Texto I: Padre José de Anchieta: «A Santa Inês» I Cordeirinha linda, como folga o povo porque vossa vinda lhe dá lume novo! Cordeirinha santa, de Iesu querida, vossa santa vinda o diabo espanta. Por isso vos canta, com prazer, o povo, porque vossa vinda lhe dá lume novo. Nossa culpa escura fugirá depressa, pois vossa cabeça vem com luz tão pura Vossa formosura honra é do povo, porque vossa vinda lhe dá lume novo. Virginal cabeça pola fé cortada, com vossa chegada, já ninguém pereça. Vinde mui depressa ajudar o povo, pois com vossa vinda lhe dais lume novo. Vós sois, cordeirinha, de Iesu formoso, mas o vosso esposo já vos fez rainha. Também padeirinha sois de nosso povo, pois, com vossa vinda, lhe dais lume novo. II Não é d’Alentejo este vosso trigo, mas Jesus amigo é vosso desejo. Morro porque vejo que este nosso povo não anda faminto deste trigo novo. Santa padeirinha, morta com cutelo, sem nenhum farelo é vossa farinha. Ela é mezinha com que sara o povo, que, com vossa vinda, terá trigo novo. O pão que amassastes dentro em vosso peito, é o amor perfeito com que a Deus amastes. Deste vos fartastes, deste dais ao povo, porque deixe o velho pelo trigo novo. Não se vende em praça este pão de vida, porque é comida que se dá de graça. Ó preciosa massa! Ó que pão tão novo que, com vossa vinda, quer Deus dar ao povo! Ó que doce bolo, que se chama graça! Quem sem ele passa é mui grande tolo, Homem sem miolo, qualquer deste povo, que não é faminto deste pão tão novo! III CANTAM: Entrai ad altare Dei virgem mártir mui formosa, pois que sois tão digna esposa de Iesu, que é sumo rei. Debaixo do sacramento, em forma de pão de trigo, vos espera, como amigo, com grande contentamento. Ali tendes vosso assento. Entrai ad altare Dei, virgem mártir mui formosa, pois que sois tão digna esposa de Iesu, que é sumo rei. Naquele lugar estreito cabereis bem com Jesus, Pois ele, com sua cruz, vos coube dentro no peito, ó virgem de grão respeito. Entrai ad altare Dei, virgem mártir mui formosa, pois que sois tão digna esposa de Iesu, que é sumo rei. http://www.soliteratura.com.br/biblioteca_virtual/biblioteca05.php Perguntas: 1. Analise os motivos principais da primeira parte do poema. 2. Analise os motivos principais da segunda parte do poema. 3. Analise os motivos principais da terceira parte do poema. 4. Interprete a mensagem do poema. 5. Comente o aspecto estilístico do poema. Texto II: Padre Antônio Vieira: SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO AOS PEIXES - (trecho) Vos estis sal terrae. Haveis de saber, irmãos peixes, que o sal, filho do mar como vós, tem duas propriedades, as quais em vós mesmos se experimentam: conservar o são e preservá-lo para que se não corrompa. Estas mesmas propriedades tinham as pregações do vosso pregador Santo António, como também as devem ter as de todos os pregadores. Uma é louvar o bem, outra repreender o mal: louvar o bem para o conservar e repreender o mal para preservar dele. Nem cuideis que isto pertence só aos homens, porque também nos peixes tem seu lugar. Assim o diz o grande Doutor da Igreja S. Basílio: Non carpere solum, reprehendereque possumus pisces, sed sunt in illis, et quae prosequenda sunt imitatione: «Não só há que notar, diz o Santo, e que repreender nos peixes, senão também que imitar e louvar.» Quando Cristo comparou a sua Igreja à rede de pescar, Sagenae missae in mare, diz que os pescadores «recolheram os peixes bons e lançaram fora os maus»: Elegerunt bonos in vasa, malos autem foras miserunt. E onde há bons e maus, há que louvar e que repreender. Suposto isto, para que procedamos com clareza, dividirei, peixes, o vosso sermão em dois pontos: no primeiro louvar-vos-ei as vossas virtudes, no segundo repreender-vos-ei os vossos vícios. E desta maneira satisfaremos às obrigações do sal, que melhor vos está ouvi-las vivos, que experimentá-las depois de mortos. (...) Antes, porém, que vos vades, assim como ouvistes os vossos louvores, ouvi também agora as vossas repreensões. Servir-vos-ão de confusão, já que não seja de emenda. A primeira cousa que me desedifica, peixes, de vós, é que vos comeis uns aos outros. Grande escândalo é este, mas a circunstância o faz ainda maior. Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos comeram os grandes, bastara um grande para muitos pequenos; mas como os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos, nem mil, para um só grande. Olhai como estranha isto Santo Agostinho: Homines pravis, praeversisque cupiditatibus facti sunt, sicut pisces invicem se devorantes: «Os homens com suas más e perversas cobiças, vêm a ser como os peixes, que se comem uns aos outros.» Tão alheia cousa é, não só da razão, mas da mesma natureza, que sendo todos criados no mesmo elemento, todos cidadãos da mesma pátria e todos finalmente irmãos, vivais de vos comer! Santo Agostinho, que pregava aos homens, para encarecer a fealdade deste escândalo, mostrou-lho nos peixes; e eu, que prego aos peixes, para que vejais quão feio e abominável é, quero que o vejais nos homens. Olhai, peixes, lá do mar para a terra. Não, não: não é isso o que vos digo. Vós virais os olhos para os matos e para o sertão? Para cá, para cá; para a cidade é que haveis de olhar. Cuidais que só os Tapuias se comem uns aos outros? Muito maior açougue é o de cá, muito mais se comem os Brancos. Vedes vós todo aquele bulir, vedes todo aquele andar, vedes aquele concorrer às praças e cruzar as ruas; vedes aquele subir e descer as calçadas, vedes aquele entrar e sair sem quietação nem sossego? Pois tudo aquilo é andarem buscando os homens como hão-de comer e como se hão-de comer. Morreu algum deles, vereis logo tantos sobre o miserável a despedaçá-lo e comê-lo. Comem-no os herdeiros, comem-no os testamenteiros, comem-no os legatários, comem-no os acredores; comem-no os oficiais dos órfãos e os dos defuntos e ausentes; come-o o médico, que o curou ou ajudou a morrer; come-o o sangrador que lhe tirou o sangue; come-a a mesma mulher, que de má vontade lhe dá para a mortalha o lençol mais velho da casa; come-o o que lhe abre a cova, o que lhe tange os sinos, e os que, cantando, o levam a enterrar; enfim, ainda o pobre defunto o não comeu a terra, e já o tem comido toda a terra. Já se os homens se comeram somente depois de mortos, parece que era menos horror e menos matéria de sentimento. Mas para que conheçais a que chega a vossa crueldade, considerai, peixes, que também os homens se comem vivos assim como vós. Vivo estava Job, quando dizia: Quare persequimini me, et carnibus meis saturamini? «Porque me perseguis tão desumanamente, vós, que me estais comendo vivo e fartando-vos da minha carne?» Quereis ver um Job destes? Vede um homem desses que andam perseguidos de pleitos ou acusados de crimes, e olhai quantos o estão comendo. Come-o o meirinho, come-o o carcereiro, come-o o escrivão, come-o o solicitador, come-o o advogado, come-o o inquiridor, come-o a testemunha, come-o o julgador, e ainda não está sentenciado, já está comido. São piores os homens que os corvos. O triste que foi à forca, não o comem os corvos senão depois de executado e morto; e o que anda em juízo, ainda não está executado nem sentenciado, e já está comido. http://www.jayrus.art.br/Apostilas/LiteraturaBrasileira/DescobriBarroco/Padre_ANTONIO_VIEIRA.htm Perguntas: 1. Analise os motivos principais deste trecho. 2. Em que contexto o autor menciona Santo Antônio? 3. Que vícios dos colonos o autor denuncia? 4. Como o autor desenvolve a comparação das pessoas com os peixes? 5. Comente o aspecto estilístico do poema. Tarefa III: 1. Procure as informações sobre a ação da Ordem jesuítica no Brasil. 2. Procure as informações sobre o candomblé, a umbanda e o espiritismo. 3. Procure as informações básicas sobre a religiosidade dos índios brasileiros.