enquanto elas dormem. Centra Cultural Säo Paulo apr63enla Brultismo Núcleo Experimental em *— Bf «mit iM*»f4a t dat Utttfta da ob's de JOH0E Li LIMA CAE7AN0 VILELA daiegundj r qjartg.filia Al 31h30 SAIA JAROEL FILHO \ ft O poéma que segue pertence á obra ^ tunica inconsútil. A ave Para /. Fernando Carneiro Ninguem sabia donde viera a estranha ave. Talvez o ultimo ciclone a arrebatasse de incognita ilha ou de algum golfo, ou nascesse das algas gigantescas do mar; ou caisse de uina outra atmosfera, ou de outro mundo ou de outro misterio. Velhos homens do mar nunca a haviam visto nos gelos nem nenhum andarilho a encontrara jamais: era nntropomorfa como um anjo e silenciosa como qualquer poeta. Primeiro pairou na grande cupula do templo mas o pontifice tangeu-a de la como se tangc um demonio doente. E na mesma noite pousou no cimo do farol; e o faroleiro tangeu-a: ela podia atrapalhar as naus. Ninguem Ihe ofereceu um pedaco de pao, ou um gesto suave onde se dependurasse. E alguem disse: "essa ave e uma ave ma das que devoram gado". E outro: "essa ave deve ser um demonio faminto". E quando as suas asas pairavam espalmadas dando sombra as criancas cansadas, ate as maes jogavam pedras na mistetiosa ave perseguida e inquieta. Talvez houvesse fugido de qualquer pico silencioso entre as nuvens ou perdesse a companheira abatida de seta. A ave era antropomorfa como um anjo e solitaria como qualquer poeta. E parecia querer o convivio dos homens que a enxotavam como se enxota um demonio doente. Quando a enchente periodica afogou os trigais, alguem disse: - "A ave trouxe a enchente". Quando a seca anual assolou os rebanhos, alguem disse: - "A ave comeu os cordeiros". E todas as fontes Ihe negando ligua, a ave desabou sobre o mundo eomo um Sansao sem vida. Entao um simples pescador apanhou o cadaver macio e falou: - "Achei o corpo de uma grande ave mansa". E alguem recordou que a ave levava ovos aos amicorclas. Um mendigo falou que a ave o abrigara muitas vezes do frio. E um nu: "a ave cedeu as penas para meu gibao". E o chele do povo: "era o rei das aves, que desconhecemos". E o filho mais moco do chefe que era sozinho e manso: "da-me as penas para eu escrever a minha vida tao igual a da ave em que me vejo mais do que me vejo em ti, meu pai". (Em Poesia completa, v. 2, p. 256-7.) 1. A ave näo encontra refúgio e conforto entre os homens. a) Que motivos os homens alegavam para näo Ihe dar acolhida? b) Na sua opiniäo, quais os motivos reais que levavam os homens a tomarem essa atitude? 2. Indique semelhaneas entre a ave e o poeta, o pescador, os anacorelas, o mendigo, o nu e o filho do chefe do povo. 3. A túnica inconsútil, a que pertence o poema lido, é obra de preocupacäo religiosa, eserita após a conversäo do poeta ao catolicismo, em 1935. Levando em conta o contexto místico em que se inserc o pocma, aponte no mínimo duas interpretacôes religiosas relacionadas ao símbolo da ave. 4. Discuta com o professor e com a classe e indique outras interpretacôes näo religiosas relacionadas ao símbolo da ave. Murilo Mendes iiiilro))oinorfb: semelhan- te ao homem. anacoretas: ermitäos; re-ligiosos que vivem soli-tariamente. Cancäo do exílio Minha terra tem macieiras da California onde cantam gaturamos de Veneza. Os poetas da minha terra säo pretos que vivem em torres de ametista, os sargentos do cxéreito säo monistas, cubistas, os filósofos säo polacos vendendo a prestacôes. A gente näo pode dormir com os oradores e os pernilongos. Os sururus em família tém por testemunha a Gioconda. Eu morro sufocado cm terra cstrangeira. Nossas flores säo mais bonitas nossas frutas mais gostosas mas custam cem mil-réis a dúzia. Ai quern me dera chupar uma carambola de verdiide e ouvir um sabiá com certidäo de idade! (Em Antonio Candido e J. Aderaldo Castello. Op. cit., v. 3, p. 181.) Jorge de Lima Essa negra fulô Ora, se deu que chcgou (isso já faz muito tempo) no bangiié dum meu avô uma negra bonitinha chamada negra Fulô. Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! (Kra a fala da Sinhá) — Vai forrar a minha cama, pentear os mcus cabclos, vem ajudar a tirar a minha roupa, Fulô! Essa negra Fulô! Essa negrinha Fulô ticou logo pra miieama, para vigiar a Sinhá pra engomar pro Sinhô! Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! (Era a fala da Sinhá) vem mc ajudar, ó Fulô, vem abanar o meu corpo que eu estou suada, Fulô! vem cocar minha coceira, vem me catar cafuné, vem balancar minha rede, vem me contar urna história, que eu estou com sono, Fulô! Essa negra Fulô! "Era um dia uma princesa que vivia num castelo que possuía um vestido com os peixinhos do mar. Entrou na penia dum pato saiu na perná dum pinto o Rei-Sinhô me mandou que vos contasse mais cinco." Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô? Ó Fulô? Vai botar para dormir csscs mcninos, Fulô! "Minha mäe me penteou minha madrasta me enterrou pelos figos da fígueira que o Sabiá beliscou." Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Fulô? Ó Fulô? (Era a íala da Sinhá chamando a negra Fulô.) Cadé meu frasco dc chciro que teu Sinhô me mandou? Ah! foi vocé que roubou! Ah! (bi vocé que roubou! O Sinhô lbi ver a negra lcvar couro do feitor A negra tirou a roupa. O sinhô disse: Fulô! (A vista se escureceu que nem a negra Fulô.) Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô? Ó Fulô? Cadé meu lenco de rendas cadé meu cinto, meu broche, cadé meu terco de ouro que teu Sinhô me mandou? Ah! foi vocc que roubou. Ah! foi vocé que roubou. Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! O Sinhô foi acoitar sozinho a negra Fulô. A negra tirou a saia e tirou o cabecäo, de dentro dele pulou nuinha a negra Fulô Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô? Ó Fulô? Cadé, cadé teu Sinhô que nosso Senhor me mandou? Ah! foi vocé que roubou, foi vocô, negra Fulô? Essa negra Fulô! (Em Poesia completa, v. 1, p. 119-21.) EDU LOBO/CHICO BUARQUE EW |i.i(),:ili:n h'IARQCIE -i_> C MILTON NASCIMENTO • JANE DUBOC • GAL COSTA • SIMONE GILBERTO GIL « TIM MAIA ZIZI POSSI s CHICO BUARQUE EDU LOBO í ."ľ ?Ä1 ^^^^^^^p^^^Äi^l^_.T ...... ...........„......;.. .*v CecjUa o grupo dos principajs, poetas da segunda geracäo do Modernismo brasileiro. Espiritualistas ambos, Cecília desenvolve urna poesia intimista e reflexiva, de profumla sensibilidade feminina. Vinícius, partindo de urna poesia religiosa e idealizante, chega a ser um dos poetas mais sensuais de nossa literatura. mbora näo tenham pertencido diretamente ao grupo católico ca-rioca formado por Jorge de Lima, Murilo Mendes, Ismael Nery, Tristäo de Ataíde e otilros, Cecília Meireles e Vinícius de Moraes também säo consi-derados poetas espiritualistas e reforcam essa tendencia de sua geracäo. Contudo, a obrá de ämbos tŕilhä caminhos próprios: no caso de Cecília, caminha sempre na dircgäo da reflexäo filosófica e existencíal; no caso Uč Vinícius, caminha cada vez maTs"pa7ä"úma percepfäó materiál da vida,„dp,., amôTe d a mulher. á Mňskii Cecilia Meireles (1901-1964) é a primeira grande escritora da literatura brasileira c a principal voz femimna""d1Tnossa "poesia moderna. Nasceu no Rio de Janeiro, onde fez seus primeiros estudos e se formou proTessora. Sempře preocupada com a educacäo dé'cTiärígäs, dedicou-se ao magistério, ao mesmo tempo que desenvolvia uma intcnsa atividade lilerária e jornalística, cq-laborando em. qiiase todos os jornais e revistas cariocas da época. Em 1919, lancou seu primeiro tivro de poemas, Es-'peclros, bem recebido pela crítica. A partir da dccada de 30, já conhecida e respeitada, passou a lecionar litei;atura luso-bra-sileira na Univcrsidade do Distrito Federal e adar_cursos_e j^zeFcpnferenciäs' em vários paises, como Portugal eEstados Unidos. Sempre cultivou um Interesse enorme pelo Oriente c, em 1953, esteve na India e em Gpa. — A produeäo literaria de Cecília Meireles é(ampla) Embora mais conhecida como poetisa, deixou contribuigöes no domi-nio do conto, da crôiiíca, da literatura infantil e. do folclojc. A poesia: o neo-simbolismo A rigor, Cecilia Meireles nunca esteve filiada a nenhum movimento literário. Sua poesia, de modo geral, filia-se ás tradigöes da lirica luso-brasileira. Apesar disso, suas pu-blicagöes iniciäis^- Espectros (1919), Nunca mais... epoema dos poemas (1923) e Baiadas para El-Rei (1925) - evidenciam certa inclinagäo peío_Simbolismp. Essa tendénci,a-é.fionfirmada pela partieipagäo da autora na reyista caripca(Fa?říř,^6rgao literário de orienfaeäo espiritualista que defendia jS^htversalismp c a preservaeäo de certos valores tradicionais da poesia. Alem dissoTa freqücncia com que elementos como o vento, a água, o mar, o ar, o tempo, o espajo, a solidäo e a música üparecem em sua poesia dá a ela um caráter fluido e etérep, que confirmam a inclinacao neo-simbolista, Ö espiritualismo e o orientalismo, täo prezados pelos simboíistas, também se faz presente na poesia de Cecilia Tvlěíreles, que sempre se interessou pela cultura oriental. Do pouto de vista formal, a escritora foi das mais habili-dosas em nossa poesia moderna, com cuidadosa selecäo vo-cabular e forte inclinagäo para a musicalidade (outro trago associado ao Simbolismo), para o verso curto, e para os jpa-ralelismos,, a exemplo da poesia medieval portuguesa, como se observa nestes versos: Noite perdida Näo te lamento: embarco a vida no pensamento, busco a alvorada do sonho isento, puro e sem nada, - rosa encarnada, intacta, ao vento. Noite perdida, Noite encontrada, morla. vivida [...] A efemeridade do tempo Cecilia Meireles cultivou uma poesia reflexiva, de fundo filosófico, que abordou, dentie out ros, tenuis como a transitoriedade da vida, o tempo, o amor, o infinito, a nature/a, a eriagao ařtística. Mas niio se deve entender sua atitudc reflexiva com postura intelectual, racional Cecilia foi antes de tudo uma jssj^tora/^ntuitivaj que sempre procurou questionar e com-preender o mundo a parlir ďas próprias experiéncias que a vida lhe re-servara: a mořte dos pais quando menina, a mořte da avó que a educara, o suicídio do primeiro marído, q silěncio, a solidao. A propria escritora revela os objetivos que persegue por meio da poesia: "Áuordar a eriatura humana j dessa espécie de sonambulismo em que tantos se deixam arrastar. Mostrar-1 lhes a vida em profundidadc. Sem pretensao filosófica ou de salvagao - masj por uma contemphigao poética afetuosa c participante".* Desses temas, o que mais se destaca é a fugacidg^„doj^mjio e a efemeridade das coisas. Tal preocupagao filosófica, lico ftláo explorado por toda a tradicáo clássica, sobreludo pelo Barroco, tem bases na experiéncia pessoal da autora. É a propria poctisa quem comenta: Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, Ires meses depois da mořte de meu pai, e perdi minha mae antes dos trés anos. Essas e outras mortes ocorddas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequunina, uma tal intimidade com a Mořte que docemeute aprendi essas relagoes entre o Efémero e o Eterno [...] Em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar nem mc espantci por perder. A nogao ou sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamentp mesmo da minha personalidade. (Em Cecitia Meireles, p. 3.) Em Cecíliu Meireles. Säo Paulo, Abril Educagäo, 1982, p. 6. Literatura Comentada. A poesia historical Romanceiro da Inconfldéncia Raramente a poesia de Cecília Meireles fugiu á sua orientacäo intimista para ir ao encontro dejjroblemaš sociais. Entretanto, Ronwnceiro^dgjjv-confídéncia. (1953), pelo vies da História, abre important espaco em sua obra para a rcílcxäo sobre questôes de natureza politica e social, tais como a liberdade, a justica, a miséria, a ganáncia, a traijäo, o idealismo. Fruto de urn longo trabalho que envolveu dez anos de pesquisas, Romanceiro da Inconfidéncia é "urna narrativa rimada", como diz a autora, que rcconstrói, fundindo história e lenda, os acontecimentos de Vila Rica j época da Inconfidéncia Mineira (1789). Lembrando a estrutura dos romances medievais, o Romanceiro é um misto de váríasjiarrativas, falas e cenários, compondo um rico painel social, eco-nômico, politico e cultural do Brasil-Colônia á épuca do delo da mineracao. Obra dc forte densidade dramática, com amplas possiBitidades de re-criacäo em linguagem teatral, Romanceiro da Inconfidéncia content algumas das mais belas páginas de nossa literatúra de inspiracäo histórico-nacio-nalista. Observe-se, como exemplo, a forca dramática deste fragmento: Atrás de portas fechadas, á luz de velas acesas, entre sigilo e espionagem, acontcce a Inconfiděncia. E diz o Vigário ao Poeta: "Escreva-me aquela letra do versinho de Vergílio..." E dá-lhe o papel e a pcna. E diz o Poeta ao Vigário, com dramática prudéncia: "Tenha meus dedos cortados, antes que tal verso eserevam..." LIBERDADE, AINDA QUE TARDE, ouve-se em redor da mesa. E a bandeira já está viva, e sobe, na noitc imensa. E os scus tristes inventores já säo reus - pois so atrevcram a falar em Liberdade. Liberdade - essa pala'vra que o sonho humano alimenta; que nfio há ninguém que explique, c ninguém que näo entenda! E a vizinhanca näo dorme: murmura, imagina, inventa. Näo fica bandeira escrita, mas ilea escrita a sentenca. Ao reunir scus escritos para a publicacao de Obras poeticas (1958), a poetisa nao incluiu seus tres livros iniciais por entender que sua verdadeira maturidade poetica iniciara-se com Viagem (1939). A escritora publicaria, dentre outras, estas obras de poesia: Vaga mitsica (1942), Mar absoluto e outros poemas (1945), Doze noturnos de Holanda e O aeronauta (1952), Romanceiro da Inconfidencia (1953), Solombra (1963) e Cdnticos (1981). Este é o primciro de urna série de cinco poemas, todos intitulados "motivo da rosa", da obra Mar absoluto. Esses textos abordam o terna da efemeridade do tempo. 1° motivo da rosa Vejo-te em seda e mvatr, e täo de orvalho trémula, que penso ver, efemera, toda a Beleza em lágrimas por ser bela e ser frágil. Meus olhos te ofcre?o: espelho para a face que terás, no meu verso, quando, depois que passes, jamais ninguém te csqueca. Entäo, de seda e nácar, toda de orvalho trémula, serás eterna. E eféniero o rosto meu, nas lágrimas do teu orvalho... E frágil. (Em Obra poética, p. 232.) rnicar: substancia branca, com reflexos irisados, que se encontra no interior das conchas. eleniero: dc pouca duracao, passageiro, transitorio. 1. Compare a estrutura formal do poema - métrica, selecäo vocabular, construcäo sintática, sonoridades - á linguagem dos poemas modernistas da primeira geracäo. Em que se diferenciám? 2. De acordo com a primeira estrofe do poema de Cecília Meireles, que atributos tem a rosa para assumir o signifieado da efemeridade das coisas? 3. Identificado com a condicäo da rosa, o eu lírico busca um meio para que a rosa alcance a eternidade. Qual é esse meio? 4. O processo de identificasäo entre o eu lírico e a rosa revela uma profunda inquietude do eu perante a forca avassaladora do tempo. a) Destaque da ultima estrofe do pocma elementos que comprovem, alem da identifica?äo, a transferéncia dos atributos da rosa para o eu. b) De acordo com a sua opiniäo, qual é a saída para o eu lírico encontrar iguahnente a eternidade? Quem nunca ouviu estes versos? Ou estes? Ou ainda estes? Olha que coisa mais linda Mais cheia de graga E ela menina Que ycm e que passa... Um velho calgäo de banho O dia pra vadiar Um céu que näo tem tamanho E um arco-íris no ar Se voce quer ser minha namorada Ah, que linda namorada Voce poderia ser... Esses versos pertencem a Vínícius de Moraes (1913-1980),, que, além de ter sidojum dos mais famosos compositores da. música ppjiujarjjmsjlgira e um dos furidädóres, nos anos 50, do movimento musical Bossa Nova, foi tämbém poeta sigrfiričatívo da segunda fase do Modernismo. O poeta nasceu no Rio de Janeiro, em urna família de intelectuais. ÍS em 1928, comégotTa ľa/e r äs pŕimeíŕas composicôes musicais. Formou:sejem Lctras em 1929 e em Direito cm 1933, ano ém que pubTieóu seii primeiro livro de poemas, O caminho para a dištancia. Tornou-se representante do Mínistério de Educacäo junto á Ccnsura Cinemaťográfica. Na década de 40 ingres-sou na carreíra diplomática e também no jornalismo, como cronista e crítico de cinema. Como diplomata, viveu durante muitos anos em "Los Angeles, Paris e Montevidéu, com alguns intervalos no Brasil. Nesse periodo, conheceu intelectuais e artístas de todo o mundo. Na década de 50, interessou-se por música de cá-mara e popular e eomecou a compor. Em 56, publicou a pcga teatral Orfeu da Conceipäo, levada ao p'alco do Teätro Municipal do Rio dc Janeiro com grande su-cesso. A peca continha músicas do proprio Vinícius e dej Tom Jobim/ Algiim tempo depois,£Joäo Gilberte] juntou-se á dupla, para dar„prigem ao movimento da 'Bossa Nova. Ainda em( %x) publicou o poema 'O "óperário em construcäo'. X" partir daí, Vinícius dedi-cou-se cada vez.mais á yida de cantor e compositor, compondo e fazendo shorn com vários parceiros, como Dorival Caymmi, lom Jobim, Edu Lobo, Baden Powell, Toquinho, Chico Buarquc c outros. T* á f\ ■*£ W LT i» - *k A pocsia: da transcendencia espiritual ao amor sensual Como poeta, Vinícius situa-se entre o grupo de poetas religiosos que se formo\i no Rio de Janeiro entre os anos 30-40. Quando publicou sua Antológia poetka, em 1955, Vinícius de Moraes advertiu que sua obra consistia em duas fases: "A primeira, transcendental," freqüentemente mística, resultante de sua fase crista, termina com o poema 'Ariana, a mulher', cditado em 1936". Na segunda fase "estäo nitidamente marcados os movimentos de aproximacäo do mundo material, com a difícil ..mas consistente repulsa ao idealismo dos primeiros anos". ) A exemplo de outros poetas de sua geracäo, £ primeira fase da poesia de Vinícius é marcada peia preocupacäo religiosa,*pélä angústía existencial diantc da condicäo humária c pclo déséjo dé superar, por meto da trans-cendenciäTtiística, as sensäcöes de pecado, culpa e desconsolo que a vida terrena lhe oferecia. Os poemas dessa fase geralmente sao longos, com versos igualmentc longos, em linguagem abstrata, alegorica eHeclamatoria, Observe: No sangue e na lama O corpo scm vida tombou. Mas nos olhos do homem caido Havia ainda a luz do sacrificio que redime F. no grande Espirito que adejava o mar e o montc Mil vozcs clamavam que a vitoria do homem forte tombado na luta Era o novo Evangelho para o homem da paz que lavra no campo. A poesia sensual e social / j Cinco elegias (1943) e a obra que marca, na poesia ,-de Vinicius, a passagem para uma fase de proximidade maior com p mundo. material. O poeta passa a in-teressar-se por lemas cotidianos, pclas_coisas simples da vida e explora^omjsensualisniojos temas"3q amoj' c dafmulher./A linguagem tambem tende a simplicidade: o verso livre passa a ser mais empregado,' a cotnuni-cacao torna-se mais direta e dinamica. Pode-se dizer que, pela primeira vez, Vinicius adcre as propostas dos modernistas de 22, apesar de sempre " tefem feito parte de sua poesia certadicjao classica e o gosto pelosoneto. Contudo, em suas maos, o soneto ganha uma roupagem diferentc, mais moderna e real, fazcntio uso de vocabulos do cotidiano, pouco comuns nesse tipo de composicao. R o caso, por exemplo, deste soneto, em que o erotismo e recriado a partir de uma forma classica e de uma linguagem crua c dircta: Soneto de devocäo Essa mulher que se arremessa, fria E lúbrica em meus brajos, e nos seios Me arrebuta e me beija e balbucia Versos, votos de amor e nomes feios. Essa mulher, flor de melancolia Que se ri dos meus pálidos receios A unica cntrc todas a quem dci Os carinhos que nunca a outra daria. Essa mulher que a cada amor proclama A miséria e a grandeza de quem ama E guarda a marca dos meus dentes nela. Essa mulher é um mundo! - uma cadela Talvez... - mas na moldura de uma cama Nunca mulher nenhuma foi täo bela! (Em Poesia conipleta e prosa. Aguilar, 1974, p. 156.) _ Alem da poesia sensual, Vinicius também se interessou pela Cjpocsia sociál^O poema 'Operário em construgao' (1956) é o melKbř exemplo dessa preocupagao; por meio de uma linguagem simples e direta, quase didática, o poeta manifesta soli-dariedade ás classes oprimidas e almeja atingir a consciéncia daquclcs que o lěem ou ouvem. Observe este fragmente: Era ele que erguia casas Onde antes só havia chao. Como um pássaro sem asas Ele subia com as casas Que lne brotavam da mao. Mas tudo desconhecia De sua grande missao: Nao sabia, por exemplo Que a casa de um homem é um templo Um templo sem religiao Como tampouco sabia Que a casa que ele fazia Sendo a sua liberdade Era a sua eseravidao. Mas ele desconhecia . Esse fato extraordinario:,. Que o operario faz a coisa E a coisa faz o operario. De forma que, certo dia A mesa, ao cottar o pao . O operario foi tornado: : De uma subita emocSo Ao constatar assombrado Que tudo naquela mesa : - Garrafa, prato, faciio -Era ele quem os fazia i Ele, um humilde operário Um operário em construcáo. Olhou em torno: gamela Banco, enxerga, caldeirao Vidro, parede, janela Casa, cidade; nacao! Tudo, tudo o que existia Era ele quem o fazia Ele, um humilde operário Um operário que sabia Exercer a profissíío. Ah, homens de pensamento Nao sabereis nunca o quanto Aquele humilde operário Soube naquele momento! Děste ultimo Vinícius, poeta sensual e social, para o cantor e compositor Vinícius é um passo. A partir dos anos 60 afasta-se da pocsia c cntrcga-se de corpo e alma á música. Se a poesia brasileira perdeu para a música popular um grande talento que ainda poderia deixar novas contribuicoes, nao se sabe. O certo é que Vinícius, como nenhum outro, foi o poeta mais co-nhecido e amado do publico brasileiro, aquele que levou ás rodas de bar, aos teatros e ao rádio composipoes de requinte literário. Texto II Soneto da fidelidade De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempře, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dole sc cncantc mais meu pensamento. Quero vivě-lo em cada vao momento R em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso c derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento. E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a mořte, angústia de quem vivc quem sabe a solidao, fim de quem ama Eu possa me dizer do amor (que live): Que nao seja imortal, posto que é cháma Mas que seja infinito enquanto dure. (Idem, p. 183.) A seguir, voce lera dois dos mais conhecidos poemas de Vinicius de Moraes. Texto I Soneto da separacito De repente do riso fez-se o pranto Silencioso e branco como a bruma E das bocas unidas fez-se a espuma E das maos espalmadas fez-se o espanto. De repente da calma fez-se o vento Que dos olhos desfez a ultima chama E da paixao fez-se o pressentimento E do momento imovel fez-se o drama. Dc repente, nao mais que de repente Fez-se de triste o que se fez amante E de sozinho o que se fez contente. Fez-se do amigo proximo o distante Fez-se da vida uma aventura errante De repente, nao mais que de repente. (Em Poesia completa e prosa, p. 226.) Observe a construcao dos textos, o tipo de composicao, a métrica dos versos, o vocabulário c a sintaxe. Identifique a que representantes da tradicao literária estáo ligados, justificando com elementos dos textos. A beleza dos textos reside, em grande parte, nos recursos sonoros empregados e nas imagens construidas a partir de comparacoes, metáforas e antiteses. a) Destaque da primeira estrofe do texto I urn exemplo de aliteracao e outro de comparacáo. b) Identifique a figura de linguagem a partir da qual, para estabelecer a oposipao entre o passado c o presente, é construído todo o texto I. c) Destaque do texto II urn exemplo de polissindeto. O texto I reitera a oposipao entre como era no passado e como é no presente. a) Caracterize cada urn desses momentos. b) O verso "De repente, nao mais que de repente" acentua o aspecto temporal do poema. Que sentido assume esse verso no contexto? No texto II, o eu lirico jura fidelidade á pessoa amada, seja nos momentos de dor, seja nos de alcgria. A respeito dos tercetos do poema: a) explique o que signiflcam, para o eu lirico, a morte e a solidao; b) dě uma explicaipáo coerente ao emprego dos parénteses no verso "Eu possa me dizer do amor (que tive)"; c) interprete a metafora presente no verso "Que nao seja imortal, posto que é chama"; d) identifique o conceito de fidelidade para o eu lirico. 1 i 1. (Fuvest-SP) Uma flor ainda desbotada ilude a polícia, rompe o asfalto. Fugám completo silěncio, paralisem os ncgócios, garaoto que uma flor nasceu. Sua cor näo se percebe. Suas pétalas näo se abrem. Seu nome näo está nos livros. E feia. Mas 6 uma flor. Fůrou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio. Este é um fragmente do poema 'A flor e a náusea', do livro A rosa do povo, de Carlos Drummond de Andrade. a) O que o nascimento da flor representa? b) Que relagäo se poderia estabelecer entre este poema e o momento histórico em que foi elaborado? 2. (Unicamp-SP) Leia com atcngäo os dois fragmentos a seguir, extraidos do poema de Carlos Driimmond de Andrade cujo titulo, "Procura da poesia", tambem indica seu tema. Compare-os e explique como o tema e desenvolvido em cada um deles. X 1 Fragmento 1: "Näo facas versos sobrc acontccimcntos. Näo hä criagäo nem morte perante a poesia. Diante dela, a vida e um sol estätico näo aqucce nem ilumina. As finalidades, os aniversärios, os incidentcs pcssoais i näo coli tarn. ; Näo fagas poesia com o corpo, esse excelente, completo e confortävel corpo, täo infenso ä efusäo Urica." Fragmento 2: "Penetra surdamente'no reino das palavras. Lá estäo os poemas que esperam ser escritos. Estäo paralisados, mas näo há desespero, há calma e frescura na superfkie intata. Ľi-los, sós e mudos, em estado de dicionário." 3. (Fuvest-SP) Näo scrci o poeta de um mundo caduco. Também näo cantarei o mundo futuro. Estou preso á vida e olho meus companheiros, Estäo taciturnos, mas nulrem grandes esperangus, Entre eles, considero a enorme realidade. O presente é täo grande, näo nos afastemos. Näo nos afastemos muito, vamos de mäos dadas. a) Identitique o autor do poema e o movimento literário a que pcrtcncc. b) O que se entende por mundo caduco? 4. (PUC-SP) Encostei-me a ti, sabendo que eras somente onda. Sabendo bem que eras nuvem, depus a minha vida em ti. Como sabia bem tudo isso, e dei-me ao teu destino frágil, fiquci sem poder chorar, quando caí. (Cecília Meireles) A realidade exterior, presente na poesia dc Cecília Meireles, toma forma a partir de elementos instáveis, móveis e etéreos. A recriayäo poétien dessa realidade revela a visäo de mundo da autora. - Assim sendo, a) identifiquc o tema que cstá presente no poema acima; b) transereva os termos que, no poema, caracterizam o tema. 5. (FE1-SP) Assinale a série em que todas as obras säo de Carlos Drummond de Andrade: a) Scntimento do Mundo; A Rosa do Povo; Claro Enigma. b) Claro Enigma; Clä do Jabuti; Kiriale c) Confissôes de Minas; Cämara Ardente; Broquéis d) Ligäo de Coisas; Amar, Verbo Tntransitivo; Contos de Aprendiz. e) Brejo das Almas; Pauliccia Desvairada; Fazendeiro do Ar 6. (PUC-RS) Näo fagas versos sobre acontecimentos. Näo há criagäo nem morte perante a poesia. Diante dela, a vida é um sol estático, Näo aquece nem ilumina. Uma das constantes na obra poética de Carlos Drummond dc Andrade, como sc vcrifica nos versos acima, é: a) a locugäo do hörnern social. b) o negativismo destrutivo. c) a violagäo e desintegragäo da palavra. d) o questionamento da propria poesia. e) o pessimismo lírico. 7. (FMU/FIAM-SP) Música popular e poesia brasileira andam associadas. Assinale a alternativa que contenha um poeta modernista que teve inúmeros poemas musicados: a) Castro Alves b) RaulBopp c) Alphonsus de Guimaracns d) Vinicius de Moraes e) Olavo Bilac Nesta unidade, estaremos cstijdando a produgäo cultural Lrasileira dos Ultimos tempos. Para saber mais, sugerimos: aos filmes A hora da ostrela, de Suzana Amaral, basea-no no romance de Clarice Lispec-lor; Hora e vez de Augusto Matraya, de Roberto Santos, e Sagara-na, o duelo, de Paulo Thiago, ba--.eados em contos de Guimaräes Rosa; e Morte e vida Severina, Laseado num auto do poeta Joäo Cabral de Melo Neto. Procure ver também o senado Grande sertäo: veredas, baseado no romance de Guimaräes Rosa, produzido pela Rede Globo na década de 80, disponível em video. ~ os discos Joäo Cabral de Melo Neto, com poemas declamados pelo proprio poeta, com música de Egberto Gismoiiti (Somlivre, 1984); o disco Tropi-cália, porta-voz do movimento tropicalista nos anos 60. os diretores e os filmes do Cinema Novo, dentre eles Vidas secas, de Nelson Pe-reira dos Santos, e Terra em transe, de Glauber Rochá. í a obra O que é isso, com- panheiro?, de Fernando Gabeira, guerrilheiro nos anos 60 e exilado politico, que narra a vida política brasileira, do golpe de 64 até o mício da década de 70. sobre as rela goes do movimento tropicalista com as idéias de Oswald di-Andrade; sobre as relagöes da poesia concreta com a geragäo de 45; sobre a importáncia que a música popular brasileira passa a ter a partir dos anos 60, em grande parte substituindo a cha-mada "poesia oficial"; sobre a "arte de resistěncia" que se fez no Brasil durante o regime mili tar, como forma de combater ii ditadura e driblar a censura. .- . . ...» hH,^, - iHr.i f.. 1 ^ife ■HHHBPSfliJ 1I1L 'l\WHKv ^™ JHL IBB ■v Iconographia l\ii'i>>f'"'ll^''''"' ' ' 0 desafio que se coloca para os escritores das décadas de 40 e 50 é a pesquisa estética e a rcnovacäo das forraas de expressäo literária, tanto na poesia quanto na prosa. Clarice Lispector, por exemplo, com seu romance inovador e com sua linguagem altamente poetka, pôe em xeque os modelos narrativos tradicionais, os liinites entre a poesia e a prosa e, ao mesmo tempo, obriga a crítica literária a rever seus modelos de análise e avaliacäo da obra literária. "I J. Jm 1945, termina a Segunda Guerra Mundial e, no Brasil, a dita-dura de Vargas. O mundo passa a viver a Guerra Fria, e o Brasil um período democratic*) e desenvolvimentista, que chegaria á eufória no governo de Juscelino Kubitschck (1956-1961). Os escritores, agora menos exigidos social e politicamente do que na década anterior, buscam urna renovacäo literária cuja prcocupacäo principal é a propria linguagem. A poesia A poesia de 45 traz ao cenário das discussôes literárias a seguinte questäo: a poesia é a arte da palavra. Esse princípio implicava a alteragäo de ponlos de visia da poesia de 30, que já tinha sido social, política, religiosa, filosófica... O trapo formalizante, portanto, é o que caracteriza essa geracäo de poetas. Alguns tenderam mais ao estilo culto e elevado, de feicäo parna-siana; outros caminharam noutra dire9äo, buscando a linguagem essencial, sintética, precisa, concreta c racional, dando conlinuidade a algumas ex-pericncias fcitas nessc scntido por Drtimmond e Murilo Mendes. Panorama, a revisla carioca que divulgou os textos dessa geragäo entre 1948 e 1953, anunciava: "Somos na realidadc urn novo cstado poético, e muitos säo os que buscam um novo caminho fora dos limites do mo-dernismo". Foram publicados nessa revista dezenas de novos poetas, dentre eles Alphonsus de Guimaraens Filho, Pericles Eugénio da Silva Ramos, Geir Campos, Jose Paulo Paes, Paulo Bonfim e Joäo Cabral de Melo Neto, o poeta de maior destaque dessa gera9äo. A prosa O período é muito rico para a prosa brasileira, que conta com a pu-blicagäo de várias obras sígniticativas, principalmente nos generös conto e romance. Parle dessa prosa retoma e aprofunda a sondagem psicológica que já vinha sendo desenvolvida por autores anteriores, como Mario de Andrade e Graciliano Ramos. É o que se verifica, por exemplo, nos contos e romances de Clarice Lispector e Lygia Fagundes Teiles. O regionalismo, fartamente explorado pela geragäo de 30, também é retomado por autores como Joäo Guimaräes Rosa, Mário Palmcrio e outros, que procuram dar-lhe um tratamento renovado. O espago tirbano também é representado pelas crônicas de Rubem Braga e pelos contos de Dalton Trevisan, Lygia Fagundes Teiles, Ciarice Lispector e outros. Ciarice lispector: a escritura seivagem Vamos deixar que a propria Clarice Lispector (1926-1977) fale um poueo sobre si mesma: Nasci na Ucränia, terra de meus pais. Nasci numa aldcia chamada Tchetchelnik, que näo figura no mapa de täo pequena e insigniticante. Quando minha mäe estava gravida de mim, meus pais já ostávam sc encaminhando para os Fstados Unidos ou Brasil, ainda näo haviam decidido: pararam em Tchetchelnik para eu nascer, e prosseguiram viagem. Cheguei ao Brasil com apenas dois meses de idade. Sou brasileira naturalizada, quando, por uma questäo de meses, poderia ser brasileira nata. Fiz da lingua portuguesa a minha vida interior, o meu pensamento mais intimo, usei-a para palavras de amor. Comecei a escrever pequenos contos logo que me alfabetizaram, e escrevi-os em portugués, é claro. Criei-me em Recife. [...] E nasci para escrever. Minha liberdade é escrever. A palavra é o meu domínio sobre o mundo. [Apud Berla Waldman. Clarice Lispector. Säo Paulo, Brasllíense, 1983. p. 9-10.) ■ - 7 ■_-->■ ■- Hlipilllilliltllll As inovacöes Quando publicou sua primeira obra, o romance Perto do corapäo sel-vage.m (1944), Clarice Lispector provocou verdadeiro espanto na critica e no publico da época. Acostumada a certo tipo de romance, como o de 30, a critica reconheceu o talento da jovem escritora (entäo com 17 anos), mas apontou-lhe inúmeras falhas, sobretudo de construeäo. Alvaro Lins, por exemplo, importante critico da época, escreveu: "Li o romance duas vezeš, c ao terminar só havia uma impressäo: a de que ele näo estava tealizado, a de que estava incompleta e inacabada a sua estrutura como obra de ficcäo".* Na verdade Clarice Lispector, com Perto do corapäo selvagem, intro-duzia em nossa literaturajiovas téemcasde expressäo, que obrigavam a uma revisäo de eritérios avaliativos. Sua narrativa subverte com freqüencia a estrutura dos tradicionais generös narrativos (o conto, a noveia, o romance), quebra a scqüencia "comeco, meio e fim", assim como a ordern cronológica, e funde a prosa á poesia, ao fazer uso constantc de imagens, metáforas, antíťésě?f paradoxos, símbolos, sonoridades, etc. Fluxo de consciéncia e epifania Outro aspecto inovador da prosa de Clarice é o fluxo de consciéncia, uma experiěncia mais radical do que a introspeccäo psicológica, já praticada por vários eseritores, desde o Realismo no século XIX. A introspeccäo psicológica tradicional é uma interiorizaeäo no universo mental da personagem, feita de forma linear, com espatjos determinados c com marcadores temporais nítidos. O leitor tem pleno domínio da siluaeäo e distingue com facilidade um momento passado, revivido pela personagem por meio da memoria, de um momento presente ou de um momento de imaginaeäo. O fluxo de consciéncia quebra esses limites espago-temporais, que tornám a obra verossímil (semelhante á verdade), de modo que presente e passado, rcalidade e desejo misturam-se, Como se fossem as imagens captadas por uma cämara instalada no cérebro de uma personagem que deixa o pensamento solto, o fluxo de consciéncia cruza vários pianos narrativos, sem preocupacao com a logica ou com a ordern narrativa. %J1 wĚĚSĚĚMSĚm WH ttkm WimĚSĚmm Os mortos de sobrecasaca. Rio de Janeiro, Civilizacäo Brasileira, 1963. p. 189. Essas experiéncias já vinham sendo feitas no exterior pelos eseritores Marcel Proust e James Joyce. No Brasil, Ciarice é quem as introduz. Muitas vezeš, alem do fluxo de consciéncia, as personagens de Clarice vivem também um processo epifänico. (O termo epifania é emprestado da religiäo e significa "revelacäo".) Esse processo pode ser desencadeado por qualquer fato banal do cotidiano: um enconträo, um beijo, um olhar, um susto. A personagem, mergulhada num fluxo de consciéncia, passa a ver o mundo c a si mesma de outro modo. E como se tivesse tido, de fato, uma revelacäo e, a partir dela, passasse a ter uma visäo mais aprofundada da vida, das pessoas, das relacöes humanas, etc. De modo geral, esses momentos epifänicos säo dilaecrantes e däo origem a rupturas de valores, a questionamenlos filosó-ficos e existenciais, permitindo a aproximagäo de realidades opostas, tais como naseimento e morte, bem e mal, amor e ódio, matar ou morrer por amor, seduzir e ser seduzido, etc. Perfis femininos e universalismo Ciarice Lispector nunca aeeitou o rótulo de escritora fc-minista. Apesar disso, muitas de suas obrus, romances e contos těm como protagonistas personagens femininas, quase sempre situadas em centros urbanos. A escritora, ao explicar sua vo-caeäo para a literatura, comenta: [...] talvez porque para as outras vocacöes eu precisaria de um longo aprendizado, enquanto que para escrever o aprendi-zado é a propria vida se vivendo em nós e ao redor tle nós. K que näo sei estudar. E, para escrever, o único estudo č mesmo escrever. (Apud Berta Waldman. Op. cH., p. 11.) Portanto, o ponto de partida dc sua literatura é o da experiěncia pessoal da mulher e o seu ambiente familiar. Con-tudo, Clarice extrapola os limites desse universo; seus temas, no conjunto, säo essencialmente humanos e universais, como as relacöes entrc o cu c o outro, a falsidade das relacöes humanas, a condicäo social da mulher, o esvaziamento das relacöes familiäres e, sobretudo, a propria linguagem - única forma de comunicaeäo com o mundo. Clarice é considerada uma escritora intimista e psicológica. Dizia ela: "Algumas pessoas cosem para fora; eu coso para dentro". Mas, como toda boa literatura, sua produeäo acaba por envolver outros universos. Sua obra näo deixa dc ser também social, filosófica, existencial e metalingiiística. A sua ultima obra, por exemplo, A hora da estrela (1977), é uma narrativa que, dentre outros aspectos, aborda a condicäo social de uma migrante nordestina no Rio de Janeiro, as re-flexöes existencialistas sobre o ser humano, a condigäo e o papcl do eseritor moderno e a história da propria eseritura literária. Ciarice publicou romances, contos, crönicas e literatura infantil. De suas mais de vinte obras, destacam-se: Perlo do c.orapäo seivagem, O lustre (romance, 1946), Lapos de familia (contos, 1960), A paixäo segundo G. H. (romance, 1964), Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres (romance, 1969), Agua viva (prosa, 1973), A hora da estrela (romance, 1977), A bela e a fera (contos, 1979). No género infantil publicou O mistério do coelhinho pensante (1967), A mulher que matou os peťxes, A vida intima de Laura e OLitros. O texto a seguir é um dos mais importantes contos dc Clarice Lispector. Hoi publicado pela primeria vez em Alguns contos (1952) e reeditado em Lapos de família. Dele foram extraídos frag-mentos que focalizam duas situacôes: na primeira, a personagem Ana está no bonde, depois dc fazer algumas compras para o jantar, cm que receberá familiares; na segunda siťuacäo, terminado o jantar, Ana está com o marido, Amor Um pouco cansada, com as compras deformando o novo saco de tricň, Ana subiu no bonde. Depositou o volume no colo e o bonde comecou a andar. Recostou-se entäo no banco procurando conforlo, nimi suspiro de meia satisfacäo. Os íilhos dc Ana eram bons, uma coisa verdadeira e sumarenta. Cresciam, tomavam banho, exigiam para si, malcriados, instantes cada vez mais completes. A cozinha era enfun espacosa, o fogäo enguicado dava estouros. O calor era forte no apartamento que eslavam aos poucos pagando. Mas o vento batendo nas cortinas que ela mesma cortara lembrava-lhe que se quisesse podia parar e enxugar a testa, olhando o calmo horizonte. Como um lavrador. Ela plantara as sementes que tinha na mäo, näo outras, mas essas apenas. E cresciam árvores. Crescia sua rápida conversa com o cobrador de luz, crescia a água enchendo o tanque, cresciam seus filhos, crescia a mesa com comidas, o marido chegando com os jornais e sorrindo de fome, o canto importuno das empregadas do edifício. Ana dava a tudo, tran-qůilamente, sua mäo pequena e forte, sua correnle de vida. Čerta hora da tarde era mais perigosa. Čerta hora da tarde as árvores que plantara riam dela. Quando nadá mais precisava de sua forca, inquietava-se. No entanto sentia-se mais solida do que nunca, seu corpo engrossara um pouco e era de se ver o modo como cortava blusas para os meninos, a grande tesoura dando estalidos na fazenda. Todo o seu desejo vagamente artistico encaminhara-se há muito no sentido de tornar os dias realizados e belos; com o tempo, seu gosto pelo decorativo se desenvolvera e suplantara a intima desordem. Parecia ter descoberto que tudo era passível de aperfeicoamento, a cada coisa se emprestaria uma aparéncia harmoniosa; a vida podia ser feita pela mäo do homem. No fundo, Ana sempře tivera necessidadc dc sentir a raiz firme das coisas. E isso um lar perplexamente lhe dera. Por caminhos tortos, viera a cair num destino de mulher, com a surpresa de nele caber como se o tivesse inventado. O homem com quem casara era um homem verdadeiro, os filhos que tivera eram filhos verdadeiros. Sua juventude anterior pa-recia-lhe estranha como uma doenca de vida. [...] O bonde se arrastava, em seguida estacava. Até Humaitá tinha tempo de descansar. Foi entäo que olhou para o homem parádo no ponto. A diferenca entre ele e os outros é que ele estava realmente parado. De pé, suas mäos se mantinham avaneadas. Era um cego. O que ha via mais que fizesse Ana se aprumar em desconfianca? Alguma coisa inlranqiiila estava sucedendo. Entäo ela viu: o cego mascava chicles... Um homem cego mascava chicles. Ana ainda teve tempo de pensar por um segundo que os irmäos viriam jantar - o coraeäo batia-lhe violento, espacado. Inclinada, olhava o cego profundamente, como se olha o que näo nos vé. Ele mastigava goma na escuridäo. Sem sofrimento, com os olhos abertos. O movimento da mastigaeäo fazia-o parecer sorrir c de repente deixar de sorrir, sorrir e deixar de sorrir - como se ele a tivesse insultado, Ana olhava-o. E quem a visse teria a impressäo de uma mulher com ódio. Mas conlinuava a olhá-lo, cada vez mais inclinada - o bonde deu uma arrancada subita jogando-a desprevenida para trás, o pesado saco de tricó despencou-se do colo, ruiu no chäo - Ana deu um grito, o condutor deu ordern de paráda antes de saber do que se tratava - o bonde estacou, os passageiros olharam assustados. Incapaz de se mover para apanhar suas compras, Ana sc aprumava pálida. Uma ex-pressäo de rosto, há muito näo usada, ressurgira-lhe com dificuldadc, ainda incerta, in-compreensível. O moleque dos jornais ria entregando-lhe o volume. Mas os ovos se haviam quebrado no embrulho de jornal. Gemas amarelas e viscosas pingavam entre os fios da rede. O cego interrompera a mastigaeäo e avancava as mäos inseguras, tentando inutilmente pegar o que acontecia. O embrulho dos ovos foi jogado fora da rede e, entre os sorrisos dos passageiros e o sinal do condutor, o bonde deu a nova arrancada de partida. Poucos instantes depois já näo a olhavam mais. O bonde se sacudia nos trilhos c o cego mascando goma flcara atrás para sempře. Mas o mal estava feito. A rede de tricó era áspera entre os dedos, näo intima como quando a tricotara. A rede perdera o sentido e estar num bonde era um fio partido; näo sabia o que fa/.er com as compras no colo. E como uma estranha música, o mundo recomegava ao redor. O mal estava feito. Por quě? Teria esquecido de que havia cegos? A piedade a sufoeava, Ana respirava pesadamente. Mesmo as coisas que existiam antes do acontecimento estavam agora de sobreaviso, tinham um ar mais hostil, perecível... O mundo se tornara de novo um mal-estar. Vários anos ruiam, as gemas amarelas escorriam. Expulsa de seus próprios dias, parccia-lhe que as pessoas da rua eram periclitantes, que se mantinham por um mínimo equilíbrio á tona na escuridäo - e por um momento a falta de sentido dcixava-as täo livres que elas näo sabiam para onde ir. Perceber uma auséncia de lei foi täo súbito que Ana se agarrou ao banco da freute, como se pudesse cair do bonde, como se as coisas pudessem ser revertidas com a mesma calma com que näo o eram. O que chamava de crise viera afinal. E sua marca era o prazer intenso com que olhava agora as coisas, sofrendo cspantada. [...] Um cego mascando chicles mergulhara o mundo em escura sofreguidäo. [...] Ana caira numa bondade extremamente dolorosa. Ela apaziguara täo bem a vida, cuidara tanto para que esta näo explodisse. Mantinha tudo em Serena compreensäo, separava uma pessoa das outras, as roupas eram claramente feitas para serem usadas e podia-se escolher pelo jornal o filme da noitc - tudo feito de modo a que um dia sc seguisse ao outro. E um cego mascando goma despedaeava tudo isso. E através da piedade aparecia a Ana uma vida cheia de náusea doce, até a boca. Depois do jantar, enfim, a primeira brisa mais fresca entrou pelas janelas. Eles rodeavam a mesa, a familia. Cansados do dia, felizes em nao discordar, tiro dispostos a nao ver defeitos. Riam-se de tudo, com o coracao bom e humano. As criancas cresciam admiravelmente em torno deles. E como a uma borboleta, Ana prendeu o instante entre os dedos antes que ele nunca mais fosse seu. Depois, quando todos foram embora e as criancas já estavam deitadas, ela era uma mulher bruta que olhava pela janela. A cidade estava adormecida e quente. O que o ccgo desencadeara caberia nos seus dias? Quantos anos levaria até envelhecer de novo? Qualquer movimento seu e pisaria numa das criancas. Mas com uma maldade de amante, parecia aceitar que da flor saísse o mosquito, que as vitórias-régias boiasscm no escuro do lago. O cego pendia entre os frutos do Jardim Botánico. Se fora urn estouro do fogao, o logo já teria pegado em toda a casa! pensou correndo para a cozinha e deparando com seu marido dianle do café derramado. - O que foi?! - gritou vibrando toda. Ele se assustou com o medo da mulher. E de repente riu entendendo: - Nao foi nada - disse -, sou um desajeitado. - Ele parecia cansado, com olhciras. Mas diante do estranho rosto de Ana, espiou-a com maior alencäo. Depois atraiu-a a si, em rápido afago. - Näo quero que Hie acontC9a nada, nunca! - disse ela. - Deixe que pclo menos me aconteca o fogäo dar um estouro - respondeu ele sorrindo. Ela continuou sem forea nos seus bracos. Hoje de tarde alguma coisa tranqiiila se re- bentara, e na casa toda havia um tom humoristico, triste. É hora de dormir, disse ele, é tarde. Num gesto que näo era seu, mas que pareceu natural, segurou a mäo da mulher, levando-a consigo sem olhar para trás, afastando-a do perigo do viver. Acabara-se a vertigem de bondado. E, se atravessara o amor e o seu inľerno, penteava-se agora diante do espelho, por um instante sem nenhum mundo no coracäo. Antes de se deitar, como se apagasse urna vela soprou a pequena tlama do dia. {Lagos de família. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1983. p. 19-33.) 1. Os trés primeiros parágrafos do conto caracterizam a personagem Ana. De acordo com eles: a) Como se caracteriza Ana sociidmente? b) Qual a sua rela9äo com a família? c) Por que a narradora afirma "Čerta hora da tarde era mais perigosa"? 2. Vcrifica-se, nesse conto, o emprego da epifania como processo de conscientiza9äo da personagem acerca de si mesma. a) Qual o fato exterior responsável pelo processo epitänico? b) Dé urna interpreta9äo possível: o que poderia haver cm comum entre Ana e esse fato que deseneadeia o processo epifänico? 3. Com a arrancada do bonde, as compras de Ana väo ao chäo. Da rede que ela mesma tecera, "gemas amarelas e viscosas pingavam entre os fíos". E, no décimo parágrafo, se afirma: "A rede perdera o sentido e eslar num bonde era um fio partido". Supondo que a rede c os ovos sejam símbolos da condiíäo de Ana: a) O que simboliza a rede na vida de Ana? b) Dé urna interpretagäo possível aos ovos e á sua quebra. c) O que representa o "lio partido"? Destaque do décimo parágrafo um trecho que justifique sna resposta. 4. Após a aventura de descobertas pelo universo do cotidiano e do proprio eu, Ana retorna a casa. Sobre os Ultimos episódios clo conto: a) Pode-se afirmar quo a rcvcla9äo de Ana mudará a sua vida e a sua relagäo familiar? b) Ana será a mesma mulher? c) Como se pnde compreender o papel do marido ao segurar a mäo da mulher e afastá-la do "perigo de viver"? 5. Em vários contos de Clarice há o questionamento das relafôes familiäres rigidamente conven-cionadas. Tomando por base o eunto 'Amor', por que se pode afirmar que, embora trabalhe p universo da conscicncia individual, Clarice Lispector consegue ser também social? Clarice Lispector Tentacäo Ela estava com S0IU90. E como se näo bastasse a claridade das duas horas, ela era ruiva. Na rua väzia as pedras vibravam de calor - a cabe9a da menina flamejava. Sentada nos degraus de sua casa, ela suportava. Ninguém na rua, só uma pessoa esperando inutilmente no ponto do bonde. E como se näo bastasse seu olhar submisso e paciente, o S0IU90 a interrompia de momento a momento, abalando o queixo que se apoiava oonformado na mäo. Que fazer de uma menina ruiva com S0IU90? Olhamo-nos sem palavras, desalento contra desalento. Na rua deserta penhum sinal de bonde. Numa terra de morenos, ser ruivo era uma revolta involuntária. Que importava se num dia futuro sua marca ia fazé-la erguer insolente uma vnbega. de mulher? Por enquanto ela estava sentada num degrau faiscante da porta, ás duas horas. O que a salvava era uma bolsa velha de senhora, com al9a partida. Segurava-a com um amor conjugal já habituado, apertando-a contra os joelhos. Foi quando se aproximou a sua outra metade neste mundo, um irmäo em Grajaú. A possibilidade de comunicH9äo surgiu no ängulo quente da esquina, acompanhando uma senhora, e encarnada na figura de um cäo. Era um basset lindo e miserável, doce sob a sua fatalidade. Era um basset ruivo. Lá vinha ele trotando, á frente de sua dona, arrastando scu comprimento. Desprevenido, acostumado, cachorro. A menina abriu os olhos pasmada. Suavemente avisado, o cachorro estacou diante dela. Sua lingua vibrava. Ambos se olhavam. Entre tantos seres que estäo prontos para se tornarem donos de outro ser, lá estava a menina que viera ao mundo para ter aqucle cachorro. Ele fremia suavemente, sem latir. Ela olhava-o sob os cabelos, fascinada, séria. Quanta tempo se passava? Um grande 500190 sacudiu-a desafmado. Ele nem sequer tremeu. Também ela passou por cima do solugo e continuou a fitá-lo. Os pělos de ambos eram curtos, vermelhos. Que foi que se disseram? Näo se sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapidamente, pois näo hávia tempo. Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-se com urgencia, com encabu-lamcnto, surpieendidos. No meio de tanta vaga impossibilidade e de tanto sol, ali estava a solugäo para a erianga vermelha. E no meio de tantas ruas a sérem trotadas, de tantos cäes maiores, de tantos esgotos secos -lá estava Uma menína, como se fora carne de sua ruiva carne. Eles se fitavam profundos, entregues, ausentes de Grajaú. Mais um instante e o suspenso sonho se quebraria, cedendo talvez á gravidade com que se pediam. Mas ambos eram comprometidos. Ela com sua infancia impossível, o centro da inocencia que só se abriria quando ela fosse uma mulher. Ele com sua natureza aprisionada. A dona esperava impaciente sob o guarda-sol. O basset ruivo afinal despregou-se da menina e saiu sonambulo. Ela ficou espantada, com o aconteci-monto nas mäos, numa mudez que nem pai nem mäe comprcenderiam. Acompanhou-o com olhos pretos que mal aereditavam, debrugada sobre a bolsa e os joelhos, até vé-lo dobrar a outra esquina. Mas ele foi mais forte que ela. Nem urna só vez olhou para trás. (Em A tej/äo estranc/e/ra, 8! ed, Säo Paulo, Átlca, 1989. p. S9-60.) im Blil 'Pits f' mt/Km t 1 ■V ■. . .1 t, '4' •i - <ŕ j j > »- ■ - ■•■ <■ * ř r >' ,, ', . '. „ ,ll )l{ -i.>picľi.y líf-i.'-'i í- j Iconographia t j&ijl Perseguindo a tradicäo regionalista, já largamente explorada em nossa literatura por autores de várias geracôes e époeas, Guimaräes Roľ essa tidd.fao - mas tambem levar a literatura brasileira a um de seus pontos mais altos. '-•i^ofio Guimaräes Rosa (1908-1967), mineiro de Cordisburgo, desdc cedo mos-trou Interesse por lingua s e peius coisas da natureza: bichos, plantas, insetos. Formou-se em Medicína e exerceu a profissäo, clinican-do pelo interior de seu Estado, onde recolheu importante material para as suas obras. Em 1934, ingressou na carreira diplomática, chegando a embaixador, e passou a viver em vários países, sempře escrevendo e am-pliando seu conhecimento sobre linguas e cultures diferentes, Guimaräes morreu em 1967, ties dias depois de tomar posse na Academia Brasileira de Letras. llBilI i -i ESP tili ,1 . Como escritor, Guimaräes Rosa é uma das principals expressöes da literatura brasileira. A genialidade de sua obra unanimemente tem deslumbrado as várias lendSncias da CTÍtiea e do publico. Embora já tivesse ronquistado um prômio com um livro de poemas (m;, ca publicado), Guimaräes Rosa estreou em 1946, coiv ■ lancamento de Sagarana (coutos). De eunho regiomhista, a obra sur-preendeu a erítica e levou o eseritor ao renome, em virtude da originalidade de sua linguagem e de suas técnicas narrativas, que apontavam uma mudanca stibstancíal na velha tradicäo regionalista. Dez anos depois, o autor confirmaria as expectativas, dando a publico, de uma só vez, em 1956, duas obras-primas: Corpu debaile (novelets), e Grandesertäo: veredux (romance). Ö autor publicou ainda Primeiras esiónai '(1962) e Tútaméia - Terceiras estóľias (1967). Atuaimente a obra Corpo de bade é publieada em trčs partes: Mamtehäu e MiguiUm, No Urubuquaquá, no Pinhém e Noiles do sertäa. ', Mí.-,. iii ,i 'r . Hint- n Ä novidade da lirigiiaciern A tradicäo regionalista na literatura brasileira é antiga. Comeca comlislómánticos Alencar e Taunay, passa pelos autores naturalistas e pré-modernistas, como Domitigos Olímpio e Euclides da Cunha, c pelos modernistas de 30, como Graciliano Ramos e Jose Lins do Rego. Para todos esses momentos da prosa regionalista, sempře se colocou aos autores um problema de diiícil solucäo: a linguagem a ser empregada. O autor deveria empregar a lingua culta, que Ihc era propria, ou a lingua regional, ou as duas? A solueäo para esse problema quase sempře foi a dajydstura: o narrador empregava uma lingua culta, com afgůns termos regionais, e as personagens utilizavam a linguagem típica da regiäo. O emprego da lingua regional, nesse časo, quase sempře ficava no nível do vocabulário. EBBäl Iři II *íl, 1-7. "V. ll'I SlljSJtiii HR i.ii ' n.// l.lli!.. ľ I í i il ■ f), f II t,(lpi řfol-i) KCJI-l-M , ' i . 1. ■.' m-iicjj.j. -! .: 1 11' !Uv-.'[l»Wff|.A,.'t •<■ l'l?- U.. ftU' it vl.\. ÍÍ.Í ■ '-'f ■ 'SI ''" ,-ľi : M. lnu >«• . ... .tlmil- i ..j. „ii.-.i.; |i.....i' iiffí-> -.ot-|!K ťí.-«".'»i ':.': 1..H.U-. „!-.,... - ,,:.,«1„.,.;' ~ -i m '. ij-,.'i,r, ľ;-y„<.í: ií. j„, n.iiiiii)i i=,. isii-í ,i-,j,|i( . fl-M'i ,r. If .1 i li in non mi. ; i -||| j • . .'i A seguir voce lerä o conto 'Desenredo', que intcgra a obra Tiitameiu - Terceiras estörias. Como e proprio do estilo de Rosa, o texto exige urn leitor atento as sutiiezas da construgäo da lingua e da propria narracäo, mas o resultado e altamente compensador, pois o leitor pode saborear uma narrativa rica e inovadora, humana e universal. i Desenredo 33 Si DUEO IRBS i iľ ■im Do narrador a seus ouvintes: - Jó Joaquim, cliente, era quieto, respeitado, bom como o cheiro de cerveja. Tinha o para nao ser célebre. Com elas quern pode, porém'.' Foi Adao dormir, e Eva nascer. Chamando-se Liviria, Rivilia ou Irlivia, a que, nesta observacáo, a Jó Joaquim apareceu. Antes bonita, olhos de viva mosca, mořena mel e pao. Alias, casada. Sorriram-se, viram-se. Era infinitamente maio c Jó Joaquim pegou o amor. Etifim, entenderam-se. Voando o mais em impeto dc nau tangida a vela e vento. Mas muito tendo tudo de ser secreto, claro, coberto de sete capas. Porque o marido se fazia notório, na valentia com ciúme; e as aldeias sao a alheia vigiláncia. Entao ao rigor geral os dois se sujeitaram, conforme o clandestino amor em sua forma local, conforme o mundo é mundo. Todo abismo é navegável a barquinhos de papel. Nao se via quando e como se viam. Jó Joaquim, alem disso, existindo só retraído, minuciosamente, Espeiar é reconhecer-sc incomplete Dcpendiam eles de enorme milagrc. O incwiado engano. Até que - deu-sc o O trágico nao vcm a conta-gotas. Apanhara o marido a mulher: com outro, um terceiro... Sem mais cá nem mais lá, mediante revolver, assustou-a e matou-o. Diz-se, também, que de leve a ferira, leviano modo. Jó Joaquim, dcrrubadamente surpreso, no absurdo desislia de crer, e foi para o aaeuoiaa dt.rvil, por dores, trios, calorcs, quicá lágrimas, devolvido ao barro, entrc o mifiiwl e o iitfninio. Imagina-ra-a jamais a ter o pé em ties estribos; chegou a maldizer de seus próprios e gratos iibiisiUru.os. Reteve-se de vS-la. Proibia-se de ser pseudopersonagem, em lance de táo vermelha e preta amplitude. Ela - longe - sempre ou ao maximo mais fbrmosa, já sarada e sa. Ele exercitava-se a agiientar-se, nas defcituosas emocoes. Enquanto, ora, as coisas amaduravam. Todo fím é impossivel? Azarado fugitivo, e como a Providencia pray., o marido faleceu, afogado ou de tifo. O tempo é engenhoso. Soube-o logo Jó Joaquim, em seu íra neumal- , dolorido mas já medicado. Vai, pois, com a amada se enconlron - ela sutil como uma collier de cha, grade dc .a ,,'Mío:;, o firmě fascínio. Nela acreditou, num abrir e náo fechar de ouvidos. Daí, de repente, casaram-se. Alegres, sim, para feliz eseándalo popular, por que forma fosse. Mas. Sempre vem imprevisivel o i 0 Ou: os tempos se seguem e parafraseiam-se. Deu-se a entrada dos demónios. Da vez, Jó Joaquim foi quem a deparou, em péssima hora: traído e traidora, De amor náo a matou, que náo era para tu? de tigre ou leáo, Expulsou-a apenas, apostrofando-se, como inédito poeta e homem. E viajou fugida a mulher, a desconhecido destine Tudo aplaudiu e reprovou o povo, repartido. Pelo fato, Jó Joaquim sentiu-se histórico, quase eriminoso, reincidente. Triste, pois que táo calado. Suas lágrimas corriam atrás dela, como formiguinhas brancas. Mas, no í<áí-i<> da barca, de novo respeitado, quieto. Vá-se a camisa, que näo o dela dentro. Era o seu um amor meditado, a prova de remorsos. Dedicou-se a endireitar-se. Mais. No decorrer e aoaa.uca:, Jó Joaquim entrou sensível a aplicar-se, a progressivo, jeitoso ■•Sť. A bonanca nada tem a ver com a tempestade. < rívni? Sábio sempre foi Ulysses, que comecou por se fa/.er de louco. Desejava ele, Jó Joaquim, a felicidadc - idéia inata. Entregou-se a remir, redimir a mulher, á conta inteira. Incrível? E de notár que o ar vem do ar. De sofrer e amar, a gente näo se . Ele queria apenas os iiM|t«:li;w.-., platonizava. Ela era um aroma. Nunca tivera ela amantes! Näo um. Näo dois. Dissc-sc c dizia isso Jó Joaquim. Reportava a lenda a embustes, falsas ä'a a; escabrosas. Cumpria-lhe descaluniá-la, obrigava-sc por tudo. Trouxe á I a <<-m« do mundo, de caso raso, o que fora táo claro como água suja. Demonstrando-o, amatemático, contrario ao público pensamento e á logica, desde que Aristoteles a fundou. O que näo era täo fácil como refritar almóndegas. Sem malícia, com paciéncia, sem insisténcia, principalmente. O ponto está em que o soube, de tal arte: por antipesquisas, acronologia miúda, con-versinhas escudadas, remendados testemunhos. Jó Joaquim, genial, operava o passado -plásíico e contraditório raseunho. Criava nova, transformada realidade, mais alta. Mais čerta? Celebrava-a. , tendo-a por justa e averiguada, com convicgäo manifesta. Haja o absoluto amar - e qualquer causa se irrefuta. Pois, produziu efeito. Surtiu bem. Sumiram-se os pontos das reticéncias, o tempo sečou o assunto. Total o transato demanchava-se, a anterior evidencia e seu nevociro. O real e válido, na árvore, é a reta que vai para cima. Todos já acreditavam. Jó Joaquim primeiro que todos. Mesmo a mulher, até, por fím. Chcgou-lhe lá a notícia, onde se achava, em ignota, defendida, perfeila dištancia. Soube-se nua e pura. Veio sem culpa. Voltou, com dengos e fofos de bandeira ao vento. Trés vezeš passa perto da gente a felicidade. Jó Joaquim e Vilíria retomaram-se, c con-viveram, aaavr . 1 ' í" , I 1 k l»'^- 1^ j I I I 1 I >■ „ II II r[ » jjlll '.V^5, l i I: 1 ."loll Ki ch 'f ď' -■'í ' 'I jľj '.1 ' M |.>!.|Il wm Grande sertäo: veredas ou a história de uma travessia Grande sertäo: veredas c a obra-prima de Guimaräes Rosa e um dos mais importantes romances de nossa literatura. Riobaldo, seu narra-dor-protagonista, agora um velho e pacato fazen-deiro, faz um relato de sua vida a um interlocutor, um "doutor" que minca aparece na história, mas cuja fala é sugerida pelas respostas de Riobaldo. Assim, apesar do diálogo sugerido, a narracäo é um longo monólogo em que Riobaldo traz á tona suas lembrancas em torno de lutas sangrentas de jaguncos, perseguicôes e emboseadas nos sertôes de Minas, Goiás e sul da Bahia, bem como suas aventuras amorosas. II I I I mm Ao mesmo tempo, Riobaldo vai relatando as preocupacoes metafisicas que sempre marcaram a sua vida. Dentre elas, destaea-se a existéncia ou nao do diabo. Para elc cssa questáo é primordial, porque, pelo que se depreendc da obra, provavelmente fizera um pacto com o demónio a fim de veneer Hermógenes, chefe do bando inimigo. Portanto, dessc fator depende a sua salvacáo e daí advém as inquietacoes da personagem. O amor e suas ambigiiidades Riobaldo conhece e relata trés amores na história: o envolvimento com Otacilia, moca recatada que conheceu numa fazenda; o amor sensual de Nhorinhá, uma prostituta; e o amor ambiguo e envolvente de Diadorim. Desses trés, o ultimo é o mais importante e, ao mesmo tempo, o amor impossivel. Diadorim é o nome íntimo (que só Riobaldo conhece) de Reinaldo, valente jagunco e melhor amigb de Riobaldo que entrara na guerra porque queria vingar a morte de seu pai, o chefe Joca Ramiro. A descoberta do amor por Diadorim surpreende Riobaldo, que nunca tivera nenhum traco homossexual. Apesar disso, o amor crescia incontro-lável: Mas Diadorim, conforme diante de mim estava parádo, reluzia no rosto, com uma beleza ainda maior, fora de todo comum. Os olhos - vislumbre mcu -que ciesciam sem beira, dum verde dos outros Verdes, como o de nenhum pasto. [...] De que jeito eu podia amar um hörnern, meu de natureza igual, macho cm suas roupas e suas armas, espalhado rústico em suas acnes?! Me franzi. Ele tinha a culpa? Eu tinha a culpa? 1 No término da obra, depois que Diadorim mata Hermógenes e por ele, no encontro final, os corpos säo recolhidos para serem Entäo é que se descobre: Diadorim era uma mulher (Diadorina, seu verdadeiro nome) que se fizera homem apenas para ser aceita no bando e vingar a morte do pai. A revelaeäo leva Riobaldo ao desespero: "Uivei. Diadorim! Diadorim era uma mulher. Diadorim era mulher como o sol näo acende a água do rio Urucuia, como eu solucei meu desespero". A travessia A travessia está presente em vários momentos da obra: uma dificil travessia que čerta vez Riobaldo faz do rio Säo Francisco; a travessia do sertäo, do amor e do medo; a travessia da morte e do diabo. E também a travessia de sua propria vida, que Riobaldo faz, ao repassar a memória e contar sua história ao interlocutor. Somente quando Riobaldo chega ao final dc sua história é que as coisas fazem sentido para ele. E o sentido da vida também fica elaro: "Porque aprender a viver é que é o viver mesmo". Ľ chega a uma conclusäo sobre sua dúvida iniciál: "O diabo näo há! É o que eu digo, se for... Existc é homem humano. Travessia". e morto lavados. 11 • i^t- i it "i 'i v n 'i i m in : mm ■■■I ° Kiii MM De primeiro, eu fazia e mexia, e pensar näo pensava. Näo possuia os prazos. Vivi puxando dificil de dificel, peixe vivo no moquém: quem mói no asp'ro, näo fantaséia. Mas, agora, feita a folga que me vem, e sem pequenos dessossegos, estou de range rede. E me inventci neste gosto, de especular idéias. O diabo existe e näo existe? Dou o dito. Abrenúncio. Essas melancolias. O senhor vé: existe cachoeira; c pois? Mas cachoeira é barranco de chäo, e água se caindo por ele, retombando; o senhor consome essa água, on desfaz o barranco, sobra cachoeira alguma? Viver é negócio muilo perigoso... Explico ao senhor: o diabo vige dentro do hornom, os erespos do hörnern - ou é o homem arruinado, ou o homem dos avessos. Solto, por si, cidadäo, é que näo tem diabo nenhum. Nenbum! -é o que digo. O senhor aprova? Me declare tudo, franco — é alta mercé que me faz: e pedir posso, encarecido. Este caso - por estúrdio que me vejam - é de minha čerta importäncia. Tomara näo fosse... Mas, näo diga que o senhor, assisado e instruido, que acredita na pessoa dele?! Näo? Lhe agradeco! Sua alta opiniäo compöe minha valia. Já sabia, esperava por ela —já o campo! Ah, a gente, na velhice, carece de ter sua aragem de descanso. Lhe agradeco. Tem diabn nenhum. Nem espirito. Nunca vi. Alguém devia de ver, entäo era eu mesmo, este vosso servidor. Fosse lhe conlar... Bern, o diabo regula seu estado preto, nas criaturas, nas mulheres, nos homens. Ate: nas criancas - cu digo. Pois näo é ditado: "menino - trem do diabo"? E nos usos, nas plantas, nas águas, na terra, no vento... Eslrumes. ... O diuho na rua, no meio do redemunho... Hem? Hem? Ah. Figuracäo minha, de pior pra trás, as certas lembrancas. Mal haja-me! Sofro pena de contar näo... Melhor, se arrepare: pois num chäo, e com igual formato de ramos e folhas, näo dá a mandioca mansa, que se come comum, e a mandioca-brava, que mata? Agora, o senhor já viu uma estranhez? A mandioca-doce pode de repente virar azangada - motivos näo sei; ás vezes se diz que é por replantada no terreno sempre com mudas seguidas, de manaibas vai em amargando, de tanto cm tanto. de si mesma toma peconhas. E, ora veja: a outra, a mandioca-brava, também é que ás vezes pode ficar mansa, a esmo de se comer sem nenhum mal. E que isso é? Eh, o senhor já viu, por ver, a feiúra de ódio franzido, carantonho, nas faces duma cobra cascavel? Observou porco gordo cada dia mais feliz bruto, capaz de, pudesse, roncar e engulir por sua suja comodidade a mundo todo? E gaviäo, corpo, alguns, as feicöes deles já reprcscntam a precisäo de talhar para adiante, rasgar e estracalhar a bico, parece uma quicé muito afiada por ruim desejo. Tudo. Tem até tortas racas de pedras, horrorosas, venenosas - que estragam mortal a água, se estäo jazendo em fundo de poco; o diabo dentro delas dorme: säo o demo. Se sabe? E o demo - que é só assim o signilicado dum azougue maligno - tem ordern de scguir o caminho dele, tem licenca para campear?! Arre, ele está misturado em tudo. Que o que gasta, vai gastando o diabo de dentro da gente, aos pouquinhos, é o razoável softer. E a alegria de amor - compadre meu Quelemém diz. Família. Deveras? E, e näo é. O senhor ache e näo achc. Tudo é c näo ô... Quasc todo mais grave criminoso feroz, sempre é muito bom marido, bom filho, bom pai, e é bom amigo-de-seu-amigos! Sei desses. Só que tem os depois - e Deus, junto. Vi muitas nuvens. {Grande serfäo; veredas. 15? sd. Rio da Janeiro, J. Olympio, 1982. p. 11-2.) 1. Destaque do texto um segmento que comprove a presenca de um interlocutor que fala com o narrador, Riobaldo. 2. O texto, no geral, apresenta feicáo dissertativa, uma vez que pretende defender o ponto de vista do narrador sobre a existéncia ou nao do diabo. a) A tese é lancada no segundo paragrafe Identifique-a. b) Dc que argumentos o narrador se vale para identificar a tese? 3. No quarto parágrafo, o narrador conclui: "Tudo é e näo é...". Partiiido desse princípio, pode-se dizer que Riobaldo acredita na existencia de Deus? Justifique. f m v il / U Íepeda/Folha Imagem Poderia a lingualem de um poema näo apenas referir-se a um objeto, mas imitä-lo, stigeri-lo, a ponto de o sentirmos dentro do proprio poema? Essa e uma das preocupacöes da poesia de Joäo Cabral de Melo Neto, que tambem se intercssou pelos problemas sociais do Nordeste, por temas relacionados ä arte e por futebol. 11 'oäo Cabral de Melo Neto_é q mais importante poeta da geraeäo de 45. Nasceu em 1920, em Recife, Tuho e neto de donos de engenho. Desde cedo apresentou interesse pcla pala vra, pela literatura de cordel nordestina c desejava ser erítico literário. Tinha como primos dois nomes ilustres da cultura brasileira: Gilberte Freyre e Manuel Bandeira, com quem batia longos papos. Aos vinte anos já lia no original os grandes poetas da literatura estrangeira, como Apollinaire, Valéry e outros. Em 1942, apenas com o curso secundário concluído, muda-se para o Rio de Janeiro e, para so-breviver, ingressa no funcionalismo publico. Trazia consigo seu primeiro livro, Pedra do sono. Trés anos depois, num segundo coneurso, ingressa no Itamarati, passando a viver cm várias cidades do mundo, como Barcelona, Londres, Sevilha, Marsclha, Genebra, Berná e outras. ii" W „.>'' ""i " ■ ľ " '< 1 ...... i.u^kém <.... Marcelo VIgneron/Reflsxo Cronologicamente, Joäo Cabral jsitua-se entre os poetas da geragäo de 45, mas trilhou caminhos propTios, dando conlinuidade a certos tragos que já se delineavam na poesia de Drummonde Murilo Mendes, tais como a poesia substantiva, a objetrvidade e a precisao dos vocábulos. Pedra do sono (1942), sua obra inaugural, já äpre-senla uma inclinacäo para a objetividade (o lado "pedra", do titülo)," embóřa a obra esíeja ídentificada com a oricntagáo surrealista (o lado "sono"), como se observaTiestes versos: O mar soprava sinos os sinos secavam as flores as flores cram cabecas dc santos. O engenheiro da palavra A partir da obra seguinte, O engenheiro (1945), verifica-sc um afasta-mento da linha surrealista e uma tendencia crescente á geometrizacäo e exatidäo da linguagem, como se o poeta procurasse seguir o exemplo do engenheiro. Pěrceba a economia da linguagem e a tendencia á substanti-vayäo neste,poema dc Čabral: O engenheiro A Antônio B. Baltar A luz, o sol, o ar livre envolvem o sonho do engenheiro. O engenheiro sonha coisas claras: superficies, tenis, um copo de água. O lápis, o esquadro, o papel; o desenho, o projeto, o numero: o engenheiro pensa o mundo justo, mundo que nenhum véu encobre. (Em certas tardes nós subíamos ao edifício. A cidade diária, como um jornal que todos Ham, ganhava um pulmäo de cimento e vidro.) A água, o vento, a claridade, de um lado o rio, no alto as nuvens, situavam na natureza o edifício crescendo de suas forcas simples. (Em Poesias completas. 3? ed. Rio de Janeiro, J. Olympic, 1979. p. 344.) Nas obras seguintes, essa tendencia objetivante aprjafiinda-se e leva o pocta a criar um novo conceito de poesia, que desšacraíiza a chamada "poesia profunda", isto é, os versos de sentimenťos ou de abordagem j.n-|rospectiva. Em suas principais obras - dentre elas O edo sem plumas (1950), O rio (1954), Quaderna (1960), Morte[e vidaseyerina (1965), A educapäopelapedra (1966), Museu de tudo (1975), Ä escola ďasfacas (1980) t Poesia erítica (1982)""" děstacam-se trés lagos fundamentals: a preocupagäo cada vez maior com a realidade social, particularmente com o Nordeste brasileiro; a reflexäo permanente sobre a criagäq artística; e o aprimoramento de sua poética já em construcäo, a poética da linguagem-objeto, isto é, que proeura sugerir o assunto retratado pela propria construgäo da lmguagem. A morte do eu lírico Talvez se possa afírmar que a poesia de Joäo Cabral tenha sido a pri-meira a estabelecer um corte profundo entre a poesia romantičtí e a moderna. Para o poeta, a poesia näo é fruto de inspiracäo nem de estados emocionais, como o amor, a alegria, etc.; ela resulta de um trabalho rational, árduo, que implica fazer e desfazer várias vezes o texto até que ele atinja sua forma mais adequada. Ao tratar da mulher como terna amoroso, por exemplo, o poeta o faz de forma distanciaría, sem cair no sentimentalismo. Observe como ele trata da seducäo feminina nestes versos: Tua sedugäo é menos de mulher do que de casa: pois vem de como é por dentro ou por detrás da fachada. Mesmo quando ela possui tua plácida elegancia, esse teu reboco claro, riso franco de varandas, urna casa nao e nunca só para ser contemplada; melhor: somente por dentro é possível contemplá-la. Seduz pelo que ó dentro, ou será, quando se abra: pelo que pode ser dentro de suas paredes fechadas im Kill I jľ H im ill ji-ii i' k )(< ij«, ill l»ll' I It flH n k i Lľ,v. i'\ r>ií'.|lni; ■ m nií.JíijjíiiV 't)rt^®t «Sit**» - J Mr i>'< mm M-riv e vida severma Mořte e vida Severina é a obra mais cpnhecida dc Joáo Cabral_e_a respónšáwí por sua relativa popularidade. Trata-se de um auto de Natal que persegue a tradicao dos autos medieyais, fazendo uso dafredondiffia, 3o jitmoe da musicalidade, próprios dg,_gosto popular. Foi levada aos palcos brasileiros incontáveis vezes e, em(1966,) musicada por Chico Buarque de Hollanda, conheceu seu maior sucessó, scndo vista por mais de čem'mil pessoas ho Tuca (Teatro da PUC de Sao Paulo) e ganhando prémios no Brasil e na Franca. Mořte e vida severina retrata a condicáo do retirante nordestino (um dos muitos sevennos), que fogc da scca c da miscria (a "morte", do ti'tulo da obra). Desiíudido, Sevennp parte em~direcao a Recife, trilhando o leito seco do rio Capibaribef^o^'climhiho procura traballío, mas só enco.ntra mortes, mortes de severinos como ele. Ao chegar a Recife, ouve a conversa de dois coveiros, por meio da qual fica sabendo que ali também, na capital, grassa a miséria e a morte. Desolado, o retirante aproxima-se de um dos cais do Capibaribe e pensa em suicidio. Mas aproxima-se de Severino um morador daquele mangue, "Šeu José, mestre carpina", que, com sua sabedoria de muitos anos de vida severina, despcrta-lhc alguma esperanca. Logo depois, Seu José é chamado por uma vizinha, que Ihe dá a noticia: acabara de nascer o seu filho. Severino o acompanha. ■HHHHIHHHBBHHI WW II -I.. ílť nu ftflfijrolrt .1.1' in =n .f.->'£l 'I'I'.st,= Á casa dc mestre carpina, os vizinhos levam presentes humildes: leite do peito, jornal para servir de cobertor, água, um canário, etc. O texto que segue reproduz as ultimas falas que compoem o desfecho da narrativa. Falam as duos cigunas que havium aparecido com os vizinhos: - Atenjao pego, senhores, para esta breve lei tura: somos ciganas do Egito, lemos a sortě futura. Vou dizer todas as coisas 1 que desde já posso ver na vida desse mcnino acabado de nascer: aprenderá a engatinhar por ai, com aratus, aprenderá a caminhar na lama, com goiamuns, e a correr o ensinaráo os anfibios caranguejos, pelo que será anfibio como a gente daqui mesnio. Cedo aprenderá a cagar: primeiro, com as galinhas, que é catando pelo cháo tudo o que cheira a comida; depois, aprenderá com outras espécies de bichos: com os porcos nos monturos, com os cachorros no lixo. Vejo-o, uns anos mais tarde, na illia do Maruim, vestido negro de lama, voltar de pescar siris; e vejo-o, ainda maior, pelo imenso lamaráo Tazendo dos dedos iscas para pescar camaráo, - Atenfáo peco, senhores, também para minha lei tura: também ven ho dos Egitos, vou completar a figura. Outras coisas que estou vendo é necessário que eu diga: náo ficará a pescar de jereré toda a vida. Minha amiga se esqueceu de dizer todas as linhas; náo pensem que a vida dclc há de ser sempře daninha. Enxcrgo daqui a planina que é a vida do homem de olício, bem mais sadia que os mangues, tenha embora prccipícios. Náo o vcjo.dentro dos mangues, vejo-o dentro de uma fábrica: se está negro náo é lama, é graxa de sua máquina, coisa mais linipa que a lama do pescador de maré que vemos aqui, vestido de lama da cara ao pé. E mais: para que náo pensem que em sua vida tudo é triste, vejo coisa que o trabalho talvez a té lhe conquiste: que é mudar-se destes mangues daqui do Capibaribe para um mucambo melhor nos mangues do Bebcribe. i1 ! .1 > mi O carpina fata com o retirante que estere defora, sem tomar parte em nada: - Severine- retirante, deixe agora que lhe diga: eu nao sei bem a resposta da pergunta que fazia, se náo vale raais saltar fora da ponte e da vida; nem conhego essa resposta, se quer mesmo que lhe diga; é dificil defender, só com palavras, a vida, ainda mais quando ela é esta que vč, scverina; mas se responder náo pude á pergunta que fazia, ela, a vida, a respondeu com sua presenca viva. E náo há melhor resposta que o espetáculo da vida: vé-la desfiar seu fio, que também sc cháma vida, ver a fábrica que ela mesma, teimosamente, se fabrica, vé-la brotar como há pouco em nova vida explodida; mesmo quando é assim pequena a explosáo, como a ocorrida; mesmo quando é uma explosáo como a de há pouco, franzina; mesmo quando 6 a explosáo de uma vida severina. (Em Poesias completas, p. 236-41.) Joäo Cabral de Melo Neto v Tecendo a manha Urn galo sozinho nao tece uma manha: ele precisara scmpre dc outros galos. De um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro; de um outro galo que apanhe o grito que um galo antes e o lance a outro; e de outros galos que com muitos outros galos se cruzem os fios de sol de.seus gntos de galo, . para que a manha? desde uma teia tenue, se va tecendo, entre todos os galos. •■.E sc encorpando em tela, entre todos, se erguendo tenda,: onde entrem todos, se entretendendo para todos, no loldo (a manhs!) que plana livre de armaeäo. A manhä, toldo de um tccido täo aéreo que, tecido, se eleva por si: luz baläo. -• (Em Poes/as comp/eías, p. 19.) ILUSTRAgAO: VIM Desenhos Fabula de um arquiteto A arquitetura como construir portas, de abrir; ou como construir o aberto; construir, nao como ilhar e prender, nem construir como fechar secretos; construir portas abertas, em portas; casas exclusivamente portas e tecto. O arquiteto: o que abre para o homem (tudo se sanearia desde casas abertas) portas por-onde, jamais portas-contra; por onde, livres: ar luz razao certa. Os autos tradicionalmente retratam, em data natalina, o naseimento de Cristo. Trata-sc, portanto, de um texto de fundo religioso. a) Que personagens dos textos lidos säo responsäveis pela ambientaeäo mistica das cenas? b) Que ligacöes podem ser estabelecidas entre essas personagens e as que compöem o naseimento de Cristo? c) Que ligacöes podem ser estabelecidas entre o bebe nascido e Cristo? A propösito das falas das ciganas: a) O que as diferencia quanto äs previsöes que fazem para o bebe? b) Em que essas previsöes se assemelham? Na conversa entre Scverino e mestre carpina, o retirante pergunta ao mestre "se näo vale mais saltar/ fora da ponte e da vida". a) Quem responde a Severino? b) Qual e a resposta? A explosäo de mais "uma vida severina", como diz o ultimo verso, parece dar continuidade a essa corrente de severinos. Eies näo estäo apenas no sertäo seco do Nordeste; agora estäo por todo o pais, severinamente lutanto contra a "morte em vida". Afinal, quem säo os severinos deste pais? Ate que, tantos livres o amedrontando, renegou dar a viver no claro e aberto. Onde väos de abrir, ele foi amurando opacos de fechar; onde vidro, concreto; até refechar o hörnern: na capela utero, com confortos de matriz, outra vez feto. (Idem, p. 20.) '>! fA Iconognpi la .áflHHHHhOTlHiytfKi 111 A cul tura brasileira acompanha o ritmo das mudan-$as. Novas idéias surgcm nos diferentes dominios da arte: a Bossa Nova, o Cinema Novo, o Teatro de Arena, as vanguardas concretas na poesia e nas artes plásticas, os festivals de música transmitidos pela televisäo. Após o golpc militar dc 1964, a atividadc cultural do pais ainda se manlém dinámica por mais alguns anos. Surge p Teatro Oficina, que § encena O-rei da vela, de Os- | wald de Ändrade; säo criados |, os CPCs (Centros Populäres f: de Culture), que visam levni' 8 '■; cultura para as ruas; a Tro- | í picália ganha as radios c a televisäo. Esse periodo cJer-vescente lermina com a dc cretagäo do AI-5, em 1968, o exílio de políticose artistas e * , _j a instituiíao dc uma ccnsi i.i previa a eventos culturais. Duas sao as marcas principals da cultura brasileira nas ultimas decadas: a efemeridade e a mistura das tendencias artistico-culturais. Trata-se de urn periodo fertil, com o lancamento de inumeras revistas, manifestos e movimentos, mas de curta duracao. Ao mesmo tempo, verifica-se uma mistura dessas tendencias com as antigas linhas de nossa tradicao literaria. Depois da implantacao da censura a todo tipo de atividade cultural, acentuou-se o carater dispersivo dessa literatura, que passou a contar basicamente com producoes individuais. Os alios 50-60 O Brasil, nos anos 50 e 60, até o golpe de 64, vive um periodo de ver-dadeira eufória política e econômica. E a época do governo demoerático-populista de Juscelino Kubitschek (1956-1961), que empreende uma política econômica industrial e desenvolvimentista. Propondo á nacäo um Piano de Metas que permitiria ao pais desenvolver cinqitenta anos de sua história cm cinco, Juscelino abre as portas ao capital estrangeiro, que aqui instala suas indústrias e se aproveita de nossa mäo-de-obra barata. A construcäo de Brasilia, a gera^äo de novos empregos na indústria e no comércio, a ampliafäo do consumo - tudo isso cria uma atmosféra ingénua de eufória no pais. No piano internacionál, a vitória da Revolucäo Cubana abre a discussäo sobre as relaeöes de forca entre as grandes nacôes e aguca a consciéncia dos países do Terceiro Mundo no sentido de se manterem independentes dos Estados Unidos e da Uniäo Soviética. O Concretismo: o poema-ícone O Concretismo provavelmente foi, dos anos 50 até os nossos dias, a principál correnfe de vanguarda em nossa literatura, em virtude da Ihfluéncia que exerceu sobre sucessivos grupos de poetas, artistas plásticos e músicos. O movimento foi eriado por trés poetas paulistas, em 1956: Décio Pignatari e os irmáos Augusto e Haroldo de Campos. Como porla-voz de suas 'idéias, o grupo eriou a revista Noigrandes. Os poetas coneretos, taT~qual já fazia ---- _ Joáo Cabral de Melo Neto, pregam o íim da poesia intimista, o desaparccimento do eu 'lírico, e propoem uma concepcao poética baseada na geometriza9ao e visualizafáo da linguagem. Para isso, retomam certos procedimen- ^ i tos langados pelas correntes de vanguarda do come50 do século, tais como o Futurismo e o Cubismó, e dao continuidade a certas experiénciaii formais já feitas por Murilo Mendes e Joao Cabral de Melo Neto. ! *i * »t « -Ate * , i^y-ftl ■■■■ *lií.í»i"1|i 'Iii i ■ff SEIEEEB ľ' .|M|. II 1 I "•P'-v-i:l|t|o,s 1|| < ,- ' &!^l< iilŕfelií I dl l'ílvi. ' liľl SB SEŠ wl i - 'A <-rji i .Jife U(it-ii.ui..'t4jh " i.-1 / 'i' •m "gť:,:.-.:-..--.-:,.,..:-::.- Mu I l.i lľ ill müEMUE •A? ' jrl I Ii 31 I I l'( |Wi Ii till I Jlof*-' hi it .f*-"1 ■" ■HU 'f AK O grupo estreou a 15 de Janeiro de 1940, no Teatro Ginástieo, com Assim é, se Ihe parece, de Pirandello. O éxito alcancado pelo cspetáculo levou o grupo a apresentar logo depois uma nova pega, Uma mulher e trés palhapos, de Marcel Achard. Durante a Scgunda Grande Guerra refugiou-se no Brasil o ator polonés Ziembinski - hoje definitivamente incorporado á história do teatro nacionál -, que se juntou a Os Comediantes também como diretor. Acatando a sugestäo de encenar autor nacionál feita por Ziembinski - segundo ele, procedimento indispen-sável para a existencia do teatro de qualidade no Brasil —, Os Comediantes estrearam, em 28 de dezembro de 1943, Vestido de noiva, de Nelson Rodrigucs. Assim se iniciava a renovagäo do teatro brasileiro, assentada na presenca de um diretor que fazia do espetáculo um trabalho de equipe e na série de inovagóes tanto formais quanto temáticas feitas pela pega. A partir de entäo, comegam a surgir inúmeros grupos e inúmeros autores que däo novo impulso ao teatro brasileiro contemporáneo. Em Säo Paulo, em 1948, o industrial italiano Franco Zampari fundou o Teatro Brasileiro de Comé-dia (TBC), que durante muito tempo utilizou a formula "atores de talento + diretores estrangeiros + pegas clássicas e consagradas = sucesso". Pelo palco do TBC, que ocupou posigäo de lideranga no teatro brasileiro, desfilaram atores como Nydia Lícia, Sérgio Cardoso, Tônia Carrero, Maria Delia Costa, Cacilda Becker, Paulo Autran, sob orientagäo de diretores como Adolfo Celi, Luciano Sake, Ruggero Jacobbi e o próprio Ziembinski - todos estrangeiros. O único dramaturgo brasileiro encenado pelo TBC até 1958 foi Abilio Pereira de Almeida. De cisóes do TBC surgiram várias companhias: a Nydia Lícia-Sérgio Cardoso, a Tônia Carrero-Paulo Autran, a de Cacilda Becker, e o Teatro dos Sete. Em 1953 foi criado o Teatro de Arena, em Säo Paulo, com participagäo de José Renato e, mais tardc, Augusto Boal, que defendia um teatro mais voltado para temas nacionais. Após a encenagäo de Eles näo usam black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri, em 1958, o grupo sc solidificou e apresentou Revolupäo na America do Sul, Arena conta Zumbi, Arena conta Tiradentes, Cusíro Alves pede passagem e muitas outras pegas criadas pelos próprios atores. O grande mérito do Teatro de Arena foi a eliminagäo do preconceito que existia em torno do dramaturgo brasileiro, levando o próprio TBC, no íim da década de 50, a encenar pegas brasilciras. Na década de 60, passaram a existir no pais diversos grupos teatrais de caráter contestador, além do Teatro de Arena. Destacaram-se o Grupo Oficina, em Säo Paulo, cujo grande momento foi a revolucionária encenagäo de O rei da vela, de Oswald de Andrade, sob diregäo de José Celso Martinez, e o Grupo Opiniäo, no Rio de Janeiro, de que faziam parte os dramaturgos Oduvaldo Viana Filho e Paulo Pontes. Em 1965, o Opiniäo levou á cena Liberdade, liherdade, com textos de Flávio Rangel e Millôr Fernandes, entremeados de cangôes de protesto. Após a promulgagäo do AI-5, o pais passou a viver uma fase artística difícil. Com a instituigäo da censura nos meios de comunicagäo, proibiram-se inúmeras apresentagôes teatrais, mutilaram-se textos, e muitos atores e diretores foram exilados. O teatro de eunho contestador, politico, renovador desapareceu, substituído por criagôes de tom ufanista, e seu fio somente séria retomado após 1976, quando se iniciou uma lenta e gradual liberagäo da censura. Sob a diregäo de José Celso Martinez, o Teatro Oficina - fechado pela polícia em 1968 - passou por reformas recentes e foi reaberto com a pega Ham-let, vencedora do prcmio de melhor diregäo em 1993. Dentre os autores do moderno teatro brasileiro situam-se Nelson Rodrigucs, Gianfrancesco Guarnieri, Dias Gomes, Aria-no Suassuna, Jorge Andradc, Augusto Boal, Ruy Guerra, Ferreira Guliar, Chico Buar-que de Hollanda, Oduvaldo Viana Filho, Paulo Pontes, Plinio Marcos, Millôr Fernandes. Nelson Rodrigues, o desbravador Autor polémico, Nelson Rodrigues é considerado o maior dramaturgo brasileiro. Ao romper com quase todas as « tradigôes cenicas, Nelson Rodrigues f renovou a dramaturgia brasileira: jo- S gou com pianos dramáticos, instaurou a simultaneidade de tempo e agäo, utilizou técnicas variadas de corte e ritmo, próprias da linguagem cinematográfica. "[...] enveredci por um camiuho que pode me levar a qualqucr destino, me-nos ao exito. [...] um teatro que poderia chamar assim - 'desagradáveľ. [...] porquc säo obras pestilenlas, ľélidas, capazes, por si só, de produzir o tifo e a malária na platéia." (Apud Sábato Magaldi, Panorama do teatro brasileiro. MEC/DAC/Funarte/SNT, s/d, p. 205.) Mjij jfc. •a -'V" -1. Suas pegas retomam incessantemcntc os mesmos temas incestos, suicídios, adultéľios, loucura - e conslroem um vasto painel da classe média burguesa. Ao seu primeiro texto, A mulher sent pecado, seguiu-se Vestido de noiva, cuja encenacäo em 1943, pelo grupo Os Comediantes, marcou o inicio de uma profunda renovacäo na dramaturgia brasileira. Talvez nenliuma peca na história de nosso teatro tenha inspirado tantos artigos e tantos elogios. Outras pegas de sua autoria säo Anjo negro, Valsa n" 6, Viúva, porém honesta, Os sete gatinhos, Bonitinha, mas ordinária, A falecida, Toda midez ser á castigada. Muitas pccas de Nelson Rodrigues foram adaptadas para o cinema e a lelevisäo, como, por exemplo, Os sete gatinhos, A dania do lotapäo, Toda nudez ser á castigada, A morte no espelho (telenovela). ■• V AM»"«« & CINQUENTA ANOS DEPOIS (Foíha de S. Paulo, 26/12/93.) Em Vestido de noiva, o cenário é dividido em trcs pianos, cada um correspondendo a um dos espagos nos quais se passa a acäo: o piano da realidade, o da alucinagäo e o da memoria. A pega comega com o acidente de aulomóvel sofrido por Alaíde. No piano da realidade, ela é levada ao hospital. Repórtercs noticiam o acidente, a operagäo cirúrgica, a morte e o enterro da personagem. No piano da alucinagäo, Alaíde procura e cncontra Madame Clessi, uma mundana que fora assassinada pelo ultimo amante. Alaíde, antes de se casar, morara na casa que pcrtcnccra a Clessi, local do assassinato. Instigada por Madame Clessi, Alaíde vai recordando a propria vida, até descobrir que há um conflito entre ela, a irmä (a mulher de véu) e Pedro, seu marido. ('Irevus. Luz no piano du realidade: Lúčia e Pedro. Lucia chorando. Cor oas. Luz também no piano irreal.) Alaíde - Quem terá morrido ali, naquela casa? Clessi - Olha! Uma fortuna em flores! Alaíde - Enterro de gente rica é assim. Clessi - O meu também teve muita gente, näo teve? Alaíde - Pelo menos, o jornal disse. (No piano da realidade.) Pedro (Em voz baixa.) - Lucia! Lucia (Tomando um choque, levantando-se.) - Que é? Que horas säo? Pedro - 3 horas. IM Lúcia - Fique longe de mim! Nao sc aproxime! Pedro - Mas que é isso? Lúcia (... Com ódio concentrado) - Nunca mais! Nunca mais quero nada com vocé! Juro! Pedro - Vocé enlouqueceu? O que é que eu fiz? Lúcia (Obstinada.) - Jurei diante do corpo dc Alaide! Pedro (Chocado.) - Vocé fez isso? Lúcia (Com decisdo.) Hz. Fiz, sim. Quer que eu vá na sala e jure oulra vez? (Mergulha a cabepa entre as máos.) Ontcm, antes dela sair para morrer, tivemos uma discussao horrível! Pedro (Baixo.) - Ela sabia? Lúcia (Patética.) - Sabia. Adivinhou o nosso pensamento. E eu disse. Pedro - Mas comigo nunca tocou no assunto. Lúcia - Discutimos quantas vezeš! Ameacei-a de escándalo. Mas ontem, foi horrível - horrível! Sabe o que ela me disse? "Nem que eu morra deixarei vocé em paz!" (Lúcia fa/a com a cabepa entre as máos. Alaide responde através do mierofone escondido no buqué. Luz cai em penumbra, durante todo o diálogo evocativo.) Alaíde (Com voz lenta e sem brilho.) - Nem que eu morra, deixarei vocé em paz! Lúcia (Palando surdamen/e.) - Pensa que eu tenho medo de alma do outro mundo? Alaíde (Mierofone.) - Nao brinque, Lúcia! Se eu morrer - nao sei se exisle vida depois da mořte - mas se existir, vocé vai ver! Lúcia (Sardónica.) - Ver o qué, minha filha? Alaíde (Mierofone.) Vocé nao terá um minuto de paz, se casar com Pedro! Eu nao deixo -vocé verá! Lúcia (Irónica) - Está tao čerta assim de morrer? Alaide (Mierofone) - Nao sei! Vocé e Pedro sáo capazes de tudo! Eu posso acordar morta e todo mundo pensar que foi suicídio! Lúcia - Quem sabe? (Noulro lom.) Eu mandei vocé tirar Pedro de mim? (Em Neíson Rodrigues. Sáo Paulo, Abril Educacáo, 1981. p. 25-7. Literatura Comentada.) ■ 7 "f f- 1. As relagöes entre as pessoas säo lensas e conflitantes. Estabelega o tipo de conflito existente entre as personagens: a) Alaide e Lucia; b) Alaide e Pedro; c) Lucia e Pedro; d) Alaide, Lucia e Pedro. 2. Retire do texto um fato ou personagem que represente, respectivamente, ps pianos da realidade, da memoria e da alucinagäo. 3. Vestido de noiva traz uma Serie de inovagöes formais. a) que elementos do texto permitem afirmar que Vestido de noiva näo obedece äs regras de unidade de tempo e espago preconizadas por Aristoteles para toda pega dramätica? b) O tempo passado se apresenta de modo linear? Fundamente sua resposta em elementos do texto. c) De que linguagem e propria a tecnica do flash-back utilizada por Nelson Rodrigues para rcconslituir o passado de Alaide? 1. Considere estes dois textos: Texto I - Fabiane-, voce ó um homem, exelamou em voz alta. Conteve-se, notou que os menínos estavam perto, com certeza iam admirar-se ouvindo-o falar só. E, pensando bem, ele näo era homem: era apenas um cabra ocupado em guardar coisas dos outros. [...] Olhou em torno, com rcecio de que, fóra os meninos, alguém tivesse percebido a frase imprudente. Corrigiu-a, murmurando: - Voce é um bicho, Fabiano. Texto II Explico ao senhor: o diabo vige dentro do homem, os erespos do homem - ou é o homem arruinado, ou o homem dos avessos. Solto, por si, cidadäo, é que näo tem diabo nenhum. Nenhum! - é o que digo. O senhor aprova? [...] Mas, näo diga que o senhor, assisado e instruído, que acredila na pessoa dele?! Näo? Lhe agradeco! Sua alta opiniäo compôe minha valia. a) Identifique as obras e os autores a que pertencem os fragmentos acima. b) As duas obras säo regionalislas, como se pode perceber por indícios da linguagem. Contudo, conforme os próprios excertos demonstram, há entre os autores diferengas fundamentals na abordagem do universo regional. Explicite essas diferengas, valendo-se dos excertos para justifiear. 2. Considere as seguintes afirmativas acerca da obra de Guimaräes Rosa: I. Seu regionalismo apresenta inovacôes sobretudo em dois aspectos essenciais: a linguagem, que evidencia urna profunda pesquisa linguística, que envolve tanto tracos da lingua falada no sertäo de Minas Gerais quanto neologismos, arcaismos, estrangeirismos, etc. E a capacidade de, partindo do sertäo mineiro, superar os limites do regional e refletir sobre os grandes temas humanos universais. II. Embora tome feigôes particulares, o regionalismo de Guimaräes Rosa dá continuidade ao regionalismo de 30, urna vez que, por exemplo, retrata a violéncia dos cangaceiros nordestinos, como já fizera Jose Lins do Rego em Pedra Bonita. TTI. Obra de temas variados e naturcza narrativa complexa, conio as veredas do sertäo, pode-se afirmar que dois temas ressaltam em Grande sertäo: veredas, de Guimaräes Rosa: a descoberta do amor (entre Riobaldo e Diadorim) e a metafisica (em particular a existencia do bem e do mal, de Deus e do diabo). IV. Em Grande sertäo: veredas, o fato de o narrador (Riobaldo) fazer a narrativa de sua vida orahnente a um interlocutor (um doutor da cidade) permite ao autor explorar na linguagem narrativa da personagem várias camadas lingüisticas que caracterizam a lingua da regiäo: a fonética, a vocabular, a sintática e a semäntica. Das quatro afirmativas acima, apenas urna apresenta err o. Identifique-a e explique em que consiste esse erro. 3. A respeito da literatúra de Clarice Lispector e Guimaräes Rosa, aponte a assertiva falsa e explique em que reside o erro. I. Guimaräes Rosa é um eseritor regionalista que, contudo, atinge o universalismo ao abordar temas como o bem e o mal, Deus e o diabo, o amor, a loucura, etc. II. Clarice Lispector é uma eseritora urbana, que focaliza principalmente o universo da mulher de classe média brasileira, fazendo, portanto, uma abordagem restrita ao seu universo pessoal. III. Tanto Clarice quanto Guimaräes conseguem uma densa profundidadc psicológica em seus trabalhos. IV. A linguagem de ambos os autores beira o limiar da poesia, tal o trabalho que empreendem com a expressäo, fazendo uso de imagens, de sonoridades, de metaforizacáo, etc. V. Embora os dois autores devám muito á tradicäo literária modernista (por exemplo, o regionalismo e a introspeccäo psicológica de 30), devem ser vistos como autores da geragäo de 45, devido á inovagäo que empreenderam justamente quanto a esses aspectos herdados da geragäo anterior. 4. (Fuvest-SP) Há um conto de Guimaräes Rosa em que os bois conversam entre si, fazendo consideragôes de várias naturezas. a) De que conto se traía? b) A presenga de animais é freqüente em Guimaräes Rosa? Cite outro exemplo. 5. (PUC-SP) beba coca cola babe cola beba coca babe cola caco caco cola cloaca (Décio Pignatari) Alfredo Bosi afirma que "no contexto da poesia brasileira, o Concretismo afirmou-se como antítese á verteilte intimista e estetizantc dos anos 40 e repropôs temas, formas e, näo raro, atitudes peculiares ao Modernismo de 22 em sua fase mais polémica e mais aderente ás vanguardas européias". Leia atentamente o poéma acima e aponte as características da Poesia Concreta presentes nele. (Uncsp) Texto para as questôes 6 a 8. Essas coisas todas sc passaram tempos depois. Talhei de avanco, em minha história. O senhor tolere minhas más devassas no contar. E ignorancia. Eu näo converso com ninguém de fora, quase. Näo sei contar direito. Aprendi um pouco foi com o compadre meu Quelemém; mas ele quer saber tudo diverso: quer näo é o caso inteirado em si, mas a sobre-coisa, a outra coisa. Agora, neste dia nosso, com o senhor mesmo - me eseutando com dcvocäo assim - é que aos poucos vou indo aprendendo a contar corrigido. E para o dito volto. O romance, do qual o trecho acima foi extraído, veio a publico cm 1956 e é uma das mais importantes obras da literatúra brasileira. Nele, um velho fazendeiro, recolhido a uma vida de paz e descanso, conta a um interlocutor, forasteiro e homem da cidade, os episódios de seu movimento passado de jagungo. Levando em conta o trecho transerito, as ponderagöes fei tas e o conhecimento da obra, responda: 6. Qual é o assunto de que trata o trecho acima? 7. Qual é o nome do narrador-personagem do romance? Quais os nomes de uma personagem ambígua da obra, que inicialmente se apresenta como homem e ao final se revela mulher? 8. Qual é o título do romance? Qual é o nome de seu autor? 9. (PUC-RS) Entre a paisagem o rio fluía como uma espada de líquido espesso; como um cäo humilde e espesso. Entre a paisagem (fluía) de homens plantados na lama; de casas de lama plantadas em ilhas coaguladas na lama; paisagem de anfibios de lama e lama Como demonstram as estrofes aeima, é no livro O Cäo sem Plumas que Joäo Cabnü de Melo Neto inicia a temática centrada no: a) social d) objeto b) eu e) despojamento c) poético 10. (F. Carlos Chagas-SP) "... a composicäo de elementos básicos de linguagem organizados ótico-acusticamente no espago gráľico por fatores de proximidade e semelhanca, como uma espécie de ideológia para uma dada cmocäo, visaiido á apresentaeäo direta - presentificaeäo - do objeto." Um poeta identificado com a filosofia desse movimento estético é: a) Joäo Cabral de Melo Neto b) Paulo Mendes Campos c) Décio Pignatari d) Gcir Campos e) n.d.a. 11. (F. Carlos Chagas-SP) A pergunta anterior refere-se a qual corrente de vanguarda da literatura brasileira? a) poesia-práxis b) coneretismo c) anarco-abstratismo d) anarco-antropofágico e) poema-processo 12. (PUC-RS) O conjunto de novelas de Joäo Guimaräes Rosa, publkado ein 1956, aparece sob o litulo: a) Corpo de Buile b) Sagarana c) Primeiras Estórias ď) Estas Estórias c) Grande Sertäo: veredas 13. (Unicamp-SP) Casimire de Abreu é um poeta romäntico e Cacaso é um poeta conlemporäneo. "H com vocé a Modernidade", de Cacaso, remete-nos ao poema "Meus Oito Anos", de Casimiro de Abreu. Leia, com atencäo, os dois textos transcritos a seguir e, aproximando seus elementos comuns e distinguindo os elementos divergentes, explique como o poema contempoiáneo dialoga com a tradigäo romäntica. Oh! que saudades que tenho Da aurora da minha vida, Da minha intäncia querida, Que os anos näo trazem mais! Que amor, que sonhos, que flores, Naquelas tardes fagueiras á sombra das bananeiras Debaixo dos laranjais! (Casimiro de Abreu, "Meus Oilo Anos") Meu verso é profundamente romäntico. Choram cavaquinhos luares se derramam e vai por aí a longa sombra de rumores e ciganos. Ai que saudades que tenho de meus negros Verdes anos! (Cacaso, "E Com Voces a Modemidade", poema de Beljo na Boca, 1975) 14. (OSEC-SP) I. "Viver é muito perigoso." II. "Ao vencedor, as batatas." III. "E agora, Jose?" As írases aciiiia säo, respectivamente, de: a) Machado de Assis, Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade. b) Graciliano Ramos, Machado de Assis, Manuel Bandeira. c) Guimaräes Rosa, Lima Barreto, Mario de Andrade. d) Cecilia Meireles, Machado de Assis, Manuel Bandeira. e) Guimaräes Rosa, Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade. 15. (Fuvest-SP) "O romance é nariado na primeira pessoa, em monólogo ininterrupto, por Riobaldo, velho fazendeiro do norte de Minas, antigo jagunco, que conta a sua vida e a sua angústia." (A. Cändldo e J. A. Castello.) O autor do romance a que se refere o texto acima é também o de: a) Chapaddo do Bugre. d) Sagarana. b) O Garimpeiro. e) O Coronet e. o Lobisomem, c) Vila dos Con/ins. 16. (Fuvest-SP) Fazendo um paralelo entre Os sertöes, de Euclides da Cunha, e Grande sertäo: veredas, de Guimaräes Rosa, pode-se afirmar: a) Em ambas as obras predomina o espírito científico, sendo analisados aspectos da realidade brasileira. b) Ambas těm por cenário o sertäo do Brasil sotcntrional, sendo numerosas as referéncias á flora e á fauna. c) Ambas as obras, criacôcs de autores dotados de génio, muito enriqueceram nossa literatura regional de ficcäo. d) Ambas tém como principal objetivo denunciar nosso subdesenvolvimento, revelando a miséria fisica e moral do hörnern do sertäo. e) Tendo cada uma suas peculiaridades estilisticas, säo ambas produto de intensa elaboragäo da linguagem. 17. (UFPR) A obra Grande Sertäo; veredas, dc Guimaräes Rosa: a) continua o regionalismo dos fins do século passado, sem grandes inovagöes. b) exprime problemas humanos, em eslilo proprio, baseado na contribuigäo lingüistica regional. c) desereve tipos de várias regiôes do Brasil, na tentativa de documentar a realidade brasileira. d) fíxa os tipos regionais, com precisäo científíca. e) idealiza o tipo sertanejo, continuando a tradigäo dc Alencar, 18. (PUC-RS) A partir do livro de estréia,___, urna das características do estilo de Clarice Lispector é a adjetivagäo_. a) O Lustre - pictórica d) Per to do Corapdo Seivagem — surpreendente b) A Mapa no Escwo - preciosa e) A Legiäo Estrangeira popular c) A Cidade Sitiada - coloquial 19. (UFRS) O romance de Clarice Lispector: a) filia-se á ficcäo romäntica do see. XDC, ao criar heroínas idealizadas e mitificar a figura da mulher. b) defme-se como literatura feminista por excelencia, ao propor urna visäo da mulher oprimida mím universo masculino. c) prende-se ä erítica de costumes, ao analisar com grande senso de humor uma sociedade urbana em transformagäo. d) exploia até as ultimas conseqiiéncias, utilizando embora a temática urbana, a linha do romance neonaturalista da geragäo dc 30. e) renova, define e intensifica a tendencia introspectiva tle determinada corrente de ficgäo da segunda gcracäo moderna. 20. (UFMG) Sobre o adjetivo severina, da expressäo Morte e Vida Severina que intitula a pega de I Joäo Cabral de Melo Neto, todas as afirmativas estäo certas, exceto: a) Refere-se aos migrantes nordestinos que, revoltados, lutam contra o sistema latifundiário que oprime o camponés. b) Pode ser sinônimo de vida árida, estéril, carente de bens materials e de afetividade. c) Designa a vida e a morte dos retirantcs que a seca escorraca do scrtäo e o latifúndio escorraga da terra. d) Qualifica a existencia negada, a vida daqueles seres marginalizados determinada pela morte. e) Dá nome á vida de homens anônimos, que se repetem física e espiritualmente, sem condigôes concretas de mudanga. 21. (Cesesp-PE) A partir de 1945, segundo um critério histórico, as tendéncias da literatura brasileira estruturam-se, configurando um quadro diferente daquele advindo de 1922 (Semana de Arte Moderna). Dentre as opgôes apresentadas, quais as que deftnem a nova tendencia? 1. anarquismo estético, justificado pela Segunda Guerra Mundial 2. preocupagäo existencial e metafísica que se aliava ao proteste contra as circunstáncias históricas 3. volta ao metro e á rima tradicionais, ao lado de novas invengôes do verso 4. busca de originalidadc a qualquer prego a) 1,2 d) 4,1 b) 2,3 e) 4,2 c) 3,4 22. (UM-SP) Este "auto de Natal pernambucano, longo poema equilibrado entre rigor formal e ^ temática, conta o roteiro de um homem do Agreste que vai em demanda do literal e topa em cada parada com a morte, presenga anôníma e coletiva, ate que no ultimo pouso lhe chega a nova do nascimento de um menino, signo de que algo resiste á constante negagäo da existencia". (Alfredo Bosí, História Concisa da Literatura Brasiteira, p. 523.) Trata-se de: a) Pai Joäo b) Evocapuo do Recife c) Brasil-Menino d) Morte e Vida Severina 23. (UFPA) Sobre o aspecto das obras literárias: Coluna A (1) Grande Sertäo: veredas (2) Senhora (3) Vidas Secas (4) O Ateneu (5) Fogo Motto Coluna B ( ) romance de cunho psicológico que narra a vida da personagem principal dentro de um internáte. ( ) obra de cunho social, escrita em linguagem cuidada que retlete a influéncia de Machado de Assis. ( ) romance de caráter urbano que retrata aspectos da sociedade da época, tendo, como [ exemplo, o casamento conventional. * ( ) obra-prima de seu autor, que focaliza a vida do engenho e sua decadéncia. ( ) romance de tensäo transfigurada em que o autor procura constituir uma outra realidade, de caráter universal, sem esquecer, porém, os problemas do homem da rcgiäo. Sua linguagem é original. a) 5, 4, 1, 3, 2 b) 4, 3, 2, 5, 1 c) 3, 1, 4, 2, 5 d) 2, 3, 4, 5, 1 e) 1, 3, 2, 5, 4 WE ■ 24. (FESP-PE) Em que alternativa a associagäo do texto com o autor está erradal a) "Essa cova em que estás com palmos medida, é a conta menor que tiraste em vida." (Joäo cabral) b) "... nada é mais triste do que um engenho de fogo morto. Uma desolagäo de fim de vida, de ruina que dá á paisagem rural uma melancolia de cemitério abandonado." (Jose uns do Rego) c) "Eu näo dei por esta mudanga, täo simples, täo čerta, täo ráčil: - Em que espelho ficou perdida a minha face?" (Cecília Meireies) d) "Lá fora a vista era uma tristura dc entardecer dentro da cerragäo. Macunaíma sentiu-se desinfeliz e teve saudade de Ci a inesquecível." (Máňo de Andrade) e) "Vou-me embora pra Pasárgada Lá sou amigo do rei Lá tenho a mulher que eu quero Na cama que escolherei Vou-me embora pra Pasárgada." (Lima Barreto) 25. (Vunesp) Leia com atengäo o texto a seguir: Ara, ara, bichinha. Antcs pelesses mundöes, viu-que-te-viu, avistci deparado muito que assim-assim, luziluzindo, eu figurava rindo quem nem-nem. Apois. A senhora tolere. Näo gloso. Deus esteja, que-que vem a ser isso que nem-nem sei o que for? Neste trecho, extraído da obra Vencecavalo e outro povo, o autor, Joäo Ubaldo Ribeiro, alude parodisticamente ao estilo de: a) Graciliano Ramos d) Osman Lins b) Jose Lins do Rego e) Dalton Trevisan c) Joäo Guimaräes Rosa 26. (Vunesp) Por que é entäo que este livro täo longamcnte é enviado a quern faz uma pocsia de dis tin ta liga de ago? Envio-o a o lei lor contra, envio-o ao leitor maugrado e intolerante, o que Pound diz de todos o mais grato; áquelc que me sabendo näo poder ser de seu lado, soube 1er com aeuidade poetas revolucionados. O trecho faz parte do poema-dedicatória "A Augusto de Campos" (Agrestes, 1985). O poeta, autor também de Auto do f rade, Museu de tudo, A escola das facas, A educafäo pela pedra, etc., refere-se a Augusto de Campos como leitor ideal c alude á corrente poética a que este pertence. O autor do trecho e a corrente poética desse virtual leitor säo, respectivamente: a) Ferreira Guliar e Concretismo. b) Ilaroldo de Campos e Neoconcretismo. c) Caetano Veloso e Tropicalismo. d) Joäo Cabral de Melo Ncto e Concretismo. e) Carlos Drummond de Andrade e "geragäo de 45". I : i—~ — J \ \ 27. (Carlos Chagas-BA) O apelo ao ideograma, on apenas ao processo ideogramático de composigäo, a substituicäo do artesanato pela utilizacäo de elementos plásticos e visuais, cnfím, a desvinculacáo em relacäo á sintaxe, o poema de duas ou trôs palavras, reduziiam, porém, ao extremo a area lingiiística. Estas palavras problematizam: a) a poética de vanguarda, reprcscntada pela poesia conerela da década de 50. b) a poesia modernista de 22, de que é particular exemplo o poema-piada. c) a poesia da geracäo de 45, univcrsalizante e de apurado esmero formal. d) a poética da geracäo de 30, de temática social e linguagem discursiva. e) a poesia do pré-modernismo, oscilantc cntre as formas Iradicionais e as inovadoras. 28. (Cescem) Pega de Nelson Rodrigucs, dcscnvolve-se em diferentes pianos; o da vida real, concreta, objetiva; e o da vida da imaginagäo, desregrada, libertada. Consiste no que sc pode chamar de "tragedia de memoria", e afirmou-se como um marco do teatro moderno brasileiro. Trata-se de: a) Album de fumilia b) A falecida c) Vcstido de naiva d) Eies näo usam black-tie e) Navalha na came 29. (UFPR) Dias Gomes, Ariano Suassuna, Oduvaldo Viana Filho e Plinio Marcos säo dratnaturgos <-brasileiros contemporäneos que escreveram, respectivamente: a) O santo üu/uerito, O auto da compadecida, Rasga corapäo, Navalha na came b) 0 pagador de promessas, Os ossos do barfio, 0 assalto, O abajw liläs c) O berpo do heröi, A pena e a lei, O ultimo carro, Quando as mäquinas param d) As primicias, Album de familia, A prova de fogo, Bairela e) O rei de ramos, Farsa da boa preguijxi, Senhora na boca do lixo, Homens de papel (f 30. (FKSP-PE) Numere a segunda coluna de acordo com a primeira. 1. Ciarice Lispector 2. Osman Lins 3. Cecilia Meireles 4. Rachel de Queiroz 5. Erico Verissimo ( ) Painel epico da formaeäo da civiiizacäo gaücha, O tempo e o vento e um clässico que consagrou o nome de seu autor como um dos grandes romancistas brasileiros. ( ) Escreveu Romanceiro da Inconfidencia; "sua linguagem 6 simples e acessivel"; preocupa-se com o tempo, com a solidäo e o sentimento. ( ) O romance A rainha dos etirceres da Grecia demonstra que o seu autor tendeu tanto para a fiegäo como para o ensaio. ( ) Em A paixdo segundo G. H., analisa urna figura profundamente interessada na sua inter- relagäo com o cosmo. \ ( ) Chico Bento, F. lnäcia, Cordulina säo personagens de um dos seus conhecidos romances, e que figura na literatura brasileira regionalista como um dos mais lidos. A seqüencia obtida e: a) 3, 1, 4, 5, 2 b) 1, 5, 2, 4, 3 c) 5, 3, 2, 1, 4 d) 3, 1, 4, 2, 5 1 e) 4, 2, 5, 3, 1 31. (Santa Cnsa-SP) Obras de Dalton Trevisan, Rubem Fonseca, Clarice Lispector e Lygia Fagundes Teiles atestam o fato de que: a) a linguagem (desagregadora) e a visäo do mundo (reivindicatória, anárquica) dos modernistas de primeira geracäo constituem a fönte primeira de inspiraeäo dos contistas contemporäneos. b) a poesia de caráter social e reivindicatória lem caracteiizado a criagäo literária dos autores modernos. c) estilos muito semelhantes, com tracos de neo-romantismo, dominám a criagäo literária contemporänea. d) o conto, de tendéncias diversas (de demincia social, intiinista, de especulaeäo da existencia), tern sido uma constante da produeäo literária contemporänea. e) romances politicamente comprometidos, neonaturalistas, de denúncia das mazclas da sociedade, constituem o aspecto mais importante da literatura da geracäo de 30. 32. (F. Objetivo-SP) Considere o texto: Posicöes do corpo Sob o azul sobre o azul subazul subsol subsolo (Casslano Ricardo} Todas as caracteristicas que seguem encontram-se no poema iicima, exceto: a) aproveitamento do espapo concreto, em que a palavra sc dimensiona visualmente. b) presenca de sintaxe antidiscursiva, suprimidos os elementos de Hgapäo tradicionais da frase. c) incorporapäo de temas e formas do folclore, numa aproximapäo com ufanismo romäntico, d) tendencia á criagäo voeahular, á sintaxe apurada e á maior concisäo de linguagem. e) técnica da repetigäo, como elemento decisivo para a fixagäo da mensagem nuclear do poema. MANUAL DO PROFESSOR Introdugäo Esta obra pretende ser instrumento que pormita ao professor c ao aluno a realizaeäo de um curso completo de Literatura Brasileira no 2? grau. Complete näo apenas quanto ao conteudo programático, mas também enquanto instrumento que, por meio de um conjunto de vivéncias lingtiísticas, artísticas e culturais, possibilite ao aluno tima formayäo humanistica e critica em relat;äo ao mundo de que partieipa. Os capítulos agrupam tópicos afins, cujos conteúdos se relacionam e se complementam. Por exemplo, o capítulo "A épica árcade" trata conjuntamente, por meio de estudo comparativo, os poemas épicos Caramwu, de Santa Rita Durao, e O Uraguai, de Basílio da Gama. Os capítulos estáo organizados assim: Fiqae ligado! Pesquise!: Com este título, abre-se uma secao cujo objetivo é estabelecer relaeoes entre a literatura e o contexto cultural da época retratada; ou entre a literatura da época e as várias formas de produíao cultural existentes hoje: literatura, cinema, teatro, música, televisao, etc, Normalmente, ela aeompanha o primeiro capítulo de cada unidade da obra; contudo, pode aparecer em outros capítulos, de acordo com a necessidade. Essa secáo rcúnc um conjunto dc sugestoes por meio das quais o aluno passa a vivenciar e relacionar de forma mais direta os assuntos abordados em aula. Por exemplo, ao se tratar de um assunto como o Romantismo, é estimulante que o aluno desenvolva outras atividades relacionadas ao tema, como assistir a alguns filmes que retratam o ambiente da época (a maior parte disponível em video), ouvir a música da época, pesquisar a pintura romántica e relacioná-la ao contexto religioso da época, e assim por diante. A vivéncia com esses outros tipos de linguagem naturalmente nao substitui a leitura e a análise de textos literários, mas pode torná-lu mais rica e agradável, uma vez que o aluno passa a relacionar a pródufao literária de determinada época á cultura do mundo em que vivemos. O item que trata das estratégias oferece algumas sugestoes de como essa segáo pode ser mais bem aproveitada. l.mlura\'Pense e responda: Esta segao promove o trabalho de leitura e análise de textos literários, prioridade na abordagem da leitura. Texto complementar: Esta se9áo normalmente conclui o estudo do capítulo e pode atender a diferentes finalidades. Serve, por exemplo, para sintetizar as informacoes essenciais sobre o assunto estudado; para ampliar o conteúdo específico, relacionando-o com outros aspectos culturais daquele periodo ou do autor estudado; para avaliar a importáncia de determinado autor no contexto da tradijao literária; e assim por diante. Dada a natureza complementar do texto, cahe ao professor decidir se o utiliza ou nao em sala de aula, se o recomenda como leitura para casa, para a prova, etc. Antologia: Alént dos textos que servem como exemplo e como objeto de análise ao longo do capítulo, esta SC980 ofercce mais alguns textos do autor em estudo para que o professor possa explorá-los livremente e ampliar as informa9oes sobre o assunto. Eles tanto podem servir para análises promovidas pelo professor, como também para seminários propostos a grupos; ou ainda podem ser utilizados para exercícios de análise literária, a sérem desenvolvidos individualmente ou em grupo, na classe ou em casa; o podem também servir apenas como fonte de prazer ao aluno, ou seja, ler para "curtir". A estrutura dos capítulos Impresso nas Oficinus du EDITORA AVE- MARIA 1 Boxes: Contém tcxtos paralelos, que objetivam "dialogar" com o texto-base, acrescentando informacöes. Ora servem para ampliar um aspccto Iralado no texto-base; ora fazem a relacao entre o assunto em estudo e aspectos da cultura de hoje, prcsentes no cinema, na música, na moda, em comportamenlos; ora podem apresentar uma curiosidade sobre um autor ou uma época; e assim por diante. Criados criteriosamente e na quantidade ideal, os boxes näo sc transformam em "ruidos" na comunicacäo; pelo contrario, tornám a leitura mais estimulante e ágil, uma vez que o aluno-leitor se vc ou vé a seu mundo naquilo que lé. Os capítulos estäo agrupados em unidades e, na medida do possivel, cada movimento literário, ou estilo de época, é tratado em uma unidade. Metodológia A abordagem da literatúra se faz priorizando a leitura e a análise do texto literário. Essa lcitura busca compreender de que forma cada movimento literário ou cada autor organizam seus textos (tanto na forma quanto no conteúdo), deflnindo assim urn estilo de época ou urn estilo individual. Quando se introduz um movimento literário, por exemplo, a atividade central é o exame minucioso de um texto literário representative da época, para que se possa extrair dele um modelo de linguagem daquele movimento. Postcriormente, esse estudo é ampliado com o item "Do texto ao contexto histórico", que visa esclarecer por que o texto literário daquela época se configura daquela forma, isto é, quais as relacoes existentes entre o período literário estudado e a socicdade da época, em seus aspectos econômico, politico, religioso e cultural. Os capitulos que estudam autores säo organizados de acordo com as facetas de suas obras, Por exemplo, no estudo de Gongalves Dias, por duas vezes é encontrada a secäo Leitura: a primeira promove um estudo de sna épica, a segunda, um estudo da lírica. O estudo geral do autor é complementado pela Antológia, que oferece outro texto para análise. Em todos os capitulos, há um esforco no sentido de estabelccer relacôes entre essa história da literatúra e a cultura de que fazemos parte, näo apenas no ämbito da literatúra, mas também em outros campos artísticos e culturais. Nesse sentido, säo comuns boxes e exercicios que promovem ou sugerem leitura comparada, relates intertextuais, comparapäo de urna época literária e outra, confronto da história da cultura com a cultura contemporänea ao aluno, como a música, o cinema, os movimentos culturais altemativos, a moda, a televisäo, etc. O professor encontrará sugestôes de pesquisa c roteiros de leitura que objetivam aprofundar e ampliar o universo das informacôes Lransmitidas nas aulas. Além das sugestôes da secäo Fique ligado! Pesquise!, há, por exemplo, ncstc manual, um roteiro de análise de romances romänticos que, com pequcnas modifícacôes, pode ser utilizado para a análise de qualquer romance, em qualquer série. Há, ainda, um roteiro de orientacäo para leitura e representacäo do texto diamático, que, igualmente, pode ser utilizado em qualquer série, roteiros específicos de análise literária de obras completas, como Luciola, Triste Jim de Policarpo Quaresma, Macunaima, de romances regionalistas que tratam da seca e de outros, Neste cadcrno do professor, para cada unidade há algumas orientacôes sobrc os objetivos gerais e sugestôes de estratégias e temas de pesquisa que podem ser oferecidos aos alunos. Avaliacäo Entendemos que deva haver variedade e qualidade nas avaliacôes. Elas podem ocorrer na forma de provas periódicas (mensal, bimestral, trimestral), producöes de texto, licöes, chamada oral, trabalhos expositivos/criativos a partir de temas do conteúdo programático ou a partir de leiturá extraclasse. Séria interessante que os critérios de avaliacäo fossem previamente expostos á classe. Provas Acreditamos que, no 2? grau, o aluno deve lidar com diferentes situacôes e variados tipos de questäo e ser levado a refletir, relacionar, confrontar, inferir, concluir, opinar criticamente, ctc. A seguir sugerimos alguns dos muitos tipos de questäo que, a nosso ver, säo coerentes'com a metodológia adotada ncstc livro c que avaliam se os objetivos foram alcaneados. Qitestáo de caráter conceitual No século XVIII, apesar do cnvolvimento de nossos poetas árcades na Inconfidéncia Mineira, nao se pode dizer que suas obras literárias tenham sido a expressao de um nacionalismo consciente! Contudo, podem-se perceber na obra de certos autores alguns aspectos relacionados ao Hrasil-Colónia, á nossa terra, á nossa genie, os quais constituem uma atitudc nathista. Indique um autor árcade em cuja obra se vcrifíqucm tracos nativistas e explicite esses tracos. Questao a partir de textos A respeito destes versos: Ornemos nossas testas com as flores, e facamos de feno um brando lei to: prendamo-nos, Marília, em laco estreito, gozemos do prazer de saos amores. Sobre as nossas cabecas, sem que o possas deter, o tempo corre e para nós o tempo que se passa também, Marília, morre. a) Observe o nomc próprio que aparece no texto e o tipo de estrutura formal do poema. Em seguida, identifique o autor e a obra a que pertence. Justifique sua resposta mencionando pelo menos um aspecto que seja específico a esse autor do Arcadismo brasileiro. b) No texto, ressalta um aspecto de conteúdo comum a toda a poesia clássica, empregado também pelos poetas barrocos e que se mantém no Arcadismo. Qual é? Em que consisíe? Retire um verso em que tal aspecto ocorra. Estratégias As novas propostas pedagógicas incriminani a "cducacäo baneária", na qual o aluno se coloea de forma passiva, e defendem a necessidade de o estudante assumir papel ativo no processo ensino/ aprendizagem. Essa postura implica variedade de estratégias e preparacäo previa, por parte do professor, quanto aos assuntos que possam vír a ser trabalhados individualmente pelos alunos ou em grupos no decorrer do bimestre. Para os professores que tenham essa opcäo, além das propostas sugeridas pela secäo Fique ligado! Pesquise!, há orientacôes específieas no início de cada unidade, , acompanhadas de sugestôes de fihnes, leituras, música e bibliografia cspeciahzada, além de temas para trabalhos de criatividade e pesquisa a sercm desenvolvidos pelos alunos. 2 Questao a partir de assertivas Há, a seguir, quatro assertivas a respeito do Barroco brasileiro. Apenas uma apresenta erro. Identiíique-a, indique em que consistc o erro e cxplique como seria o correto: I. O Barroco brasileiro apresenta uma producao literária que, embora seja muito ligada aos padrocs da cultura européia, já evidencia a preocupacáo de tratar dos assuntos locais. Isso se verifica na obra dos dois expoentes de nosso Barroco: Gregório de Matos e Pe. Antonio Vieira. II. A obra de Pe. Antonio Vieira, apesar de ser eminentemente religiosa, sempTe se envolveu com quesloes políticas e sociais. Ao defender os interesses brasileiros, sua obra pode ser considerada a primeira a veicular o sentimento nathista que marcou nossa literatura durante todo o período colonial. 3 III A obra lírica de Gregório de Matos é adequada aos modelos do Barroco europeu, com poemas religiosos e filosóflcos inspirados pela Contra-Reforma e com os poemas amorosos, divididos entre o amor sensual c o sentimente de culpa. Sua obra satirica, contudo, envereda por um caminho particular, tanto no nível da forma quanta no do conleúdo e no da lingua portuguesa utilizada. IV. Gregório de Matos e Pe. Antonio Vieira foram contemporáneos na Bahia e pertenceram ao movimento barroco. Há, porém, diferencas marcantes entre os dois: enquanto Vieira dedicou-se á prosa (em especial aos scrmôes), Gregório dedicou-se d poesia; enquanto Vieira foi um autor predominantemente conceptista, Gregório cultivou tanto o cultismo quanto o conceptismo; enquanto Vieira empregava um portugués culto era suas obras, Gregório dividia-se entre o portuguěs culto c as palavras indígenas e africanas, as girias, os termos de baixo caläo, etc. Confronto de textos Leia com ateii9äo estes poemas, do poeta modernista Manuel Bandeira: Texto I Consoada Quando a Indesejada das gentes ohegar O mcu dia foi bum, pode a noitc descer. (Näo sei se duta ou caroável), (A noite com os seus sortilégios) Talvez cu tenha medo. Encontrará lavrado o campo, a casa limpa, Talvez sorria, ou diga: A mesa posta, - Aló, iniludível! Com cada coisa em seu lugar. Observasäo: consoada: pequena refeicäo noturna, ceia da noite de Natal; presente no dia de Natal; caroável: carinhosa. Texto ti Momento mim café Quando o enterro passou Os homens que se achavam no café Tiraram o chapéu, maquinalmente Saudavam o morto distraídos Esta varn todos voltados para a vida Absortos na vida Confiantes da vida. Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado Olhando o esquife longamente Este sabia que a vida é uma agitagäo feroz e sem finalidade Que a vida é traicäo E saudava a materia que passava Liberta para sempře da alma extinta. 1. A respeito do texto I: a) Interprete, de acordo com o sentido mats profimdo do texto, a oposicäo entre dia e noite. b) Dé uma interpretaeäo coerente com o conteúdo aos trés Ultimos versos do poema. c) Explique o título do poema, com base no sentido mais profundo do texto. 2. A respeito do texto II: a) Explique a oposicäo de idéias existente entre a primeira e a segunda estrofes. b) Explique o sentido do ultimo verso do poema. 3. Destaquc do texto I urn verso que se aproxima, do ponto de vista semäntico, "Que a vida é traipSo". este, do texto II: 4. Relatione o terna, presente nos dois textos, ao conjunto da obra de Manuel Bandeira. Pergunlas sobre a relaßäo entre literatúra e comemporaneidade A revista Veja, de 7/8/91, publicou um comentário critico acerca do romance Estorvo, de Chico Buarque de Hollanda, no qual se lia: "Bosi [professor e critico literário], autor de História concisa da literatúra brasileira, enxerga ainda no livro cenas dos filmes de Antonioni e 'acenos' de Os ratos, obra mais conhecida do gaúcho Dyonélio Machado". No mesmo comentário ainda se lé: "o livro é o relate dos aeonteeimentos de alguns dias na vida do personagem central c narrador da história, que näo tern nome - como todos os outros no romance - nem profissäo e mora numa cidadc indefmida, mas na qual se pode idenlificar o Rio de Janeiro". A partir do que conhece a respeito da obra Os ratos e a partir do comentário critico acima, estabclcca semelhanjas e diferencas entre Estorvo e Os ratos. Trabalhos de pesquisa e leitura extradasse O professor pode valer-sc desses meios para motivar o aluno e fazé-lo participar ativamente do processo de ensino/aprendizagem. O primeiro passo é estabelecer os temas prioritários relativos ao conteúdo trabalhado ou os temas relacionados á obra literária que esteja sendo lida por toda a classe. O segundo passo é dividir os temas entre os gmpos, marcar datas, estabelecer critérios dc avalia9äo e oferecer fontes e/ou uma bibliografia de apoio para os alunos. Supondo que se queira oferecer trabalhos de pesquisa aos alunos, de modo a anlecipar o processo de aprendizagem, eis algumas sugestôes: • O contexto histórico-cultural da Európa no início do século XX. • O contexto histórico-cultural brasileiro no início do século XX. • Apresenta9äo de esquetes surrealistas feitas pelos alunos. • Parnasianismo versus Modernismo, a partir de declama9äo de textos e/ou representa9äo. • Réplica da Semana de Artc Moderna. • Avalia9äo crítica da Semana de Arte Moderna: importäncia, contribuÍ9ôes, etc. • Compara9äo entre o nacionalismo romántico, o nacionalismo modernista c o nacionalismo de hojc. • Compara9äo entre o indianismo romántico, o indianismo modernista e a condÍ9äo do índio hoje. • OposÍ9äo e distin9äo entre os vários malandros na literatura (Leonardo, de Memórias de um sargento de milícias, Macunaíma, da obra homônima, a personagem da Opera do malandró) e entre estes c o malandro hoje, na rua e no poder. Supondo que se queira preparar a classe para a leitura extraclasse, eis algumas sugestöes, caso a obra a ser lida fosse Vidas secas, de Graciliano Ramos: e Pesquisa histórico-geográftca, situando a regiäo nordestina afetada freqüentemente pelas secas, indicando os principais ciclos de seca e estabelcccndo redoes com a obra lida quanto aos aspectos humano, social, econflmico e natural. • Justifícar o título da obra, bem conio explicar, com base cm um dieionário onomástico, o signifícado de substantivos como Fabiano, Vitória, Baleia. Relacioná-los com as personagens. • Analisar a estrutura da obra. Justifícar o título de cada capítulo, com base no conteúdo de que trata. Comparar o primeiro e o ultimo capítulos: o que apresentam em comum? Por que se pode dizer que Vidas secas é um romance cíclico? • A crítica literária vč na obra influěncias do Realismo e do Naturalisme Explicar por que, justificando com exemplos da obra. • Na obra há um processo de humaniza9äo ou de animaliza9äo de algumas personagens. Explicar como se dá esse processo e sua ímportáncia na interpreta9äo geral da obra. 4 • Analisar a linguagem da obra corno um todo: Como é a linguagem das personagens?, como é a linguagem do narrador? Relacionar essas formas de linguagem ao universo retratado pela obra. Verificar também a importancia, do ponlo de vista psicológico, do discurso indirelo livre para a construgäo das personagens. • Trabalhos criativos: a) teatro b) música c) video d) quadrinhos e) desenhos f) danea Observagäo: Como a execugäo dcssas atividades de pesquisa e de leitura extraclasse implica um numero considerável de aulas, mesmo quc scjam trabalhos rápidos, é indispensável que o professor inclua essas atividades em seu planejamento. O tempo dispcndido poderú, cm parte, ser recuperado mais tardc pelo professor, quando o assunto for tratado em aulas regulares. Caberia ao professor, no caso, a tarefa de ampliar, aprofundar, relacionar e concluir os conteúdos já descnvolvidos. Respostas das questoes propostas Unidade 1 Nesta unidade sao trabalhados certos conteudos rclacionados a literatura. Se o professor desejar, e se for viavel nas condigoes da escola cm que leciona. poderao ser desenvolvidas diversas atividades de pesquisa, com o objetivo de ampliar as informagoes e por o aluno em contato direto com os conteudos enfocados. No capiltilo 1, por exemplo, podem scr propostos trabalhos de rapida execugao, em torno de alguns tcmas como: • As fungoes da linguagem na musica popular brasileira (os alunos devem trazer a letra em cartazes e a musica gravada; em seguida, o grupo analisa a letra e extrai as fungoes de linguagem pre-dominantes). • As fungoes da linguagem na propaganda (igualmente, o grupo deve trazer anuncios de revistas e jornais on propagandas de televisao gravadas e fazer a analise das fungoes da linguagem predominantes). • A conotagao na musica popular e/ou na propaganda (os mcsmos procedimentos sugeridos nos trabalhos referentcs as fungoes de linguagem). • Com o texto dramatico lido no capitulo 2 da unidade 1, sugerem-se as atividades de leitura dramatica e encenagao, conforme as instrugoes que seguem, a serem passadas para os alunos: Leitura dramátiea 1. Forme um grupo com seus colegas, com um numero de integrantes igual ao numero de personagens do texto. 2, Faga, cm grupo, urna segunda leitura do texto, em voz alta, cada aluno lendo as falas de urna personagem. Essa segunda leitura pode ser urna leitura branca, isto é, urna leitura quc visa apenas a urna compreensäo mais ampla do texto, um domínio maior da história. 6 3. A partir da tereeira ieitura, comece a buscar a representagäo, ou seja, comece a transformar a leitura em agäo. Lembre-se de que o ator 6 um fingidor, algucm quc cria ilusöcs. a) Para melhor interpretar sua personagem, analise e debata com seu grupo o comportamento psicolögico de sua personagem, tendo em vista as seguintes questöes: • Quais säo os desejos e objetivos de sua personagem em eada cena? • O que (quais fatos) ou quem (qual personagem) se contrapöc aos scus desejos c objetivos? • Como sua personagem reage diante dos confiitos? b) Depois da analise, busque sua personagem, sinta-a e, poueo a poueo, procure dar-lhe uma voz, descobrindo a melhor forma de expressä-la. c) Considere a pontuagäo do texto c as rubricas de interpretagäo. d) Näo deixe cair a entonagäo no final da fräse. Observe como falam os locutores de radio e televisäo e procure imitä-los. c) Caso sinta necessidade, marque seu texto com pausas para respiragäo e destaque os verbos das frases para dar um apoio maior ä inflcxäo da voz. f) Para ajudar no volume da voz, imagine - como fazem no meio teatral - que na ultima filcira do teatro hä uma velhinha meio surda e que voce deve representar para ela. 4. Apös cada um dos elcmcntos do grupo haver encontrado a expressäo propria de sua personagem, faga a leitura dramätica do texto para a classe. Encenafäo Para encenar o texto, a leitura dramätica e pre-requisito. Assim, apös executar todas as instrugoes anteriores, observe as que seguem: 1. Decore o texto de sua personagem. 2. Observe agora tambem as rubricas de movimento. 3. Imaginc-se vivendo as situagoes de sua personagem. 4. Imagine o cenärio e as outras personagens que contracenam com voce. 5. Crie o cenärio. a sonoplastia, os figurinos. Para isso, alem de fazer uso de sua criatividade e a de seus colegas, envolva outros alunos para colaborar na montagem do texto. 6. Ensaie quantas vezes julgar necessario. 7. Caso algum elemento do grupo se esquega, durante os ensaios ou a apresentagäo, de uma parte do texto, improvise uma saida, ou recorra ao ponto. Ponto e uma pessoa que, no teatro, vai lendo o que os atores devem dizer, para Ihes ajudar a memoria. 8. Monte o espetäculo e apresente-o ä classe. 9. Durante os ensaios e as api esentagoes, vä se colocando aos poucos no lugar de sua personagem e viva-a, ou seja, comece a fazer teatro. Nota: Caso tenha se interessado muito por essa atividade, forme um grupo de teatro com seus colegas e, seguindo as mesmas orientagöes, ou enriquecendo-as com a ajuda do professor e a leitura de textos cspecializados, busque outros textos para representagäo. CAPÍTULO 1 - Linguagem e literatura Pense e responda (p. 10) 1. a) A expressao "nuvens de algodao" sugere uma forma ingénua de ver a realidade; antes, para ele, o mundo era como doce, sem problemas. 7 b) A descoberta o torna crítico perante o mundo e ele entäo passa a libertar-se da realidade qpressora. c) Ä prisäo da inconsciéncia politico-social, isto é, considera preso aquele que näo compreende criticamentc a realidade e faz parte das regras sociais sem refletir sobre elas. 2. a) Critica primeiramentc os jovens, que fazem parte do consumismo de forma inconsciente; mas há também uma critica a todos os grupos sociais, manipulados pelos meios de comunicacäo de massa e pelo consumismo. b) Todos nós: provavelmente, nós, brasileiros. c) Há uma idéia de que, fazendo parte desse jogo social, näo conseguimos ser nós mesmos; o que somos e o que sonhamos säo condicionados pelas regras desse jogo. 3. Os culpados, segundo o texto, säo todos aqucles que fazem parte do poder, alem dos oportunistas e dos conformistas. Logo, näo tem culpa aqueles que těm uma posicäo contraria á destes. CAPÍTULO 2 - As linguagens da literatura Pense e responda (p. 26) a) A alternäncia entre silabas acenluadas e näo acentuadas sugere o movimento de vaivém das ondas. b) aliteracäo: o fonema /d/; assonäncia: os fonemas /a/ e /o/ (on); paronomasia: a semelhanga entre as palavras emda, onda, aonde, aindu. Exercicios (p. 29) 1. complicafäo: Maria Elvira, de boca bonila, arranjou namorado. Misacl näo quer eseändalo, muda de casa; faz isso por trěs anos; climax: Misael mata Maria Elvira com trěs tiros. 2. Misael: funcionário publico, 63 anos, hörnern bom, tolerante. 3. Trés anos. 4. Maria Elvira estava doente, com sifilis, era prostituta e estava cm péssimas condicöes finaneeiras. 5. Na Lapa. Pense e respunda (p. 33) 1. a) As personagens Joäo Grilo, o bispo e o padre aguardam, após a mořte, uma decisäo sobre seu destino, que está, no princípio, nas mäos do Encourado e, mais tarde, nas de Manuel. b) Encourado, Joäo Grilo, o bispo, o padre e Manuel. c) Possivelmente num tribunal, pois é a cena de um julgamento. Quanto á descricäo do local, resposta pessoal. 2. a) Joäo Grilo: esperto, ladino, atrevido, corajoso, "sertanejo pobre e amarelo", sincero, prcconceituoso; bispo: todo cheio de dignidadc, mas, na verdade, indigno da Igreja, mundano, autoritário, soberbo. b) A caracterizaeäo da personagem teatral se dá por meio do que ela revela sobre si mesma, do que ela fa/, e daquilo que as outras personagens dizem a seu respeito. 3. A funcäo da rubrica é oriental- os atores sobre como devem falar e niovimentar-se em cena, alem de também informal' sobre o cenário e a indumentária. 4. O publico. 5. Funcíio conativa ou apelativa. CAPÍTULO 3 - O Quinhentismo no Brasil Pense e responda (p. 40) 1. a) O barulho das ondas do mar que rebenlavam na costa. b) O fato de falarem línguas diferentes. 2. a) Que ele esperava, como capitäo, ser reverenciado. b) Os índios näo lhe fizeram nenhuma mesura. As diferentes posturas revelam obviamente um choque cultural. 8 3. Se nela havia ou näo metais preciosos, como ouro, prata e ferro. 4. a) Que a terra seja colonizada. b) A catequizacäo dos índios, de acordo com o ideal portugués de propagagäo da fé. 5. Tan to no texto de Caminha quanto nesse fragmetito de Os hisiadas, de Camöes, os interesses econôinicos e políticos do imperialismo portugués säo justificados com o argumenta de que é necessário levar o cristianismo ás "terras viciosas" (näo cristas). Unidade 2 Os contcúdos desta unidade estäo relacionados ao Barroco c ao seu contexto histórico. Com o objetivo de ampliar o conhecimento do aluno, sugerimos os seguintes temas para trabalhos de pesquisa e leitura: • A Contra-Rsforma e seus reflexos na cultura do século XVII. • As artes plásticas no Barroco europeu (aproveitar o filme Caravaggio). • As artes plásticas no Barroco brasileiro: a pintura, a escultura e a arquitctura em Ouro Preto e outras cidades históricas. • A obra de Aleijadinho. • A música barroca, com destaque para a obra de Vivaldi. e A biografia de Gregório de Matos (sugere-se que o resultado da pesquisa seja urna representagäo que inclua declamagäo de poemas líricos e satíricos do autor), • O messianismo e as profecias de Pe. Antônio Vieira. Como apoio bibliográfico, sugerimos: Barroco, de Suzy Mello. Säo Paulo, Brasiliense, 1983. O Boca do Inferno, de Ana Miranda. Säo Paulo, Cia. das Letras, 1989. História da literatúra portuguesa, de Antônio José Saraiva e Oscar Lopes. 12? ed. Porto, Porto Editora, 1982. Poesias selecionadas, de Gregório de Matos, organizada por Francisco Maciel Silveira. Säo Paulo, FTD, 1993. CAPÍTULO 4 - Barroco: a arte da indisciplina Pense e responda (p. 46) 1. Ambos os textos tém como terna a religiao, evidenciando a influéncia da Contra-Reforma na arte. 2. a) O eu lírico do sonete, arrependido de seus pecados, identifica-se com a imagem de Cristo crucifieado e, pela imaginacáo, deseja unir-so a ele em seu sofrimento, como forma de purificagáo c transcendéncia. b) Em ambos os textos a fé supera os sofrimentos. No texto I, o sofrimento fisico é represenlado pela identificac.áo do eu lírico com a figura tlagelada de Cristo na cruz; no texto II, as rcferěncias aos flagelos físicos sao reais e históricas. 3. a) antíteses: eclipsados/abertos, perdoar-me/condenar-me, despertos/fechados, etc. • inversoes: há inversoes em todo o poema; tomando a primeira estrofe como exemplo, temos: "vós correndo vou, brafos sagrados"/Vou correndo a vós, brajos sagrados; "Nessa cruz sacrossanta descobertos"/Descobertos nessa cruz sacrossanta; "Que, para receber-me, estais abertos"/Que estais abertos para receber-me; "E, por nao castigar-me, estais cravados"/E estais eravados por nao me castigar. b) sugestoex sonoras: "batiam e martelavam", "moíam", "imprensavam" imagens violentas: dentre outras: "penduravam pelos cabelos", "batiam e martelavam com tal forca", "aravam ou cardavam os membros com pentes e garfos de ferro", "moíam e imprensavam os ossos". 4. No texto I, pela desericao do sacritício de Cristo e pela identificagao do eu lírico com esses sofrimentos. No texto II, a morbidcz é maior ainda, em virtude do detalhamento das torturas sofridas pelos eristaos católicos. 9 CAPÍTULO 5 - O Barroco no Brasil Unidade 3 Pense e responda (p. 58) 1. O en Hrico do texto arrepende-se de seus pecados c pede a cleméncia de Deus, 2. eu Hrico: delinqiiido, pecado, tanto pecado, culpa; Deus: cleméncia, perdoar, um só gemido, perdäo 3. A parabola se encontra nos dois terectos. O eu lírico lembra a parabola bíblica da ovelha perdida que foi recuperada por Deus. Em seguida aplica-a á sua propria situagäo: equivalendo a urna ovelha perdida, deseja ser recuperado (perdoado) por Deus. 4. a) "...quanto mais tenho delinqiiido, / Vos tenho a perdoar mais empenhado"; "A abrandar-vos sobeja um só gemido"; "mesma culpa, que vos há ofendido, / Vos tem para o perdáo lisonjeado" b) "e näo queirais, pastor divino, / Perder na vossa ovelha a vossa glória." 5. O texto é predominantemente conceplista, em razäo da sua estrutura lógico-argumentativa, do seu jogo de idéias e do emprego da parabola. Contudo, alguns poticos aspectos relacionados ao cultismo podem ser apontados, tais como as invcrsôcs sintáticas, o requinte vocabular e a sugestäo sonora do "gemido". Pense e responda (p. 60) 1. a) A erítica é feita tanto á classe dominante quanto áqueles aventureiros que descjam ascender socialmente. b) A desonestidade e o oportunismo, próprios de todas elas. 2. a) Resposta pessoal. Contudo, um dos sentidos possíveis séria o de vazar (furar) a tripa da tropa do trapo (gente baixa), isto é, pór a nu a sua verdadeira identidade. Näo se pode esquecer também que toda a ultima estrofe está mais voltada para o efeito sonoro e para a galhofa do que para a clareza das idéias. b) Porqiie, segundo o lexto, todas as rimas já tinham sido utilizadas (observar as palavras fmais dos versos anteriores) e, portanto, acabando as rimas, sería a hora de acabar o poema. c) "Em apa, epa, ipa, opa, upa," Pense e responda (p. 64) 1. A falha provem do pregador, do ouvinte ou de Deus. 2. Os olhos correspondent ao ouvinte, que entra com o conhecimento; o espclho corresponde ao pregador, que entra com a doutrina; c a luz corresponde a Dens, que entra com a graca. 3. Um argumenta de fe: "Esta proposicäo e de fc, defmida no Concilio Tridentino". 4. A semente corresponde ä palavra de Deus (o evangelho), e as pedras e os espinhos correspondem aos piorcs ouvintes que hä na Igreja: as pedras, äqueles que säo endurecidos; os espinhos, äqueles que säo maus ouvintes, que so se interessant por sutilezas e galanterias, que prejudicam as pessoas, etc. 5. O de que os culpados pelo fato de a palavra de Deus näo frutificar säo os pregadores, porque eles näo tcm sabido difundir o Evangelho. I Era dia com o vestibular (p. 64) 1. a) Queixa-se da transitoriedade, da falta de firmeza das coisas: o dia, a alegria, a formosura. j b) A consciencia da fugacidade do tempo e da precariedade da vida terrestre e humana. ! c) antiteses: sol e luz/noite escura e tristes sombras, tristezas/alegria, firmeza/inconstäncia; inversöes: "Depois da luz se segue a noite escura", "Em tristes sombras morre a formosura", ; "Em continuas tristezas a alegria" > d) Nada e constante. A tmica firmeza esti na propria inconstancia. 2. b 3. c 4. d O estudo sobre literatúra desia unidade enfoca o Arcadismo no Brasil. Movimento relacionado ao contexto das idéias iluministas, da Revolucäo Francesa e da Inconfidéncia Mineira, poderá ter seu estudo ampliado pelos seguintes temas de pesquisa: • As idéias dos principals iluministas: Voltaire, Montesquieu, Rousseau. • A Constiluicäo brasileira e o Iluminismo. • O Iluminismo e a Revolucäo Francesa (aproveitar o filme Danton). • A pintura ncoclässica: Watteau. • A música neoclássica: Bach c Mozart. • Os poetas arcades brasileiros e a Inconfidéncia Mineira. • O nativismo na poesia arcade brasileira: vestigios da paisagem brasileira na obra de Claudio Manuel da Costa, Tomas Antonio Gonzaga e Silva Alvarenga. • Sete Povos das Missöcs: confronto entre o relato de O Uraguai, de Basilio da Gama, c o filme A Missäo. Como apoio bibliográfico, sugerimos: Formapäo da literatúra brasileira, de Antonio Candido de Mello e Souza. Belo Horizonte/Säo Paulo, Itatiaia/Edusp, 1975. As revolußöes burguesas, de Paulo Miceli. Säo Paulo, Atual, 1987. O Iluminismo e os reis filosofos, de Luiz Salinas Fortes. Säo Paulo, Brasiliense, 1981 (Col. Tudo é História). CAPITULO 6 - A Arcadia Pcnse e responda (p. 70) 1. a) E um vaqueiro. b) Regressa da cidade para o campo. Na cidade senlia-se infeliz, o que e comprovado pela expressäo "em pranto". Alem disso, critica a futilidade dos valores da vida urbana: "a louca fantasia", "mais valia / Que da cidade o lisonjeiro encanto". c) De volta da cidade, chegou ao campo, onde se sente bem, integrado com a natureza e com os amigos. 2. a) O espago rural apresenta-se rustico e simples; o espago urbano apresenta-se rico e luxuoso. b) Na concepeäo do eu lirico, o espago rural e sinönimx) de tranqüilidade, de equilibrio e de alegria; o espago urbano, ao contrario, e um local de sofrimentos e enganos. 3. Apenas os nomes dos pastores gregos que, adaplados ä paisagem mineira, aparecem como vaqueiros. 4. a) Ao contrario dos textos barrocos, a linguagem ärcade apresenta moderagäo: simplicidade vocabular, poucas inversöes e poucas figuras de linguagem. b) Na linguagem ärcade os sentimentos säo controlados, racionalizados, e buscam o equihbrio; na linguagem barroca predomina o conflito espiritual. c) Enquanto os temas barrocos se relacionam com o dualismo vivido pelo hörnern do seculo XVII, os textos arcades expressam um ideal de vida simples e natural. d) A visäo de mundo do hörnern barroco e conflituosa, porque e fruto de duas mentalidades diferentes: a teocentrica e a antropocentrica. A visäo de mundo do hörnern ärcade estä relacionada com o racioiialismo do seculo XVIII c com certos ideais da burguesia em ascensäo, tais como justiga, igualdade, simplicidade, etc. CAPITULO 7 - O Arcadismo no Brasil Pense e responda (p. 81) 1. a) A natureza sc mostra exuberante, florescente, alegre e harmonica, b) O eu lirico, ao contrario do que se espera, fica triste diante desse belo quadro natural. 10 11 c) O proprio eu lirico reconhece que a natureza (o "objeto" a que se refere o texto) é capaz de afastar as mágoas do peito humano, mas näo ao scu caso: ao contrario, nclc provoca "ánsia, dor, agonia". 2. O eu lirico scnte-se triste ante o belo quadro natural porque, quanto mais o olha, mais sc lembra da mulher amada. Por isso, prefere näo olhá-lo mais, a fim de livrar-sc de sentimentos negativos. Pense e respond a (p. 84) 1. a) A primeira parte, que trata predominantementc do passado, é formada pelas trés estrofes iniciais; a segunda parte, que trata de pianos para o futuro, é formada pelas quatro estrofes seguintes. b) Na primeira parte, o eu lirico identifica-sc como um "honrado pastor" da aldeia, que levava uma vida simples, mas honesta e feliz, ao lado da mulher amada. c) Idealiza, na segunda parte, uma vida ainda mais simples materialmente (já que perdeu tudo o que tinha), mas cheia de realizagóes espirituais, ao lado da mulher amada e dos filhos. 2. bucolismo: o ambiente bucólico é sugerido por um conjunto de elementos, tais como o rio, a sementeira, o gado, a choga, os cordeiros, etc.; aurea medioeritas: a terceira c a quinta estrofes sao cxemplos de vida materialmente simples mas feliz; elementos da cultura greco-latina: Jove 3. a) Na primeira estrofe, ao afirmar que nao era um vaqueiro qualquer, mas um "honrado pastor" e que sempře tivera em sua casa humilde o necessário para viver; e, na segunda estrofe, ao desejar ter maior riqueza para ofertar á mulher amada. (E imporlante lembrar ao aluno que o convite amoroso se faz com base cm argumentos de natureza económica, procurando passar a idéia de uma imido estável, de acordo com a ideologia burguesa.) b) Vida familiar, fidelidade e simplicidade. 4. a) Gonzaga encontrava-se preso quando esereveu esse poema, em virtude de sua participacao na Inconfidéncia Mineira. b) Mais do que mera adequagáo aos temas árcades, para Gonzaga, nesse momento, sonhar com uma vida materialmente simples, mas feliz, é para ele um desejo real, já que todos os seus bens haviam sido confíscados pela Coroa portuguesa. O poeta esperava pělo julgamento, com a esperanga de ainda poder ser feliz ao lado de Maria Dorotéia (Marília). (Convém ressaltar a novidade trazida por Gonzaga ao incorporar á poesia tracos da experiěncia pessoal - o que será, no século seguinte, muito praticado pelos eseritores románticos.) Pense e responda (p. 86) 1. a) O poeta vive em estado de petíúria, identifícada com a simplicidade da casa, a falta do empregado. b) Mesmo assim, prefere a sua condicäo á do rico, porque este, nem sempře honcsto, só se preocupa em deixar heranga. 2. O autor critica sobrctudo o desrespeito do governador em relacao ás leis vigentes, a hipocrisia de suas atitudes diante da populacäo e a sua demagógia. 3. O povo, diante da política centralizadora e demagógica do governante, acorre a ele a fim de resolver os seus problemas, dando-lhe assim prestígio e apoio politico. CAPITULO 8 - A epica arcade Pense e responda (p, 95) 1. O texto I, de O Uraguai, nao possui estrofacao e apresenta versos decassilabos brancos (sem rima); ja o texto II apresenta estrofes em oitava-rima, isto e, estrofes com oito versos decassilabos, dispostos rimicamente de acordo com o esquema abababec. 1) 2. Os dois episódios těm em comum, quarto ao assunto, a morte por amor. 3. a) Um bosque escuro e negro, no qual há uma lapa cavernosa e uma fonte murmurante. Lugar delicioso e triste, cuja relva é verde e onde há rosas e jasmins, b) Embora haja o envolvimento de Lindóia com a natureza, é preciso observar que esta difere do ambiente bucólico arcade. No poema em estudo, a natureza é sombria, triste e escura; para os arcades a natureza é campestre, simples, pastoril. 4. a) Compara Diogo Álvares a um barbaro tigre; em seguida, chama-o de infame, cruel e traidor. A Paraguacu, chama-a de indigna, infame, traidora, néscia e feia. b) É caracteristico da época observar a norma culta da lingua. Alem disso era objetivo dos eseritores árcades elevar nossa literatura, igualando-a a literatura portuguesa e ás demais literaturas européias, c, para isso, tentavam eliminar qualquer vestigio local. 5. a) O texto II, pois o episódio näo é tratado de forma narrativa: a fala de Moema dá ao texto dramaticidade e dinamismo. b) O texto I. Lindóia ama um índio c prefere morrer a casar-se com um índio inimigo. Escolhe para morrer um lugar que faz parte de scu hábitat. Em dia com o vestibular (p. 95) 1. b 2. Tomáš Antonio Gonzaga - árcade - século XVIII - Inconfidéncia Mineira 3. a) Refräo ou estribilho. b) Realgar certas idéias, conferir musicalidade ao texlo e organizá-lo em partes. Unidade 4 ! Nesta unidade e na seguinte é estudado o Romantismo brasileiro. Ao longo dos estudos desenvolvidos, o professor poderá dispor de interessantes temas para pesquisas e seminários em grupo, com a fmalidade de fuudamentar melhor os conteúdos desenvolvidos e ampliar o universo de informagóes do aluno. Eis algumas sugestoes: e O índio no contexto histórieo-cultural brasileiro: confronto entre a literatura indianista romántica e textos dc História, com dados precisos sobrc o papel do índio na sociedade brasileira no periodo colonial e no século passado. Também se pode fazer o confronto entre o índio apresentado pelo movimento romántico e o índio hoje « O negro na literatura romántica: o tratamento dado ao terna em autores como Castro Alves e José de Alcncar. Os alunos poderao conhecer a visao de Alencar sobre o negro a partir de leitura das pegas teatrais Mae e Demůnio familiar; em seguida, poderao confrontá-la com a visao de Castro Alves, expressa em seus poemas abolicionistas. s O amor romántico: desenvolver o conceito de amor entre os románticos, com base na poesia, na ' prosa e em textos eriticos. A obra de Dante Morcira Leite, e a obra historiográfica de Philippe Ariés c Georges Duby (autores quc trabalham na linha da "história do cotidiano"), citadas a £ seguir, poderao auxiliar na pesquisa. i • A mulher romántica, defmida a partir de textos em prosa e verso. Pode ser feito umpainel i evolutivo da mulher na poesia romántica -por exemplo, a mulher em Gongalves Dias, em Alvares i dc Azevedo e em Castro Alves - acompanhando-se as mudangas no tratamento dado a cla. Na prosa pode ser feito o mesmo, utilizando-se obras como A Moreninha, Inocéncia e Senhora. Esse papel feminino poderá ser confrontado com a visao histórica de Ariěs e Duby. s Vida e obra de Lord Byron e suas influencias na literatura ultra-romántica brasileira. . « Representagao cle O navio negreiro, de Castro Alves. Sugerc-se que o grupo divida o texto em parles e o declame, fazendo-se sugestoes a mar e a sofrimentos dos eseravos. ® Resquicios de valores románticos nas músicas populares atuais. 13 • Resquícios de valores románticos nas telenovelas de hoje. • Roupas e moda no Romantisme Como bibliografia de apoio, sugerimos: • O amor románlico e outros temas, de Dante Moreira Leite, Editora Maeional/Edusp, 1979. • Formapäo da literatura brasileira, de Antonio Candido de Mello e Souza. Belo Ilorizonte/Säo Paulo, Itatiaia/Edusp, 1975. • O Romantismo, de J. Guirsbuig, org. Säo Paulo, Perspectiva/Secretaria da Cultura, Ciéncia e Tccnologia, 1975. o História da vida privada, de Philippc Ariěs e Georges Duby. Säo Paulo, Cia. das Letras, 1991. v. 4. • Teatro compteto, de José de Alencar. Rio de Janeiro, Servico Nacionál de Tealro, 1977. s O espirito das roupas, de Gilda de Mello e Souza. Säo Paulo, Cia. das Letras. • A roupa e a moda, de James Laver. Säo Paulo, Cia. das Letras. CAPÍTTJLO 9 - Romantismo: a arte da burguesia Pense e responda (p. 102) 1. a) O vocabulário e as construcôes frasais caracterizam-se pela simplicidade. (É interessante lembrar ao aluno que as palavras sabiá e pahneira originam-se do tupi, o que demonstra a preocupacäo do autor de empregar uma linguagem brasileira.) b) O verso é a redondilha maior (sete sílabas poéticas) e o numero de versos por estrofe varia: as třes primeiras possuem quatro versos e as duas ultimas, seis versos. c) A de aproximar a poesia da cultura popular. (K interessante lembrar ao aluno, tarnbém, que as redondilhas originam-se da poesia medieval portuguesa e sempře tiveram grande penetracäo popular. Os repentistas nordeslinos, por exemplo, usam com frequencia as redondilhas e os decassílabos.) d) Essas novidades representant maior liberdade do artista romäntico para criar seus textos. 2. a) Cá, que representa Coimbra, e lá, que representa o Brasil. b) O Brasil é visto pelo eu lírico de modo idealizado. E um pais em que tudo é melhor e, portanto, a ľelicidade é possível. Coimbra, por outro lado, näo possuindo os dotes da pátria brasileira, só traz infelicidades ao eu lírico. c) Amor, saudade. d) Näo. Tanto a caracterizacäo da pátria brasileira quanto a contraposicäo feita a Coimbra säo subjetivas, pois expressam a opiniäo do eu lírico, ou seja, o modo particular como elc sente esses dois espacos. 3. É nacionalista, porque, valorizando a pátria distante e suas belezas naturais e fazendo uso de uma lingua brasileira, o poeta busca definir a identidadc cultural da nacäo brasileira. CAPÍTULO 10 - O Romantismo no Brasil Pense e responda (p. 116) 1. a) O índio se vě forte e corajoso, membro de uma grande naeao, a tupi. b) A nacao tupi náo existe mais, dizimada por tribos inimigas; seus últimos membros andam agora errantes. c) O índio foge acompanhado do pai, velho e cego, com a finalidade de salvá-lo e dar-lhe proteeáo. 2. a) Alega ser a única razao e o único meio de sobrevivéncia do pai. b) Propije voltar e se entregar como eseravo aos índios timbiras, após ter cuidado do pai. 3. a) Os valores a que se liga o índio associam-se a certos valores da cavalaria medieval, tais como honra, bondade, fidelidade e coragem. b) A sua bondade filial e a sua integraoao á natureza e ao universo cultural e primitivo de sua raca. 14 Pense e responda (p. 118) 1. A palavra mi, que, ja no seculo passado, era um arcaismo. 2. a) O eu lirico perdeu o senso ou a propria identidade: enlouqueceu. b) O eu lirico lamenta a sua condicao; julga-sc infeliz. c) Supoe-se que a mulher amada tenha ignorado ou recusado os sentimentos do eu lirico, por isso o seu sofrimcnto. 3. a) Pelas antiteses vidajmorte e loucurajamor, o poeta sugere as cmocoes conflituosas que a mulher amada desperta no eu lirico. b) O poeta cria as seguintes relacoes: assim como o mar calmo reflete os ceus, os olhos da mulher amada refletcm a alma dela. Desse modo os olhos (verdes) estao para o mar como a alma esta para o ceu. Logo, os olhos da mulher amada tambem sugerem, como os ecus, o infinito, a beleza, a serenidade, etc. 4. a) Aos leitores ou aos amigos. b) Por nao ter sido correspondido, o eu lirico sente-sc um morto-vivo; alguem que, embora vivo, morreu interiormcnte. CAPÍTULO 11 - O Ultra-Romantismo Pense e responda (p. 125) .s 1. Entediado, o eu lirico isola-se em sou quarto, limitando-se a ler e a fumar. 2. a) Bebendo, fumando c lendo romances lascivos. b) Tinha sonhos de ser poeta e de ser feliz, em mundos de fantasia habitados pelas grandes amantes da literatura, como Margarida, Elvira e Clarissa. c) "[...] eu acordava/Arquejando a beijnr meu travesseiro?" 3. Em contraposicao ao mundo degradado e caótico do eu lirico, os pais significant pureza e serenidade. 4. a) Os dois primeiros e os trés últimos versos da parte XIV reveiam consciéncia por parte do eu I lirico. Os versos intermediaries sugerem um estado de embriaguez, motivado pelo conhaque e pelo estado blase do eu lirico. b) Volta-lhe á mentě a imagem de uma mulher amada, sugerida anteriormente pelos sonhos amorosos da parte X. c) Náo, a viagem terá continuidadc, conforme sugere o pedido de que tragam fogo, charutos c de que acendam a lámpada para leitura. Pense e responda (p. 130) 1. Alternando uma silaba acentuada com duas náo acentuadas (■■'--), o ritmo dos versos é semelhante ao ritmo da valsa e também cquivale aos passos da danca da valsa: dois passos seguidos de um. 2. a) "Sente as delioias dos anjos do céu!" ou "qual silfo voando". b) O véu, em nossa cultura, associa-se a pureza, virgindade, etc. A queda do véu equivale á perda da ingenuidadé ou da pureza. c) A imagem presente em "rompe-se o casulo da seda, esfralda-se a borboleta". t 3. "Seu seio nevado de amor se intumesce". 4. O jogo erótico é construído a partir da presenca da insistente afirmacao contida no refiáo "Náo quero, nao posso, náo devo contar" e, ao mesmo tempo, da narracao e descricao das cenas amorosas do baile. 5. Para os poetas da geracáo ultra-romántica, o mcdo de amar se traduz no medo de amar fisicamente a virgem e, assim, destruir o próprio amor. Pense e responda (p. 132) I. a) Ao filho: "pomba prcdileta", "estrela", "messe de um dourado estio", etc.; ao pai: "mar de angústias", "pegureiro". 15 b) O fillio representava a razäo dc viver, a esperanca, o destino e a crcnca do pai. 2. a) Näo, porque, de acordo com o texto, o fillio fala na voz dos ventos, no chorar das aves, no respiro ľlébil das ondas e no brilho das cstrelas. b) O pantcísmo da estrofe reside no princípio de que o filho se transforma em Deus e se manifesta em toda forma de movimento e vida natural. CAPÍTULO 12 - O condoreirismo Pense e responda (p. 140) 1. a) A "orquestra" é a metafora do conjunto de sons (gritos, lamentos) emitidos pelos negros maltratados. A "serpente" é o chicote. b) As cores säo o vermelho e o preto, que compoem o dramático painel em que o sangue dos eseravos contrasta com o negro de sua pele. c) Dentre outras: "Horrendos a danyar", "a serpente/ faz doudas espirais", "cantando, gerne e ti!", "Fazei-os mais danfar!.,.". d) "Tinit de ferros... estalar de acoite...", "E ri-se a orquestra, irónica, estridente...", "Ouvem-se gritos... o chicote estala". (É importante lembrar o aluno da sugestäo do proprio som do chicote, na expressäo "o chicote estala".) 2. A dan9a dos eseravos é, na verdade, o conjunto de movimentos - acompanhados pelos gritos dc dor (a orquestra) - que os negros fazem ao serem chicoteados. 3. Hipérboles como "sonho dantesco", "Em sangue a se hanhar" c "LegiSes de homens" acentuam o tom trágico da cena descrita. 4. A base de argumentaeäo da parte IV é a emoejo. A plasticidade da cena e o detalhe das descricöes levam o leitor a compor um rico painel de suplicios da escravidäo e, dessa forma, sensibilizar-se diante da causa defendida. Pense e responda (p. 142) 1. a) Ela aperta o amante ao seio, a fim de rete-lo por mais tempo. b) Nas geracöes romänticas anteriores, as niulheres normalmente tinham uma atitude passiva ou distante perante o amor masculino. No poema de Castro Alves, ao contrario, a mulher c partieipante da rclafSo amorosa. 2. a) "Desmanchado o roupäo, a espádua nua" c "globo de teu peito". b) Na quinta estrofe, predomina a visäo; na sexta, o oltäto; na sétima, o tato. 3. a) "Ri, suspira, soluya, anseia e chora..." b) "E noite ainda./ Que importa os raios dc uma nova aurora?!..." 4. Na primeira estrofe, a expressäo tiuha o sentido de despedida; na ultima, como o eu lirico vai continuar com a mulher amada, a expressäo revela o desejo de que ela tenha, como ele, uma boa noite de amor. 5. Há várias interpreta9oes possíveis. Uma delas é o desejo de universalizar a mulher e o amor. A Maria do poema, portanto, näo seria apenas uma mulher, mas o conjunto das grandes amantes universais. Em dia com o vestibular (p. 145) 1. a) F b) V c) F d) F o) V 2. Em bora o poema seja moderno, faz mencao a um conjunto de elementos próprios do Romantismo, como elementos da natureza (lua, vento, mar, estrelas, etc.), ambiente noturno, o tema amoroso e a explora9äo dos sentimentos. 3. Impossívcl: o piano hipotético sugerido pelo verbo tivesse (pretérito imperfeito do subjuntivo) está em oposÍ9ao (marcada pela conjun9äo adversativa mas) aos verbos /eve e term. O primeiro, no pretérito perfeito, refere-se ao passado, pondo em dúvida que alguém tenha tido esse tipo de amor. E o verbo fena, no futuro do pretérito, como é proprio desse tempo verbal, prevé a impossibilidade de esse amor se realizar, a näo ser que houvesse uma série de condipöes ideais para isso. 16 4. Essa obra introduz oficialmente o Romantismo no Brasil. Sua importäncia reside mais nas idéias ľomänticas veiculadas em seu prefácio do que propriameute nos poemas que a compoem. 5. "vibrar as cordas do cora9äo": predominio do sentimento sobre a razäo; "elevar o pensamento nas asas da harmonia a té as idéias arquétipas": desejo de comunhäo com o cosmos; "Jamais deve esquecer-se de sua missäo": a visäo de que o poeta, como um ser superior, tem um papcl social a ser cumprido. 6. b 11. e 16. e 7. b 12. b 17. c 8. e 13. d 18. a 9. b 14. b 10. e 15. a Unidade 5 Nesta unidade é estudada a prosa do Romantismo. Alem das sugestoes propostas em Fique ligadol Pesqtdse!, outros trabalhos poderao enriquecer ainda mais o curso dc literatura. Eis algumas sugestoes: • Visao panorámica da prosa romántica a partir da leitura das principals obras. (Vcja rela9áo de obras sugeridas para leitura e sugestáo de rotciro para leitura e análise literária a seguir.) Obras sugeridas ' l. O mofo hitů, de Joaquim Manuel de Maccdo. 2. Memórkts de um sargento de milicias, de Manuel Antonio de Almeida 3. Senhora, de José de Alencar 4. O Guaraui, de José de Alencar 5. Iracema, de José de Alencar 6. O gaúcho, de José de Alencar 7. Inocéncia, dc Visconde de Taunay 8. O Cabeleira, de Franklin Távora 9. O semmarisla, de Bernardo Guimaraes 10. A eserava Isaura, de Bernardo Guimaraes 11. Noite na taverna, de Álvares dc Azevedo A classe deve ser organizada em grupos, de modo que cada um deles fa9a a leitura e o estudo de uma obra. Roteiro para leitura e análise literária 1. Bibliografia Situar o autor no tempo, dar um rápido painel de suas mais importantes produ9oes e, se for possível, estabelecer eventuais nexos entre sua vida e sua obra. 2. Resuino do enredo Sintetizar os principals acontecimentos da obra. 3. Personagens Verificar se as personagens sofrem mudan9as e se sílo aprofundadas psicologicamente (personagens esféricas), ou se sao imutáveis, recebendo tratamento superficial e exterior (personagens planas); ou, ainda, se delas sc deslacam apenas tra90s gerais e comuns ao grupo a que pertencem, como a fofoqueira, o padre, a beata, a comadre, etc. (tipo). 4. Tempo Observar a presesa dos tempos cronológico (do rclógio) ou psicológico (tempo interior, da consciéncia) e a importáncia deles para a constru9ao da seqúcncia narrativa e das personagens. 17 5. Espafo Deve ser observado na perspective de sua relagäo com a personagem e de sua importáncia para o signifleado geral da obra, Importa estudar tanto o espaco físico ou geográfico (meio ambiente) quanto o espaco social (meio social) em que atuam as personagens. 6. E oco narratho Verificar se o ponto de vista do narrador é cm 1? o u 3?pessoa e em que medida essa opcäo serve aos propósitos do narrador ou do autor. 7. Entito Devem ser buseados na obra tragos que caracterizam o estilo proprio do autor, como certos típos de construcäo de frase; uso freqücnte de certas classes gramaticais; construcôes paralelísticas; frequéncia c tipos de descrigäo, comparagôes, figuras de linguagem, arnbigüidades, ironias; linguagem culta ou populär; elc. 8. Verossimilhanpa Deve~se averiguar a relagäo entre a obra de arte e a rcalidade que ela retrata ou recria, seja urna realidade presente (contemporänca ao autor da obra), seja urna realidade histórica. Tal observagäo pode ser importante para se perceber a filiacäo da obra a determinado movimento literário. Por exemplo, o Romantismo tem em geral uma visäo da realidade idealizadu.fantasiosa; o Realismo, ao contrario, procura atingir o máximo de verossimilhanga na obra, por meio de uma perspectiva erítica; e assim por diante, 9. Movimento literário Os vários aspectos anteriormente levantados deveräo ser tomados em coujunto neste item, pois säo eles, ao lado dos temas mais comuns a cssas obras e da visäo de mundo (a ideológia) nelas expressa, que caracterizam a linguagem de determinado movimento literário. Deve-se verificar em que medida a obra em estudo corresponde aos padrôes estabelecidos pelo movimento literário a que cronologicamente está relacionada ou, ao contrario, representa fuga a esses padrôes. 10. Conclusôes Este item de fechamento deve avaliar a importáncia e a contribuipäo da obra e do autor estudados á nossa literatura. Devem ser levados em conta aspectos como: o autor funda ou näo uma nova tradigäo em nossa literatura; se näo funda, a que tradigäo está vinculado e que contribuigôes trouxe para o aprofundamento dessa tradigäo; qual o destaque desse eseritor ou de sua obra no movimento literário a que pertence. Ä medida que os seminários forem ocorrendo, esle item será enriquecido com estudos comparativos entre as obras, como, por exemplo, a erítica social em Memórias de um sargento de milícias c em Senhora; a mulher em Inocéncia e em Senhorcr, o regionalismo de O gaúcho e de O Caheleira; o índio e o negro a partir de Iracema e A eserava Isaura, e assim por diante. A classe deve ser organizada em grupos, de modo que cada grupo faga a lcitura e o estudo de urna obra. Para finalizar os trabalhos, deve ser promovida uma discussäo acerca da importáncia de cada uma das obras cstudadas para a formagäo do Romantismo brasilciro e para a concretizagäo do projeto de construgäo de uma identidade nacionál com base no romance. • Leitura extraclasse c análise literária da obra Luciola, de José de Alcncar. (Veja o roteiro para leitura e análise da obra a seguir.) Roteiro para leitura e anallse de Luciola Este c urn dos mais importantes romances urbanos de nosso Romantismo e o ponto alto das experiencias psicologicas realizadas nesse tipo de romance. A exemplo do romance A Dama das Cornelias, de Alexandre Dumas Filho, Alencar, em Luciola, toma como tema a prostituigao na alta socicdade, analisando-a pcla otica das relagoes entre individuo e socicdade como faz, em Senhora, com rclagao ao casamento. O romance, ousado para a epoca, conseguiu conquistar novas camadas de publico - cspecialmente masculino —, em virtude da curiosidade e da polemica criada em torno de seu tema. 1. Com base no roteiro para leitura e analisc apresentado anteriormente, fazer urn estudo dos aspectos cstruturais que possam ser significativos: o tipo de pcrsonagem, o foco narrativo, o tempo e o espago, a verossimilhanga, etc. 2. Levando em conta a concepgao idealizada de amor dos romanticos, o que pode explicar o interesse de autores desse movimento pelo tema da prostituigao? 3. Toda obra e construida a partir de dualismos - trago comuni a linguagem romantica - que envolvem a protagonista. Explicar o dualismo existente em Lucia quanto: a) ao conceito que tinha sobre a virgindade; b) aos seus comportamentos, antes e depois de prostituir-se; c) aos seus dois nomes, o falso e o verdadeiro; d) ao significado que tinham para ela o passado, a infiincia e o presente. e) ao significado que tinham para ela a casa no campo, integrada com a natureza, e a vida na cidade; f) ao seu comportamento de evitar sexualmente Paulo, ja no final da obra; g) ao significado de um filho para cla; h) ao amor e ao dinheiro. 4. Em que aspectos Luciola constitui uma critica a sociedade brasileira do scculo passado? 5. Por que a obra Luciola pode ser considcrada o ponto alto do romance psicologico na prosa romantica nacional? 6. E comum, nas obras romanticas, tanto o final fehz, quando o amor vence todas as barreiras, quanto o final tragico, quando o amor, impossibilitado de realizar-se na vida, devera realizar-se no ecu, apos a morte. Discutir por que a morte e a saida romantica esperada para a rcsolugao do conflito em Luciola. 1. Reunindo as informagoes colhidas no decorrer desla atividade, justificar, com todos os dados possiveis, por que Luciola e uma obra tipicamente romantica. Toda a classe devera ler a obra. As questoes podem ser respondidas individualmontc ou em grupo, e os resultados expostos num amplo debate com a participagao de todos. Em seguida, pode ser elaborado um painel com as melhores respostas. • Ncgros e indios na literatura romantica. Fundamcntos economicos da mudanga no seu tratamento. Pesquisa baseada na obra de Nelson Werneck Sodre sugerida como apoio bibliografico. • O folhetim, a fotonovela c a telenovela. Semelhangas e diferengas. • As relagoes amorosas e o casamento no Romantismo. Confrontar o tratamento dado a esse tema em obras como A Moreninha, Inocencia e Senhora e outras com a forma por meio da qual essas relagoes se davam na vida real. Consultar a Ilistoria da vida privada, de Philippe Aries e Georges Duby. • Sexualidade no Romantismo. Confrontar textos e obras ligadas as "faces de Ariel e Caliban", de Alvares de Az6vedo; Luciola, de Alcncar: o amor cheio de culpa, em Eurico, o presbitero, de Alexandre Herculano, etc. Confrontar essa visao literaria do sexo no seculo passado com a dos historiadores Aries e Duby, que tambem tratam do assunto. • O gotico na literatura c na cultura contemporanea. Alem das sugestocs apresentadas, os alunos poderao aprofundar o tema fazendo um levantamento da influencia gotica nos quadrinhos, na miisica popular e no cinema. Sugere-se que, alem de miisicas de Rita Lee, os alunos oucam a miisica 'Vampiro' de Jorge Mautner, que se encontra no disco Cinema transcendental, de Caetano Veloso. Tambem e possivel fazer tradugoes de letras de miisicas do heavy-metal. Seria interessante a leitura do poema 'O corvo' e dc eontos de Edgar Allan Poe. Como apoio bibliografico, sugerimos: • Mai dos seculos, de Alvares de Azevcdo e Luiz GS. Sao Paulo, Melhoramentos, 1990. • Formapao da literatura brasileira, de Antonio Candido de Mello e Souza. Belo Horizonte/Sao Paulo, Itatiaia/Edusp, 1975. 18 19 • História cla vida privada, de Philippe Ariěs e Georges Duby. Säo Paulo, Cia. das Letras. v. 4. s História da literatura brasileira, de Nélson Werneck Sodró. Rio de Janeiro, Civilizacäo Brasileira, 1976. CAPÍTULO 13 - O romance romäntico e a identidade nacionál Pense e responda (p. 157) 1. Dentre outros, "A cena estava se tornando patética; ambos choravam e só passados alguns instantes, a inexplicável Moreninha pöde falar e responder ao triste estudante". 2. a) O impedimenta amoroso dcixa de existir quando, "por coincidéncia", as personagens se reconhecem, percebendo ser elas as mesmas personagens envolvidas no episódio de sete anos atrás. O resultado é o final feliz. b) Está perleitamente de acordo com o ideal amoroso romántico e com as normas sociais, em virtude de nfio ter havido adultério nu traigäo cm relacäo á "primeira esposa". 3. a) Surpreender, cmocionar o leitor; a revelagäo da pcripéeia normalmcnte se faz no climax da narrativa. b) A revelagäo de que Augusto e Carolina eram as mesmas pessoas envolvidas no juramento, sete anos antes. CAPÍTULO 14 - O romance indianista Pense e responda (p. 166) 1. a) A luta de Peri contra a propria natureza, ao desprender a palmeira do solo, com o objetivo de salvar sobretudo Cecilia, b) "senhora". 2. a) "Fez-se no semblantc da virgem um ninho de castos rubores". b) Supöe-se que, em vez de morrer, o casal vá repetir a lenda dc Tamandaré, ou seja, quando as águas baixarem iräo povoar o Brasil, dando origem á raca brasileira. 3. a) No texto I, Peri é retratado como destemido e forte, desafiando as forgas da propria natureza. Já Ipavu, no texto II, revela-se negligente e acomodado, procurando tirar proveito das modcrnidades trazidas pelo hörnern branco, sem mostrar preoeupagáo com sua identidade cultural. b) O colonizador branco sempře foi retratado como aventureiro, obcecado por interesses economicos e sem ideais humanitários. Vicenlino Beiräo, contrariando essa tradigäo, mostra-se excessivamente idealista e sonhador. É uma figura quixotesca da guerrilha na Amazonia, em contraposicäo á indiferenga o ao acomodamento do índio. c) Porque destrói a visäo idealizada do índio. Ipavu é o oposto do "cavaleiro medieval" indígena ou do "bom selvagem"; é imediatista, prático e acomodado. CAPÍTULO 15 - O romance regional Pense e responda (p. 173) 1. O autor alterna a linguagem culta do narrador com a linguagem coloquial e regional das personagens, valendo-se ainda de notas de rodapé para esclarecer ou comentar palavras e expressöes regionais. Com esse tipo de linguagem, a obra ganha maior realismo. 2. a) Um perigo á moral da família, tanto quando se casam como quando nao se casam. b) Um alívio, pois o problema passa a ser do marido. 3. a) No antepenúltimo paragrafe b) O narrador critica a opiniäo diseriminatória que há nos sertôes sobre as mulheres, apontando suas tristes conseqíiéncias: clausura e crimes equivocados. 4. a) Cirino tern uma visao sobre as mulheres mais moderna c liberal do que Pereira, provavelmente em razao de suas andangas como "medico", b) "e e costume meu antigo a ninguem contrariar, para viver bem com todos e deles merecer o tratamento que julgo ter direito a receber." CAPÍTULO 16 - O romance urbano Pense e responda (p. 179) 1. a) O texto I retrala as camadas mais humildes da sociedade, enfocando o meirinho Pataca, a vulgar Maria das Hortaligas, o barbeiro, a parteira, o sacristäo, etc. O texto II retrata a alta sociedade carioca do século passado, conforme referencia do texto aos "salöes", b) No texto I, näo há nenhuma referencia ao casamento de Leonardo com Maria das Hortaligas. Ela já chegou gravida e, de acordo com o texto, "foram morar juntos". Com base nesse episódio, supöe-se que, para o grupo social retratado no texto, o casamento tenha um valor secundário. Já no texto II, o casamento é visto como meio de enriquecimento e ascensao social. 2. a) De acordo com as regras daquela sociedade, Maria das Hortaligas engravida antes de ter se casado com Leonardo. b) Aurélia, do texto II, quebra a convengäo relativa ao papel social feminino no século passado, que era de submissäo e dependěncia. c) A transgressäo de Aurélia é mais reprimida. Näo há no texto I nenhuma mengäo a prcconceito social em relagäo ao comportamento de Maria das Hortaligas. 3. Queria que a festa tivesse ares aristocráticos e que se dangasse o minuetc, como era de praxe nas cortes. Entretanto, a festa acabou virando uma folia, porque os convidados, näo estando acosturnados ao requinte, acabaram cedendo ao canto do proprio Leonardo, a partir do qual cresceram a alegria e a algazarra. 4. a) Aurélia governa sua propria vida, o que era comum apenas entre os homens da época. b) Ao fato de ser órfä, rica e näo depender de ninguém. 5. a) Memórias de um sargento de milícias foge mats aos padrôcs románticos, em razäo da linguagem empregada e do tratamento dado á mulher e ao amor. b) Senhora, que, ao criticar o jogo de interesses sociais e ao analisar a mesquinhez do comportamento, prenuncia o Realismo. CAPÍTULO 17 - A prosa gótica Pense e responda (p. 186) 1. a) Ambientes noturnos, decadentes e mórbidos; as mas de Roma á noite, o cemitério, as orgias, a igreja em que estava o corpo da virgem, o quarto em que havia o túmulo e a taverna, b) Por meio da presenga de cruzes e de aves da noite no campo a que chegaram; e do tropego no corpo do coveiro, bébado. 2. A partir do parágrafo que assim se inicia: "Nao lembras, Bertram". O nexo entre as narrativas se faz por meio da pergunta do narrador a Bertram, pedindo o seu testemunho. 3. "forma branca", "estátua pálida á lua" 4. a) É a neerofilia. Antes de saber que a virgem estava viva, Solfieri consuma fisicamente o amor com ela. b) Ao revelar que a moga tivera um ataque de catalepsia. 5. comportamentos da mulher. o canto do início do texto; sua visita ao cemitério á noite; comportamentos de Solfieri: as orgias, a embriaguez, a neerofilia, a devassidao, a morbidez. 6. Expressam uma visáo pessimista e deeadente do mundo. Solfieri revela-se um ser sem perspectivas, cuja vida se agita numa busca frenética de prazeres e no desafio á propria mořte. Em dia com o vestibular (p. 187) 1. a) Aurélia, sem se identificar, manda oferecer um dote de cem contos a Seixas, que aceita. 20 b) Depois de viverem juntos por onze meses, sem consumar o easamento, Scixas trabalha e consegue refazer a quantia recebida como dole. Ao devolvc-la á esposa e limpar sua honra, Aurélia cai-lhe aos pés, rcvelando-lhe seus sentimentos, o que possibilita a uniäo definitiva do casal. 2. a) Cinco minutos e Inocéncia. b) Nas duas obras, as protagonistas, Carlota na primeira e Inocéncia na segunda, morrem, sendo, assim, impedidas de realizarem-se no amor. Em Inocéncia, além da personagem feminina, morre também sou amado, o falso medico Cirino, assassinado pelo rival Manecäo. 3. a) O protagonista, Leonardinlio, c quem uue os vários episódios da obra, formando o seu emedo. O narrador, tomando urna postura irônico-critica, também assume papel decisivo na construgäo da coesäo narrativa. b) Um importante episódio é a prisäo de Leonardinho, por motivo de vadiagem, e a interferencia de Maria Regalada junto ao ex-amante, o delegado Major Vidigal. O episódio, ao mesmo tempo que decide o rumo da narrativa (Leonardinho vai entrar nas milícias), é fundamental para a compreensäo da linha-mestra do romance: a malandragcm, a vadiagem e o jogo de influéncias mencionados por Antonio Candido. 4. a) O Guarani e Ubirujara. b) Em Iracema, Alencar propôe-se a narrar a lenda - criada por ele mesmo - de como se teria oiiginado o Estado do Ceará e tido início a povoagäo mestica no Brasil, com o eruzamento entre o branco e o indígena. 5. b. 6. b. 7. d. 8. c. 9. e. 10. c. 11. .Toaquim Manuel de Macedo - A Moreninha - Romantismo Unidade 6 Nesta unidade é estudado o Realismo no Brasil. Algumas propostas para trabalhos podcräo dar ainda maior dinamismo ás aulas. Eis algumas sugestôes: • Leitura extraclasse de O alienisla de Machado de Assis, seguida de debate, c de O cortifo, de Aluísio Azevedo, seguida de questôes. (Veja roteiro para debate e questôes propostas a seguir.) Roteiro para debate sobre 'O alienista' Este admirável conto de Machado de Assis p5e em discussäo os critérios dc normalidade e loucura e as fronteiras entre urna e outra. 1. Qual é o objetivo de Simäo Bacamarte e o que ele faz para consegui-lo? 2. O que permite a Simäo Bacamarte, em nome de seus projetos cientificos, exercer sobre os habitantes de Itaguai um poder tiränico c arbitrário? 3. Faga um levantamento das tcorias defendidas por Simäo Bacamarte. 4. Indique a corrciite cienlífica que, preconizada pelo Realismo e pelo Naturalismo, se identifica com as teorias sobre a loucura deľendidas pelo cientista. Se necessário, consulte o capítulo 'História social do Realismo, do Naturalismo e do Parnasianísmo'. 5. Tustifique por que, diante do poder exercido por Simäo Bacamarte, o povo de Itaguai assume uma atilude de respeito e, ao mesmo tempo, se amedronta. 6. Faga um estudo sobre o comportamento de Porfírio quando no poder e, depois, fora dele. 7. Tomando como referčncias o objetivo de Simäo Bacamarte e o dcsenrolar dos fatos, responda: a) Entre as características que o narrador deixa entrever no capítulo I, quais podem explicar o desfecho do conto? b) O desfecho do conto surpreende? Justifique com base nas informagôes contidas no ultimo capítulo. c) Simäo Bacamarte, o alienista, é o único alienado? Ou o alienista é o único normal? 11 8. Em 'O alienista', Machado de Assis diverte-se e nos diverte satirizando, por meio da obsessiva busca da verdade empreendida por Simäo Bacamarte, as fronteiras estabelecidas entre a razäo e a loucura. a) Qual é a visäo machadiana sobre aquilo que se convencionou chamar "loucura"? b) Retire do texto elementos que demonstrem a irónia machadiana diante da ciéncia de sua época. Questôes sobre O cortifo 1. Por que se pode aíirmar que o proprio ambiente, o cortigo, é a personagem principal da obra? 2. Desenvolver a seguinte afirmagäo: O tema mais importante no romance é o do imigrante portugués, representado principalmente por personagens situadas em trés diferentes posigöes sócio-econômicas: Joäo Romäo, Miranda e Jerônimo. 3. Discutir a seguinte afirmagäo: "O portugués negociante de fazendas por aťacado foi vencido pelo portugués negociante de secos e molhados". (Dirce Cortes Riedel) 4. De acordo com a visäo naturalista, por que Jerônimo, um portugués, näo teria vencido na vida, ao contrario dos demais de sua raga? 5. No decorrer da narrativa, algumas personagens softem um processo de transformagäo social e moral, como, por exemplo, Joäo Romäo, Piedade, Jerônimo e Pombiiiha. Demonstrar a transformagäo ocorrida e a condigäo final de cada um deles. 6. Comentar as causas, segundo a visäo naturalista, de Pombinha ter se tornado prostituta e de Jerônimo haver se abrasileirado. 7. Por que é possivel afirmar que o sucesso de Joäo Romäo pode ser visto sob o enfoque da lei da selegäo natural? 8. Por que O cortifo e os demais romances naturalistas säo considerados romances de tese? a A loucura em Machadn de Assis, a partir das obras Quincas Borba, Memórias póslumas de Brás Cubas (de que participa também a personagem Quincas Borba) e O alienista. Fundamental' as rcflexöes sobre loucura com as sugestôes bibliográficas. 9 Ciéncia e poder, a partir de O alienisla e do filme O ovo da serpente, de Ingmar Bergman, a O adultério no Realismo, a partir das obras Dom Casmurro, de Machado de Assis, e O primo Busilio, de Ega de Queirós. Confrontar com a visäo histórica de Ariés e Duby expressa na História da vida privada. a As correntes fiiosóficas e científicas da segunda metade do século passado: o positivismo, o determinismo, o darwinismo, o marxisme a Estudo comparado: Germinal, de Emile Zola, c O cor lipo, de Aluísio Azevedo. a A sexiialidade na literatura realista-naturalista e suas relagôes com as teorias científicas da época. Além dc obras como O cortifo, de Aluísio Azevedo, A came, de Julio Ribeiro, O primo Basilio, de Ega de Queirós, também se pode pór cm discussäo o celibato dos religiosos a partir de obras como O crime do Padre Amaro, de Ega de Queirós, e O missUmário, de Inglés de Souza. O celibato visto pelo enfoque naturalista pode ainda ser comparado ao celibato romäntico de Eurico, o presbítero. a Confronto entre Romantismo e Realismo quanto a estes aspectos: o papel da mullier na sociedade; o valor do easamento, da fidelidade e da família; a religiosidade. a Ü problema da habitagäo nos centres urbanos, no século passado e neste. Pode-se tomar como ponto de partida a obra O cortifo. A obra de Ariés c Duby sugerida a seguir oferece subsídios para essa pcsquisa quanto ao contexto europeu. a As escolas que funcionavam em regime de inlernato no Brasil, tomando como ponto de partida a obra O Ateneu, de Raul Pompéia, e os estudos eríticos sugeridos na bibliografia, a Comparagäo entre o romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, e o roteiro cinematográfico Capita, de Lygia Fagundes Telies e Paulo Emílio Salles Gomes (Editora Siciliano). a Roupas e moda da época do Realismo. 23 Sugestôes bibliográficas: 9 Doeiifa mental e psiculogia, de Michel Foucault. Ed. Tempo Rrasileiro. e História da loucura, de Michel Foucault. Säo Paulo, Perspectiva. s Ao vencedor, as batatas, de Roberto Schwarz. Säo Paulo, Duas Cidades, 1977. e Que haras säo?, de Roberto Schwarz. Säo Paulo, Cia. das Letras, 1989. • Machado de Assis, de Alfredo Bosi e outros. Säo Paulo, Atica. « Machado de Assis, de Lucia Miguel-Pereira. Rio de Janeiro, Brasiliana, 1939. 9 O Ateneu - Retórica e paixäo, de Leyla Peirone-Moisés, org. Säo Paulo, Brasiliense, 1988. s História da vida privada, de Philippe Ariěs e Georges Duby. Säo Paulo, Cia. das Letras, 1991. v. 4. 9 Capita e outras Evas, de Machado de Assis e Michele. Säo Paulo, Melhoramentos, 1990. 9 Cortipos & condomlnios, de Aluísío Azevedo e Laerte. Säo Paulo, Melhoramentos, 1990. » O espirito das roupas, de Gilda de Mello e Souza. Säo Paulo, Cia. das Letras, s A roupa e a moda, de James Laver. Säo Paulo, Cia. das Letras. CAPÍTULO 18 - O Realismo: a realidade desnuda Pense c responda (p. 198) 1. A linguagem do texto I é mais culta que a do texlo II. Alem disso, a adjetivagäo do texto de Alencar eleva, idealiza a personagem deserita, ao passo que, no texto TI, a adjetivafäo é comum, sem nenhuma pretensäo idealizante. 2. a) de 1871 a 1885: catorze anos b) Em todo o conto se encontram abundantes exemplos de narrativa lenta. Como sugestäo, pode ser apontado este parágrafo: "Entre meia-noite e uma hora, Pestana 3. 9 Maria era tísica e viúva. « O casamento, para Pestana, significava apenas companhia c, talvez, inspiragäo para eriar; conveniéncia, portanto. » Näo há amor entre Pestana e Maria. 9 Mais do que o relacionamento amoroso, importa a Pestana a realizagäo como artista, que seria compor uma pega classic«. 4. O idealismo romäntico de Pestana frustra-se diante dos interesses materialistas do mundo em que ele vive. Desse idealismo podem-se esperar apenas fruslracäo, conflitos interiores, inadequacäo social. 5. a) Pestana, aos poucos, cede aos interesses materialistas do editor c vai abandonando os seus sonhos de perfeigäo artística e de auto-realizaeäo. As polčas passam a ser sou único meio de sobrevivěncia. b) Passa a conviver mais tranqüilamente com as polcas. Quanto á música clássica, resigna-se em näo conseguir realizá-la e contenta-se em ouvi-la. c) Uma visäo pessimista. O hörnern é visto como um ser frustrado e incapaz dc agir sobre as suas fraquezas pessoais, cedendo ás imposigöes materialistas da sociedade. CAPÍTULO 19 - O Realismo no Brasil Pense e responda (p. 206) 1. Colocando-se na perspectiva de um "defunto autor", o narrador consegue tet, do alem, uma visäo mais ampla e crítica do mundo dos vivos. 2. As memórias seräo eseritas mim tom de brincadeira, livremente, numa mesela de irónia e sarcasmo, tristeza e pessimismo. 3. a) Os graves säo leitores críticos, que esperant um romance sério; os frivolos säo leitores superficiais, que esperant um romance leve, semelhante áqueles que estäo habituados a ler. 24 b) Consciente de que propöe inovacöes, portanto um modo de narrar desconhecido do publico leitor da epoca, Bids Cubas näo espera ter o credito dos leitores, nem sua estima nem seu amor, pois tanto ös graves quanto os frivolos näo encontraräo nesse romance aquilo que esperam. 4. a) O livro e enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa conlragäo cadaverica, uma.narrativa lenta, alem de um estilo irregular, improprio para o leitor eomum, acostumado a ler livros que chegam logo ao desfecho, ou que content muita agäo. b) A narrativa lenta permite estudar detalhes, deter-se em minücias aparentemente insignificantes. Com seu estilo ebrio, permitc-se analisar as personagens sob todos os ängulos, podendo guinar ä direita e ä esquerda, andar e parar, etc. 5. Com o proposito de despertar-lhe a atengäo para os problemas da criagäo literäria e da teenica narrativa, desmitificando-as, conscientizando o leitor do caräter ficcional da obra literäria e obrigando-o a partieipar do processo narrativo. 6. Quando zomba dos leitores, quando afirma que o melhor prölogo e aquele que diz as coisas de um jeito obscuro e truncado, quando responsabiliza o leitor pelos defeitos do livro, etc. 7. a) A sociedade impöe aos homens a luta pela celebridade e pela fortuna. b) Tal como os outros homens, tatnbem ele, Bnis Cubas, sonhou alcancar o primeiro lugar, aeima da ciencia e da riqueza, com a invengäo de seu emplastro. Logrado em seu intento, porque adoeceu, considera-se, do outro lado da vida, ainda com um saldo, pois, näo tendo tido filhos, näo deixou a ninguem como heranca o legado da miseria humana. c) Uma atitude de descrenga c de pessimismo diante da vida. Pense e responda (p. 209) 1. Referindo-se ao episódio que envolve os olhos de Capitu, o narrador interrompe a narrativa e comenta: "Retórica dos namorados, dá-me uma comparagäo exata e poética para dizer o que fbram aqueles olhos de Capitu. Näo me acodc imagem capaz de dizer, sem quebra de dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram". 2. Por causa do poder de atragäo que Capitu exercia sobre Bentinho. 3. Capitu tem um jeito proprio de ser, é esperta, hábil, doce, misteriosa, enérgica, sabe o que quer e exerce sobre Bentinho uma atragäo que ele "vé" em seus olhos ("olhos de ressaca") e sente no espirito ("uma forga que arrastava para dentro"). 4. Capitu. Ao receber respostas evasivas de Bentinho sobre o fato de Joäo Dias ter ou näo intercedido junto á mäe em seti favor, Capitu, explosivamente, diz: "E um inferno isto! Vocé teimc com ele, Bentinho". 5. Como narrador-personagem, Bentinho näo tem oniscicneia dos fatos, näo tem uma visäo total das personagens. Desse modo, quando se demora na contemplacäo dos olhos de Capitu, cle interpreta suas agöes, achando ser outro seu intento ou que era um pretexto para mirá-los mais de perto. Pense e responda (p. 210) 1. a) Porque o encontro de duas expansöes, ou a expansäo dc duas formas, pode determinar a supressäo dc uma delas; a supressäo de uma é a condigäo necessária para a sobrevivěncia da outra. b) Segundo o exemplo, duas tribos famintas disputam as bal alas do campo. Se as dividem em paz - as batatas säo insufícientes para nutrir as duas tribos -, ambas acabam por morrer. Nesse caso, a paz causa destruÍ9äo. Se, entretanto, em razäo da dišputa pelas batatas uma extermina a outra, as batatas garantem a sobrevivěncia da vitoriosa. Nesse caso, a guerra é a conservagäo. c) O piincípio do humanitismo está na idéia de que somenle os mais fortes sobrevivem; esse é o princípio regulador da existencia humana. d) A expressäo "ao vencedor, as batatas" resume a idéia central do humanitismo: aos mais fortes a vitória e a sobrevivěncia. Contudo, näo se pode deixar de observar a irónia do autor contida na frase. 2. A briga dos cäes pelo osso - episódio a que o hörnern comum näo dá nenhum valor -, para o Glósofo Quincas Borba exemplifica a sua célebre teória do humanitismo: tanto na briga dos cäes quanto na luta entre os homens, vence o mais forte. 25 CAPÍTULO 20 - A prosa naturalista Pense e responda (p. 214) 1. a) Näo há privacidade; o banho matinal é feito em conjunto, numa aglomeragäo em volta das bicas; latrinas abreni e fecham, criangas fazem suas necessidades fisiológicas no capinzal dos fundos. b) O grupo das pessoas que pertencem ás camadas mais baixas da populacäo. o) Uma atmosféra de prazer c de alegria, de barulho e confusäo, de conversas, de risos, de choros de criangas, de vozes de pessoas misturadas ás dos animais domésticos. 2. Do ponto de vista físico e social, simultaneamente. Justificam-no: "cabegas congestionadas de sono", "amplos bocejos", "pigarreava-se grosso", "sons de vozes que se aftereavam" e todo o quinto paragrafe 3. A mulher é descrita sob a ótica do animalesco e do sensual: coxas, nudez, pele bronzeada, cabelos presos no alto do casco. 4. a) "em volta das bicas era um zunzum crescente; uma aglomeragäo tumultuosa de machos e fémeas"; "suspendendo o cabelo para o alto do casco"; "fossando c fungando contra as palmas das mäos"; "o prazer animal de existir" b) Sim, o trecho em que säo descritas as mulheres lavando-se nas bicas. 5. Pode-se considerar como exemplo de degradagäo humana o fato de viverem coletivamente, sem privacidade, como bichos, rcalizando suas necessidades flsicas sem se ocultarem. Nesse caso, o parágrafo intciro mostra situagöes de degradagäo humana. 6. Porque o que ele pretende mostrar é o agrupamento, os tipos que representant a engrenagem social, e näo individuos com marcas próprias, com características particulares. 7. Por possibilitar ao narrador analisar, obscrvar, distanciar-sc do objeto em estudo c revelar os fatos o mais proximamente possivel da realidade. 8. olfativas: "a roupa lavada [...] umedecia o ar e punha-lhe um fartum acre de sabäo ordinário", "o cheiro quente do café aquecia"; auditivas: "ouviam-se amplos bocejos", "comegavam as xícaras a tilintar"; "choros abafados de crianga"; táteis: "umedecia", "espumas secas", "para näo as molhar"; visuais: "o cortigo acordava, abrindo, näo os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas", "a tostada nudez dos bragos e do pescogo". 9. O quarto, o quinto e o sexto parágraíbs. 10. Tal qual as abelhas, que zumbindo se agrupam em volta do mcl, os homens e as mulheres (machos e fémeas) aglomeram-se tumultuosamente em torno das bicas de água. O narrador mais uma vez ressalta o lado biológico, animal, do hörnern. Pense e responda (p. 219) 1. a) Realgam a scnsualidade da personagem Rita Baiana, seus instintos carnais. b) bragos, cintura, ilhargas, cabega, barriga, dedos, pemas, quadris, nuca c) Os quadris. A danga sensual e urn convite ao sexo. 2. "a luz ardente do meio-dia"; "o calor vermelho das sestas da fazenda"; "o aroma quente dos trevos e das baunilhas"; "a palmeira virginal e esquiva"; "era o veneno e o agücar gostoso"; "o sapoti mais doce que o mel e era a castanha de caju que abre feridas com o seu azeite de fogo". 3. a) Rita Baiana e "cobra verde e traigoeira", "a lagarta viscosa", "a murigoca doida". b) A danga sensual de Rita Baiana assanha os desejos de Jerönimo, acorda-lhe o corpo, piea-lhe o sangue e acendc-lhe o desejo carnal. c) Para Jeronimo, Rita e a sintese das impressöes que ele recebeu ao chegar ao Brasil; e o misterio, a sedugäo, o sexo. O desejo que sente por ela e prenuncio da atuagäo que o meio fisico e social terä sobre ele. Pense e responda (p. 221) 1. Aristarco é um empresário travestido de educador. Artificialmente paternal e bondoso, representa o educador ao receber os alunos e os pais. Por trás da aparéncia de sacerdote, manifesta-se o empresário calculista, esperto, que bajula os privilegiados. 2. As situagöes e experiéncias vividas por Sérgio adolescente, no colégio O Ateneu, säo reconstituídas e narradas subjetivamente, sob o ponto de vista de Sérgio adulto. 3. Vaidoso; tem atitudes premeditadas; visivelmenle aborrecido, transfigura-se em educador quando a situagäo exige; tem olhar fulgurante, supercílios semelhantes aos de um monstro japonés c bigodes enormes. 4. a) Resposta pessoal. b) Talvez com a intengäo de desnudá lo, de reforgar seu mau caráter de Talso educador, como se estivesse se vingando do diretor. CAPÍTULO 21 - O Parnasianismo no Brasil Pense e responda (p. 225) 1. a) Compara-se ao ourives, pois também o poeta, quando esereve, aprecia a minúcia, o detalhe e a perfeigäo formal. b) Por um lado a vé eomo arte requintada e superior; por outro, identifica-a também como decoragäo. c) E a perfeigäo formal. 2. Na 8? estrofe, o poeta mostra-se distanciado da realidade e desinteressado de seus problemas. Isolado, preocupa-se apenas com a arte. 3. Conforme o texto de Gongalvcs de Magalhäcs, o pocta romäntico valoriza mais a livre expressäo das emogöes, sem se importar tanto com a perfeigäo formal do poema. Já Bilac defende o contrario: a forma está acima de tudo, principalmente dos sentímentos, que devem ser contidos. Pense e responda (p. 228) 1. Há o cu lírico, identificado pelos pronomes e verbos de If pessoa, e seus intcrlocutores, vós, identificados pelo tratamento em 2? pessoa do plural. 2. a) Só o amor pode permitir a comunicagáo com as estrelas. b) Principalmente neste trecho: "saudoso e em pranto, / Inda as procuro c) O Romantisme Pense e responda (p. 229) 1. a) O autor compara o movimento das pombas aos sonhos da adolescéncia, que igualmente voam. b) Os pombos retornam aos pombais ao fim da tarde, mas os sonhos adolescentes näo voltam mais. 2. a) A madrugada corresponde á juventude, c a tarde, á velhicc. b) Os percalgos da vida, que acabam por fazer os sonhos se perderem. 3. O eu lírico, revelando preocupagäo metafisica, trata com pessimismo a condigäo do homem perante a vida e o tempo. 4. O deseritivismo, a sobriedade c contengäo das emogöes, o foimalismo. Em dia com o vestibular (p. 231) 1. a) Memórias póstumas de Brás Cubas e O initiate b) Rompem com o Romantismo. 2. c 6. a 10. a 3. VVFVF 7. b 4. VVFVF 8. a 5. c 9. c, e 11. a) Memórias de um sargento de milícias b) O cortipo 12. a) Refere-se ao Realismo e ao Naturalismo. b) Tanto o Realismo de Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, quanto o Naturalismo de O cortipo, de Aluísio Azevedo, säo romances urbanos que analisam o comporfamento do homem inserido na sociedade burguesa. Expöem a fragilidade da condigäo humana em face da competigäo e do jogo de interesses sociais que marcam essa sociedade. 13. c L Unidade 7 Nesta unidade é estudado o Simbolismo brasileiro. Ccrtos trabalhos dos alunos poderäo enriquecer as aulas. Fis algumas sugestôes dc temas para pesquisa e seminários: » O decadentismo do final do século, a partir de poemas de Cruz e Sousa. • O resgate do gótico feito pelos simbolistas Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaracns. • A pintura impressionista. Pode-se esuulher a obra de um pintor, como Van Gogh, por exemplo, sobre o qual existe ľilnie biográfico, alóm de urna história sobre sua pintura, no filme Sonho.s, de Akira Kurosawa. • Simbolistas x parnasianos: divergéncias e convergéneias. Apontar semelhancas e diferencas estéticas e ideológicas entre os movimentos, tomando textos dos dois movimentos como ponto de partida. Sugestôes bibliográficas: a Á literatúra simbolista, de Henri Peyre. Säo Paulo, Cultrix/Edusp, 1983. • Arte moderna, de Giulio Carlo Argon. Säo Paulo, Companhia das Letras, 1993. CAPÍTULO 22 - Simbolismo: a linguagem da música Pense e responda (p. 239) 1. a) substantivos: solutus, perils, contornos, solidäo, Fantasia, visöes; adjetivos: plangentes, dormentes, momos, tristes, vagos, murmurejantes, remotas, ignotas. b) Quase todos eles scrvem como resposta. Sugestäo: "Tristes perfis, os mais vagos contornos", "noitcs remotas que nos azuis da Fantasia bordo". 2. a) Sugere os sons dos violöes. b) Sugerem tristeza, lamento c choro, conforme as expressöes: "Solugos ao luar", "bocas murmurejantes dc lamento", "gemidos, prantos". 3. a) Aproxima os campos sensorials auditivo ("plangente", "bocas murmurejantes", etc.), tätil ("mornos") e visual ("a/.uis da Fantasia", "luz da lua"). b) "veludosas vozes" 4. Na verdade, todo o poema sugere uma visäo de mundo pessimista, por parte do eu lirico. Na ultima estrofe, contudo, essa visäo é explícita. Segundo o texto, as almas fatigadas do sonho isolam-se nos sons dos violöes tristonhos. Há uma visäo dc desagregacäo ("abismaram no mistério"), isolamenlo ("ilhas de dcgrcdo") e dor ou mořte ("degredo atroz, funéreo"). CAPÍTULO 23 - O Simbolismo no Brasil Pense e responda (p. 244) 1. a) "desce" e "sobe". b) "a lámpada do sonho". 2. a) Resposta pessoal. Contudo, elementos do texto - "änsias", "desejos", "solucado grito", "sonho" - levatn a crer que o infinite) seja o proprio eu, um eu que está a escavar-se, á procura de si mesmo, de uma identidade ou de uma razäo existential. b) Provavelmcnte uma resposta para suas angústias pessoais. c) Näo, porque o infinito se transforma em lava. Pense e responda (p. 246) 1. a) céu/mar; perto/longe; subiu/desceu b) Deseja dividir-se entre a realidade espiritual (a lua do céu), e a realidade conereta (a lua do mar). 2. "enlouqueceu", "sonhar", "desvario" 3. a) O céu recebe a alma; logo, liga-sc ao aspecto espiritual. O mar recebe o corpo; logo, represerila o universo material. b) De acordo com o conceito simbolista, sim: por meio da mořte, Ismália transcende a realidade conereta, integrando-se ao cosmos. c) Sim, porque, para os simbolistas, a razilo e a logica aprisionam o homem. Dar vazáo ao mundo interior, explorar zonas ocultas da mentě humana é o mesmo que transcender os limites do mundo material. CAPÍTULO 24 - O teatro brasileiro no século XIX Pense e responda (p. 253) 1. Henrique é um jovem sonhador, um sentimental, um amante da natureza e da poesia. Suas aspiragôes profissionais revelam seti caráter idealista e reiteram scu espírito poético. 2. a) "Näo é preciso coisa alguma." b) A possibilidade de ascensäo social rápida - estando, nesse sentido, acima de todas as outras carreiras -, alem do exercício do poder sobre todas as pessoas, sobre "o Brasil inteiro". As outras carreiras, quando se consegue delas colher algum fruto, este chega tardiamente, quando já se está velho, pobre, doente c sem esperancas. 3. Há aqui um trocadilho jocoso; isso porque näo pensar em ser politico, ou näo ter claieza do que isso significa, é a verdadeira condicäo para ser politico. 4. Säo iguais; näo há diferenga alguma entre eles. 5. Aquele que está no poder c, mais tardc, dependendo do rumo que a política tomar, esse mesmo partido ou outro que lhe dé a possibilidade de subir. 6. Um programa politico "é um amontoado de palavras mais ou menos bem combinadas, que tém sempre por fim ocultar aquilo que se pretende ťazer". 7. Resposta pessoal. Em dia com o vestibular (p. 256) 1. a) A auséncia de verbos e a presenga de alguns substantivos relacionados á liturgia (ŕncensos, turíbulos, aras), acompanhados de urna adjetivacäo intensa, conferem ao texto um caráter sugestivo, que evoca urna ambientagäo mística e litúrgica. b) Buscando outras capacidades expressivas das palavras e dos versos, os simbolistas valorizam aspectos como cor, som e imagem. Nesses versos, o autor sugere ambientagäo litúrgica por meio da cor branca, das imagens fugidias e indefinidas e por meio da sonoridade criada pelas aliteragóes (fonemas /s/, /f/ e /v/, principalmente) e assonäncias (foncma /a/, principalmente). 2. a) Simbolismo. b) Presenga de sinestesia era "música fria"; a musicalidade criada sobretudo pela aliteragäo de oclusivas e vibrantes, como em esíranha, hemer, tremer; a adjetivagäo abundante. 3. c 4. e 5. a 6. b, f 7. d 8. b, c 9. b 10. a) A sinestesia consiste no eruzamento de campos sensorials diferentes. b) No texto, a sinestesia ocorre com a aproximagäo de elementos como "música" e "fria", ou seja, a audigäo e o tato. 11. a 12. c 13. d 14. b 15. b Unidade 8 Nesta unidade sao estudados o Pre-Modernismo e a primeira fase do Modcmismo brasileiros. Se o professor quiscr, podcra propor otimos temas para trabalhos de pesquisa e seminarios, com a finalidade de aprofundar os conteudos e envolver de forma direta os alunos. A titulo de sugestao, eis alguns desses temas: • A guerra dc Canudos e suas causas socio-economicas. • Lima Barreto e a literatura negra no Brasil. • A literatura infantil de Monteiro Lobato: a missao pedagogica e o preconceito. • O Futtirismo italiano e o faseismo: ligagoes ideologicas e historicas. 29 a O cinema surrealista de Luis Bunuel: pesquisa a partir dos Ulmes existentes em locadoras: O fantasma cla liberdaile, O discrete charme da burguesia, A heia da tarde, O cäo andaluz, Esse obscuro objeto do desejo e outros. a Réplica da Semana de Arte Moderna, com dcclamacäo de parte da conferencia proferida na primeira noite por Graca Aranha, declamacäo do poema 'Os sapos', de Manuel Bandeira, e, se possivel, execueäo ou reprodu9äo de musicas de Villa-Lobos. s O nacionalismo na literatura brasileira: confronto entre o nacionalisme romántico e o nacionalismu modernista (a partir, principalmente, das ideias dos movimentos Pau-Brasil, Antropofagia, Verde-Amarelismo e Anta). Contrapó-los á visäo que se tem do proprio pais hoje. a Como no item anterior, estabelecer confrontos, dessa vez com relagäo ao terna índio. Contrapor o indio idealizado do Romantismo á personagem Macunaíma, de Mario de Andrade. Confrontar tanto um quanto o outro com o índio do Brasil de hoje. a Como nos dois itens anteriores, estabelecer confrontos, agora com rela9äo ao terna o malandro na literatura. Confrontar o malandro de Memórias de um sargento de milícias com a personagem Macunaíma, da obra de Mario de Andrade, e com a malandragem carioca mostrada na pe9a Opera do malandro, de Chico Buarque de Hollanda. Existe também o filme homonimo, disponível em video, baseado na pc9a. a Leitura extraclasse e análise literária de Macunaíma, de Mario de Andrade. (Veja sugestäo de roteiro para leitura e análise a seguir, a ser passado para os alunos.) Roteiro para leitura e análise de Macunaíma 1. Compaiando o herói Macunaíma, de Mario, ao herói Peri, de Jose de Alencar: a) explique por que Mario de Andrade faz uma revisäo crítica do indianismo romántico; b) apontc as semelhan9as existentes entre os projetos literários dos dois eseritores. 2. Releia o capítulo IX, 'Carta pras Tcamiabas'. Nele, a linguagem erudita e complexa, empregada parodicamente, visa erilicar certos setores da cultura brasileira. Identifique-os. 3. Por que se pode afirmar que cm Macunaíma existem influéncias do Surrealismo? Retire elementos da obra que comprovem sua resposta. 4. A propósito das trěs ra9as - o índio, o bianco e o negro - fundamentais da forma9äo étnica nacionál: a) Qual a versäo dada na obra para a origem das ra9as? b) Qual a origem dessa versäo? 5. O universo da magia, da religiäo e do misticismo assume papel de capital importáncia na obra, pois é ele que dá coeréneia a um mundo lendário e absurdo. a) Se, em muitas dessas lendas indígenas que integram Macunaíma, o absurdo é incorporado com naturalidade, por que se pode afirmar que o Surrealismo näo foi uma descoberta exclusiva de André Breton, em 1924? b) Qual é a religiäo de Macunaíma? c) Qual a semelhan9a entre essa postura da personagem e a postura dos brasileiros em geral diante da religiäo? d) Que possíveis explica9Öes de ordern histórica e cultural se podem atribuir a esse fenómeno? 6. Releia o capítulo XVIT, 'Ursa Maior'. Lembrando que Vei, a Sol, pode ser tornáda como símbolo de tropicalidade: a) Por que se pode afirmar que nesse capítulo Vei se vinga de Macunaíma? b) O que podem simbolizar as "águas frias" em que Macunaíma se jógou, induzido por Vei? 7. Justifique, com todos os elementos possíveis da obra, por que Macunaíma é uma obra nacionalista. 8. A personagem Macunaíma já foi comparada pela crítica á personagem Leonardo Filho, da obra Memórias de um sargento de milicias. Em que se assemelham? 9. Mario de Andrade minca aderiu completamcnte a nenhuma corrente ou movimento surgidos na época; participou mais como colaborador de seus órgaos de divulga9äo, mas sempře rejeitou rótulos. Publicada em 1928, mas eserita em 1926, Macunaíma apresenta, de fato, vários pontos de contato com o Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade, e, embora obra de concep9ao anterior ao manifesto, Oswald vřu nela a realiza9äo de sua conccp9äo antropofágica de cultura brasileira. Busque pontos de contato entre as idéias dos manifestos de Oswald de Andrade e Macunaíma. 30 10. Sugere-se como atividade complementar que se assista ao filme Macunaima, dirigido por Joaquim Pedro de Andrade, e posteriormente se fa9a uma compara9ao entre a ficgao e o cinema, ambientado nos anos 60. O filme pode ser encontrado com facilidade em vidcolocadoras. Para a realiza9ao desta atividade, e necessario que toda a classe proceda a leitura integral da obra; posteriormente, individualmente ou em grupo, os alunos devem responder as questSes propostas no roteiro e, em dia a ser combinado, expor os resultados do trabalho num amplo debate a ser realizado por toda a classe. Ao termino do debate, sugcrc-sc a clabora9ao dc um paincl com as melhoies respostas e as conclusoes finais. Para sanar as dificuldades de vocabulario e permitir um estudo da obra com maior acuidade, sugere-sc que sejam lidas, ou ao menos consultadas, estas obras: Macunaima, o heroi sem nenhum cardter, edi9ao critica de Tele Porto A. Lopez, publicada em 1978 pela editora Livros Tecnicos e Cientificos e pela Secretaria da Cultura, Ciencia e Tecnologia de Sao Paulo, e Roteiro de Macunaima, de M. Cavalcanti Proen9a, editada pela Civiliza9ao Brasileira. Como apoio bibliografico, sugcrimos: a 'Gucrra de Canudos... e o sertao virou um mar de sangue', reportagem em Superinteressante, n? 11, novembro/93.- - a Canudos, o campo em chamas, de Marco Antonio Vila. Sao Paulo, Brasiliense, 1993. a O Pre-Modernismo, de Alfredo Bosi. Sao Paulo, Cultrix, 1973. a 'Os olhos, a barca e o espelho' (sobre Lima Barreto), arligo em A educacao pela noite e outros ensaios, de Antonio Candido. Sao Paulo, Atica, 1989. a A literatura infantil, de Jesualdo Sosa, Sao Paulo, Cultrix/Edusp, 1978. a Movimentos da vanguarda europeia, de Lucia Helena. Sao Paulo, Scipione, 1993. a Futurismo: uma poetica da modernidade, de Annateresa Fabris. Sao Paulo, Perspectiva/Edusp, 1987. a Vanguarda europeia e Modernismo brasileiro, de Gilberto Mendon9a Teles. Petropolis, Vozcs, 1983. a Modernismo brasileiro e vanguarda, de Lucia Helena. Sao Paulo, Atica, 1986. » A Semana de Arte Modema, de Neide Rezende. Sao Paulo, Atica, 1983. a Arte modema, dc Giulio Argan. Sao Paulo, Cia. das Letras, 1993. a Do Pau-Brasil a Antropofagia e as Utopias, de Oswald de Andrade. Rio de Janeiro, Civiliza9ao Brasileira, 1978. a 'Dialetica da malandragem', artigo de Antonio Candido, em Revisla do Instituto de Estudos Brasileiros, n? 8. Sao Paulo, Edusp, 1970. CAPÍTULO 25 - O Pré-Modernismo Pense e responda (p. 267) 1. A natureza do sertäo nordestino mostra-se rude, seca e poueo receptiva ao hörnern. 2. Porque, de um lado, mostra-se forte e impulsivo; de outro lado, mostra-se, ílsicamente, frágil, além de apático. 3. A guerra a que se refere o autor é a da necessidade de trazer o sertanejo para a civiliza9äo, de incorporá-lo á vida do pais. 4. a) "Näo tem o raquitismo exaustivo dos mestÍ90s neurasténicos do literal." b) Porque o enfoque do autor é nitidamente determinista. Partindo da análise das condi9Öes do r meio natural ('A terra'), o autor passa a analisar o homem, seus comportamentos e seu meio / social ('O homem'). Na terceira parte ('A luta'), a guerra é vista como o resultado dessa intera9äo do homem eom o meio. c) As causas reais säo a miséria, a ignorancia, o fanatismo religioso (advindo das duas primeiras) e a marginaliza9äo política a que ficaram sujeitos os nordestinos do sertäo. Pense e responda (p. 270) \ 1. a) Seu amor pelo pais, indo trabalhar míma repartijjäo do Exército para estar mais ligado aos I interesses da patria; além disso, seu interesse por geografia, história, riquezas naturais, a lingua tupi ludo que estivesse relacionado ao pais. 31 1« b) As pessoas, em parte, o admiram e respeitam, mas, em parte, nao o levam a sério e o ridicularizam. 2. a) Prineipalmente a classe média. Sao mostrados funcionários públicos, gente assalariada. b) Sim, por parte do doutor Segadas, que náo via razáo em Policarpo se interessar por livros, uma ve/ que nao era formado. 3. A zombaria dos colegas da reparticao prenuncia o "triste fim" da personagem. Idealista, ufanista, Policarpo sonha com um destino grandioso para a nacao, sem notar que sua acao é isolada, pois a maioria das pessoas está interessada em seus problcmas particulares. Pense e responda (p. 274) 1. Sai-se muito mal, porque nao resultam em uma vida melhor: náo planta (o lavrador), só vcnde o que a natureza ofcrccc (o mercador) e pensa (o filósofo) que "nada paga a pena" porque a terra nao é sua. 2. O lato de consumir e vender o que a natureza oferece e de nao promover nenhuma melhoria em sua casa. 3. A falta de uma reforma agrářia que garantisse a posse da terra ao pequeno trabalhador rural. 4. Como a vida que leva é semelhante á de seus pais e avós, pensa que sempře foi e sempře será assim, Nao vale a pena mudar. "De qualqucr jeito se vive." Pense e responda (p. 276) 1. a) "carbono", "amoníaco", "epigénesis", "hipocondríaco", "verme", etc. b) Os trés prňneiros vocábulos citados acima provém da ciéncia, particularmente da Química. 2. a) Encara a vida e a si mesmo de forma pessimista, pois entende que o homem é materia, química, e tudo caminha para a destruicao. b) A mořte é enfocada como um fato natural, como sendo o destino final e fatal de toda forma de vida. Cabe ressaltar também a crueza com que a mořte é tratada, representada pela imagem do verme a comer "sangue podře". 3. Embora o título contenha a palavra Psicologia, o poema detém-se a tratar da materia, das substáncias químicas que formám o eu, evitando maior introspeccao. Apesar disso, é possível constatar o negativismo interior do eu lírico, que se considera "vencido"'cm virtude da fragilidade fisica do ser humano e da forca implacávcl da mořte. 4. Sim, porque a condicao humana retratada pelo poema (constituicao e fragilidade fisica do ser humano, fatalidadc da mořte) nao é exclusiva do eu lírico, mas universal. 5. A característica naturalista do poema está no cientificismo; a característiea simbolista encontra-se na visito mórbida, pessimista e decadentista do eu lírico sobre a vida. CAPÍTULO 26 - A arte moderna: liberdade e acäo Pense e responda (p. 287) 1. As estrofes 1, 2, 4 e 5 veiculam erítieas, e as estrofes 3 (com excecao do 1? verso), 6 e 7 apresentam propostas. 2. a) Critica a ľalta de espontaneidade dos poetas do passado, bem como a sua atitudc buroerática e formalista perante a poesia. b) O Parnasianismo. 3. a) O terceiro e o quarto versos do poema servem de exemplo, porque, sem nenhuma preocupacäo com rilmo ou métrica, säo bastante longos. b) O emprego da palavra clown é um barbarismo, do tipo estrangeirismo. 4. a) Porque, desprendidos de valores sociais, seu lirismo é mais auténtico. b) O lirismo tem de ser, antes de tudo, profundo e verdadeiro. 5. Todas as correntes fizeram uso dessas tčenicas. Contudo, as primeiras a defenderem esses procedimentos ľoram o Futurismo e o Expressionismo. a CAPÍTULO 27 - O Modernismo no Brasil Pense e responda (p. 299) 1. a) A propria critica a poetas do passado, identificados como "sapos"; a prova vel referencia ao pai de Olavo Bilac, herói na Gucrra do Paraguai; o emprego de expressôcs como "parnasiano aguado", "Falam pclas tripas", etc. b) A critica é fcita ao Parnasianismo e á sua concepcäo formalista de arte, conforme demonstra a expressäo "parnasiano aguado" e os versos "A grande arte é como / Lavor de joalheiro". c) O principio da perfeicäo formal. 2. Resposta pessoal. (Provavelmente o ceticismo dos parnasianos se dá cm decorréncia do rumo que a poesia tomou no século XX; ou seja, eles consideram que a verdadeira poesia - a parnasiana -morreu.) 3. a) Por meio de expressôes ou de versos bastante ritmados, que tem uma ľuncäo onomatopéica no texto, como "Näo foi - Foi - Nao foil". b) O sapo-cururu é o mais comum dos sapos brasileiros. c) O sapo-cururu pode simbolizar o nascer de uma nova arte brasileira, simples, cotidiana e á parte da "grita" académica. Pense e responda (p. 307) 1. a) Rejeitando a catequese crista, o texto I preíére ver a religiäo brasileira como o resultado de nossa antropofagia cultural, isto é, a mistura dc várias influéncias. O texto II defende um catolicisuio tolerante. b) O texto 1 vé o indio como vitima do processo de colonizacäo e catequizacäo; exalta a antropofagia ensinada pelo indio. O texto IT, ao defender "a igualdade dos povos e das racas", näo reconhece a violéncia sofrida pelo indio, considcrado uma das bases da etnia brasileira e simbolo da nacionalidade. c) O texto T, especialmente no ultimo parágrafo, deixa claro que, na visäo do autor, as instituigôes sociais säo falsas e opressoras. O texto II defende a renovacäo do pais, aceitando "todas as instituigôes conservadoras". 2. O texto I defende um nacionalismo erítico, isto é, a valorizagäo näo ufanista da cultura brasileira misturada a urna "devoracäo" da cultura estrangeira. O texto II defende um nacionalismo ufanista, mostrando preocupacäo quanto á construcäo de um pais com pluralismos ideológico, religioso, racial e politico. CAPÍTULO 28 - Os Andrades: demolicäo e construeäo Pense e responda (p. 312) 1. a) A portuguesa. b) Säo a base dc nossa formaeäo étnica. 2. a) Sugcre a realidade do indio pos-colonizaeäo: em vez de ser um "indio forte, filho do nořte", o indio brasileiro é filho da mořte, o que sugere a destruicäo e a morte trazidas .pelo branco colonizador. Esse verso demonstra o tom irönico-critico de Oswald em relacäo ao nacionalismo ufanista. b) Paródia. 3. Todo o poema é permeado pelo tom piadístico e irónico. Destacam-se estes aspeclos: o portugués, ao chegar ao Brasil, pergunta ao indio sc ele é cristäo; o indio responde com verso de Gongalves Dias; o negro que sai da fornalha; e a origem de nosso carnaval. 4. a) Ao carnaval. b) Sendo resultado do cruzamento de racas e culturas, o carnaval é visto como a verdadeira expressäo da cultura brasileira, como um fato religioso. 5. (Espera-se que o resultado musical obtido seja associado ao carnaval. A relagäo entre o título e o carnaval reside na visäo do autor de que o Brasil, em todos os seus aspectos - raciais, culturais, lingüisticos, religiosos, etc. -, consiste em um grande carnaval.) 33 Pense e responda (p. 322) 1. a) origem indígena e) origern popular b) origem africana d) origern regional, nordestina 2. O emprego de uma lingua popular, coloquial e ás vezeš regional; a ulili/aeíio de modinhas populäres; o gosto pelos provérbios ("■■■ Pouea saúde [...]"). 3. Os melhores exemplos estäo no paragrafe- que se inicia por "Quando a jacumä de Vei..." e no seguinte, cm que o Rio de Janeiro é chamado de "maloca sublime" e árvores de pau-brasil convivem com palácios de cor na avenida Rio Bianco. 4. Macunaíma, nesse texto, como em loda a obra, mostra-se sensual, oportunista, preguifoso e volúvel. 5. a) Que Macunaíma näo tem caráter. b) A crítica é feita ao gosto e ao interesse dos brasileiros por tudo o que é estrangeiro. c) Resposta pessoal. (Para Mario de Andrade, o eomportatnento da personagem é resultante do recente hibridismo étnico e cultural dos povos latino-americanos, que, por isso, näo těm traditio.) CAPÍTULO 29 - Manuel Bandeira e Alcantara Machado Pense e responda (p. 328) 1. a) Interessa-lhc o Recife que habita a sua memoria: o Recife de sua infáncia. b) Uma postura subjetiva. 2. Há um cruzamento de pontes de vista. Ao mesmo tempo que ocorre o distanciamento do adulto ("Meu avö morto. Recife morto..."), o eu lirico revive, por meio da memoria, as cenas do passado, como se fosse menino outra vez ("Uma pessoa grande dizia:"). 3. As brincadeiras de roda com suas cantigas infantis, os pregňes, as ereni;as e festas populäres, os nomes de ruas, etc. 4. A falta de pontua9ao sugere, no primciro verso, a rapidez das a^öes; no segundo, a violéncia das águas durante as cheias. O segundo verso enumera caoticamente, no decorrer de um verso longo, várias coisas carregadas pela cheia; sugere, portanto, a ar;äo da cheia, que passa de uma só vez, arrastando tudo caoticamente. 5. a) É a lingua espontánea e natural falada pelo povo. b) As pessoas cultas: cscritores, leitores, professores, etc. c) Sim, pelo emprego que faz de uma lingua coloquial, em que ressaltam palavras populäres, como "midubim" e "macaquear". 6. a) Porque, tendo morrido o avö - uma das figuras centrais da mitologia de sua infäncia -, morre- Ihe também o Recife de sua memoria, b) mclancolia, nostalgia, tristeza Pense e responda (p. 330) 1. a) O cá para Gonyalves Dias é Coimbra, onde ele estudava, e o hi é o Brasil idealizado. Para Manuel Bandeira, o cá é a realidade conereta (certamente no proprio Brasil), e o lá é a realidade desejada. b) Ambos idealizam o lá, por entenderem que lá a vida seťá melhor e poderäo set' felizes; e ambos eriticam o cá, onde tudo é mais feio ou oprime. (Entretanto, cabe ressaltar para o aluno o tato de o lá de Goii9alves Dias - o Brasil - ser o cá de Manuel Bandeira, do qual este quer fugir.) 2. Certas agöes simples do cotidiano - andar de bicicleta, subir em pau-de-sebo, etc. -, näo podendo mais ser realizadas pelo poeta em virtude de sua tuberculose, passam a figurar no mundo idealizado de Pasárgada. 3. O emprego de palavras e expressčes como "Vou-me embora", "brabo", "pra", "no tempo dc eu menino". Formalmente se evidencia a redondilha maior, verso de longa tradÍ9ao popular. 4. Principalmente os versos "Que Joana a louca de Espanha / Rainha e falsa demente / Vein a ser contraparentc / Da nora que nunca tive". 5. De acordo com o texto, Pasárgada lem uma funfäo escapista para o cu lirico, ou seja, projetando-se nela, o eu lirico evita a vontade de se matar. Pense e responda (p. 336) 1. A linguagem cinematográfica. 2. O sexto parágrafo. 3. a) O nome das personagens, as gravatas dos irmäos mais velhos, verde e vermelha; a tia cantando opera ("Ahi, Mari!"); a fala "Subito!" (rápido), da mäe; a referenda ao Palestra Futebol Clube ("Palestrino"), etc. b) Morar na rua Oriente, em Säo Paulo, antigamentc habitada por imigrantes italianos; a "ralé"; andar de bonde; jogar no bicho; o irmäo trabalhar na fábrica; o jogo de futebol na rua com bola de meia; as flores pobres cobrindo o caixäo, etc. 4. a) "Entäo voce näo vai amanhä no enterro. Eu vou!" b) Nome de personagem (Beppino, Peronneta, Nino, etc.); o título da opera "Ahi, Mari!"; a palavra "Subito". 5. O desejo de ascender na escala social. Como imigrante italiano marginalizado, queria ser aeeito, afirmar-se na sociedade brasileira. 6. Dentre outras interpreta9Öes, pode-se considerar Gactaninho como sujeito da a9äo (o menino atropelou / amassou o bonde, preeipitando-sc sob as rodas do veiculo) e, ao mesmo tempo, paciente da a9äo (o menino foi atropelado / amassado / morto pelo bonde). A ambigüidade da expressäo "Amassou o bonde" suaviza a crueza do espetáculo; a ironia suaviza a piedade. Em dia com o vestibular (p. 338) 1. a) Os sertdes - Ettclidcs da Cunha b) Säo trés partes: A terra', 'O homem' e A luta'. 2. a) Nesse capitulo, Quaresma perde a ilusäo que tinha em rela9ao á República, pois passa a ver a podridäo que a sustentava. b) Quaresma vc as torturas e os assassinates cometidos contra os prisioneiros de guerra. Revoltado com essas injustÍ9as, escreve uma carta a Floriano Peixoto, denunciando-as. Como consequěncia, é condenado ao fuzilamcnto, por trai9äo. 3. A literatura extraída do cotidiano, da vida presente, conforme a frasc do Oswald de Andrade em seti manifesto da Poesia Pau-Brasil: "A poesia existe nos fatos". 4. "Uma noite ele chegou no bar". "O verbo chegar rege a preposi9äo a. Deveria ser, portanto: "Uma noite ele chegou ao bar". 5. Todo o poema é construído por oposÍ9oes. Uma delas está no apelido da personagem, "Joäo Gostoso", que stipoe čerta popularidude e até superioridade, em oposÍ9ao ao sen Irágico e banal destino: morrer afogado na Lagoa, depois de uma bebedeira. 6. c 7. e 8. d 9. b 10. b 11. d 12. a 13. d 14. b 15. b 16. b .17. d . 18. e 19. c 20. c 21. o formalismo parnasiano - modernista 22. a) Márió de Andrade b) Paulicéia desvairada (poesia); Macunaíma (rapsódia) Unidade 9 Nesta unidade é estudado o regionalismo de 30,-com ánfase no romance nordestino e no terna da seca. Poderäo ser propostos alguns ternas para pesquisas, seminários e trabalhos eriativos, com a flnalidade de aprofundar os conteúdos e envolver de forma direta os alunos. A título de sugostäo, eis alguns desses temas: • As seeas no Nordeste brasileiro: causas geográficas, cielos, principals secas ocorridas, conseqiiéncias geopolíticas, etc. a Influěncias do Realismo e do Naturalismo, do século passado, no romance de 30 do século XX. Observa9äo a partir de obras como Vidas secas, de Graciliano Ramos, O Quinze, de Rachel de Queiroz, e Fogo morto, de Jose Lins do Rego. » Painel literário das obras que abordam o tema da scca: O Cabekira, de Franklin Tavora;A bagaceira, de José Américo de Almeida; O Quinze; Vidas secas; Seara vermelha, de Jorge Amado; 0? Corumhas, de Armando Pontes; e Mořte e vida severina, de Joao Cabral de Melo Neto. • Diferencas enlre a obra Vidas secas e o filme homónimo de Nelson Pcreira dos Santos, bascado na obra de Graciliano. . n r\ a O renómeno do cangaco na cultura brasileira: razoes sócio-economicas e reílcxos na cultura. U cangaco em Pedra Boniía, de José Lins do Rego, e no filme O cangaceiro. 9 A Bahia de Jorge Amado. Painel sociocultural tracado pelo autor em obras como Capitaes da areia, Terras do sem-fim, Dona Flor e sens dois maridos e outras. Aproveitar o material existente cm video. Relational- com o movimento de redescoberta da Bahia e dos movimentos afros, que vem acontecendo desdc 1993; com Daniela Mercury, Olodum, Timbalada e outros. • Outras vertentes do romance de 30: o romance introspectivo dc Lúcio Cardoso, em Maleila e Crónica da casa assassinada, e de Dionélio Machado, em Os ratos; e o romance de influencia surrealista de Jorge de Lima, em O Anjo. • O emprego e a inrportáncia da técnica do discurso indireto livrc nos romances de 30. Tomar como base Vidas secas, de Graciliano Ramos, e Fogo morto, de José Lins do Rego. Como apoio bibliográfico, sugerimos: s 'A ticcao' (para o tema da seca), de Alfredo Bosi, em História concisa da literatura brasileira. Sao Paulo, Cultrix, 1975. . 'A Revolucap de 1930 e a cultura', de Antonio Candido, em A F.ducapdo pela notte & outros ensatos. Sao Paulo, Ática, 1989. . • Graciliano Ramos, organizada por Sónia Brayner. 2' ed. Rio dc Janeiro, Cmlizacao Brasileira, 1978. • 'Vidas secas: romance e fíta', dc Neusa Pinsard Cacccsse, em Graciliano Ramos. » 'O estilo indireto livre em Graciliano Ramos', de Fábio Freixeiro, em Graciliano Ramos. s 'Vidas Secas', de Affonso Romano de SanťAna, em Análise estrutural de romances brasileiros. 4" ed. Rio de Janeiro, Vozes, 1974. CAPÍTULO 30 - O romance de 30 Pense e responda (p. 350) 1. "Cinqüenta anos! Quantas horas inúteis! Consumir-se uma pessoa a vida inteira sem saber para qué!"; "Estraguei a minha vida, estraguei-a estupidamente."; "Nem sequer tenho amizade a meu fílho. Que miséria!"; etc. 2. De sua profissäo e de seu modo dc vida. 3. Porque, embora angustiado, reconhecendo-se um hörnern duro, calejado, insensivel, Paulo Honório acha que näo conseguiria modificar-se. 4. Embora com saude, Paulo Honório, aos cinqüenta anos, sente-se velho, arrasado. Viveu sem objetivo, maltratando a si e aos outros. Criou "casca", embotou a sensibilidade, tornou-se bruto, egoista, desconfiado um aleijado. Näo consegue apiedar-se de niuguém, näo amou, nein se deixou amar, nem sequer tem amizade a seu filho. 5. A consciéncia da inutilidadc de sua vida: näo foi feliz, näo fez ninguém feliz; näo passa dc um bicho, um bicho que luta instintivamente pela sobrevivéncia, que acumula para as futuras geraeöes. . 6. "Deitar-me, rolar no colchäo até a madrugada, é uma tortura. Prcfiro ficar sentado, concluindo isto."; "De longe em longc sento-me fatigado e eserevo uma linha." 7. Fazer uma revisäo de sua vida, entender a si mesmo, "desembrutecer"; tentar justificar a inutilidade de scus esforcos, de sua vida. CAPÍTULO 31 - Rachel de Queiroz e José Lins do Rego Pense e responda (p. 355) 1. a) "Eles tinham saído na véspera, de manhä, da Canoa"; "E foram andando á toa, devagarinho, costeando a margem da caatinga." b) "Cordulina, que vinha quase cambaleando"; "O cabelo, em falripas sujas, como que gasto, acabado"; "q Duquinha, também só osso e pele, levava, com um gemido abafado, a mäozinha" , 2. Os retirantes es'täo n um a estráda, costeando a margem da caatinga. A vegetagäo compôe-se de galhos secos, há pedras, o sol é intenso. 3. a) Deixa cair a faca com a qual descarnara a cabra e, de cócoras, tenta explicar-se confusamente. b) Porque pensa na mulher e no filho mais novo, sentados numa pedra, já desfalecidos pela fome. 4. Apesar da humilhaoäo, da amargura, do ánimo abatido, da lembranca da mulher e do filho quase mortos dc fome e da possibilidade de, mesmo com comida täo ruim, sobreviver mais um pouco, o sertanejo encontra forgas para se erguer c continual' lutando pela vida. Pense e responda (p. 359) 1. a) O fato de o povo falar de sua decadéncia cconômica; o fato de haver no engenho um monulor que, expulso dali por ele, reeusa-se a sair de suas terras e é protegido pelo cangaceiro; o fato de aconselharem Lula a näo pedir providéncias ás autoridades. b) A perda da autoridade do senhor de engenho, alem de provocar o deserédito da comunidade, permite que o cangaceiro Antonio Silvino e seu bando invadam o engenho e revolvam tudo em busca de ouro, aterrorizando os moradores, c) "O carro näo podia mais rodar, de podre que estava"; "Os cavalos näo agiientavam mais com o peso do corpo."; "O engenho se arrastava na safra de quase nadá. Mas ainda moia."; "Pobre gado, meia dúzia de reses. O moleque que o pastoreava gritava pani os bois velhos." 2. a) As pessoas o temem e, com medo de sofrer represálias, acabam por lhe dar tudo o que tém. Apenas o Capitäo Vitorino o enfrenta. b) Com a autoridade de um senhor de engenho rico e poderoso. c) Capitäo Vitorino indigna-se ao ver os cangaceiros agredirem pessoas indefesas, como o Coronel Lula e sua família, e, ainda assim, serem tratados com respcito pelo coronel José Paulino. 3. Elc enfrenta os cangaceiros com coragem e ousadia, exigindo de Antonio Silvino que "respeite os homens de bem". Reprova a atitude do coronel José Paulino, promete buscar justica, dizendo que vai telegrafar ao Presidente para contar tudo. 4. Dentre outros exemplos: "Deixa ele comigo, Beija-Flor"; "Pois eu lhe agradego, Capitäo"; "Quase que näo podia falar". CAPÍTULO 32 - Jorge Amado c Érico Veríssimo: o regional e o urbano Pense e responda (p. 365) 1. a) Infiltra-sc na vida cotidiana deles, ganha-lhes a confianca, envolve-se em suas discussoes e conversas, oferece "seu conhccimcnto militar, de capitäo que tomiira parte em mais de oito revolucoes" na disputa pela posse da mata do Sequeiro Grande. Alem disso, percebendo que Ana Badaró está apaixonada por ele, sente-se como um hörnern dos Badarós, como alguém da família. b) Aos jaguncos. Näo tém raizes, väo chegando näo se sabe de onde. Alguns abarroliun as casas dos trabalhadores, outros dormem nos dcpósitos de cacau, outros se espalham pela varanda da casa-grande. Poucos chegam montados, a maioria vem a pé. Säo servis, esperam ordens do Sinhó Badaró. c) "Os trabalhadores gemiam sous cantos nos dias de trabalho, seus cantos de servidäo e de amor impossível" 2. a) Nas cancöes tristes dos trabalhadores: "Vida de negro é dificil / É dificil como qué..."; "Eu quero morrer de noite / Bem longe, numa tocaia... / Eu quero morrer de acoite". b) O primeiro paragrafe e, no ultimo paragrafe, o trecho "eram os jaguncos que vinham, mandados por Teodoro, reerutados por Juca, mandados pelo cabo Esmeraldo, dc Tabocas, ou por seu Azevedo". )1 Pense e responds (p. 368) 1. a) É um hörnern de caráter, impetuoso, decidido, corajoso, amante de brigas, destemido, admirado por todos, "um hörnern impossivei". b) Sim, porque o gaúcho tem todo um passado de luta pela posse da terra e de luta com a terra, no sentido de torná-la produtiva. 2. a) O Cel. Ricardo Amaral e sua família. b) É um mundo de dišputa entre famílias pelo poder politico e pelo poder econômico. 3. a) Ä luta entre federalistas e republicanos dc 1893. b) Em nome do Gen. Bcnto Goncalves e pela vitória dos republicanos sobre os federalistas. Em dia com o vestibular (p. 369) 1. a 2. a 3. b 4. a) Jose Lins do Rcgo; Fogo morto; decadéncia do engenho e asecnsäo da usina b) Graciliano Ramos; Säo Bernardo; degradagäo do hörnern em sua luta incessante pela asecnsäo social c) Jose Américo de Ahneida; A bagaeeira; a hostilidade da nature/.a contra os retirantes. Na coleta do material, devem ser estabelecidos criterios para a fixagao de um roteiro. Por exemplo, o criterio podera ser o da seqiiencia lemporal da producao do poeta ou dc certos micleos lematicos de sua obra. A criagao de um cenario, o acompanhamcnto por instrumentos musicais, em especial o violao, e a participagao dc pessoas que tenham facilidade ou gosto pclo canto e pela declamagao enriquecerao o trabalho. Apos a montagem e os ensaios que se lizerem necessarios, o espetaculo devcra ser apresentado a classc e a toda a escola, se possivel. Como apoio bibliografico sugerimos as obras: a Carlos Drummond de Andrade, de Rita Chaves. Sao Paulo, Scipione, 1993. • Carlos Drummond de Andrade, organizada por Sonia Brayner. 2- ed. Rio de Janeiro, Civilizacao Brasileira, 1978. • Carlos Drummond de Andrade, Silviano Santiago. Petropolis, Vozes, 1976. • 'Inquietudes na poesia de Drummond', de Antonio Candido, em Vdrios escritos. Sao Paulo, Duas Cidades, 1970. • 'Sobrc uma fase de Carlos Drummond de Andrade', de Antonio Houaiss, em Sets poetas e um problema. 3s ed, Rio de Janeiro, Imago, 1976. • Carlos Drummond de Andrade, de Affonso Romano de Sant'Ana. 3" cd. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1980. • Poesia e poetica de Carlos Drummond de Andrade, de John Gledson. Sao Paulo, Duas Cidades, 1981. Unidade 10 Nesta unidade é estudada a poesia de 30 no Brasil. O professor poderá propor alguns tcmas para pesquisas, seminários e trabalhos criativos, com a finalidade de aprofundar os conteúdos e envolver de forma direta os alunos. A título de sugestäo, eis alguns desses temas: s Recital a partir da obra de Carlos Drummond de Andrade, com declamacäo de poemas e comentários explicativos, tomando como base as fases dc sua obra e os pocmas mais representativos de cada uma. e A presenca da guerra na poesia de Carlos Drummond de Andrade, com declamagäo de poemas c comentários explicativos. a A presenca do amor na poesia de Carlos Drummond de Andrade, com declamacäo de poemas e comentários explicativos. • Jogral, recital poético ou peca teatral baseados no Romanceiro da Inconfidéncia, de Cecilia Meireles. (Veja orientacäo apresentada a seguir.) Cecilia Meireles: jogral, recital poético ou peca teatral Após fazer uma leitura da obra Romanceiro da Inconfidéncia, os alunos dcveräo, sem perder a idéia de seqiiencia da narrativa, escolher algumas de suas partes, que sejam bastante fortes e envolventes, para sercm apresentadas a um publico. Dividido o texto entre os integrantes dos grupos, cada aluno deverá memorizar sua parte e, postcriormente, fazer a leitura drainática do texto, atentando para entonacäo, a marcacäo, a impostacäo de voz. No decorrer dos ensaios, o grupo poderá optar por um recital, um jogral ou uma peca teatral. Convém também que os alunos pesquisem, na area de História, sobre a Inconfidéncia Mineira, suas idéias e seus participantes, a fim de ficarem mais inteirados do assunto. « "Show Vinicius de Moraes", tomando como base poemas e. músicas do poeta. (Veja secäo Fique ligado! Pesquise! e orientacäo apresentada a seguir.) "Show Vinicius de Moraes" Vinicius de Moraes realizou, ao lado dc ilustres nomes da música popular brasileira, maravilhosos shows poético-musicais, em que ele próprio dcclamava e cantava muitas de suas composicocs. Sugere-se que um ou mais grupos da classe fagani uma pesquisa em livros e discos de Vinicius, a fim de collier material para uma apresentacäo poético-musical que consista em cantorias e declamagôes. 38 CAPÍTULO 33 - A poesia de 30 Pense e responda (p. 376) 1. O poema apresenta sete estrofes que, aparentemente, nada tém a ver entre si. Essa desvinculacäo entre elas explica o título do poema. 2. Cubismo e Futurismo, princip a Imente. 3. Os anjos bíblicos geralmente säo bons, prenunciam coisas boas e auxiliam as pessoas a encontrar o melhor caminho; enfim, säo "anjos de luz". O anjo que aparece ao eu lírico é o contrario disso: é "torto", vive "na sombra" e lhe prediz um futuro gauche. 4. a) O mundo mostra-sc vazio, superficial; as relacöes humanas parecem ser mediadas apenas pelo desejo. b) O eu lírico procura distanciar-sc e colocar-se numa postura crítica, atendendo á sua conscicncia. Contudo, talvez se possa vislumbrar uma atragäo por esse mundo no verso "Para que tanta perná, meu Deus, pergunta meu coragao". 5. a) Ambos se sentem vítimas de seu próprio destino, um destino gauche, que envolve contradicôes com a realidade. b) Porquc, de acordo com esse verso, Cristo era Deus e sabia que sua morte era necessária para a causa que defendia. O gauche, porém, é apenas um fraco que näo vé perspectivas para o seu confronto com o mundo. 6. a) Para o desencontro com a realidade. b) Sim. Orgulhoso e individualista, o eu lirico sente-se superior em relacäo ao mundo que considera errado. Sua postura, contudo, é apenas dc distanciamento. 7. a) Resposta pessoal. (Sem dúvida, há várias possibilidades, que väo do leitor ao Cristo, á pessoa amada e até ao "hörnern atrásdo bigode". Achamos mais coerente com o poema a interpretaeäo de que seja o leitor. E importante, nesse momenta, abrir a discussäo para outras interpretacoes e buscar a coeréncia de todo o texto.) b) Resposta pessoal, que seja coerente com o item anterior. (Supondo que o tu seja o leitor, pode-se interpretar assim: o poeta, sem que devesse, abre o segredo da eriacáo do próprio poema. O poema näo quer dizer nada de sério, é apenas tru to de uma bebedeira, da solidäo e de uma noite de luar. Nesse caso, teríamos também um autor gauche, porque näo se revela esse segredo ao leitor. Aceita essa hipótese, é importante perceber a propria irónia do poeta liesses versos, porque, é claro, ele está blefando. O poema näo é uma besteira, pois trata de assuntos sérios, que seräo amplamente aprofundados pelo autor mais tarde.) 39 Pense e responda (p. 380) 1. a) O eu lírico agora perccbe que o mundo é grande, ou seja, é mais importante do que ele, "Näo, meu coragäo näo é maior que o mundo" ou "Tu sabes eomo é grande o mundo" e outros. b) Preocupa-se com os problemas do mundo, deseja participar deles. 2. Considera sua postura individualista, inconseqiiente, que näo levava a nada, a näo scr ao empobrecimento do proprio ser humano. 3. a) O isolamento ou a indifcrcnga perante os problemas do mundo. b) Sim, considerada a sua atual disposicäo de participar da transformacäo do mundo. c) Resposta pcssoal. (O Togo pode associar-se tanto á idéia de paixäo como ä da propria gucrra, o contexto histórico do poema.) d) A palavra iws, que näo apenas inclui o eu lírico, mas também traduz o sentimente de compromisso coletivo perante a causa social. CAPÍTULO 34 - Murilo Mendes e Jorge de Lima Pense e responda (p. 389) 1. O cu lírico sente-se plenamente integrado ao universo e á forga divina que o rege. 2. a) Buscando conciliar elementos opostos, o eu lírico compreende que o mundo material é apenas uma das manifestagöes do mundo espiritual. b) Dens é a forga que rege o universo. 3. a) Revela-se nessa estrofe um coneeilo sensual de religiäo. b) A materia é a base da criaeäo: criaeäo da vida, dos pensamentos divinos e da arte. 4. Resposta pessoal. (Uma expücagäo possřvel é a de que o poeta revela neste texte o seti conceito particular de religiosidade e de espírito, segundo o qual materia e espírito näo se exeluem, sendo apenas expressöes diferentes da mesma ordern universal.) Pense e responda (p. 393) 1. a) Säo vários os motivos alegados: atrapalharia as naus, devoraria o gado, seria um demónio, teria trazido a enchente, comido os cordeiros, etc. b) Resposta pessoal. (Entrc outros, podem-se citar: incompreensäo e egoísmo htimanos; medo do desconhecido; incapacidade de conftar.) 2. Todos os seres mencionados säo pessoas que, por diferentes razčes, se colocam á margem da sociedade, residindo nisso a sua semelhanca com a ave. 3. Em razäo do sacrificio da ave e de seu flagelo, ela pode representar a figura e o saeritício de Cristo, a história do proprio eristianismo e a luta entre o bem e o mal. 4. Resposta pessoal. CAPÍTULO 35 - Cecilia Meireles e Vinícius de Moraes Pense e responda (p. 399) 1. A linguagem do poema diferencia-se bastante da empregada pelos modernistas da primeira geraeäo, por apresentar versos reguläres e maior preocupagäo vocabular e formal em geral. Portanto, a poesia liga-sc á tradicäo poética anterior ao Modernismo de 22. 2. A beleza e a fragilidade. 3. O fato dc cantá-la em seu verso. 4. a) Como a rosa, o eu lírico se sente efémero c frágil ("efémero / o rosto meu", "E frágil"). b) O eu lírico pode perpetuar-se por meio de seu canto poético, como, alias, ocorre sempře que lemos um poema de Cecilia Meireles ou de qualquer outro eseritor já falecido. Pense e responda (p. 405) 1. Os poemas estäo ligados á tradigäo clássica, uma vez que fazem uso do soneto, do verso decassílabo e possuem uma sintaxe e um vocabulário apurados. 2. a) aliteragäo: Ďranco, iruma, Aocas/y;ranto, espuma, espalmadas, espanto comparaeäo: pranto silencioso e branco como a bruma b) antítese c) "Antes, e com tal zelo, e sempře, e tanto" 3. a) Antes, tudo era bom; havia o riso, o beijo, a paixäo, a alegria, etc. O presente é ruim, o oposto do passado: pranto, espánto, pressentimento, drama, etc. b) A expicssäo enfatiza o espanto causado pela separagäo, isto é, o fato de tudo (er sido destruído mím repente. 4. a) Significant "angústia de quem vive" e "fim de quem ama"; ou seja, desilusäo, frustragäo. b) Resposta pessoal. (Sugcstäo: Talvez o eu lírico esteja extraindo um conceito particular de amor, baseado na sua experiéncia pessoal.) c) Como uma chama, o amor queima e ilumina, mas pode se apagar, tem duraeäo finita. d) Para o eu lírico, fidclidade é sinônimo de entrega total, mesmo numa relagäo provisória. Em dia com o vestibular (p. 406) 1. a) Representa uma esperanga contra todas as adversidades da vida. b) O poema pertence á fase social da poesia drummondiana (1939-45), momente em que ocorria a Segunda Guerra Mundial. 2. Em ambos os fragmentos o poeta procura aconselhar sobre a criagäo literária. No primeiro fragmento, o poeta aconselha pela negagäo: como näo deve ser feita a poesia; no segundo fragmente, usando o imperativo "ťenetra", o poeta aconselha sobre a criagäo poctica pela afirmacäo. 3. a) Carlos Drummond de Andrade - Modernismo (2a geragäo) b) O mundo passado, decadente, que naquele momento se destruía com a Segunda Guerra Mundial. 4. a) É a conscicncia da ľugacidade do amor e sua fragilidade. b) "Sabendo bem", "sabia bem tudo isso", "onda", "nuvem", "destino frágil" 5. a 6. d 7, d Unidade 11 Nesta unidade é estudada a literatura brasileira contemporänea, desde as producöes da década de 40 até as ultimas tendéncias na poesia, na prosa e no teatro. Com a fínalidade dc aprofundar os conteúdos e envolver de forma direta os alunos, alguns temas para pesquisas, seminários c trabalhos criativos poderäo ser propostos. Eis alguns desses temas: • O Concretismo: raizes e fronteiras. Ligagoes com o Futurismo, com o Cubismo e com a poesia de Drummond e Murilo Mendes. Presenga no Tropicalismo, nos anos 60, e na poesia contemporänea dos anos 70 até hoje. o Tropicalismo e Antropofagia: lagos de deglutigäo. Confronto entre as idéias da antropofagia cultural de Oswald de Andrade e as idéias tropicalistas dos anos 60. Identiticar e diseutir possíveis fcnômenos antropofágicos na cultura brasileira hoje. • Recital e análise da melhor poesia social brasileira: Drummond, Cabral e Ferreira Guliar. Apontar os principals temas e abordagens desenvolvidos poľ esses poetas. • Dramatizagäode Morte e vida severina, de Joäo Cabral de Melo Ncto, • Dramatizagäo de urna pega brasileira do século XX ou leitura extraelasse de pegas do teatro brasileiro moderno. (Veja relagäo de pegas sugeridas a seguir.) Pecas do teatro brasileiro moderno sugeridas para leitura 1. Deus the pague, Joracy Camargo 2. Triangula escaleno, Silveira Sampaio 3. Um denn dormiu lá em casa, Guilherme Figueiredo 40 41 4. Amanhä, se näo chaver, Henrique Pongetti 5. O esciavo, Lucio Cardoso 6. Um elefante no caos, Millör Fernandes 7. A farsa cla esposa perfeita, Edy Lima 8. Pluft, o fantasminha, Maria Clara Machado (infantil) 9. Vestido de noha, Nelson Rodrigues 10. O rei da vela, Oswald de Andrade 11. As mäos de Eurtdice, Pedro Bloch 12. Lampiäo, Rachel de Queiroz 13. Pedro Mico, Antonio Callado 14. Moral em concordata, Abilio Pereira de Almeida 15. Dois perdidos mima noite si/ja, Plinio Marcos 16. A moratoria, Jorge de Andrade 17. Revolupäo na America do Sul, Augusto Boal 18. Mořte e vida Severina, Joäo Cabral de Melo Neto 19. O pagador de promessas, Dias Gomes 20. O auto cla compadecida, Ariano Suassuna 21. Eies näo usam black-tie, Gianfiancesco Guarnieri 22. Rasga coraßäo, Oduvaldo Viana Filho 23. Gota ďágua, Chico Buarque de Hollanda e Paulo Pontes As peeas poderäo ser escolhidas on sorteadas, de modo a sérem todas distribuídas. Após a leitura, deverá ser promovido um painel cm que cada um comente sobre a obra que leu. • A prcsenca do poético na MPB dos anos 60-80. Sugere-se o estudo de músicas de Caetano Veloso, Chico Buarque de Hollanda e Milton Nascimento. e Música popular e literatura como forma de resisténcia polítíca. Autorcs que resistiram politicamente á censura e á repressíio durante o regime militar, entre os anos 60 c 80, como Geraldo Vandre, Chico Buarque, Milton Nascimento, Ferreira Gullar, Antonio Callado, J. J. Veiga, Plinio Marcos e outros. Como apoio bibliográfico, sugerimos: 9 Caetano Veloso. Säo Paulo, Abril Educacäo, 1981. Literatura Comentada. a Alegria, alegria, de Caetano Veloso. Rio de Janeiro, Ed. Pedra Q. Ronca, 1977. a Chico Buarque de Hollanda. Säo Paulo, Abril Kducacäo, 1980. Literatura Comentada. a Desenho mágico - Poesia e politico em Chico Buarque, de Adélia Bezcrra de Meneses. Säo Paulo, Hucitec, 1982. a Poesia conereta. Säo Paulo, Abril Educacäo, 1982. Literatura Comentada. a Algims aspeclos da teoria da poesia conereta, de Paulo Franchetti. Säo Paulo, Ed. da Unicamp. 1989. a Teoria da poesia concreto, de Augusto de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de Campos. Säo Paulo, Duas Cidades, 1975. a Poesia jovem - Anos 70. Säo Paulo, Abril Educacäo, 1982. Literatura Comentada. » Música popular e moderna poesia brasileira, de Affonso Romano de SanťAna. Petrópolis, Vozes, 1978. a 'Poesia jovem - Roteiro de velhas vanguardas á Tropicália e ao marginal mimeografado", de Silviano Santiago. Jomal do Brasil, 20/12/75. a 'Cultura e polítíca', de Roberto Schwarz, em O pai de família e outros estudos. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978. ' a 26 poetas hoje, de Ileloísa Buarque de Hollanda. Rio de Janeiro, Labor, 1976. CAPÍTULO 36 - A gerafäo de 45 Pense e responda (p. 416) 1. a) Uma dona de casa de classe média. b) Ana e o elemento organizador e aglutinador do lar, tarefa que encara como missäo. Hä um tom quase biblico nas referencias ao seu trabalho: "planlara as sementes", "cresciam ärvores", "sua corrente de vida". c) Porque, näo sendo täo requisitada pelos afazeres domesticos, inquietava-se. O seu papel familiar perdia importäncia e a sua identidade era posta em xeque. 2. a) Ver o cego mascar chicletes. b) Rcsposta pessoal. (Sugcstäo: De acordo com o sentido mais geral do conto, pelo tipo de vida que vinha levando, Ana era uma cega. Cega näo de visäo, mas de vida, de partieipaeäo social, por näo se descobrir como pessoa. Dai, talvez, a identificagäo com o cego.) 3. a) A rede familiar que ela mesma construira: a sua prisäo. b) A quebra dos ovos sugerc ruptura com aquela situacao familiar e, ao mesmo tempo, vida nova; pode scr o simbolo da conscientizaeäo de Ana sobrc sua condigäo. c) Depois do "despertar" provocado pelo cego, algo se rompera no intimo de Ana. As coisas que vinha fazendo perdem o sentido. / "Mas o mal estava feito." 4. a) Supöe-se que näo, porque Ana volta ao lar e reassume o seu papel. b) Talvez näo. Pode ser que a experiencia vivida por cla venha a se manifestar de modo mais concreto no futuro, depois de outras experiencias. c) Resposta pessoal. (Supöe-se que, ao ser conduzida pela mäo do marido, Ana reassuma seu antigo papel familiar c social de esposa e de dona de casa.) 5. Porque, partindo de Ana, a autora consegue provocar uma reflexäo sobre o papel da mulher na sociedade e sobre o desgaste das relacöes familiäres. CAPITULO 37 - Guimaräes Rosa: a linguagem reinrentada Pense e responda (p. 424) 1. a) O Jö biblico caracteriza-se pela enorme paciencia que tinha. Com J6 Joaquim näo e diferente. b) A alteracäo de nomes associa-se ä volubilidade amorosa e moral da personagem. 2. Jö Joaquim luta contra a verdade dos fatos e contra a sabedoria popular, que confirmava o caräter adültero da mulher amada. A propria conslrucäo da narrativa, pelos falsos proverbios e proverbios invertidos, ja sugere o desfecho: Jö faz o falso virar verdadeiro. 3. Nas duas situacöes em que clas foram empregadas, a narrativa poderia terminar. Contudo, a narrativa continua, desde que exista um "mas" ou algo a "mais" para se contar. Portanto, essas palavras garantem a continuidade da narrativa. 4. O nome Villria contem o dualismo final da personagem: de um lado, revela o seu caräter vil, vulgar; de outro, sua nova identidade, a da pureza do lirio. (Talvez seja interessante lembrar ao aluno que tambem o lirio tem significados contraditörios. Alem de simbolo de pureza, lambem ja foi simbolo do pecado. Em alguns paises da Kuropa medieval, as prostitutas eram marcadas no corpo a ferro quente, com o desenho de um lirio.) 5. a) O titulo do conto estä relacionado ao trabalho realizado por Jö Joaquim, de "desenredar" a fäbula conhecida de todos (a dos adulterios) e de criar novo euredo e fäbula. Ao dar a sua versäo dos fatos, Jö Joaquim passa a ser um segundo narrador da narrativa. b) A fäbula que lhe interessava, a da inocencia da mulher amada. c) A ata - com o seu sentido de registro de certos aeonteeimentos em sessöes, reunifies, etc. - co convivio social, em que a versäo de Jö Joaquim passou a ser aeeita. Pense e responda (p. 426) 1. "O senhor vS"; "Explico ao senhor", etc. 2. a) "o diabo vige dentro do hörnern" b) Afirma que o diabo estä nas pessoas, na natureza, e fundamenta com o exemplo da mandioca, da cobra, do porco, do gaviäo e das pedras, que se tornam venenosas. 3. De acordo com a concepgäo dialetica da personagem, admitir a existencia de Deus implica admitir a existencia do diabo, o que Riobaldo hesita em aeeitar, pois pode ser a certeza da condenagäo. 4} 43 CAPÍTULO 38 - Joao Cabral de Melo Neto: a linguagem-objeto Pense e responds (p. 432) 1. a) As ciganas. b) Elas associam-se aos ties Reis Magos. c) A oiigem humilde, o conteúdo de esperanga que ele representa, o destino incerto. 2. a) A primeira cigana prevě que o bebé será um homem ligado ao rio; a segunda prevé que será um operário. b) Em ambas as previsdes, ele será mais um homem socialmente marginalizado, mais um severino. 3. a) A vida. b) A vida, mesmo quando severina, vale a pena. 4. Os "scverinos" do pais sáo os trabalhadorcs em geral, que, no campo ou na eidade, lutam pela vida, apesar da miséria, da ineficácia dos governantes, da corrupcao, do custo de vida, etc. CAPITULO 39 - Tendéncias da literatura contemporänea Pense e respond a (p. 439) 1. O aspecto principal é a disposicäo visual do poema. 2. a) O poeta forma novas palavras a partir das mesmas silabas ou fonemas da mensagem publicitária. b) Näo, ao contrário. O texto tem uma fungäo antipropagandística. c) O poema pode ser lido como uma crítica á sociedade de consumo e até mesmo ao imperialismo. 3. a) O título sugere o golpe militar de 1964, ocorrido em 31 de margo. b) Näo, apesar das adversidades polídcas, ainda há a esperanga de lutar e resistir. c) Com a propria poesia, que pode ser cxtraída mesmo das coisas mais atrozes desse tempo. 4. Resposta pessoal. (Contudo, convérn ressaltar para o aluno que, rigorosamente, o texto I näo é alienante. Comparado ao texto II, o texto I só é menos explícito, menos direto em sua crítica social. Trata-se, portanto, de uma opcäo do artista, de acordo com os seus objetivos e com a forma como compreende a poesia. O texto II consegue, naturalmenle, atingir mais rápida e diretamente um numero maior de pessoas. Também é importante lembrar que nem todo poema conereto é social.) Pense e responda (p. 448) 1. É entregador de sorvetes. 2. a) A bíciclcta č vista como um instrumente mágico, capaz de dar ao cielista sensacňes de liberdade. b) O autor conrpara a relagäo entre o cielista e o guidäo da bicicleta com a que há entre o toureiro e os cornos do touro, havendo em ambos os casos ľusäo entre sujeito e objeto. 3. Resposta pessoal. (Sugestäo: O cielista, cansado e sonolento, ainda ouve o som da campainha que usa durante suas viagens. A expressäo "avanca pelo céu na contramäo" sugere um estado de leveza, um espairecer após o "vôo" cielístico.) 2. Piano da rcalidade: a fala entre Lúčia e Pedro num local proximo á sala em que se encontra o corpo de Alaíde. Piano da memoria: o diálogo evocativo entre Lúčia e Alaíde; a descoberta da traigäo e a possibilidade de assassinato da segunda. Piano da alucinacäo: o diálogo entre Alaíde e Clessi sobre o enterro tie alguém muito rico. 3. a) A acäo da peca se dá em trés pianos, o da memoria, o da realidadc e o da alucinacäo, ora se focalizando um, ora outro. Por outro lado, os ľatos passados e presentes se alternam, compondo o drama. b) Näo. O diálogo entre Clessi c Alaíde, por exemplo, se dá no piano da alucinacäo de Alaíde, ou seja, antes de ela morrer; o diálogo evocativo de Lúčia é anterior á alucinacäo de Alaíde; o diálogo entre Lúčia e Pedro se dá depois da morte de Alaíde. c) Da linguagem cinematográfica. Em dia com o vestibular (p. 456) 1. a) O texto I pertence ao romance Vklas secas, dc Graciliano Ramos, e o texto II pertence a Grande serläo: veredas, de Guimaräes Rosa, b) O texto I flea mais restrito ao universo regional, uma vez que retrata a relagäo do homem com o meio natural. Já o texto II, embora regional, tende á universalizacäo, uma vez que aborda um terna metafísico e universal: a existencia do demônio. 2. A afirmaliva II apresenta crro: Guimaräes dá continuidade a tradicäo regionalista, porôm sen universo é o dos jagungos minciros, e näo o dos cangaceiros nordestinos. 3. A afirmativa II apresenta erro: embora Clarice retrate também o universo da mullier de classe média, sua literatúra näo se cireunsereve á experiéncia pessoal. Seus textos tendem á universalizagäo, uma vez que seus temas - o amor, o relacionamento familiar, a morte, a propria literatúra - säo temas universais. 4. a) 'Conversa de bois', que faz parte da obra Sagarana. b) Sim, como é o caso dos contos 'O burrinho pedrés' e 'Corpo fechado', da mesma obra. 5. A dispôsigäo gráfica do poéma no papel, buscando uma espacializagäo e uma visualizagäo do texto, conforme algumas experiôncias do Cubismo e do Futurismo. Além disso, o poéma submete as palavras do slogan publicitário "Beba Coca-Cola" a um processo de desmontagem e remontagem, dando origem a novas sílabas e palavras a partir da troca de apenas alguns fonemas. 6. O narrador fala de suas dificuldades para contar sua propria história. 7. O narrador-personagem é Riobaldo. A personagem ambígua é Rcinaldo, cliamado de Diadorim apenas por Riobaldo, sendo Diadorina sua verdadeira identidade. 8. Grande sertao: veredas. Seu autor é Guimaräes Rosa. 9. a 10. c 11. b 12. a 13. Os versos de Casimiro de Abreu säo metrificados, enquanto os de Cacaso näo. Os de Casimire-demonstram preocupagäo com as rimas, e os de Cacaso apresentam rŕma apenas entre os dois versos finais. O diálogo entre os textos se faz pela referencia intertcxtual do verso de Cacaso: "Al que saudade que tenho de meus negros verdes anos!" Esse verso associa-se diretamente ao poéma 'Mcus oito anos', de Casimiro de Abreu. Os dois textos apresentam uma postura subjeliva, emotiva, com referé'ncias autobiográficas; porém Cacaso demonstra uma visäo crítica c irônica em relapäo á tradigäo romäntica. 14 e 15 d 16. e 17, b 18. d 19. e 20. a 21, c 22. d 23. b 24. e 25. c 26. d 27. a 28. c 29. a 30. c 31. d 32. c CAPÍTULO 40 - O teatro brasileiro no século XX Pense e responda (p. 455) 1. Alaíde e Lúcia sáo irmas e hitam pelo amor do mesmo homem, Pedro. Pedro é casado com Alaíde e amante de Lúcia. Alaíde descobre a traigao, diseute com a irma e teme ser assassinada pelos dois. Hi Bibliografia AGUIAR e SILVA, Vitor Manuel de. Teória da literatura. Coimbra, Livraria Almedina, 1973. AMARAL, Aracy. Ar tes plásticas na Semana de 22 — Subsídios para uma história das artes no Brasil. 2° ed. Säo Paulo, Perspectiva/Edusp, 1972. ANDRADE, Mario de. Aspectos da literatura hrasileira. Säo Paulo, Martins, 1974. AND RADE, Oswald de. Do Pau-Brasil á Antropológia e ás uiopias. 2? ed. Rio de Janeiro, Civilizacäo Brasileira, 1970. 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