Márcia Cancado MANUAL DE SEMÄNTICA WOCÖES BÁSICAS E EXERCÍCIOS 29 edigäo revisada EDITORA Illing Márcia Cangado MANUAL DE SEMÄNTICA NOgÖES BÁSICAS E EXERCÍCIOS 2a edigäo revisada BELO HORIZONTE EDITORA UFMG 2008 Projeto gráfico Formatacao Revisao e normalizacäo Editora^äo de texto Revisäo de provas Montagem de capa e produpo gráfica Paulo Schmidt Cässio Ribeiro Simone de Almeida Gomes Maria do Carmo Leite Ribeiro Alexandre Vasooncelos de Meie, Lira Cordova, Maria do Rosärio Alves Pereira e Renata Passos Warren M. Sanros © 2005, Márcia Cancado | 2005, Editora UFMG ©2008, Márcia Cancado | 2008, Editora UFMG - 2a ec'icäo revisads. Este livro ou parte dele näo pode ser reproduzier sem autorizaeäo escrita do Editor, C215m Cancado, Márcia Manual de semantics: nocöes básicas e exerdeios / Márcia Cancado, Belo Horizont Editora UFMG, 2008. 183 p. - (Didática) nelui references. ISBN: 978-85-7041-680-3 1. Semantics. I. Título. CDD: 412 CDU: 801.54 Ficha catalográfíca elaborada pela CCQC- Central de Contrale de Qualidade da Catalogacäo da Bíblioteca Universtána da UFMG Este livro recebeu apoio financeiro da Pró-Reitoria de Graduagäo da UFMG Editora UFMG A» Antonio Carlos, 6627 - Ala direita da Biblioteca Central - térreo Campus Pampulha ■ CEP 31270-901 - Belo Horizonte/MG Tel.: (31) 3409-4650 • Fax: (31) 3405-4768 | E-mail: editora@ufmg.br • www.editora.ufmg.br Pró-Reitoria de Graduagäo Av. Antonio Carlos, 6627 Reitoria -- 6° andar Campus Pampulha - CEP 31270-901 Belo Horizonte/MG Tel.: (31} 3409-4054 ] Fax (31) 3409-4060 ] E-rr.ah: info@prograd.ufpig.br Para Emmanuel, Henrique e Frederico SUMARIO APRESENTAQÁO 13 PARTE 1 0 QUE É SEMÁNTICA Capítulo 1 A Investigagáo do Significado 15 1. A investigagáo lingiiística 15 2. A semántica e a pragmática 16 2.1 0 uso, a mengáo, a lingua objeto e a metalinguagem 18 3. 0 objeto de estudo da semántica 19 3.1 A composicionalidade e a expressividade iingiiísticas 19 3.2 As propriedades semánticas 20 3.3 Referěncia e representagáo 23 3.4 Exercícios 24 4. Indicagóes bibliográficas 24 PARTE 2 ALGUNS FENÓMENOS SEMÁNTICOS SOB A OTICA DE UMA ABORDAGEM REFERENCIAL Capítulo 2 Implicagoes 25 1. Implicagoes ou inferéncias 25 2. Hiponímia e acarretamento 26 2.1 Exercícios 30 3. Pressuposicáo 32 3.1 Exercícios 38 4. Indicacoes bibliográficas 40 Capitulo 3 Outras Relagoes 41 1. Sinonfmia e parafrase 41 1.1 Exercfcios 44 2. Antommia e contradigao 45 2.1 Exercfcios 49 3. Anomalia 51 3.1 Exercfcios 53 4. Deixis e anafora 53 4.1 Exercfcios 56 5. Indicagoes bibliograficas 56 Capitulo 4 Ambigiiidade e Vagueza 57 1. Os varios significados das palavras 57 1.1 Ambigiiidade x vagueza 58 1.2 Exercfcios 61 2. Tipos de ambiguidade 62 2.1 Ambigiiidade lexical 63 2.1.1 Homonimia 63 2.1.2 Polissemia 63 2.1.3 Ambiguidade ou vagueza com preposigoes? 65 2.1.4 Outro caso: ambiguidade universal ou vagueza? 67 2.2 Ambiguidade sintatica 68 2.3 Ambiguidade de escopo . 69 2.4 Ambiguidade semantica 70 2.5 Atribuigao de papeis tematicos 70 2.6 Construgoes com gerundios 71 2.7 Consideragoes finais 72 2.8 Exercfcios 73 3. Indicacoes bibliograficas 74 Capítulo 5 Referencia e Sentido 75 1. A referencia 75 1.1 Sintagmas nominais e tipos de referencia 77 1.2 Problemas para urna teória da referencia 79 1.3 Exercícios 80 2.0 sentido 81 2.1 Argumentos de Frege favoráveis ä utilizagäo do sentido no significado 84 2.2 Exercícios 88 3. Indicagôes bibliograf i cas 89 PARTE 3 ALGUNS FENÔMENOS SEMÄNTICOS SOB A OTICA DE UMA ABORDAGEM MENTA LI STA Capítulo 6 Protótipos e Metáforas 1. Protótipos 1.1 Representagöes mentais 1.2 Conceitos 1.3 Condigôes necessárias e suficientes 1.4 Protótipos 1.5 Exercícios 2. Metáforas 2.1 Características das metáforas 2.2 A influéncia da metafora 2.3 0 esquema de imagens 2.3.1 0 esquema do recipiente 2.3.2 0 esquema da trajetória 2.4 Exercícios 3. Poiissemia 3.1 Preposigoes 3.2 Exercícios 4. Indicagôes bibliográficas 91 91 91 92 93 94 96 97 99 101 102 103 104 105 105 105 107 107 Capítulo 7 Os Papéis Temáticos 109 1. 0 que säo papéis temáticos? 109 2. Tipos de papéis temáticos 111 2.1 Exercícios 113 3. Problemas com as definicóes de papéis temáticos 113 3.1 A identificagäo dos papéis temáticos 114 3.2 Exercícios 116 4. Papéis temáticos e posigoes sintáticas 116 4.1 Exercícios 119 5. A grade temática dos verbos 119 5.1 Exercícios 121 6. Motivagäo empírica para o estudo dos papéis temáticos 122 6.1 Exercícios 123 7. Indicates bibliográficas 123 PARTE 4 ALGUNS FENÔMENOS SEMÁNTICOS SOB A OTICA DE UMA ABORDAGEM PRAGMÁTICA Capítulo 8 Atos de Fala e Implicaturas Conversacionais 125 1. Teoria dos atos de fala 125 1.1 Sentencas náo-declarativas 126 1.2 Os atos de fala ' 126 1.3 Condigöes de felicidade 128 1.4 Exercícios 129 2. Implicaturas conversacionais 130 2.1 Inferéncias 130 2.2 Impiicatura conversacional 132 2.3 Exercícios 136 3. Ambigüidades situacionais 136 3.1 Exercícios 137 4. Indicacóes bibliográficas 137 PARTE 5 TEORIAS SEMANTICAS Capitulo 9 Urn Breve Percurso pelas Teorias Semanticas 139 1. As varias correntes teoricas 139 2. A semantica formal 139 3. A semantica argumentative 142 4. Ateoria dos atos de fala 142 5. A semantica Gognitiva 143 6. A semantica representacional 144 7. A semantica lexical 144 8. Outras teorias 145 RESPOSTAS DOS EXERCICIOS 147 REFERENCIAS 177 SOBREAAUTORA 183 APRESENTAQÁO A idéia de escrever este livro surgiu da minha experiéncia didática, como professora de semántica nos cursos de graduagáo e de pós-graduagao da Universidade Federal de Minas Gerais. Ao longo desse tempo, pude perceber a caréncia de material didático para o aluno brasileiro que se inicia no estudo da semántica. Um material cujo conteúdo fosse bem introdutório, já que é o primeiro contato que o aluno de graduagáo, e muítas vezeš de pós-graduagáo, tem com essa area; que náo fosse uma introdugáo ampla a uma teoria específica, mas que tratasse dos principals conceitos de semántica, usando, como base, propostas de várias teorias aceitas pela comunidade linguística. O que se encontra, mais geralmente, na literatura sáo introducóes a uma teoria, como, por exemplo, "introdugáo á Semántica Formal", "Introdugáo á Semántica Cognitiva", etc. Em geral, essas introdugóes exigem um conhecimento prévio de nocóes mais básicas de semántica. Ainda, um material que fosse em portugués, com exernplos do portugués brasileiro, pois a maioria dos livros está escrita em inglés; e que o aluno pudesse pra-ticar bem o conteúdo, apresentando muitos exercicios e, inclusive, as respostas para auto-avaliagáo. Enfim, urn material que fosse "a introdugáo a qualquer introdugáo", um "manual de semántica, com nogóes básicas e exercicios", em portugués. Foi norteada por esse sentimento que resolvi transformar, em um livro, uma apos-tila iniciál, que era apenas um roteiro, baseado, em grande parte, em Meaning and grammar: an introduction to semantics, de Chierchia & McConnell-Ginet (1990). Costumava brincar com os alunos dizendo que, junto a este livro, deveria vir anexado urn professor. Por isso, a minha idéia foi anexar-lhe esse professor. Tentei elaborar urn material bem didático, em uma linguagem bem informal (na medida do possivel), tentando lembrar e introduzir duvidas que os alunos, normalmente, apresentam em sala de aula. Também achei interessante inserir muitos exercicios, com as devidas respostas, para que o livro se tornasse mais auto-suficiente. Minha intencáo foi, ainda, propiciar, ao professor de tantas escolas de Letras espalhadas pelo Brasil, um manual acessivel para que pudesse ministrar um curso introdutório de semántica. Porém, é desejável que o leitor tenha algum conhecimento de lingúística em geral, ainda que náo seja necessário um conhecimento específico de semántica. O que quero realgar mais uma vez é que o objetivo aqui náo é propor nenhuma teoria nova em semántica, ou detalhar uma corrente teórica específica. A idéia básica é perrnitir o acesso, para o leitor iniciante, aos temas centrais de semántica e a alguns dos mais importantes autores da area. Portanto, o que apresento é, basicamente, uma releitura dos principals livros de introdugáo á semántica, sobretudo os de Chierchia (2003), MANUAL DE SEMÄNTICA Chierchiaä McConnell-Ginet (1990), Saeed (1997), Hurford & Heasley (1983), Kempson (1977), Pires de Oliveira (2001), Mari & Geraldi (1937), Cruse (1986) e Lyons (1977), cujas obras segui mais de perto. Baseei-me em um autor ou outro, sempre procurando reinterpretar e exemplificar, para o portugués, o que eu entendia que determinado autor tinha conseguido explicitar melhor. Posso afirmar que esse manual é uma verdadeira "colcha de retalhos" da bibliografia básica de semäntica, acrescida de explicagöes minhas, baseadas na minha experiéncia como professora de semäntica e na minha observagäo sobre as lacunas existentes entre os livros introdutórios de semäntica e o aluno brasileiro. Tive que optar por alguns temas, devido ao enorme campo que é o da investigagäo semäntica; essa escolha, certamente, näo será consenso de todos. Porém, esperoterfornecido os instrumentos iniciais necessários para que o leitor possa continuar, em qualquer díregäo, nessa jornada semäntica. Para f inalizar esta apresentagäo, gostaria de oríentar o leitor sobre a organizagäo mais geral deste manual. Os temas a serem tratados seräo organizados em torno das trés grandes vertentes teóricas adotadas na literatura semäntica: a abordagem referencial, a abordagem mentalista e a abordagem pragmática. A parte 1 do livro, que se constitui do capítulo 1, apresenta uma introdugäo á area específica da semäntica. A parte 2, constituída pelos capítulos 2,3r 4 e 5, mostrará temas que "foram tratados de uma maneira mais significativa dentro da abordagem referencial: as implicagóes lógicas (acarretamento e pressuposigáo), as relagöes entre sentencas (sino-nímia, contradigäo, etc.), as ambigüidades, as nogöes de sentido e referencia. A parte 3, capítulos 6 e 7, tratará de temas que foram abordados, de uma maneira mais geral, em uma vertente mentalista: os protótipos, as metáforas e os papéis temáticos. A parte 4, capítulo 8, tratará de assuntos ligados a uma abordagem pragmática, ou seja, temas que tém como objeto de estudo o uso da lingua: as implicaturas conver-sacionais e os atos de fala. Na parte 5, concluo o livro com um breve percurso sobre as principals teorias semänticas existentes na literatura linguística, mostrando, tambérn, a que tipo de abordagem, das trés vertentes aqui apontadas, cada teoria está associada. ♦ ♦ ♦ Agradego aos meus estagiários do projeto Produgäo de Material Docente, Fábio de Lima Wenceslau, principalmente, pela revisäo do texto, e Luciana Coelho, principalmente, pela ajuda com as respostas dos exercícios, entre outras coisas. Agradego, também, äs minhas orientandas de graduacäo, Luisa Godoy, Ludmila Bemquerer (bolsistas do PID) e Larissa Ciríaco (bolsista do PIBIC/CNPq), pela valiosa ajuda na revisäo final do livro. Agradego aos professores Mario Alberto Perini (PUC-MG) e Jose Borges Neto (UFPR), pelos proveitosos comentários em alguns dos capítulos do livro. Agradego, também, aos meus alunos dos cursos de semäntica que sempre metrouxeram sugestôes e mesmo revisöes no decorrer da elaboragäo deste livro. Finalmente, agradego a PROGRAD/ UFMG pelo apoio financeiro e editorial, através do Projeto de Produgäo de Material Docente para a Graduacao. PARTE 1 O QUE É SEMANTICA CAPÍTULO 1 A INVESTIGAQÄO DO SIGNIFICADO 1. A Investigagäo Linguística Semantica é o estudo do significado das línguas. Este livro é urna introdugäo ä teória e ä prática da semantica na linguística moderna. Apesar de näo ser uma introdugäo a qualquer teória específica, este livro apóia-se na premissa básica de que a habilidade linguística do ser humano é baseada em um conhecimento específico que o falante tem sobre a lingua e a linguagem. É esse conhecimento que o linguista busca investigar. Ao conhecimento da lingua, chamaremos de gramática, entendendo-se por gramática o sistema de regras e/ou princípios que governam o uso dos signos da lingua. A linguística assume que o falante de qualquer lingua possui diferentes tipos de conhecimento em sua gramática: o vocabulário adquirido, como pronunciar as palavras, como construir as palavras, como construir as sentengas1 e como entender o significado das palavras e das sentengas. Refletindo essa dívisäo, a descricäo linguística tem diferentes níveis de análise: o léxico, que é o conjunto de palavras de uma lingua; a fonologia, que é o estudo dos sons de uma lingua e de como esses sons se combinam para formar as palavras; a morfológia, que é o estudo das construcóes das palavras; a sintaxe, que é o estudo de como as palavras podem ser combinadas em sentengas; e a semantica. que é o estudo do significado das palavras e das sentengas. "Sentenga (S) pode se.' asíinida. sintaticamente, pela presenga de um verbo principal conjugacfo s, serranticamente. pals expressäo de um pensarr.ento comoleto." PIRES DE OLIVEIRA. 2001, p. 99. 16 MANUAL DE SEMÁNTICA Ao conhecirnento da linguagem, associaremos o uso da lingua, ou seja, o emprego da gramatica dessa lingua nas diferentes situagoes de fala. A area da linguistica que descreve a linguagem denomina-se pragmatica. A pragmatica estuda a maneira pela qual a gramatica, como um todo, pode ser usada em situagoes comunicativas concretas. Neste livro, veremos nogoes que, ora estao no campo da lingua, ora no campo da linguagem; tentarei, na medida do possivel, situa-las em seus dominios de conhecirnento. 2. A Semantics e a Pragmatica Localizemos, primeiramente, o nosso principal objeto de estudo: a semántica. A semántica, repetindo, é o ramo da linguistica voltado para a investigagáo do significado das sentencas. Como assumimos que o lingůísta busca descrever o conhecirnento linguistico que o falante tern de sua lingua, assumimos, mais especificamente, que o semanticista busca descrever o conhecirnento semántico que o falante tern de sua lingua. Por exemplo, esse conhecirnento permite que um falante de portugués saiba que as duas sentencas abaixo descrevem a mesma situagáo: (1) a. O Joáo acredita, até hoje, que a terra é quadrada. b. O Joáo ainda pensa, atualmente, que a terra é quadrada. Esse mesmo conhecirnento também permite que um falante de portugués saiba que as duas sentengas abaixo náo podem se referir á mesma situagáo no mundo, ou seja. sáo sentengas que se referem a situagoes contraditórias: (2) a. O Joáo é um engenheiro mecánico. b. O Joáo náo é um engenheiro mecánico. Ainda, o conhecirnento semántico que o falante do portugués do Brasil tem o leva a atribuir duas interpretacóes para a sentenca abaixo: (3) A gatinha da minha vizinha anda doente. Portanto, sáo fenómenos dessa natureza que seráo o alvo de uma investigagáo semántica. Existe um certo consenso entre os semanticistas de que fatos como esses sáo relevantes para qualquer teoria que se proponha á investigar a semántica. Entretanto, antes de seguirmos com o nosso estudo sobre os fenómenos semánticos, é importante salientar que a investigagáo linguistica do significado ainda interage com o estudo de outros processos cognitivos, alem dos processes especificamente lingůísticos. Parece bem provável que certos aspectos do significado encontrem-se fora do estudo de uma teoria semántica. Veja: (4) a. Voce quer um milháo de dólares sem fazer nada? b. NáolM (responde o interlocutor, com uma entonagáo e uma expressáo facial que significant: claro que quero!) Evidentemente náo é o sistema linguistico que permite a interpretagáo da sentenca em (4b): o item lexical nao levaria a uma interpretagáo oposta a que todos nos provavelmente entendemos. O que faz, entao, o falante de (4a) entender o falante de capítulo ' A HWESTIGAQÁG DO SIGNIFICADO 17 (4b)? Sáo fatores extralingúístícos como, por exemplo, a entonagáo que o falante de (4b) usa, a sua expressáo facial, ás vezeš até seus gestos; já entramos, entáo, no campo da prosódia, da expressáo corporal, etc. Portanto, fica claro que nem sempře o sistema semšntico é o único responsável pelo significado; ao contrário, em várias situagčes, o sistema semántico tem o seu significado alterado por outros sístemas cognitivos para uma compreensáo finál do significado. Por exemplo, vem sendo explorado por alguns estudiosos que alguns aspectos do significado sáo explicados em termos de teorias da agáo, ou seja, dentro do domínio de uma teoria da pragmática. Citando uma dessas teorias, temos a teoria de atos de fala, que tem como foco de estudo o que as pessoas fazem quando produzem sentencas: afirmam, questionam, prometem, etc. Tais teorias podem ajudar a explicar como as pessoas fazem para significar mais do que está simplesmente dito, através da investigagáo das acóes intencionais dos falantes. Repare na sentenga abaixo: (5) A porta está aberta. O que significa essa sentenga? Que existe uma determinada situacao ern que um objeto denominado porta encontra-se em um estado de náo fechado (seja náo trancado ou apenas afetado em seu deslocamento). Agora imaginemos o seguinte: um professor está dando aula, e algum estudante pára na frente da sala e fica olhando para dentro; o professor dirige-se a ele, com uma atitude amigável, e profere a sentenga em (5). Certamente, nessa situagáo, a sentenga (5) nao será entendida como o estado de a porta estar aberta ou náo, mas sim, como um convite para que o estudante entre. Vejamos ainda essa mesma sentenga em uma outra situagáo: um estudante muito agitado está atrapalhando a aula; o professor diz a mesma sentenga, só que agora sua intengáo é repreender esse aluno. A sentenga (5) será entendida como uma ordem para que o estudante saia. Portanto, nos exemplos dados, vemos que o significado vai alem do sentido do que é dito. Como entendemos esse significado? Esse conhecimento tem relagáo com a nossa experíéncia sobre comportamentos em salaš de aula, intengóes, boas maneiras, isto é, com o nosso conhecimento sobre o mundo. Entender o que o professor falou em cada contexto específico parece envolver dois tipos de conhecimento. Por um lado, devemos entender o que o professor falou explicitamente, o que a sentenga em portugués a porta está aberta significa; a esse tipo de conhecimento, chamamos de semántica. A semántica pode ser pensada como a explicagáo de aspectos da interpretagáo que dependem exclusivarnente do sistema da iíngua e náo, de como as pessoas a colocam em uso; em outros termos, podemos dizer que a semántica lida com a interpretagáo das expressóes lingúísticas, com o que permanece constante quando uma čerta expressáo é proferida. Por outro lado, náo conseguiríamos entender o que o professor falou, se náo entendéssemos também qual era a intengáo dele ao falar aquela expressáo para determinada pessoa em determinado contexto; a esse tipo de conhecimento, chamamos de pragmática. A pragmática estuda os usos situados da Iíngua e lida com certos tipos de efeitos intencionais. Entretanto, o leitor verá, ao longo do livro, que nem sempře é tao clara essa divisáo e que nem sempře conseguimos precisar o que está no terreno da semántica e o que está no terreno da pragmática.2 2 Existem algumas correntes teóricas que náo acreditam em tal divisáo, ou fazern essa divisáo de uma maneira distinta ILAKOFR 1987; LANGACKER, 1987). Veja discussáo mais detalhada en LEVINSON (1983! e MEY(1993j. MANUAL DE SEMÁNTICA 2.1 O uso, a mengäo, a lingua objeto e a metalinguagem A diferenga entre uso e mengäo de uma sentenga também ajudará a compreender as nogöes de semántica e pragmática. Para entendermos essa diferenga, primeiramentě vejamos o significado da palavra significado. Certamente, o signifícado em teorias semánticas náo é táo abrangente quanto o uso que se faz na linguagem cotídiana. Observe as sentengas abaixo: (6) a. Qual o significado de ser um hörnern? b. Qual o significado de 'ser um hörnern"? Qual das sentengas acima trata a palavra signifícar do ponto de vista semantíco? Certamente, a sentenga (b) é a adequada. A outra diz respeito a questóes metafísicas. É fácil justificar essa resposta. A semántica preocupa-se com o significado de sentengas e de palavras como objetos isolados e, portanto, a resposta de (6b) estaria ligada somente a relacáo entre as palavras da expressäo destacada ser um hörnern. Poderíamos responder, por exemplo, dizendo que "ser um hörnern quer dizer ser humano, do sexo masculino, de uma determinada idade adulta". Perceba que a resposta do significado para ser um hörnern, em (6b), náo vai variar de conteúdo de acordo com quem a responde ou de acordo com o contexto. Qualquer falante do portugués aceitaría a resposta dada acima como sendo boa. Já a questáo em (6a) terá uma resposta que vai variar com o contexto: se a pergunta for feita a um filósofo, teremos uma resposta; se for feita a um hörnern do campo, certamente será outra. Por exemplo, para um filósofo, ser um hörnern pode implicar questöes de ordern existencial, etc.; para um hörnern do campo, pode signifícar simplesmente questóes de ordern prática, como aquele que sustenta a casa, etc. Chamaremos, pois, a expressäo destacada ser um hörnern, da sentenga (6b), de mengäo, e a expressäo ser um hörnern da sentenga (6a), de uso.3 Fica claro, pois, que o objeto de estudo da semántica e a mengäo das sentengas e das palavras isoladas de seu contexto; e o objeto de estudo da pragmática é o uso das palavras e das sentengas inseridas em determinado contexto. Separar as nogöes de mengäo e de uso também facilita perceber a distingáo entre lingua objeto e metalinguagem. É muito difícii o trabalho do lingüista, que tem que usar a lingua para descrever seu objeto de estudo — a propria lingua. Veja que a física pode se valer da matemátíca para explicitar certos fenómenos físicos. Portanto, o objeto de estudo da física é o fenömeno físico e a metalinguagem pa ra descrevé-la pode ser a matemática. Já o lingüista brasileiro usa a propria lingua, ou seja, o portugués brasileiro para descrever os fenómenos linguísticos observados. Porém, se fizermos a distingáo entre uso e mengäo, poderemos estabelecer que o objeto de estudo do lingüista é a mengáo da lingua e a metalinguagem usada é o uso da lingua. Como tal distingáo nem sempře é táo nitida, existem teorias que preferem usar algum tipo de formalismo como metalinguagem, por exemplo, a linguagem logica usada em teorias de semántica formal. A adogáo de uma metalinguagem diferente da propria lingua elímína prováveis distúrbios na análise linguística. 13 Quíndo a expressäo apsrece entre aspas simples ou itálico (geralmente deniro do texto), isso signifies que a msncáo da expressäo está senoa utilizada. Ä utilizagäo ce aspas duplas ir.dioa o p'oferimento da sentenga. ou seja, a agäo realizada, o uso da sentenca. CAPÍTULO 1 A INVES71GAQÄO 00 SIGNIFICADO 19 3. O Objeto de Estudo da Semántica Como já realcei acima. os semanticistas estäo de acordo quanto a algumas propriedades preliminares da lingua que uma teória sernäntíca deve explicar. Além dessas propriedades, existem também algumas propriedades pragmáticas que sempře säo consideradas relevantes, mesmo dentro de um estudo semantico. Isso se deve ao fato de que a semántica näo pode ser estudada somente como a interpretacäo de um sistema abstrato, mas também tern que ser estudada como um sistema que interage com outros sistemas, no processo da comunicacäo e expressäo dos pensamentos humanos. Tentarei explorar, neste manual, a maior parte dos fenômenos básicos dessa tarefa semántica. Entretanto, terei que optar por recortes, pois, em um só livro, séria impossível tratar de tantas questôes. Vejamos, pois, os assuntos específicos a serem aqui estudados: a composicionalidade e a expressividade das línguas, as propriedades semänticas e as nogóes de referencia e representagäo. 3.1 A composicionalidade e a expressividade lingúísticas Todas as línguas dependem de palavras e de sentengas dotadas de significado: cada palavra e cada sentenga está convencionalmente associada a pelo menos um significado. Desse modo, urna teória semántica deve, em relagäo a qualquer lingua, ser capaz de atribuir a cada palavra e a cada sentenga o significado (ou significados) que lhe(s) é (säo) associado(s) nessa lingua. No caso das palavras, isso significa essencialmente escrever um dicionário. No caso das sentengas, o problema é outro. Em todas as línguas, as palavras podem ser organizadas de modo a formar sentengas e o significado dessas sentengas depende do significado das palavras nelas contidas. Entretanto, näo se trata de um simples processo de acumulagäo: gatosperseguem cäes e cäes perseguem gatos näo significant a mesma coisa, embora as palavras das duas sentengas sejam as mesmas. Portanto, urna teória semántica deve näo só apreender a natureza exata da relagäo entre o significado de palavras e o significado de sentengas, mas deve ser capaz de enunciar de que modo essa relagäo depende da ordem das palavras ou de outros aspectos da estrutura gramatica! da sentenga. Observe que as infinitas expressôes sintáticas, altamente complexas ou näo, tém associados a elas significados que nós näo temos nenhum problema para entender; mesmo se nunca tivermos ouvido a expressäo anteriormente. Porexemplo: (7) O macaco roxo tomava um sorvete no McDonald's. Provavelmente, vocé nunca ouviu essa sentenga antes, mas, ainda assim, voce pode facilmente entender seu conteúdo. Como isso é possível? A experiéncia de se entender frases nunca escutadas antes parece muito com a experiéncia de se somar números que vocé nunca somou antes: (8> 155-26=181 Chegamos ao resultado em (8), porque nós conhecemos alguma coisa dos números e sabemos o aigoritmo da adigáo (as etapas seguidas para adicioná-los). Tentemos explicitar o procedimento que nos fez chegar ao resultado em (8): 20 MANUAL DE SEMÁNTICA (9) a. Coloque os números na vertical, conservando as unldades debaixo de unidades, dezenas debaixo de dezenas, centenas debaixo de centenas; b. Some as unidades; c. Transporte para a casa da dezena o que ultrapassar 10; d. Repita a operagáo para as dezenas e as centenas. Provavelmente, por um processo semelhante, entendemos a sentenca em (7): sabemos o que cada palavra significa e conhecemos o algoritmo que, de algum jeito, as combina e faz chegar a um resultado final, que é o significado da sentenca. Portanto, parte da tarefa de uma teoria semántica deve serfalar alguma coisa sobre o significado das palavras e falar alguma coisa sobre os algoritmos que combinam esses sígnificados para se chegar a um significado da sentenca. Lidaremos, pois, dentro do estudo semántico, com a pa.lavra como a menor unidade dessa composigáo, e as frases e sentences como a maior unidade de análise. Em todos os capítulos děste livro, as questóes abordadas envolvem, de alguma forma, esse processo de construgáo do significado. 3.2 As propriedades semánticas Os falantes nativos de uma lingua tem algumas intuigóes sobre as propriedades de sentencas e de palavras e a maneira como essas sentencas e palavras se rela-cionam. Por exemplo, se um falante sabe o significado de uma determinada sentenca, intuitivamente sabe deduzir várias outras sentengas verdadeiras a partir da primeira. Essas intuigóes parecem refletir o conhecimento semántico que o falante tem. Esse cornportamento linguístico é mais uma prova de que seu conhecimento sobre o significado náo é uma lišta de sentengas, mas um sistema complexo, ou seja, o falante de uma lingua, mesmo sem ter consciéncia, tem um conhecimento sistemático da lingua que Ihe permite fazer operagoes de natureza bastante complexa. Portanto, uma outra tarefa da semántica deve ser caracterizar e explicar essas relagoes sistemá-ticas entre palavras e entre sentencas de uma lingua que o falante é capaz de fazer. Veremos essas relagoes detalhadamente mais a frente. Porém, como uma ilustragáo, mostrarei quais sáo essas propriedades: a) As relagoes de implicagáo como hiponímia, acarretamento, pressuposigao e impli-catura conversacional: (10) a. Joáo comprou um carro. b. Joáo comprou alguma coisa. (11) a. Joáo parou de fumar. b. Joáo fumava. (12) a. Puxa! Está frio aqui. b. Voce quer que eu feche a janela? Das sentengas acima, pode-se dizer que qualquer falante deduz, a partir da verdade da sentenga (10a), a verdade da sentenga (10b); díz-se, pois, que (10a) acarreta (10b). CAPÍTULO 1 A INVESTIGACÄO DO SlGWIFICADO 21 Também se pode inferir que o sentido da expressäo a/guma coisa está contido no sentido da palavra carro; diz-se, entäo, que carro é hipônirmo da expressäo a/guma coisa. Em relagäo ao exemplo (11). percebe-se que, para se afirmar a sentenga (a), tem-se que tomar (b) como verdade; tem-se, entäo, que (11a) pressupôe (11b). De (12), pode-se dizer que a sentenga (a) sugere urna possível interpretagäo como a de (b). Estudaremos essas relagôes de implicagáo nos capítulos 2 e 8. b) As relagôes de paráfrase e de sinonímia: (13) a. O menino chegou. b. O garoto chegou. No par de sentengas acima, podemos perceber que a palavra menino pode ser trocada porgaroto, sem que haja nenhuma interferencia no conteúdo informacional da sentenga; temos, entäo, urna relagäo de sinonímia entre essas palavras. Também as sentengas acima passam a mesma informagäo, ou seja, se a sentenga (a) é verdadeira, a sentenga (b) também é verdadeira; e se (b) é verdadeira, (a) também o é. Diz-se, entäo, que (13a) é paráfrase de (13b). Essas relagôes seräo vistas no capítulo 3. c) As relagôes de contradigäo e de antonímia: (14) a. Joäo está feliz. b. Joäo está triste. Em (14), qualquerfaiante tem a intuigäo de que as duas sentengas náo podem ocorrer ao mesmo tempo e, por isso, diz-se que säo sentengas contraditórias. O que leva as sentengas a serem contraditórias säo as palavras feliz e triste, que tém sentidos opostos e säo, assim, chamadas de antônimos. Também essas nogôes seräo investigadas no capítulo 3. d) As relagôes de anomália e de adequagäo: (15) Idéias verdes incolores dormem furiosamente. Uso, aqui, o clássico exemplo de Chomsky (1957), para ilustrar o que conhecemos como anomália: urna sentenga com um significado totalmente incoerente. Urna característica das expressóes anômalas é a sua inadequagäo para o uso na maioria dos contextos. As pessoas parecem ser capazes de julgar se determinadas expressóes säo adequadas ou näo para serem proferidas em contextos particulares, ou seja, säo capazes de estabelecer as condigóes de adequagäo ao contexto, ou, como também säo conhecidas, as condicóes de felicidade de um proferimento. Estudaremos mais detalhadamente essas propriedades nos capítulos 3 e 8. e) As relagôes de ambigúidade e de vagueza Urna teória semäntica também pretende explicaras diversas ambiguidades queexistem na lingua, ou seja, a ocorréncia de sentengas que tém dois ou mais significados: (16) a, Joäo pulou de cima do banco. b. O guarda bateu na velha com a bengala. 22 MANUAL DE SEMÁNTICA Diferentes questöes estäo implicadas nas ambigüidades das sentengas em portugués. Em (16a), por exemplo, o item lexical banco gera as duas interpretagóes possíveis para a sentenga: Joáo pulou do alto de um banco, assento ou Joáo pulou do a/to de um banco, prédio. Em (16b), é a organízagáo estrutural da sentenca que gera a ambigüidade: o guarda bateu com a bengala na velha, ou o guarda bateu na velha que estava com a bengala. Náo só o léxico e/ou a sintaxe geram as ambigüidades das línguas, mas também é comum observar questöes de escopo, de papéis temáticos, de déixis, de anáfora, de vagueza dos termos, entre outras questöes, como geradoras desse fenômeno. Veremos isso detalhadamente no capítulo 4. f) Os protótipos e as metáforas A nogäo de protótipos surge com Rosch (1973, 1975), que assume a incapacidade de conceituarmos os objetos do mundo (mesmo abstratos) de uma maneira discreta, isto é, que cada objeto pertenga a uma única categoria específica. Lingüistas que trabalham com a idéia de protótipos assumem que náo sabemos diferenciar, por exemplo, quando uma xícara passa a ser uma tigela: será xicara quando seu diámetro for 5 cm, 7 cm, 10 cm... mas 15 cm? Já será uma tigela? Ou ainda será uma xícara, mas com características de tigela? Ou será uma tigela com características de xícara? Portanto, existem certos objetos que estäo no limiar da divisao de duas ou mais categorias, outros säo mais prototipicos, ou seja, possuem um maior numero de tragos de uma determinada categoria. A proposta da teoria dos protótipos é conceber os conceitos como estruturados de forma gradual, existindo um membro tipico ou central das categorias e outros menos tipicos ou mais periféricos. Veremos a nogäo dos protótipos no capítulo 6. Outro ponto a ser investigado neste manual é a metafora. As metáforas sáo entendidas, geralmente, como uma comparagäo que envolve identificagäo de semelhangas e transferéncia dessas semelhangas de um conceito para o outro. Como ilustra o exemplo em (17): (17) Este problema está sem solugäo: náo consigo achar o fio da meada. Transpöe-se o conceito da meada de la, que só se consegue desenrolar quando se tem a ponta do fio, para o conceito de um problema complicado. A metafora tem sido vista, tradicionalmente, como a forma mais importante de linguagem figurativa e atinge o seu maior uso na linguagem literária e poética. Entretanto, é fácil encontrar, em textos jornalísticos, publicitários e mesmo na nossa linguagem do dia-a-dia, exemplos em que se emprega a metafora. Os cognitivistas afirmam que a metafora faz parte da linguagem ordinária e é vista como sendo uma maneira relevante de se pensar e falar sobre o mundo. Também a nogäo de metafora será vista no capítulo 6. g) Os papéis temáticos Seguindo a posigäo de alguns lingüistas, como Larson & Segal (1995), Jackendoff (1983, 1990) e outros, incluirei, neste livro, esse tipo de relagäo que atualmente é mais conhecida na literatura como papéis temáticos (essa nogäo também é conhecida como papéis participantes, casos semänticos profundos, papéis semánticos ou relagöes temáticas): CAPÍTULCi ', A IWESTIGAQÁO DO SIGNIFICADO 23 (18) a. Joáo matou seu co/ega. b. Maria preocupa sua mše. c. Mana recebeu um prémio. d. Joäo jogou a bola. Todas as sentengas acima tém uma estrutura semäntica comum, um paralelismo semäntico. Existe uma idéia recorrente de mudanga, de afetagáo: o co/ega mudou de estado de vida, a máe mudou de estado psicológico, Maria teve uma mudanga em suas posses e a bola teve uma mudanga de lugar. Essas relagöes similares que se estabelecem entre os itens lexicais, mais geralmente entre os verbos e os substantivos das línguas, säo conhecidas como papéís temáticos. Nos exemplos acima, dizemos que o elemento em itálico tem o papeí temático de terna e definimos terna como o elemento cuja situagäo mudou com o efeito do processo expresso pela sentenga. Como veremos, terna é apenas um dos papéis temáticos possíveis; há vários outros que seräo estudados no capítulo 7. h) Os atos de fala Apesar de o papei central do uso da lingua ser a descricáo de estados de fatos, sabemos, também, que a linguagem tem outras fungöes, como ordenar, perguntar, sugerir, o que vai além de urna simples descrigäo; na realidade, a linguagem é a propria agäo em situagôes como essas. No capítulo 8, veremos esses tipos de atos de fala existentes na linguagem, tais como, ato locutivo, ilocutivo e perlocutivo; ainda veremos verbos perfomativos, que säo verbos que já trazem implícítos urna acáo. Como exemplos de verbos perfomativos, temos: (19) a. Eu te ordeno sair imediatamente. b. Aviso-te que será a ultima vez. 3.3 Referencia e representagäo Um terceiro ponto a ser estudado por urna teória semäntica diz respeito ä natureza do significado. Existe urna divisáo sobre essa questäo: para alguns lingüistas, o significado é associado a urna nogáo de referencia, ou seja, da ligagäo entre as expressöes lingüisticas e o mundo; para outros, o significado está associado a urna representagäo mental. As teorias que tratam do significado sob o ponto de vista da referencia säo chamadas de semäntica formal, ou semäntica logica, ou semäntica referencial, ou ainda semäntica de valor de verdade. Os fenômenos semänticos que seräo tratados dentro dessa perspectiva teórica estáo nos capítulos 2, 3, 4 e 5. No capítulo 5, mais especificamente, tratarei da relagäo de referencia e sentido. Portanto, um ponto relevante a ser investigado por urna teória lingiiística é a relagäo entre a lingua e o mundo: o significado externo da lingua, segundo BarwiseS Perry (1983). Por exemplo, certaspalavrasfazem referencia a determinados objetos, e aprender o que significant essas palavras é conhecer a referencia delas no mundo: (20) Noam Chomsky refere-se a um famoso lingüista. MANUAL DE SEMÄNTICA Só podemos usar a sentenga acima de urna forma adequada, se estamos nos referindo ao mesmo linguists a que todas as pessoas se referem quando usam o nome Noam Chomsky. Referencia näo é urna relagäo como implicagáo ou contradigäo, que se dá entre expressôes lingúísticas. Ao contrário, é urna relagäo entre expressôes e objetos extralingúísticos. As teorias que tratam do significado do ponto de vista representacional, ou seja, o significado como urna questäo de representagäo mental, que näo tem relagäo com a referencia no mundo, säo conhecidas como teorias mentalistas, ou representacionais, ou ainda cognitivas. Estudaremos alguns fenômenos semänticos sob a ótica da abordagem mentalista nos capítulos 6 e 7. O estudo da representagäo envolve a ligagäo entre linguagem e construtos mentais que, de alguma maneira, representam ou codificam o conhecimento semantico do falante. A idéia geral é que temos maneiras de representar mentalmente o que é significado por nós e pelos outros, quando falamos. O foco da questäo está em entender o que os ouvintes podem inferír sobre os estados e os processos cognitivos, as representagôes mentais, dos falantes. As pessoas se entendem porque säo capazes de reconstruir as representagôes mentais nas quais os outros se baseiam para falar. O sucesso da comunicagäo depende apenas em partilhar representagôes e näo, fazer a mesma ligagäo entre as situagôes do mundo e as expressôes lingúísticas. Parece ser verdade a afirmagäo de que, se a nossa fala sobre o mundo funciona täo bem, é por causa das similaridades fundamentals das nossas representagôes mentais. Temos, ainda, alguns outros lingúistas que concebem a possibilidade de essas duas abordagens serem compiementares. 3.4 Exercícios I. Exemplifique linguisticamente e explique os dois tipos de conhecimento que estäo envolvidos no significado do que é dito. II. Faca urna relagäo entre seus exemplos e as nogóes de mencäo, uso, lingua objeto e metalinguagem. III. Explique as propriedades básicas da linguagem que teorias semänticas devem abordar. 4. Indicagóes Bibliográficas Em portugues: CHIERCHIA (2003, cap. 1), PIRES DE OLIVEIRA (2001, cap. 1), LYONS (1977, cap. 1) e KEMPSON (1977, cap. 1). Em ingles: SAEED (1997, cap. 1), CHIERCHIA & McCONNELL-GINET (1990, cap. 1), LARSON & SEGAL (1995, cap. 1), HURFORD & HEASLEY (1983, cap. 1) e CANN (1993, cap. 1). PARTE 2 ALGUNS FENÓMENOS SEMÄNTICOS SOB A OTICA DE UMA ABORDAGEM REFEREIMCIAL CAPÍTULO 2 IMPL1CACÓES 1. Implicagóes ou Inferéncias A primeira propriedade a ser estudada no nosso manual será a nogäo de implicagäo. A palavra implicagäo, na linguagem cotidiana, remete a várias nogöes, tais como inferéncias, dedugöes, acarretamentos, pressuposigóes, implicaturas, etc., sem que haja uma distingáo entre elas. É comum escutarmos as frases "isso acarreta uma série de problemas", ou "isso implica uma série de problemas", como sendo frases semelhantes. Aqui, tratarei da nogäo de implicagäo de uma maneira mais rigorosa, seguindo a tradigäo dos estudos em uma abordagem referencial. Existe uma gradagáo entre esses conceitos, indo da nogäo mais restrita de acarretamento ä nogäo mais abrangente de implicatura conversacional. O acarretamento é uma nogäo estritamente semántica, que se relaciona somente com o que está contido na sentenga, independentemente do uso da mesma. A nogäo de pressuposigäo1 relaciona-se com o sentido de expressöes lexicais contidas na sentenga, mas também se refere a um conhecimento prévio, extra ling üistico, que o falante e o ouvinte tem em comum; pode-se dizer que a pressuposigäo é uma nogäo semántico-pragmática. A implicatura, Estou me referindo aqui apanas á nocao de pressuposigäo logica ou semántica; na literatura de semántica, encorvtram-se outras nogöes de pressuposigäo de que náo tratarei neste livro MANUAL DE SEMÁNTICA conhecida como implicatura conversacional, é uma nogáo estritamente pragmática, que depende exclusivamente do conhecimento extralinguístico que o falante e o ouvinte těm sobre um determinado contexto. Neste capítulo, tratarei das duas primeiras nogoes de implicagáo, o acarretamento e a pressuposigáo, que geralmente sáo nogoes tratadas dentro da abordagem referencial. A implicatura conversacional, que está relacionada ao uso da lingua, será abordada no capítulo 8, em que apresentarei fenómenos que sáo, geralmente, tratados dentro de uma abordagem pragmática. 2. Hiponímia e Acarretamento Para entendermos a nogáo de acarretamento, que é uma relagáo entre sentengas, vejamos antes a nogáo de hiponímia, que é uma relagáo similar, mas que se dá entre palavras. A hiponímia pode ser definida como uma relagáo estabelecida entre palavras, quando o sentido de uma está incluído no sentido de outra: (1) a. pastor alemáo cachorro -► animal b. rosa flor -»• vegetal c. fusca -* carro d. rnagá -+ fruta -•> vegetal Pelos exemplos, podemos perceber que a hiponímia é uma relagáo lingúística que estrutura o léxico das línguas em classes, ou seja, pastor alemáo pertence ä classe dos cachorros, que, por sua vez, pertencem ä classe dos animais; rosas sáo flores que, por sua vez, sáo vegetais, etc. Vamos estabelecer que cada exemplo acima forma uma cadeia. O item lexical mais específico, que contém todas as outras propriedades da cadeia, é chamado de hipônimo; o item lexical que está contido nos outros itens lexicais, mas náo contém nenhuma das outras propriedades da cadeia, o termo mais geral, é chamado de hiperônímo. Por exemplo, em (la),pastor alemäo é o hipônimo da cadeia apresentada, e animal, o hiperônímo, A relagáo de hiponímia é assimétrica, ou seja, o hipônimo contém o seu hiperônimo, mas o hiperônimo náo contém o seu hipônimo: todo cachorro é um animal, mas nem todo animal é um cachorro. O sentido da palavra animal está contido na palavra cachorro, mas o inverse náo é verdadeiro. Se pensarmos em uma decomposigáo lexical em termos de propriedades semánticas que cornpôern o sentido da palavra cachorro, teríamos o seguinte: (2) cachorro - animal2 + quadrúpede + mamífero A notaeäo [+...] e [-...] 6 usada para indicar cue aquela propriedaoe e existente ou näo. no item ''exical. Por exemplo, Quando indico que cachorro: '+ animal], estou me referindo ao fato de que a oalavra cachorro contem a proprieosde de ser animal; poderia afirmar, tambern, que cachorro: [- humano], pois a propriedade de ser humano näo estä presents no item lexical cachorro. CAPÍTULO 2 i IMPLÍCAQÓES j O exemplo em (2) evidencia o tato de que o sentido de animal está contido no sentido de cachorro. Experimente fazera decomposigäo lexical em propriedades semänticas para os outros exemplos em (1). Estendendo a nogáo de hiponímia para as sentencas, chegamos ä nogáo de acar-retamento, que pode ser entendida como a relagäo existente entre sentencas, quando o sentido de urna sentenga está incluído no sentido de outra. Essa relagäo é mais complexa. Tomemos um exemplo: (3) a. Isto é urna cadeira e é de madeira. b. Isto é urna cadeira de madeira. Qualquerfalante do portugués sabe que a informagáo contida em (3b) está incluída em (3a) e que, portanto, podemos concluír que (3a) acarreta (3b). Veja que, se a sentenga em (3a) for'verdadeira, conseqüentemente a sentenga em (3b) também será verdadeira; séria contraditório afirmara primeira sentenga e negar a segunda: (4) a. Isto é urna cadeira e é de madeira. b. Mas isto näo é urna cadeira de madeira. Esse conhecimento é parte do conhecimento sobre o que essas sentengas signi-ficam: näo precisamos saber nada sobre o objeto mostrado, a náo ser o fato de que é o mesmo objeto nas duas afirmagôes. Agora vejamos as sentengas em (5): (5) a. Joäo é alto e é um jogador de basquete. b. Joäo é um jogador de basquete alto. Voce diria que (5a) acarreta (5b)? Se voce respondeu näo, acertou, pois o problema agora é outro. Imaginemos que estamos apontando para os jogadores de basquete, que, em realidade, säo altos. Estamos certos em afirmar (5a). Mas imaginemos que, entre os jogadores de basquete, vocé náo julgue Joäo como sendo um dos mais altos, ao contrario, ele é o jogador mais baixo em comparagäo aos outros. Nesse caso, séria perfeitamente razoável negar (5b): (6) a. Joäo é alto e é um jogador de basquete. b. Mas Joäo näo é um jogador de basquete alto; na verdade, ele é o mais baixo do time.3 Portanto, a sentenga (5a) näo acarreta a sentenga (5b), pois, se a sentenga em (5a) for verdadeira, a sentenga em (5b) näo tern que ser necessariamente verdadeira; ou seja, podemos negar a sentenga (5b), que ela näo ficará contraditória á sentenga (5a); A diferenga entre (3) e (5] é gersda pela natureza relacíonal do adjetivoafro. Um objero é de madeira ou näo é. En:retanto, a nocäo de ako é relativa a que o adjeťvo está se referindo. Os jogEdores de basquete säo aitos, o'e urna rr.aneira geral, se os compararmos a outros indivíduos. Mas, quando nos referimos a jogadores de basquets, 1,80 m é ser alto em geral, mas näo é alto para um jogador de basquete; a média de altura de jogadores de basquete é de 1,90 m, logo um jogador de basquete de 1,80 m näo ó um jogador de basquete alto. O que acontece com o exemplo em (5i é que o adjetivo alto, usado em (a), es:á se referindo aos indivíduos em geral e, em (bl, está se referindo aos jogadores de basquete. Por isso, o conteúoo de |5b) näo está contido, necessariamente, em [5aI. MANUAL DE SEMÄNTICA ou mesmo podemos perceber que a informagäo da sentenga (5b) näo está contida na informagäo da sentenga (5a). Baseando-nos nesses argumentos, chegamos ás seguintes definigöes para a nogäo de acarretamento: (7) Duas sentengas estabelecem uma relagäo de acarretamento se;4 - a sentenga (a) for verdadeira, a sentenga (b) também é verdadeira; - a informagäo da sentenga (b) está contida na informagäo da sentenga (a); - a sentenga (a) e a negagäo da sentenga (b) säo sentengas contraditórias.5 Assim como a hiponímia, o acarretamento também é uma relagäo assimétrica, ou seja, urna sentenga contém outra, mas näo necessariamente essa segunda contém a primeira. Quando temos urna relagäo simétrica, ou seja, a sentenga (a) acarreta a sentenga (b) e a sentenga (b) também acarreta a sentenga (a), temos a relagäo de paráfrase, que veremos mais ä frente. O que fazemos ao estabelecer os acarretamentos de urna sentenga é tirar-lhetodas as informagöes que acrescentamos, a partir das nossas experiéncias, do nosso conhecimento de mundo, e deixar somente o que está explícito nas relagôes expressas pelos itens lexicais dessa sentenga, ou seja, o sentido exclusivamente literal. Em outras palavras, o acarretamento é uma propriedade que nos mostra exatamente o que está sendo veiculado por determinada sentenga, nada além. Essa é a dificuldade, pois estamos habituados a entender sentengas com todas as outras informagöes extralingüisticas que possam também estar associadas a essa sentenga, a quern profere a sentenga e a quern escuta a sentenga. Ao estabelecer os acarretamentos de uma sentenga, estamos fazendo uma espécie de triagem do que está além daquele objeto, para poder analisar somente o proprio objeto. Antes de voce exercitar-se um pouco, analisemos alguns exemplos. Aplicaremos as definigöes dadas acima, para estabelecer se há a relagäo de acarretamento entre as sentengas a seguir. E importante ressaftar que, se usarmos somente a nossa intuigäo, muitas vezes näo conseguiremos perceber qual ó realmente o significado de determinada sentenga. Por isso, como urn bom procedimento metodoiógico, vamos sempre aplicar as definigöes (uma das trés) nos exercícios propostos. Vejamos, pois, se a sentenga (8a) acarreta a sentenga (8b): (8) a. Hoje o sol está brilhando.6 b. Hoje está quente. A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), porque, se é verdade que hoje o sol está brilhando, näo é necessariamente verdade que hoje está quente, ou seja, se (a) é verdade, (b) näo é verdade necessariamente. Também podemos perceber que a informagäo de que hoje está quente näo está contida na informagäo de que hoje o sol está brilhando, ou seja, Veja que podemos usar uma ou outra defínicäo, pais todas tém o mesmo sentido. O que veremos é que, metodologicamente, para estabelecer os acarretamentos, as vezes é mais fácil empregar determinada defmigao. 5 Duas sentengas sáo contraditórias quando elas descreverem situacčes que säa impossíveis de ocorrer simultaneamenie no mundo. 6 Os exemplos e os exercícios apresentados neste capítulo sáo tirades de CANCADO (1993) ou traduzidos eadaptados de CHIERCHIA5 McCONNELL-GI NET (1990), H UR FORD & HEASLEY (1983) e SAEED [1997). CAPÍTULO Z (MPLICACOES 29 a informagáo da sentenga (b) náo está contida na informagáo da sentenga (a). Ou ainda, se negarmos a sentenga (b), ela náo ficará contraditória á sentenga (a): hoje o sol está brilhando, mas hoje náo está quente; é perfeitamente possível que essas duas sentengas estejam narrando fatos que ocorram simultaneamente no mundo. Vejamos um segundo exemplo. (9) a. Jane comeu uma fruta no café da rnanhá. b. Jane comeu uma fruta. Se é verdade que Jane comeu uma fruta no café da rnanhá, é necessariamente verdade que Jane comeu uma fruta. Portanto, podemos afirmar que a sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagáo de (b) está contida em (a); ou porque se (a) é verdade, (b) também é verdade; ou ainda, a negagáo da sentenga (b) é contraditória á sentenga (a), pois é contraditório afirmar que Jane comeu uma fruta no café da rnanhá, mas Jane náo comeu uma fruta. Como terceiro exemplo, temos: (10) a. Jane tornou café esta rnanhá. b. Jane tornou algo quente esta rnanhá. A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) náo é verdade necessariamente; se é verdade que Jane tornou café esta rnanhá, náo é necessariamente verdade que Jane tornou algo quente esta rnanhá, pois o café estava frio, por exemplo. Tente aplicar as outras definigoes, como exercício. No exemplo (11), temos: (11) a. Joao náo sabe que Maria está gravida. b. Maria está gravida. A informagáo de que Maria está gravida está contida na informagao de que Joáo náo sabe que Maria está gravida. Portanto, a sentenga (a) acarreta a sentenga (b), pois a informagáo de (b) está contida em (a). Novamente, tente as outras definigoes. Como ultimo exemplo: (12) a. Joáo pensa que Maria está gravida. b. Maria está gravida. A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), pois a negagáo da sentenga (b) náo é contraditória á sentenga (a): é perfeitamente possível dizer que Joáo pensa que Maria está gravida, mas Maria náo está gravida. De posse das informagoes dadas, tente voce fazer os exercícios propostos. I MANUAL DE SEMÁNTICA 2.1 Exercícios I. Diga se existe a relagäo de hiponímia nos pares abaixo (observando a direcäo da seta) usando a estratégia de decompor os itens lexicais em propriedades semanticas: 1. homem animado 2. gente -»■ crianga 3. onga -*■ rnamífero 4. liquidificador -*■ eletrodoméstico 5. vegetal árvore II. Para cada par de sentengas, diga se a sentenca (a) acarreta a sentenga (b) e justi fique sua resposta, usando urna das trés definigöes estudadas. 1) a. Os estudantes náo väo ä festa, b. Todo estudante vai ä festa. 2) a. Algumas vezeš, Joao é um bom instrumentista. b. Joao é um bom instrumentista. 3) a. Joao sabe que porcos näo tém asas. b. Porcos náo tém asas. 4) a. Joáo pensa que porcos náo těm asas. b. Porcos náo tém asas. 5) a. Oscar e Jose säo ricos. b. José é rico. 6) a. Oscar e José sáo de meia-idade. b. Oscar é de meia-idade. 7) a. Todo mundo saberá a resposta čerta, b. Ninguém saberá a resposta čerta. 8) a. Joáo é solteiro. b. Joáo nunca se casou. 9) a. Nós acabamos de comprar um cachorro. b. Nós acabamos de comprar alguma coisa. 10) a. Seu discurso me confundiu. b. Seu discurso me confundiu profundamente. 11) a. Ninguém teve uma vida boa por lá. b. Alguém teve uma vida boa por lá. CAPITULO 2 01 IMPLICAQŮES Jl 12) a. Os rapazes correram para casa. b. Os rapazes foram para casa. 13) a. É difícil cagar elefantes. b. Elefantes sáo difíceis de cagar. 14) a. Maria e Joáo sáo gémeos. b. Joáo e Maria tém a mesma fisionomia. 15) a. Que Maria tenha conseguido vencer náo abalou Joáo. b. Maria venceu. 16) a. Náo foi Maria que chegou tarde. b. Alguém chegou tarde. 17) a. Paulo parou de fumar. b. Paulo fumava. 18) a. Maria acha que José já chegou. b. José chegou. 19) a. Paulo e Maria ainda sáo felizes. b. Paulo é feliz. 20) a. Houve um roubo no banco, b. O banco foi roubado. 21) a. Que a Marta tenha fugido náo surpreendeu seu namorado. b. Maria fugiu. 22) a. Náo foi o menino que caiu. b. Alguém caiu. 23) a. Maria acredita que aves voam. b. Aves voam. 24) a, O presidente do Brasil anda muito gordo. b. Existe um presidente do Brasil. 25) a. Paulo continua a falar dos outros. b. Paulo falava dos outros. MANUAL DE SEMANTIC A 3. Pressuposigäo Para tratar da nogäo de pressuposigäo, seguirei a linha mais tradicional da abordagem referencial, focalizando a atengäo somente nas chamadas pressuposicöes lógicas ou semänticas.7 Entretanto, proponho que as pressuposicöes também tenham algumas características pragmáticas e, por isso, vou assumi-las como sendo urna nogáo semántico-pragmática. Afirmo isso por concordar com llari & Geraldi (1987:76), quando afirmam que "em algum sentido as pressuposigöes näo fazem parte do conteúdo assertado [ou seja, característica pragmática -comentário meu]; entretanto, é preciso salientar que no processo pelo qual somos levados a compreender um conteúdo pressuposto, a estrutura lingüistica nos oferece todos os elementos que nos permitem derivá-Io [ou seja, característica semäntica - comentário meu]". Portanto, se pensarmos em um continuo para as implicagöes, a pressuposigäo estará localizada no meio, como uma relagäo semantico-pragmátíca, diferentemente dos acarretamentos, em que säo inferidas expressöes baseando-se exclusivamente no sentido literal de outras, ou seja, uma relagäo estritamente semäntica, diferentemente das implicaturas conversacionais, que säo nogöes estritamente pragmáticas. Frege (1892) observou que existe um tipo de conteúdo em certas sentengas que näo é afetado, quando essas sentengas säo negadas, ou säo colocadas em uma forma interrogativa, ou mesmo como uma condicional antecedendo outra sentenga. Por exemplo: (13) a. Jose emprestou o carro dele para Pedro. a'. Näo é verdade que Jose emprestou o carro dele para Pedro, a". Jose emprestou o carro dele para Pedro? a'". Se Jose emprestou o carro dele para Pedro, Pedro deve estar contente. Nas sentengas em (13), o fato de o carro pertencer a Jose permanece inalterado. Podemos, entäo, afirmarqueasoragöes afirmativa, negativa, interrogativa e condicional com o verbo emprestar compartilham um tipo especifico de conteúdo. A esse conteúdo compartilhado pelas sentengas em (13), Frege deu o nome de pressuposigäo. Portanto, podemos dizer que as sentencas em (13) pressupôem a sentenga o carro pertence a José. Vejamos um outro exemplo: (14) a. O Joäo parou de fazer caminhadas. a'. O Joäo näo parou de fazer caminhadas. a". Se o Joäo parou de fazer caminhadas,... a'". O Joäo parou de fazer caminhadas? A pressuposigäo é cretads pele literatura sob diferentes perspeotivas. Existem autores que a conoebem dentro da abordagem referencial, como está sendo aquitratada (CHIERCHIA & McCONNELL-GINET, 1990; CHIERCHIA, 20Ü3, LYONS, 1 977; KEMPSON, 1977; entre outros]; outros que as dividem em pressuposigöes semänrcas e pressuposigöes pragmáticas (LEECH, 19311: e outros que as concebem somente como relacôes pragmáticas (STALMAKER ,1974; LEWIS, 1979 e SPERBER 8 WILSON, 1995). capítulo 2 mpl1cacúes Podemos afirmar que existe um conteúdo que é com parti I nado portodas as sentengas acima: oJoáotinha o hábito de fazer caminhadas; as sentengas em (14) pressupöem essa sentenga. Para que alguém diga qualquerdas sentengas em (14), ele e seu interlocutor tém que compartilhar e assumircomo verdade, ou seja, tomar como verdade urna informagäo anterior á sentenga proferida. Se for verdade que 'Joäo parou de fazer caminbadas". que "Joäo näo parou de fazer caminhadas", ou para que eu faca a pergunta "o Joäo parou de fazer caminhadas?", ou ainda, que eu coioque uma condigäo antecedente como "se Joäo parou de fazer caminhadas...", temos que tomar como uma verdade anterior que "Joäo tinha o hábito de fazer caminhadas". E se existe uma informagäo extralingüistica envolvida para que tais sentengas sejam proferidas, uma informagäo anterior ao proprio proferimento das sentengas em (14), podemos concluir que temos ai um tipo de conhecimento pragmatice Entretanto, essa suposigäo só é derivada a partir da estrutura lingüistica da propria sentenga; säo determinadas construgöes, expressöes lingüisticas, que desencadeiam essa pressuposigäo. No caso em (13), por exemplo, é sormente a partir do verbo emprestar que podemos inferir que quem empresta é dono do carro. No caso em (14), ésomente a partir da expressaoparou de... que podemos inferirque Joäo tinha o hábito de fazer... Por isso, escolhp tratar a nogäo de pressuposigäo como sendo semäntico-pragmática. Vejamos as diferengas existentes entre acarretamento e pressuposigäo, mesmo sendo essas duas nogöes consideradas, de uma maneira mais ampla, como implicagöes (ou, também, inferéncias). Primeiramente, podemos observar que acarretamento é uma relagäo entre duas sentengas. de tal modo que a verdade da segunda decorre da verdade da primeira; é exclusivamente a partir da sentenga proferida que podemos inferir alguma verdade, envolvendo assim o conhecimento estritamente semäntico. Já a pressuposigäo é um conhecimento compartilhado porfalante/ouvinte, prévio ä sentenga proferida, ainda que seja desencadeado a partirdesta; envolve um tipo de conhecimento semäntico, mas também exige um conhecimento pragmatice Outro traco distintivo entre a pressuposigäo e o acarretamento é que, apesar de as duas nogöes serem implicagöes, a primeira envolve näo somente urna implicagäo, mas uma família ďe implicagöes. Em termos sintáticos, chamaremos de família de uma determinada sentenga as quatro formas dessa sentenga: a declaracäo afirmativa, a negagäo dessa afirmativa, a interrogagäo e a condigäo antecedente. Só ocorrerá a relagäo de pressuposigäo, se todas as quatro formas acima de uma determinada sentenga (a), ou seja, se a família de (a) tomar uma determinada sentenga (b) como verdade. Se uma das sentengas da família de (a) näo tomar como verdade a sentenga (b), näo existirá a relagäo de pressuposigäo entre as sentengas (a) e (b).8 Em termos semänticos/pragmáticos, a família representa tipos de atitudes expressas em relagäo ä declaragäo afirmativa. Vejamos, pois, como a nogäo de pressuposigäo é definida: 0 É Dom 'ealcar que Tamár como verdade e pressupar. na linguagerr cotidiana, säo usacas no mesmo sentido: Para falar equilo. Maria tomou como verdade/pressupôs que sna amiga conhecia c hörnern. Na concepgäo serránfca da pressuposigäo, essas duas nocöes säo disťntas, sendo que a prmeira é uma condicäo necessária para a segurda, ou seja, pars que hajs a pressuposigäo, é necessária que todas as quatro "orrr.as oa sentenga - afirmativa, nega;iva, m:errogätiva e condicional - tomam como verdade un determinado conteúdo. Sigo, aqui. a definigäo de CHIERCMA & McCONNELL-GINET {1990j. Mukös autores assiimem que é necessario somerte que as formas aí'rmstiva e regativa da sentenoa (a) tomem [b) como verdade. MANUAL DE SEMÄNTICA (15) A sentenga (a) pressupóe a sentenga (b), se, e somente se, a sentenga (a), assirn como também os outros membros da família da sentenga (a) tomarem a sentenga (b) como verdade. Apliquemos a definigäo em (15). Tomando como base o exemplo (16), diga se há relagäo de pressuposigäo entre as duas sentengas: (16) a. Maria sabe que Pedro tem o costume de dormir na aula. b. Pedro tem o costume de dormir na aula. Para estabelecer se existe ou näo a relagäo de pressuposigäo, primeiramente temos que explicitar a família da sentenga (a), ou seja, a negacáo (sempre da oragäo principál), a condicional, a interrogativa e inclusive a propria afirmativa, e verificar se a família de (a) torna a sentenga (b) como verdade: (17) a. Maria sabe que Pedro tem o costume de dormir na aula. a'. Maria näo sabe que Pedro tem o costume de dormir na aula. a". Maria sabe que Pedro tem o costume de dormir na aula? a'". Se Maria sabe que Pedro tem o costume de dormir na aula,... b. Pedro tem o costume de dormir na aula. Fazendo a verificagäo, temos: quando eu digo que "Maria sabe que Pedro tem o costume de dormir na aula", eu tomo como verdade que "Pedro tem o costume de dormir na aula"?-Quando eu digo {a'), (a"), (a'")( eu tomo (b) como verdade? Como a resposta a todas as perguntas é positiva, eu posso afirmar que, no exemplo (17), (a) pressupóe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. Metodologicamente, acredito ser uma boa estratégia sempre aplicar, nos exercícios, o procedimento acima. Vejamos outro exemplo, estabelecendo se há ou näo urna relagäo de pressuposigäo entre as duas sentengas em (18): (18) a. Näo foi a Maria que tirou nota boa em semäntica.8 b. Alguém tirou nota boa em semäntica. Explicitando a família de (a), temos: (19) a. Näo foi a Maria que tirou nota boa em semäntica, a'. Foi a Maria que tirou nota boa em semäntica. a". (Näo) foi a Maria que tirou nota boa em semäntica? a'". Se (näo) foi a Maria que tirou nota boa em semäntica, ...1C b. Alguém tirou nota boa em semäntica. Por ra2ôes óovias, a relagäo de pressuposigäo pode ser estabelecida a partír de qualquer jrrs das quatro formas da fsmf-ia da sentenga (a) e näo, somente a parťr da afirmativa. J A hterrogaťva e a condicional pocem ser ŕeitas a pa-tir da afimativa ou cs negativa; as duas formas funcionaräo da ■nesnia maneira. cap;tulo 2 implicácóes 35 Se eu digo que "näo foi a Maria que tirou nota boa ern semäntica", eu estou tomando como verdade que "alguém tirou nota boa em semäntica"; se eu digo que "foi a Maria que tirou nota boa em semäntica", eu estou tomando como verdade que "alguém tirou nota boa em semäntica"; se eu pergunto "foi a Maria que tirou nota boa em semäntica?", eu estou tomando como verdade que "alguém tirou nota boa em semäntica"; finalmente, quando eu digo "se foi a Maria que tirou nota boa em semäntica, eu tomo como verdade que "alguém tirou nota boa em semäntica". Portanto, a sentenga (19a) pressupôe a sentenga (19b), porque a família da sentenga (a) toma a sentenga (b) como verdade, Voltando á comparagäo entre as duas implicagôes, o acarretamento e a pressuposigäo, temos que o acarretamento näo é urna condigäo necessária para a pressuposigäo; mesmo porque, como se defíne o acarretamento, näo é possível que todas as sentengas dafamília (a) sejam acarretamentos umas das outras (por exemplo, a interrogativa e a condigäo näo podem serverdades inferidas, só podem sugeriralguma coisa). Portanto, existir a relagäo de acarretamento näo é urna condigäo necessária para que exista a pressuposigäo. Contudo, pode acontecer que o acarretamento esteja presente na mesma sentenga em que ocorra urna pressuposigäo, o que ás vezes gera a errônea posigäo de se associar as duas nogôes. Vejamos essas idéias mais claramente, com os exemplos a seguir. Sentengas podem apresentar a relagäo de pressuposigäo e, também, de acarretamento. Repitamos (19a') em (20a): (20) a. Foi a Maria que tirou nota boa em semäntica. b. Alguém tirou nota boa em semäntica. Temos que a sentenga (20a) acarreta a sentenga (20b), porque, se é verdade que foi a Maria que tirou nota boa em semäntica, é necessariamente verdade que alguém tirou nota boa em semäntica. Já vimos acima que (20a) pressupôe (20b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. Portanto, além da relagäo de pressuposigäo, temos urna relagäo de acarretamento entre (a) e (b). Sentengas podem ter a relagäo de acarretamento e näo ter a relagäo de pressuposigäo: (21) a. A Maria tirou nota boa em semäntica. b. Alguém tirou nota boa em semäntica. A sentenga (21a) acarreta a sentenga (21b), porque a informagäo da sentenga (b) está contida na informagäo da sentenga (a). Entretanto, a sentenga (a) näo pressupôe a sentenga (b), porque a família de (a) näo toma (b) como verdade. Por exemplo, quando eu digo que "a Maria näo tirou nota boa em semäntica", eu näo tomo como verdade que "alguém tirou nota boa em semäntica". Finalmente, sentengas podem ter a relagäo de pressuposigäo e näo ter a relagäo de acarretamento: (22) a. Näo foi a Maria que tirou nota boa em semäntica. b. Alguém tirou nota boa em semäntica. MANUAL DE SEMÁNTICA Temos que a sentenca (22a) náo acarreta a sentenga (22b)r porque a negagáo da sentenga (b) náo é contraditória a sentenga (a). Por exemplo, pode existir uma situacáo11 tal que um professor entre na sala e diga: "Náo foi a Maria que tirou nota boa em semántica, em realioade, ninguém tirou nota boa em semántica,12 todos tiraram nota ruim." É uma sítuagáo perfeitamente possível e náo contraditória. Apesar de, em um primeiro momento, alguns estranharem essa argumentagáo, eu lembro que o acarretamento é estritamente aquilo que está contido na sentenga, e a sentenca (22a) está apenas expressando que náo foi a Maria, mas náo está expressando que foi alguém. Entretanto, a sentenga (22a) pressupóe a sentenga (22b), como já foi visto acima. Essa relagáo de pressuposigáo é que leva muitos a acreditar que também existe uma relagáo de acarretamento. Se voce ainda náo se convenceu, lembre-se do que foi realgado anteriormente sobre a dificuldade de separar o nosso conhecimento do mundo do nosso conhecimento estritamente semántico. Certamente, o falante nunca é ingénuo ao escolher certas expressoes e, na verdade, quando escoihe uma expressáo como náo foi fu/a no que... (uma expressáo desencadeadora de pressuposigáo), ou o falante acredita que foi alguém, ou ele quer fazer o ouvinte acreditar que foi alguém. Portanto, podemos pensar em duas possibilidades. Primeíra, o falante confia na verdade da sentenca (b), conhece previamente (b), senáo ele náo a estaria enunciando. Segunda possibilidade, a pressuposigáo é um mecanismo de atuagáo no discurso: o falante quer direcíonar a conversa, fazendo o ouvinte criar uma čerta expectativa em relagáo a (b). Perceba que o que é tornado como verdade pode ser anulado: (23) Na verdade, ninguém tirou nota boa em semántica. Já os acarretamentos náo podem ser anulados, pois a verdade está contida ou náo no que foi comunicado. Portanto, a pressuposigáo lida náo somente com questóes sobre sentengas individuals e seu valor de verdade (como os acarretamentos), mas também com os usos das sentencas em conexáo com o discurso. Como uma última observagáo sobre as pressuposigoes, existem inúmeras expressoes desencadeadoras dessa relagáo, como o exemplo acima: náo foi... que.,. Vejamos alguns tipos. Primeiro, podem-se listar as do tipo sintático. As construgoes clivadas,13 em (24) e (25), tem como pressuposigáo (26): (24) a. Foi o seu comportamento que me aborreceu. a'. Náo foi o seu comportamento que me aborreceu. a". Foi o seu comportamento que me aborreceu? a'". Se foi o seu comportamento que me aborreceu... Estou situando as sentencas exatarnente pars rrostra* quo. quando ex'ste uma relagáo de contradigáo entre duas sentencas, näo existe sítuagáo possível ro muncc em que essas sentencas occrram. Veja que (22al e a negagáo de !22b) näo sáo cantrsditórias, pois existem siluacoes no mundo em que é possível a ocorrěncía das duas sentengas simuhaneamentě: portanto, näo axisie re'agäo de acarretamento entre (22a) e (22bi Náo confunda esse teste com a idéia de que o aca'retamento e a conradicao sáo nogoes associadas ao jso da lingua. Fique atento para a negagäo de (22b): a negagáo ircioe sobre o quanťficador alguém e, portanto. temos ninguém tirou nets boa. Veja que aiguém näc tirou nota boa nao é urna negagáo oa senterga (bj; parece se* mais uma idéia de comolemerv.agáo: aiguém tira e alguém nšo tira. "Clivagem é um termo usado na descricäo gramatical com referenda a uma ccnstrugaodenominada oragäo clivaca: trata-se de uma urica orsgao 6W\ďáz em duas partes, csda uma com um verbo." (CRYSTAL, 199S5'49i. C.APÍTĽIL3 2 mplicacóes (25) a. O que me aborreceu foi o seu comportarnento. a'. 0 que rne aborreceu näo foi o seu comportarnento. a". 0 que me aborreceu foi o seu comportarnento? a'". Se o que me aborreceu foi o seu comportarnento, ... (26) Alguma coisa me aborreceu. Existem, também, alguns tipos de oragôes subordinadas, como as temporais e as comparativas, que desencadeiam a pressuposigäo em (b): (27) a. Eu já dirigia automóveis, quando vocé aprendeu a andar de velocípede. a'. Eu ainda náo dirigia automóveis, quando vocé aprendeu a andar develocípede. a". Eu já dirigia automóveis, quando vocé aprendeu a andar de velocípede? a'". Se eu já dirigia automóveis, quando vocé aprendeu a andar de velocípede, ... b. Vocé aprendeu a andar de velocípede. (28) a. Ele é bem mais guloso do que vocé. a'. Ele näo é bem mais guloso do que vocé. a". Ele é bem mais guloso do que vocé? a'". Se ele é bem mais guloso do que vocé,... b. Vocé é guloso. Outros tipos de desencadeadores de pressuposigäo säo os lexicais. Por exemplo, os verbos chamados factivos {saber, esquecer, adivinhar, etc.) säo desencadeadores de pressuposigôes, porque eles pressupóem a verdade do seu complemento sentencial: (29) a. Joäo sabe/esqueceu/adivinhou que cachorros voam. a'. Joäo näo sabe/esqueceu/adivinhou que cachorros voam. a". Joäo sabe/esqueceu/adivinhou que cachorros voam? a'". Se Joäo sabe/esqueceu/adivinhou que cachorros voam,... b. Cachorros voam. Podemos constatar que a família de (a) acima, toma (b) como verdade.14 Contra-riamente, os verbos näo-factivos {imaginar, pensar, achar, etc.) näo pressupóem a verdade de seus complementos. Em (30), náo podemos dizer que a sentenga (b) é tornáda como verdade, para se proferir a família da sentenga (a): (30) a. Joäo imagina/pensa/acha que cachorros voam. a'. Joäo näo imagina/pensa/acha que cachorros voam. a". Joäo imagina/pensa/acha que cachorros voam? a'". Se Joäo imagina/pensa/acha que cachorros voam,... b. Cachorros voam. Repare que tomar algurra coisa como verdade näo signiíica. necessariamenLe, oue essa coisa se;a verdade no mundo. MANUAL DE SEMÁNTICA Outro exemplo de desencadeadores texicais de pressuposigáo sáo expressóes que denotam mudanga de estado, como parar de, comegar a, iniciar em, etc. Essas expressóes pressupóem o estado anterior á mudanga ocorrida: (31) a. Joao parou de fumar. a'. Joáo náo parou de fumar. a".Joáo parou de fumar? a'". Se Joáo parou de fumar, ... b. Joáo fumava. De posse, pois, das informagóes acima, estabelega a relacáo de pressuposigáo nos exercícios propostos a seguir. 3.1 Exercícios I. Especifique as relagóes estabelecidas (acarretamento e/ou pressuposigáo) entre as sentengas (a) e (b), justificando a sua resposta de acordo com a definígáo (explicite a família de (a), no seu exercício): 1) a. 0 Joao nao adivinhou que o Paulo estava aqui b. Paulo estava aqui. 2) a. Joao adorou ter conseguido um emprego. b. Joao conseguiu um emprego. 3) a. Sandra, voce parou de vender perfumes? b. Sandra vendia perfumes. 4) a. Nao foi Jose que roubou a loja. b. Alguem roubou a loja. 5) a. Se Paulo parou de fumar,... b. Paulo fumava. 6) a. Joao certificou-se de que Maria tinha safdo. b. Maria tinha saido. 7) a. 0 inventor da penicilina nao morreu. b. Alguem inventou a penicilina. 8) a. Denis foi salvo por um lobo. b. Alguem foi salvo por um animal. 9) a. 0 rei da Franga e calvo. b. Existe um rei da Franga. 10) a. Nao foi D. Joao que declarou a independencia b. Alguem declarou a independencia. CAPITULO 2 IMPLICATES a. Joao e solteiro. b. Joao nao e casado. a. Nao foi Maria que perdeu o trem. b. Alguem perdeu o trem. a. Que Joao tenha fugido nao aborreceu Maria. b. Joao fugiu. a. Paulo e Jose ainda sao jovens. b. Jose e jovem. a. Joao acha que Maria ja saiu. b. Maria saiu. a. Joao lamenta que Maria o tenha deixado. b. Maria deixou Joao. a. Foi Jose que deixou a porta aberta. b. Alguem deixou a porta aberta. a. Pedro se certificou de que havia fechado a casa. b. Pedro havia fechado a casa. a. 0 inventor do saca-rolhas e urn desconhecido. b. Alguem inventou o saca-rolhas. a. Se Maria parou de fazer regime, ... b. Maria fazia regime. a. Alguns dos alunos nao vao se formar. b. Nem todo aluno vai se formar. a. Paulo e Jose sao poderosos. b. Paulo e poderoso. a. Nao foi a Linda que correu. b. Alguem correu. a. Eu ja falava ingles, trances e grego, quando voce aprendeu a falar ingles. b. Voce aprendeu a falar ingles. II. Diga, das afirmagoes apos o texto abaixo, se sao (ou nao) acarretamentos e/ou pressuposigoes, justificando as suas respostas peias definigoes dessas nogoes:15 Ex-chacrete desmente A ex-chacrete Josefina Canabrava desmentiu boatos do reatamento de seu casa-mento com Tim Tones. Tim Tones e filho do atual gerente das empresas Tabajara, Seu Creyson. Ela me garantiu que esta muito bem sem o artista, e que ate ja arrumou um novo amor. 16 Esse exercicio e baseado em ILAR (2001) MANUÁL DE SEMÁNTICA 1) Josefina Canabrava foi chacrete, no passado. 2} Josefina Canabrava e Tim Toneš foram casados há algum tempo. 3) O pai de Tim Toneš ainda vive. 4) O pai de Tim Toneš é Seu Creyson. 5) Seu Creyson trabalha nas empresas Tabajara como gerente. 6) Correram boatos de que Josefina Canabrava e Tim Toneš reataram o casamento. 7) Josefina e Tím Toneš náo terminaram o casamento. 4. Indicagöes Bibliográficas Em portugués: CHIERCHIA (2003, cap. 4), PIRES DE OLIVEIRA (2001, cap. 2), MÜLLER & VIOTTI (2001), ILARI & GERALDI (1987, cap. 4), KEMPSON (1977, cap. 3) e LYONS (1977, cap. 7 e 9). Em inglés: SAEED (1997, cap. 3 e 4), CHIERCHIA & McCONNELL-GINET (1990, cap. 1}, CRUSE (1986, cap. 4 e 6), HURFORD &HEASLEY(1983, cap. 3). CAPÍTULO 3 OUTRAS RELAQÖES 1. Sinonímia e Paráfrase Neste capítulo, continuaremos a estudar algumas propriedades semänticas sob urna perspectiva referencial, isto é, vamos nos valer de nogôes como referencia no mundo e valor de verdade das sentengas para tratar de alguns fenômenos do significado. A primeira propriedade a ser investigada será a sinonímia. A sinonímia lexical ocorre entre pares de palavras e expressóes, entretanto, definir exatamente essa relagäo é urna questäo complexa, que vem perseguindo estudiosos da linguagem há séculos. Urna primeira definígäo póderia ser: sinonímia é identidade de significados. Mas afir-mar apenas isso näo bašta, pois é urna afirmagäo muito ampla e que exige um certo refinamento. Vejamos algumas observagôes. Seguindo Nah & Geraldi (1987), podemos primeiro refletir que, para duas expressóes serem sinônimas, näo bašta que tenham a mesma referencia no mundo. Veja o exemplo: (1) a. Os alunos de linguística da FALE b. Os alunos mais legais da FALE Se eu disser que os alunos de linguística da FALE säo os alunos mais legais, eu estou me referindo a um mesmo grupo de pessoas no mundo, entretanto, isso näo bašta para dizer que as expressóes em (1) sejam sinônimas, pois näo tém o mesmo sentido, ou seja, näo denotam as mesmas propriedades no mundo. Entäo, um primeiro ponto é que ter somente a mesma referencia näo é urna condigäo suficiente para MANUAL DE SEMÄNTICA que haja sinonímia. Além de terem a mesma referencia, é necessário, também, que as expressôes tenham o mesmo sentido. Mas o que sígnifica ter o mesmo sentido? Assume-se que saber o sentido de urna sentenga é ser capaz, em determinadas circunstäncias, de dizer se ela é verdadeira ou falsa. Duas sentengas que tém o mesmo sentido, quando se referem ao mesmo conjunto de fatos no mundo, tém de ser ambas verdadeiras, ou ambas falsas. Transpondo essa nogáo de sentido da sentenga para o sentido da paiavra ou expressäo, llari & Geraldi (1987: 44-45) afirmam que " podemos dizer que duas palavras säo sinônimas sempre que podem ser substituídas no contexto de qualquerfrase sem que a frase passe de falsa a verdadeira, ou vice-versa". Vejamos os exempios que os autores däo: (2) a. Todo careca sonha descer urna ladeira de bicicleta com os cabelos soltos ao vento. b. Todo calvo sonha descer urna ladeira de bicicleta com os cabelos soltos ao vento. Podemos dizer tanto (a), quanto (b), que näo alteramos a verdade ou a falsidade das sentengas acima. Isso é resultado de que as palavras careca e calvo tém o mesmo sentido e referencia nas sentengas. Entretanto, apesar de urna primeira impressäo nos levar a concluir que as palavras careca e calvo säo sinônimas, podemos achar um determinado contexto em que isso näo se sustenta: (3) a. O Argemiro näo se irrita quando o chamam de calvo, mas näo suporta ser chamado de careca. b. O Argemiro näo se irrita quando o chamam de careca, mas näo suporta ser chamado de calvo. Se trocarmos as palavras calvo e careca em (3), alteraremos os sentidos e as referéncias das duas sentengas e, conseqüentemente, a verdade ou a falsidade da sentenga em (3a) passa a ser diferente da sentenga em (3b); portanto, näo podemos considerar as palavras calvo e careca sinônimas no contexto de (3). Com os exempios, percebemos que näo é possível pensar em sinonímia de palavras fora do contexto em que essas säo empregadas. Ainda, na maioria dos casos, pode-se dizer apenas que existe urna sinonímia baseada somente no significado conceitual da paiavra, sem se levar em conta o estilo, as associagôes sociais ou dialetais, ou mesmo os registros. As palavras gordo e obeso, por exemplo, podem sér intercambiáveis em determinados contextos, porém, provavelmente, a segunda ocorréncia será mais usadá por um endocrinologista e a primeira tem um uso corrente. Segundo Cruse (1986), é impossível se falar em sinônimos perfeitos; só faz sentido se falar em sinonímia gradual, ou seja, as palavras, mesmo consideradas sinônimas, sempre sofrem um tipo de especializagäo de sentido ou de uso. Passemos agora para a nogäo de sinonímia entre sentengas, também chamada de paráfrase. A nogäo de urna sentenga ser sinônima ou paráfrase de outra é urna questáo táo complexa quanto a sinonímia entre palavras e expressôes. Se o conteúdo explícito ou o significado informacional é o que interessa, entäo as sentengas abaixo podem ser aceitas como sinônimas (adotareí o nome de sinonímia, mesmo para sentengas, seguindo Chierchia & McConnell-Ginet, 1990): capítulo 3 DUTRAS PiELACQES 43 (4) a. Aquelas mulheres do canto estäo chamando. b. Aquelas senhoras do canto estäo chamando. c. Aquelas damas do canto estäo chamando. Imaginemos que o gerente de um restaurante tenha dito a sentenga (4a) para um gargom, que näo a escutou bem, e que pergunta ao seu colega o que foi que o gerente Ihe disse. O colega Ihe responde: "ele disse que..." Aescolha entre qualquer das outras duas sentengas näo faria diferenga. Acredito que, na situagäo proposta, näo há diferenga em se empregar uma das trés sentengas acima, que os falantes do portugués brasileiro concordaräo que estas tém o mesmo conteúdo ou se equivalem semanticamente. A nogäo de sinonímia envolvida aqui é o que Chierchia & McConnell-Ginet (1990) chamam de sinonímia de conteúdo e que pode ser definida como: (5) A sentenga (a) é sinonímia de conteúdo da sentenga (b), quando (a) acarretar (b) e (b) acarretar (a). Uma sinonímia de conteúdo requer somente que as sentengas (a) e (b) sejam verdadeiras, exatamente nas mesmas circunstancias. Entretanto, assim como para a sinonímia entre palavras, existe uma outra perspec-tiva em que os falantes julgam que as sentengas em (4) tém diferentes significados e que, portanto, näo säo totalmente sinônimas. Escolhendo uma e näo, a outra sentenga, os falantes podem estar passando alguma informacáo importante sobre atitudes em relagäo ä situagäo e sobre os envolvidos neía. Essas diferengas säo tradicionalmente conhecidas como conotagäo. Imaginemos agora que o colega tenha escolhido a sentenga (4c), para se referir ás mulheres da mesa do canto; por acaso, uma delas escuta e näo gosta do emprego da palavra damas. Ela faz uma reclamagáo ao gerente e o gargom pode se encontrar em apuros. Nesse caso, vemos que as sentengas em (4) näo säo totalmente sinônimas e a palavra damas teve uma conotagäo diferente para a diente. Vejamos outros exemplos em que se nota essa diferenga de perspectiva. As sentengas ativas e passivas, em geral, säo consideradas como exemplos de sentengas sinônimas: (6) a. Todo mundo nesta sala fala duas línguas. b. Duas línguas säo faladas por todo mundo nesta sala. (7) a. A polícia procura Sara. b. Sara é procurada pela polícia. Muitos poderiam dizer que (6) e (7) säo pares de sentengas sinônimas. Entretanto, em (6), por exemplo, näo há um consenso se as duas sentengas tém exatamente os mesmos acarretamentos. É provável que (6a) tenha duas interpretagöes: existem duas línguas e todos falam essas duas; e, em uma outra interpretacäo, cada um fala duas línguas diferentes. E (6b), provavelmente, acarreta somente a primeira versšo: existem duas línguas que todos falam. Assim, näo poderíamos analisaras duas sentengas como exemplo de acarretamento mútuo, que é a condicäo para que haja sinonímia entre sentengas, pois (6a) tem mais informagčes que (6b). Alem disso, ainda podemos levar em conta que a escolha do tópico da sentenga também altera a informagáo passada; a escolha de perspectiva por um falante nunca é ingénua e sem significagäo. Existe a 44 MANUAL DE SEMÁNTICA opgáo de se colocar em evidéncia alguma coisa, de se esconder alguma coisa, etc. Em (7), apesar de podermos afirmar que existe um acarretamenío mútuo entre (a) e (b), mesmo assim parece que temos uma interpretagáo preferencial de que (b) quer dizer que Sara é uma criminosa, enquanto (a) parece sugerir que Sara está apenas desaparecida. Existe, ainda, uma outra maneira em que sentengas aparentemente sinónimas podem ter diferengas de significado: é a questáo da entonagáo e foco.1 Por exemplo, nas sentengas abaixo, a resposta adequada para a pergunta entre parénteses vai depender da expressáo em que o falante coloca o foco: (8) a. MARIA bateu o bolo. (Quem bateu o bolo?) b. Maria bateu o BOLO. (O que a Maria bateu?) Portanto, novamente chegamos á conclusáo de que, mesmo entre sentengas, a sinonímia perfeita náo existe. Isso se procurarmos duas sentengas idénticas em termos de estrutura sintática, de entonagáo, de sugestóes, de possibilidades metafóricas e até mesmo de estruturas fonéticas e fonológicas. Se esperarmos encontrara sinonímia nessas circunstáncias, entáo náo é com surpresa que poderemos afirmar que esta náo existe. Por outro lado, algum tipo de sinonímia tem de ser levada em conta. Como pode-ríamos fazertraducóes ou recontar histórias que nos foram contadas, por exemplo? Algum tipo de equivaléncia semántica entre palavras e sentengas tem que ser tornáda como base, para se fazeroperacóes lingůístícas dessa natureza. A proposta é que tomemos o acarretamento mútuo, ou seja, somente o conteúdo semántico das sentengas, como sendo essa nogáo básica, para o que quer que seja a relagáo de sinonímia. É o acarretamento mútuo que garante a possibilidade de se fazer traducóes de uma língua para outra. ou para se recontar histórias, etc. Evidentemente, mesmo para tradugóes ou paráfrases de textos, algo mais é necessário do que somente a sinonímia de conteúdo; mas, garantir o acarretamento mútuo entre as sentengas dessas operagóes lingúísticas é, sem dúvida, o ponto de partida. 1.1 Exercícios I. Diga se as sentengas abaixo sáo exemplos de sinonímias de conteúdo. Justifique sua resposta pela definigáo estudada e faga os comentários pertinentes em relagáo ao uso desses exemplos na língua: 1) a. Maria náo está viva, b. Maria está morta. 2) a. Joáo é casado. b. Joáo náo é solteiro. Foco é usado para marcar o centro de interesse da sentenca: a entonagáo pode ser usada para marcar o foco da sentenca, como é o caso dos exemplos em (8). | CRYSTAL, 1935) capítulo 3 outras relacoes 3) a. Carlos é o pai de André, b. André é o filho de Carlos. 4) a. O único pais da America que tem o portugués como lingua é urna repúblíca. b. O único pais que fala portugués na America é urna república. 5) a. Aquele menino é muito esperto. b. Aquele garoto é muito esperto. 6) a. A Maria falou que o André saiu. b. A Maria disse que o André saiu. 7) a. Todos os trabalhadores dessa empresa recebem dois benefícios. b. Dois benefícios sáo recebidos por todos os trabalhadores dessa empresa. 8) a. Aquela menina é muito gorda. b. Aquela menina é obesa. 9) a. Maria é linda. b. Maria é muito bonita. 10) a. Pedro trabafha comigo. b. Eu trabalho com o Pedro. 11) a. Joäo quebrou o vaso. b. O vaso foi quebrado por Joäo. 12) a. Maria está bonita hoje. b. Que bonita está Maria hoje. c. Hoje, Maria está bonita. 13) a. Eu comi UM CHOCOLATE, b. EU comi um chocolate. 14) a. A gente quer a liberdade. b. Nos almejamos a liberdade. 15) a. Os velhos näo säo respeitados neste pais, b. Os idosos näo säo respeitados neste pais. 2. Antonírnia e Contradigäo Geralmente, define-se antonírnia como sendo urna oposigäo de sentidos entre as palavras. Entretanto, apenas essa definigäo näo é suficiente, visto que os sentidos das palavras podem se opor de várias formas, ou mesmo, que existem palavras que nem tém um oposto verdadeiro. Por exemplo, quente näo faz oposigäo a frio de urna mesma maneira que vender opôe-se a comprar; ou a/to näo faz oposigäo a baíxo de urna mesma maneira que morto opôe-se a vivo. Por isso, seguindo Hurford & Heasley (1983), näo falarei simplesmente de oposigäo de sentidos, mas tentarei delimitar MANUAL DE SEMÁNTICA alguns tipos de oposigäo existentes, assumindo trés tipos básicos de antonímia. Um primeiro tipo é a antonímia binária ou complementar. Antônimos binários säo pares de palavras que, quando urna é aplicada, a outra necessariamente näo pode sertambém aplicada. Por exemplo: (9) a. morto/vivo b. móvel/imóvel c. igual/diferente Quando dizemos que alguém está morto, necessariamente este alguém näo está vivo; e vice-versa. Se algo está móvel, necessariamente ele näo pode estar imóvel; e vice-versa. Porfim, se duas coisas säo iguais, elas näo podem ser diferentes, necessariamente; e vice-versa, Algumas vezes, ainda, esses antônimos binários podem se combinar e formar um antônimo complexo de quatro contrastes. Por exemplo: (10) homem/menino / / mulher/menina Em (10), homem pode ser o oposto óemenino, mas também de mu/ber; mulher pode sero oposto áemenina; emen/no também pode sero oposto áemenina. Assim, formamos o nosso sistema complexo de quatro combinagóes. Um segundo tipo de antônimo é chamado de inverso. Quando urna palavra descreve a relagáo entre duas coisas ou pessoas e urna outra palavra descreve essa mesma relagáo, mas em urna ordem inversa, tem-se, entáo, o antônimo inverso. Säo exemplos dessa relagáo: (11) a. pai/filho /b. menor que/maior que Se X é pai de Y, entáo Y é filho de X; temos a mesma relagáo em ordem inversa. O mesmo se dá em (b); se X é menor que Y, entáo Y é maior que X. Um terceiro tipo é o gradativo. Duas palavras säo antônimas gradativas, quando estas estäo nos terminals opostos de urna escala contínua de valores; a negagäo de um termo näo implica a afirmagäo do outro. Note que urna escala geralmente varia de acordo com o contexto usado. Vejamos um exemplo: (12) a. quente/frio b. alto/baixo Entre quente efrio, certamente, teremos urna escala, como morno, etc. Entre alto e baixo, teremos o medio, etc. Como realcei acíma, a negacäo de urna näo implica a afirmagäo da outra. Veja que, se urna coisa näo é quente, näo implica que esta seja fria; ela pode ser morna. Se alguém näo é alto, näo implica que ele seja baixo. Também termos desse tipo dependem do contexto. Urna temperatura quente no Alasca pode ser fria no Brasil; o que pode ser urna pessoa alta para os picjmeus, pode ser urna CAPlTULO 3 OUTRAS RELAQÓES 47 pessoa baixa para nós. Essa relagáo gradativa é, tipicamente, associada a adjetivos. Em geral, um teste para percebermos a gradatividade nas palavras, como neste caso de antonímia, é verificar se essas palavras combinam com expressoes do tipo meio, um pouco, muitor etc. Por exemplo, temos a expressáo melo quente ou muíto a/to, mas náo temos um pouco pal, melo morto, etc. Estendendo a idéia mais geral de antonímia, ou seja, a oposicáo de sentidos para as sentengas, temos o que se cháma de contradigáo. Entretanto, a contradigáo náo se comporta exatamente como a antonímia, no que diz respeíto á sua classificagáo. Muitas vezeš, temos até mesmo a antonímia entre palavras de determinadas sentencas, mas náo ocorre a contradigáo entre essas mesmas sentengas. Vejamos, pois, do que se trata a contradigáo. A contradigáo está intimamente ligada á nogáo de acarretamento, como já vimos no capítulo 2. Quando dizemos que "Joáo beijou Maria acarreta Maria foi beijada por Joáo", fomos guíados pelo julgamento de que, em (13), a conjungáo de (a) com a negagáo de (b) é contraditória: (13) #Joáo beijou Maria, mas Maria náo foi beijada por Joáo.2 O que significa dizer que (13) é uma sentenga contraditória? Significa que os dois fatos descritos pela sentenga (13) náo podem se realizar ao mesmo tempo e nem nas mesmas circunstáncias no mundo. Temos, entáo, a definigáo: (14) A sentenga (a) é contraditória, quando (a) nunca puder ser verdadeira; ou quando náo existir uma situagáo possível no mundo descrita por (a). A contradigáo também pode ser pensada como uma relagáo entre sentengas. Se eu digo, de uma mesma mesa, as seguintes sentengas: (15) a. Esta mesa é quadrada. b. Esta mesa é redonda. Posso afirmar que as sentengas em (15) sáo contraditórias; e teremos a seguinte definigáo: (16) As sentengas (a) e (b) sáo contraditórias quando: - (a) e (b) náo puderem ser verdadeiras ao mesmo tempo; se (a) for verdade, (b) é falsa; e quando (b) for verdade, (a)á falsa; -A situagáo descrita pela sentenga (a) náo pode ser a mesma situagáo descrita pela sentenga (b). A contradigáo, assim como a antonímia, pode ocorrer de várias maneiras. Muitas vezeš, é a presenga de palavras antónimas, existentes nas sentengas, que desencadeia as idéias contraditórias. Por exemplo, a antonímia binária, em que a utilizagáo de uma palavra implica a ímpossibilidade da utilizagáo de outra simultaneamente e com a mesma referenda, pode desencadear uma relagáo de contradigáo nas sentengas: 2 Usarei o simbolo # pa'5 indícar uma contradigáo na sentenga. MANUAL DE SEMÁNTICA (17) a. #Joáo é casado e descasado. b. #Essa moga que está calada está falando. Quando se tem o antónimo gradativo, ou seja, palavras que estáo em terminals opostos de uma escala em uma mesma sentenga, também podemos ter uma relagáo de contradigáo: (18) a. #0 dia está quente e está frio. b. #0 homem é alto e pequeno. Antónimos inversos igualmente podem desencadeara contradigáo: (19) a. #Este homem é pai de José, mas também é filho de José. b. #Joáo é maior que Maria e menor que Maria. Entretanto, náo é só a antonímia que desencadeia uma relagáo de contradigáo. Um exemplo seria a utilizagáo da negagáo de uma afirmagáo anterior: (20) a. #Maria viajou, mas Maria náo viajou. b. #Joáo está vivo, mas náo está vivo. Uma outra maneira de expressar a contradigáo, sem usar antonímias, é negar uma das propriedades semánticas contidas em um item lexical: (21) a. #Meu irmáo mora em Paris, mas meu irmáo nunca esteve em Paris, b. #Eu viajei de aviáo, mas nunca andei de aviáo. Ou seja, quem mora, já esteve; e quem viajou de algum meio de transporte, já andou desse meio; se negarmos essas propriedades, estaremos sendo contraditórios. Também náo é sempře que ocorre a antonímia que teremos sentengas contraditó-rias. As situagoes descritas abaixo sáo perfeitamente possíveis de ocorrer no mundo, apesar de os pares de sentengas conterem antónimos: (22) Eu encontreí um rato morto no banheiro e encontrei um rato vivo no banheiro. (23) Algumas pessoas amam o Brasil, mas algumas pessoas detestam o Brasil. (24) Joáo comprou trěs animais machos como bichinhos de estimagáo e comprou trés animais fémeas como bichinhos de estimagáo. A utilizagáo da quantificagáo através dos itens um, alguns e trés faz alternar os referentes dos sintagmas nas sentengas (22), (23) e (24), possibilitando a utilizagáo dos pares antónimos. Também a utilizagáo de antónimos inversos nem sempře gera uma contradigáo: (25) Joáo comprou a casa e Joáo vendeu a casa. (26) Joáo é pai de José e filho de Antonio. CAPÍTULC 3 outras helaqoes Vale realcar que a contradigáo, apesar de exprimir situagóes impossíveis de ocorrer simultaneamentě no mundo, é muito utilizada na linguagem como um instrumento do discurso: o que é contraditório serve para passar alguma informagáo extra-sentencial, isto é, podemos inferír, pragmatícamente, informacóes alem das que estáo explícitas na sentenga.3 Sáo perfeitamente interpretáveis sentencas como as abaixo: (27) - Esse aluno é inteligente? - Ele é e náo é. ' Acredito que a maior parte dos ouvintes entenderia a contradigáo acima como: o aluno é inteligente em algumas coisas, mas em outras náo. Essa possibilidade tem relacáo com a imprecisáo semántica, ou natureza relacional, de itens lexicais tais como: inteligente, grande, bonito, etc. A contradigáo pode ser ainda um rico instrumento para textos literários e poéticos. 2.1 Exercícios I. Identifique o tipo de antonímia que se encontra nos pares de palavras abaixo: 1) amor/ódio 2) adulto/crianga 3) grosso/fino 4) preto/branco 5) solteiro/casado 6) em cima/embaixo 7) avô/neto 8) com pra r/vender 9) grande/pequeno 10) melhor que/pior que 11) cachorro/cadela 12) fácil/difícil 13) macho/fémea 14) urbano/ru ral 15) bom/ruim li. Verifique se os pares de sentencas abaixo sao contraditórios (assuma a mesma referencia nos pares} e o que está gerando a contradigáo: 1) a. Paulo está alegre. b. Paulo está triste. Vej a maís detaíhes sobre o terna no capítulo 8, com o estudo das impircaíuras csnversaciong's. 50 MANUAL DE SEMÁNTICA 2) a. Paulo náo gosta de futebol. b. Paulo vai ao campo de futebol. 3) a. Maria é máe de Rosa. b. Rosa náo é filha de Maria. 4 a. A mesa daquele canto é de madeira, b. A mesa daquele canto é de ferro. 5) a. O quarto 202 é em cima do 102. b. O quarto 102 é embaixo do 202. 6) a. As pessoas saudáveis moram no campo. b. As pessoas saudáveis moram na cidade. 7) a. Algumas pessoas saudáveis moram no campo. b. Algumas pessoas saudáveis moram na cidade. 8) a. Maria é casada com Joäo. b. Joäo é viúvo. 9) a. Paulo é o irmäo mais velho de Pedro, b. Pedro é filho único. 10) a. Joäo gosta muito de dormir. b. Joäo acorda cedo todos os dias. III. Aponte as contradigöes semänticas do soneto abaixo (use a definigäo): Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói e näo se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer; É um näo querer mais que bem querer; É solitário andar por entre a gente; É nunca contentar-se de contente; É cuidar que se ganha em se perder; E querer estar preso por vontade; É servir a quem vence, o vencedor; É ter com quem nos mata lealdade. Mas como causar pode seu favor Nos coragöes humanos amizade, Se täo contrario a si é o mesmo Amor? (Ca m ô es, Urica) capítulo 3 i outras relaqůes j 3. Anomalia Sentengas boas sintaticamente, mas claramente incoerentes ou totalmente sem sentído, que näo geram nenhum tipo de acarretamento, säo chamadas, pelos lingüistas, de anomalias: (28) a. A raiz quadrada da mesa de Miia bebe humanidade. b. As näo coloridas idéias verdes dormem furiosamente. c. Rir é muito úmido. d. O fato de que queijo é verde tropegou inadvertidamente. e. Minha escova é loira e alta. f. Ser um teoréma assusta consternacäo. As nogöes de contradigäo e de anomalia, ás vezeš, se confundem. Porém, a estranheza ou incoeréncia de uma frasecontraditória, como Jošo é careca e cabeludo, é que duas situagöes possíveis e näo problemáticas, isoladamente, foram colocadas juntas. Se isolarmos as sentengas, é perfeitamente possível deduzir verdades das duas sentengas. Mas as sentengas em (28) säo estranhas por outros motivos. Näo há como gerar nenhum tipo de acarretamento, isto é, uma verdade necessária, a partir de uma sentenga anómaia. Podemos até imaginär uma maneira de interpretar as sentengas, usando inferéncias de natureza pragmática. Por exemplo, em (28e) eu poderia interpretar que a escova tem o formato de uma mulher, mas, certamente, essa interpretagäo näo seria necessariamente verdade para todos. Normalmente, poetas usam, alem da contradigäo, uma linguagem anómala para sugerir as mais diversas interpretagoes aos leitores. Por exemplo, a sentenga (28b), um famoso exemplo de Chomsky (1957), é a linha final de um poema de John Hollander. Chomsky (1965) introduziu a nocäo de restrigöes selecionais para marcar tais sentengas como agramaticais.4 Imaginemos que todo falante de portugués, ao adquirir o verbo beber como integrantedeseu léxico, tambérn adquirea informagäo lexical de que o seu complemento é alguma coisa bebivel ou, de uma maneira mais geral, algo liquido; e que o seu sujeito designa alguma coisa que seja um bebedor, ou mais geralmente, um ente animado. A idéia é que o léxico fornece um mecanismo, assegurando que beber selecione somente argumentos5 que satisfagam essas condtcöes. Na informagäo dada no léxico, Defer deve estar marcado com os seguintes tragos selecionais: (29) beber: V [3N [+animado]]_[SN[+ líquido]] Agramatical e quanco jrr.a sentenga nao e considerada urna sentenga integrsnte da lingua pelos falantes nativo dessa lingua. Usa-se o simbolo * no inicio da sentenga, para marca-ia como agramatical. Veja o exemplo: (ij 'Carro o comprado Joao. De una forma simplificada. podemos dizer que argumentos sao o sujeito e o(s) conplenentofs) do verbo. 52 MANUÁL DE SEMÁNTICA Em (29), entende-se que beber só deve ser inserido nos contextos sentenciais em que hajá um sujeito animado precedente e um objeto líquido posposto. As especificagóes dos SNs (sintagmas nominais)3 acima sáo dadas a partir do nůcleo do sintagma. Veja o exemplo: (30) O menino bebeu a água. Para que a sentenga acima seja gramatical, menino deve ser marcado com o trago [+animado] e água, com o trago [ + lfquido]. Realmente é o que ocorre e a sentenga (30) é gramatical. Entretanto, se vocé ouvir uma sentenga como: (31) ?0 campo bebeu toda a água da chůva.7 Vocé diria que uma sentenga como (31) é anómala? Dificilmente alguém acharia a sentenga incoerente, embora ela esteja violando uma das restrígóes selecionais dos itens lexicais aí envolvidos. Provavelmente todos interpretaríamos a sentenga de um mesrno modo: atribuiríamos o trago [+animado] ao campo e, de uma maneira metafórica, interpretaríamos a sentenga. A essa altura, fica fácil perceber que tarnbém as anomalías sáo graduais, ou seja, há sentengas com um grau menor de anomalia, como (31), facilmente transformáveis em sentengas aceitas semanticamente e interpretáveis de uma única maneira. Em outras sentengas, altamente anómalas, por mais que alteremos os tragos selecionais, náo conseguimos chegara uma interpretagáo única, ou mesmo coerente. Acredito ser o caso das sentengas em (28). Nesse ponto, esbarramos de novo na divisáo do que é do campo da semántica e do que é do campo da pragmática. Por isso é necessário realgar que as restrigóes selecionais sáo somente uma primeira fonte de restrigóes, que náo conseguem limitartodas as possíveis ocorréncias anómalas de uma sentenga. Mesmo no caso em que náo há transformagóes metafóricas, podem ocorrer outros tipos de problemas. Vejamos as restrigóes selecionais para o verbo ler: (32) ler: V [SN [ + humano]j_[SN [-.abstrato]] As informagoes em (32) poderiam gerar uma sentenga como: (33) *0 analfabeto leu o carro. Para restringirmos ao maximo as ocorréncias com o verbo ler, teríamos que, praticamente, reescrever o sentido específico do verbo em suas restrigóes selecionais; ou seja, [-analfabeto] para o sujeito e [-f-legível] para o objeto, o que náo traz nenhuma vantagem do ponto de vista de uma teoria. Por isso, vamos tomar as restrigóes selecionais de um item lexical apenas como um ponto de partida, uma estratégia mais geral que o falante adquire, juntamente com outras informagoes lexicais, para evitar as construgóes de sentengas anómalas, ou mesmo para construí-las intencionalmente. ° Sintagma ncrnhal (SN) é um grupo de palavras que ocorre. p'eferencial>nente, na seguinte ordern no poiuguěs. um determinante, um nome e um qualificador; semeňte o rtome. o nijcleo, :ern a ob'igetciedade de estar presence, sendo as outras ciesses de palavras opcionais. 7 Quanco náo se tem certeza sobre a gramatxalidade da sentenga, esta é marcaoa, em seu início, com o símbolo da .nterrogsgšo. Quanto maíora es:ranheza da semenga, mais interrogagóes sšo colecadas. CAPÍTULO 3 OUTflAS RELAQŮES 3.1 Exercícios I. Considerados os exemplos em (28), explique, em termos de restrigóes selecionais, por que há anomália. II. Identífique nas sentengas abaixo o que seja anomália ou contradigáo. Justifique sua resposta, usando as definigóes estudadas: 1) Pedro é bígamo. mas näo é verdade que ele tenha duas mulheres. 2) Falar pedras significa chorar quente. 3) Imenso trabalho nos chorá a flor. 4) Frederico é mais novo que Henrique, mas o Frederico nasceu antes do Henrique. 5) O coragáo pulverizado range sob o peso nervoso. 6) Os olhos de vidro devoram os bragos da musa sem bragos. 7) O cachorro manso bravo falou mais alto que o horném. 8) Aquela mulher alta é muito baixa. 9) A cadeira bebeu a esperanca do menino. 10) A cortina falou ao telefone. 4. Déixis e Anáfora A separagäo entre semäntica e pragmática, como estamos vendo, näo é feita sem problemas. Assumi, aqui, que a semäntica, ao contrario da pragmática, estuda o significado da sentenga fora do uso, sem inseri-la em um contexto. Embora essa dis-tincäo seja útii, äs vezes pode nos levar a enganos. Um exemplo desse fato pode ser ilustrado pela nogäo de déíxís.8 Os elementos déiticos permitem identifícar pessoas, coisas, momentos e iugares a partir da situagäo da fala, ou seja, a partir do contexto. Podemos associar os elementos déiticos, de urna maneira mais geral, aos pronomes demonstrativos, aos pronomes pessoais, aos tempos de verbos e aos advérbios de lugar e de tempo. Säo elementos cujas interpretagöes dependem de informagóes con-textuais, embora näo possamos classificáHos como elementos pragmáticos. Isso se deve ao fato de existir um caráter sistemático para a interpretagáo desses elementos. Vejamos os exemplos: (34) a. Este gato é muito bonito. b. Eu adoro chocolate. c. Aqui é o pais da impunldade. d. Aquele ali, eu levo. O termo déixis vem do grego e significa o ato de mos:rar, apontar. MANUAL DE SEMÄNTICA Temos em (34) expressöes que só podemos entender, se nos remetermos ao contexto de fala. Em (34a), o falante tern que apontar o gato no mundo, para que o ouvinte encontre a que gato ele se refere; em (34b), o ouvinte tem que locaíizar o indi-víduo que fala, para saber a quem a palavra eu se refere; em (34c), o ouvinte tem que saber onde o falante está sítuado, para identificar sobre qual pais ele fala; em (34d), só o ato de apontar leva o ouvinte a identificar qual é o objeto a ser levado. Portanto, dependemos do contexto para encontrar os referentes desses elementos, ou seja, a referencia varia de acordo com a situagäo de fala. Entretanto, o sentido permanece o mesmo. É fáciJ perceber que o sentido das oragöes em (34) näo varia. Se eu digo "este gato é muito bonito", o sentido dessa sentenga sera: existe urn determinado animal, mamifero, felino, que tern como qualidade ser bonito, em qualquer contexto. 0 que vai variar é o referente do gato no mundo. Seguindo llari & Geraldi (1987), podemos entender que o sentido dos déiticos é um certo "roteiro para encontrar referentes". Por exemplo, a palavra eu tem por sentido um roteiro que consiste em identificar o falante; aqui tem por sentido um roteiro que consiste em identificar o lugar da fala; e assim por diante. Essa peculiaridade da interpretagäo dos déiticos permite-nos, desde já, ilustrar a distingäo existente entre sentido e referencia, nogöes estas que seräo estudadas mais ä frente. Veja que a contextualizagäo envolvida no processo da déixis é bem distinta da envolvida no uso do conhecimento pragmático, para a interpretagäo de determinadas sentengas. Quando lidamos com o conhecimento pragmático, para atribuirmos significado äs sentengas, este varia de acordo com o contexto e, também, distancia-se muito do sentido semäntico da propria sentenga. Basta retomarmos a sentenga a porta está aberta, exemplo (5), do capítulo 1, para identificarmos os vários significados que a sentenga adquire, de acordo com o contexto usado, totalmente distintos do sentido literal da sentenga. Concluindo, vale realgar que o fenômeno da déixis é um dos tragos que distinguem a linguagem humana das linguagens artificials, tornando-a ágil e apropriada para o uso em situagôes correntes. Segundo Benveniste (1976), a déixis é um fenômeno que demonstra a presenga do hörnern na lingua, colocando em discussäo algumas visôes que limitám o estudo da significagäo. Continuando com a nogäo de referencialidade, vamos distinguir agora o fenômeno da anáfora do fenômeno da déixis. A anáfora também consiste em identificar objetos, pessoas, momentos, lugares e agôes, entretanto, isso se dá por urna referencia a outros objetos, pessoas, etc., anteriormente mencionados no discurso ou na sentenga: (35) a. Tem uma mulher aí fora. Ela quer vender livros. b. Avise a Teresa que sai, se eta ligar. c. Q técnico insistiu que ele näo achava nada errado no computador. As expressöes em itálico säo entendidas como sendo correferenciais (tém a mesma referencia no mundo); os itens sublinhados e itálicos funcionam como antecedentes e os outros itens só em itálico säo referenciaímente dependentes dos antecedentes. Dizemos que as expressöes säo interpretadas anaforicamente, quando sua interpretagäo é derivada da expressäo antecedente. Existem expressöes que podem ser usadas ora como déiticas (36a), ora como anafóricas <36b). Entretanto, existem capítuld 3 outras relaqóes 55 algumas expressóes que só podem ser interpretadas anaforicamente (37); náo existe maneira de apontá-las no mundo: (36) a. Ela já saíu. (déixis) b. A Maria estava na sala, mas ela já saiu. (anáfora) (37) a. Maria está orgulhosa de simesma. b. * Si mesma já saiu. Na literatura lingůística, usa-se a mesma letra (em geral, as letras i, j, k), colo-cadas abalxo do antecedente e do referente, para indicar a correferéncia entre as expressóes: (38) a. Tem uma mulhe^ aí fora. Elai quer vender livros. b. Avise a Teresaj que saí, se e^ ligar. c. O técnico^ insistiu que elek náo achava nada de errado no computador. Essas conexóes referenciais podem ser mais complexas do que as apresentadas acima. Vejamos alguns exemplos: (39) a. [Toda mulherjj pensa que ela, dará uma educacáo melhor ao seu. filho do que sua.t máe deu. b. [Nenhum homerr^ deveria se, culpar pelos erros de seusi filhos. Expressóes como toda mu/her, nenhum homem náo se referem, no sentido intuitivo, a uma determinada pessoa no mundo. Mesmo assim, dizemos que a relagáo dessas expressóes com a anáfora é uma relagáo de correferéncia. Também podemos ter outros tipos de correferéncia como as abaixo: (40) [Quais candidatos^ votaráo [neles mesmos]? (41) Gina. falou para Maria, que elasf+ saíssem. (42) Carlos pescou [alguns peixesji e Marcos os, cozinhou. (43) Se Joséj vir Maria, ele, a desculpará. Julgamento sobre possibilidades de correferéncia é um conhecimento linguístico que todo falante tem e é um dado fundamental para o estudo da lingůística. Existem casos em que os julgamentos sáo chamados de referéncias disjuntivas. De acordo com o julgamento dos falantes, as sentencas abaixo náo podem ser interpretadas como sendo anaforicamente relacionadas: (44) a. *Si mesma é orgulhosa de Maria. b. Teresa, a, encontrou, saindo do cinema. c. *Elei insistiu que o técnico náo achou nada. As sentencas (44b e c) só se tornám gramaticais se elas forem interpretadas sem a correferencialidade marcada; a sentenga (44a) é sempře agramatical. 56 MANUAL DE SEMÁNT1CA Restricóes a esses tipos de ocorréncia parecem ter sua origem na estrutura das sentengas, ou seja, na sintaxe. Chomsky (1981) propóe a existencia de princípios síntáticos, denominados Princípios A, B e C, que restringem as possibilidades de correferéncias.9 Esses princípios explicariam a agramaticalídade das sentengas em (44). Baseando-me nesses princípios, de uma maneira bem geral, poderia dizerque a sentenga em (44a) é agramatical devido ao Princípio A, que estabelece que a anáfora si mesma näo pode ser o antecedente dentro da sentenga em que ela está contida. A sentenga em (44b) séria agramatical devido ao Princípio B: o pronome a näo pode ter um antecedente, em relagäo de correferéncia, dentro da sentenga em que ele está contido. A sentenga em (44c) é agramatical devido ao Princípio C: a expressäo referencia] o técnico näo pode tomar nenhum antecedente em relagäo de correferéncia, dentro da mesma sentenga. 4.1 Exercícios I. Estabelega todas as relagôes de correferéncia anafórica possíveis para que as sentengas sejam gramaticais, usando a notagäo de letras. Estabelega também as relacoes déiticas possíveis, usando urna letra sem correferéncia: 1) Joäo acredita que poucas mulheres pensam que elas possam ser bem-sucedídas. 2) Eles conhecem poucos homens na cidade. 3) Ela pensa que Barbara está doente. 4) Se ela ficar doente, Barbara ficará em casa. 5) Nenhum homem trabalha eficientemente, quando ele está infeliz. 6) Nenhum dos parentes de Ana pensa que ele é pago adequadamente. 7) Aquele infeliz contou para o Paulo o que a Maria pensa dele. 8) Qualquer garota na classe pode pular mais alto que Maria, se ela quiser. 9) A mäe dela está orgulhosa de Maria. 10) Todo homem é orgulhoso de sua mäe. 5. Indicacóes Bibliograficas Em portugués: PIRES DE OUVEIRA (2001, cap. 2), ILAR1 & GERALDI (1987, cap. 4 e 5). Em inglěs: Ver SAEED (1997, cap. 3), CHIERCHIA & McCONNELL-GINET (1990, cap. 1), CRUSE (1986, cap. 4, 9, 10, 11 e 12) e HURF0RD & HEASLEY (1983, cap. 2 e 3). Como näo é o objatí vo deste :ivro tratar de assunios s.ntátícos, remeto o leitor a livros que tratem de infodugáo ä sintaxe cerativa, tais como, Ml OTO etal. (2000), RAPOSO 11995), enre outros. CAPÍTULO 4 AMBIGÚIDADE E VAGUEZA 1. Os Vários Significados das Palavras Contínuando com o estudo das propriedades semánticas ainda dentro de uma pers-pectiva referencial, farei, neste capítulo, um estudo sobre a ambigúidade e fenómenos relativos a essa propriedade, tais como a polissemia, a vagueza, etc. No capítulo 6, veremos uma outra maneira de tratar a polissemia, sob uma perspectiva cognitiva; e no capítulo 8, veremos um outro tipo de ambigúidade, a situacional, que é uma propriedade relativa ao uso da língua. Todo falante sabe que dar o significado das palavras náo é uma tarefa fácíl. As vezeš, pensamos que sabemos o significado de determinada palavra, mas, quando tentamos estabelecé-lo exatamente, ele nos foge. Isso se deve ao fato de o significado, na maioria das vezeš, estabelecer-se a partir de um determínado contexto.2 Geralmente é mais fácil defínir uma palavra se esta é dada no contexto de uma sentenga. Efeitos contextuais podem direcionar os significados das palavras para diferentes cami-nhos. Veja, por exemplo: se eu perguntar o sentido do verbo quebrar para qualquer falante do portugués, há uma grande chance de ele me responder que é o ato de alguma coisa se partir, ou seja, o ato de alguma coisa mudar de estado. Entretanto, se analisarmos as sentengas abaixo, veremos que a resposta náo é táo simpíes assim: Encorrtra-se, também, a terminológia vaguidade; sigo, aqui, a traducjo dada por Pagani, Negri e llari em CHIERCHIA (2003). 2 Ver discussäo sobre o assunto em FIRTH (1957), HALLIDAY (1966), LYONS 0963), KEMPSON (1977), SAEED (1997) a CHIERCHIA (2003). 58 MANUAL DE SEMÄNT1CA (1) a. Paulo quebrou o vaso com um martelo. b. Paulo quebrou o vaso com o empurräo que levou. c. Paulo quebrou sua promessa. d. Paulo quebrou a cabega no acidente. e. Paulo quebrou a cabega com aquele problema. f. Paulo quebrou a cara. g. Paulo quebrou a empresa. Sera que em (1) temos outros sentidos, alem do que parece o mais öbvio para quebrar? Ou o verbo quebrar tem o mesmo sentido em todas as ocorrencias, sendo somente influenciado pelos contextos em que aparece? Sera que existe um sentido geral em que se encaixe a palavra quebrar em todos os diferentes contextos mostrados em (1)? Podemos perceber que, em (1a) e em (1b), os sentidos säo bem pröximos, talvez partir ou estilhagar, so mudando as fungöes semänticas que o sujeito de cada sentenga tem: em (a), Paulo e o proprio agente da agäo; em (b), Paulo e somente a causa, Em (c), ja temos um sentido mais abstrato do que seja quebrar, ou seja, temos a ideia dedescumprir. Em (d), o verbo quebrar tem o sentido demachucar. Em (e), temos a ideia depensarmuito ou reflet/r. Em (f), podemos dizerque se recupera o sentido de decepcionar. Finalmente, em (g), podemos pensar que quebrartem o sentido de falir. 0 problema colocado acima, geralmente, e discutido pelos semanticistas em termos de ambigüidade ou vagueza. Vejamos, pois, como se definem essas nogöes. 1.1 Ambigüidade x vagueza Seguindo a argumentagäo de Saeed (1997), podemos dizer que, dos exemplos em (1), se cada ocorrencia de quebrar tiver um sentido diferente, entäo quebrar e ambiguo de sete maneiras. Entretanto, se as sete ocorrencias em (1) compartilharem um mesmo sentido mais geral, entäo quebrar e simplesmente vago em seus diferentes usos. A ideia geral e que, em exemplos de vagueza, o contexto pode acrescentar informagöes que näo estäo especificadas no sentido; e, em exemplos de ambigüidade, o contexto especificarä qual o sentido a ser selecionado. 0 problema, naturalmente, e decidir, para um dado exemplo, quando estä envolvida a ideia de ambigüidade ou de vagueza. Muitos testes säo propostos, para se fazer a distingäo entre essas duas nogöes. Vejamos, pois, alguns desses testes. Um primeiro teste, proposto por Kempson (1977), consiste no uso da palavra tambem,2 como uma forma reduzida de sentenga, sendo uma maneira de se evitar a repetigäo da sentenga anterior. Tornemos mais claro o exemplo: (2) a. Carlos adora sorvete; Maria tambem. b. Joäo corria todos os dias; Maria tambem. Essa forma e uma adaptagäo das formas do so, so do, do so too do ingles, propostas per KEMPSON 11977)- CAPITULO 4 AMBIGÜIDADE E VAGUEZA As sentengas em (2) säo compreensiveis, porque existe uma convengäo estabelecida de identidade eritre a primeira sentenca e a sentenga inferida a partir da palavra tambem. Entendemos que, em (2a), a Mariaadorasorvete, e que, em (2b), a Maria corria todos os dias. 0 teste de ambigüidade de Kempson vale-se dessa identidade: se a sentenga antecedentetivermais de uma interpretagäo, entäo a segunda tambem terä as mesmas interpretagöes da sua antecedente. Por exemplo, qualquer que seja o sentido atribuido ä sentenga ambigua em (3), a sentenga reduzida tambem o escolherä: (3) 0 Joäo adora aquele canto; a Maria tambem. A ambigüidade da sentenga, em (3), origina-se do fato de a palavra canto ter dois significados distintos: canto relacionado ä müsica, ou canto relacionado ao lugar. Veja que, se voce entender que a palavra canto refere-se ä müsica, as duas sentengas teräo quese referirä müsica. E impossivel seter uma interpretagäo em que a primeira sentenga refira-se ä müsica e a segunda, ao lugar; ou vice-versa. A sentenga (4) näo seria uma paräfrase de (3): (4) 0 Joäo adora aquela müsica; a Maria adora aquele lugar. Opondo-se a esse comportamento, se tivermos sentengas em que exista so a vagueza dos termos, os aspectos inespecificos do sentido säo invisiveis a essa identidade do tambem. Pode-se comparar isso, por exemplo, com a palavra beijo, que e uma palavra que pode ser considerada vaga (beijo na mäo, no rosto, na boca), mas näo, ambigua: (5) 0 Joäo beijou a Maria; o Paulo tambem. E perfeitamente possivel que as sentengas acima estejam descrevendo um fato, como: Joäo beijou a Maria no rosto e o Paulo a beijou na boca. Repare que, quando a sentenga e vaga, a interpretagäo da especificidade da segunda sentenca com tambem näo fica restrita ä interpretagäo da mesma especificidade da primeira sentenga. Diferentemente das sentengas ambiguas. Esse teste parece funcionar bem para distinguir essas nogöes. A complicagäo em aplicä-lo e que nem sempre conseguimos, em uma mesma sentenga, as duas interpretagöes da ambigüidade, como no caso do quebrar. Fica diffeil imaginär uma mesma sentenga em que se possam atribuir os sentidos de fa/ir e de deeepeionar ao verbo quebrar, ou mesmo uma sentenga em que se tenham as duas interpretagöes de estilHagar e de machucar. Um outro teste para se distinguir ambigüidade e que, a cada uma das possiveis interpretagöes de uma ambigüidade, estarä associada uma rede de sentidos espeeifica. Essa relagäo semäntica espeeifica näo pode sertransferida de um sentido para o outro. Por exemplo, quebrar pode estar associado a dois sentidos distintos: ao de estilhagar, como em (1a e b), e ao de descumprir, como em (1c). Vamos chamä-los de quebrar, e de quebrar2. Podemos associar a quebrar^ värias palavras que fagam parte de seu campo semäntico. Por exemplo, vaso e uma palavra que tem como caracterfstica semäntica [ser estilhagävei], portanto vamos assumir que essa palavra faca parte do campo semäntico de quebrarr Observe que, nas sentengas que se constroem com quebrar e vaso, podemos substituir o verbo por outro que tenha o mesmo sentido de quebrar v mas isso näo e possivel se eu empregaro quebrar2. Veja, no exemplo abaixo, como a sentenca (c) fica anömala: MANUAL DE SEMÄNTICA (6} a. Paulo quebrou o vaso. b. Paulo estilhagou o vaso. c. *Paulo descumpriu o vaso. A relagäo inversa também é verdadeira, ou seja, vamos associarao campo semäntico de quebrar2 a palavra promessa. Nesse contexto sentencial, só podemos substituir o verbo por outro que tenha o mesmo sentido de quebrar2: (7) a. Paulo quebrou a promessa. b. Paulo descumpriu a promessa. c. *Paulo estilhagou a promessa. O teste de relagäo de sentidos empregado sugere que existe urna ambigüidade para quebrar em (1a e b) e em (1c). Existem várias outras propostas para testes de ambigüidade, entretanto, o que se pode observar é que muitos deles säo difíceis de aplicar, devido ä dificuldade de se criar contextos adequados, e poucos säo aqueles em que näo existe algum tipo de controvérsia em relagäo ä sua aplicacäo. Para se ter uma leitura mais detalhada a respeito desses testes, ver CRUSE (1986: 49-83). Retomando a nogáo de vagueza, torno a realgar que esse fenômeno semäntico está associado a expressôes quefazem referéncias apenas de urna maneira aproximada, deixando o contexto acrescentar as informagôes näo especificadas nas expressôes vagas. Tome-se, como exemplo, adjetivos relacionais como alto, grande, simples, etc. Se pensarmos que um elefante é grande, estaremos corretos. Mas se pensarrnos que uma formiga de 20 cm é grande, também estaremos corretos. Portanto, a idéia de grandeza é uma nogáo vaga. Certos quantificadores, como vários, alguns, etc., náo especificam quem säo as pessoas exatas de quem falamos. Até mesmo adjetivos que parecem mais determinados, podem ser vagos. Se pensarmos em verde, náo sabe-remos o limite certo de onde essa cor passa para o azul (como um azul esverdeado) ou, em diregäo inversa, quando passa para o amarelo (como um amarelo limäo). Em realidade, podemos observar que quase todas as palavras da lingua těm uma čerta vagueza de sentido. Mesmo palavras como xícara, por exemplo. Se aumentarmos a sua dimensäo, alguns já poderiam achar que se trata de uma tigela. Apesar de näo sabermos o limite no qual comeca uma tigela e termina uma xícara, todos sabem reconhecer que alguns objetos säo claramente xfcaras e que outros säo claramente tígelas. Entretanto, existem alguns que estariam no limite dessa graduagäo, onde näo saberíamos ao certo se seria uma xícara ou uma tigela.6. Alem disso, podemos acrescentar que a vagueza é um fenômeno gradual, pois éfácil perceber que algumas expressôes säo bem mais vagas {grande) do que outras [verde). Em termos de processo de comunicagáo, a vagueza é uma propriedade da lingua muito útil. Trata-se de uma maneira econômica e, contraditoriamente, exata de nos expressarmos, sem que sejamos obrigados a determinadas escolhas, äs vezes, muito complicadas no uso da lingua. O emprego da palavra verde livra-nos de ter que decidir exatamente onde estáo os limites espectrais dessa cor. Falante e ouvinte se entendem, Esse fenomeno, traiado por ROSCH (1973, 1975] em sua teora de prototipos, e desenvo.vido em tempos !inguisticos por FILLMORE 119821 e LA: Experienciador/Beneficiário > Terna/Paciente > Instrumento > Locativo O diagrama em (47) pode ser lido em duas diregôes: os papéis localizados mais á esquerda do diagrama säo os que tém maior preferencia para a posigäo de sujeito; ou seja, agente, experienciador e beneficiário tém a preferencia para serem sujeitos. Os papéis localizados mais ä direita tém urna preferencia menor para a posigäo de sujeito; ou seja. será mais difícil encontrar um terna ou paciente ou instrumento ou locativo em posigäo de sujeito. Urna segunda maneira de interpretar o diagrama é um tipo de regra de expectativa, isto é, se urna lingua tiver um sujeito locativo, espera-se que essa lingua tenha todos os outros papéis, ä esquerda do diagrama, na posigäo do sujeito, ou seja, essa lingua terá como sujeito um instrumento, um terna ou paciente, um experienciador ou beneficiário e um agente. Entretanto, se urna lingua permitir um instrumento na posigäo de sujeito, podemos esperar que essa lingua tenha todos os outros papéis á esquerda nessa posigäo, mas näo podemos prever se essa lingua permitirá, como um sujeito, um locativo, que fica em urna posigäo mais ä direita do instrumento. Com essa previsäo, näo esperamos encontrar no mundo urna lingua que 5 Ver, por exemplo, FILLMORE (1968), JACKENDOFF (1972, 1983, 1990). GIVON (19841, FOLEY 6 VAN VALIN (19841. CARRIER-DUNCAN (1985.1. GRIMSHAW (1990), BRESNAN & KANERVA (1989), DOVVTY 11991), HUDSON (1992) e, para o portugues brasileiro. CANQADO (2003 a e b, 2005). 118 MANUÁL DE SEMÄNTICA permita um agente e um instrumento sérem um sujeito e näo encontrar um terna ou um paciente como sujeito. Essa expectativa parece estar correta para o portugués, pois do instrumento para a esquerda encontramos todos os tipos de papéis temáticos propostos pela hierarquia na posigäo de sujeito, entretanto, näo parece ocorrer um locativo nessa posigäo: A) Sujeito Agente: (48) a. O ladráo roubou a jóia. b. O menino pulou a janela. B) Sujeito Experienciador: (49) a. Joáo ama Maria. b. Joäo pressentiu o perigo. C) Sujeito Beneficiário: (50) a. Maria recebeu o presente. b. Joäo ganhou a corrida. D) Sujeito Paciente: (51) a. Joäo morreu. b. O vaso quebrou. E) Sujeito Terna: (52) a. A bola rolou a montanha. b. A seta atingiu o alvo. F) Sujeito Instrumento: (53) a. A chave abriu a porta. b. Aquela caneta amarela escreveu essa carta. G) Sujeito Locativo: (54) a. *Belo Horizonte moro eu. b. *Paris veio Joäo.6 Para concluir, deixo claro que a proposta de hierarquia é muito aceita pela literatura linguística, no entanto existem várias divergéncias a respeito da ordem dos papéis, de quais säo os papéis realmente relevantes para a hierarquia e de outros pontos teóricos. 5 Existerr exemplos como: (i) O céu tem estrelas. (ii) Esse sítio dá bananas. Mas tarnbém existem controvérsias sobre os sjjeitos dessas sentencas sérem locativos ou nac CAPÍTULD 7 OS PAPÉIS TEMÁTICOS 4.1 Exercícios I. Para cada urn dos papéis temáticos abaixo, construa uma sentenga em que esse papel temático ocupe a posigáo de sujeito: 1) agente 2) paciente 3) beneficiário 4) instrumento 5) experienciador 5. A Grade Temática dos Verbos A cada tipo de verbo sáo associados diferentes papéis temáticos: matar, por exemplo, é associado a agente e a paciente, enquanto morrer é associado somente a paciente. Essas informagóes a respeito dos papéis temáticos dos verbos fazem parte do conhecimento semántico da lingua que o falante adquire. Portantó, espera-se que essas informagóes, de alguma maneira, estejam estocadas no léxico. Devemos ter informagóes náo somente a respeito do numero e do tipo sintático dos compiementos que um verbo pede, ou seja, a sua transitividade, mas também devemos saber que tipo de conteúdo semántico esse complemento tem, ou seja, se é um agente, um paciente, etc. Sáo essas informagóes que orientam a formagáo das sentengas na sintaxe. Na literatura da gramática gerativa, essa lišta de papéis temáticos é geralmente chamada grade temática, que será também o termo adotado aqui. Vejamos um exemplo com o verbo colocar. (55) COLOCAR: V, < Agente. Terna, Locativo > A grade temática em (55), alem de nos dar a informagao sintática de que o verbo colocar é um verbo bitransitivo, ou seja, tem dois compiementos, alem de seu sujeito, que está sublinhado, ainda traz a informagao semántica de que existe um agente, um terna e um locativo, que sáo as relagóes semánticas estabelecidas entre o verbo colocar e seus argumentos. As informagóes acima predizem que esse verbo, quando saturado (completado), deve formar uma sentenga como (56): (56) Joáo colocou o livro na mesa. Em (56), todos os sintagmas da sentenga estáo especificados na grade temática de colocar, descrita em (55). Entretanto, náo é sempře que todos os sintagmas das sentengas fazem parte da grade temática do verbo. Aos papéis temáticos que fazem parte da grade temática do verbo, chamamos de argumentos (sujeito e compiementos); aos que náo sáo especificagóes do verbo, chamamos de adjuntos. Embora essa distin-gáo nem sempře seja táo clara, ela é útil e muito usada. Para poder estabelecer essa divisáo, proponho alguns testes bastante utilizados na literatura linguística: MANUAL DE SEMÄNTICA (57) a. Jošo coloGou o tivro no escritório. b. Joäo leu o livro no escritório. Como distinguiro escritório como argumento de (57a) e como adjunto de (57b)? Uma primeíra motivagäo pode ser a necessidade da explicitagäo sintática do argumento para a gramaticalidade da sentenga: (58) a. *Joäo colocou o livro. b. Joäo leu o livro. Portanto, o verbo colocar teria urn locativo como argumento. Mas esse näo é um teste infalível. Veja que, dependendo do complemento, podemos ter (59), que é perfeitamente gramatical: (59) Joäo colocou o chapéu e saiu.7 Essa questäo de adjungäo e complementagäo é bastante complicada na literatura lingüistica e pouco clara aínda. Entretanto, temos sempře que nos valer dessas nogôes nas nossas análises. Intuitivamente, todos concordam que elas existem. Portanto, o que podemos fazer é aplicar alguns testes, mesmo como o acima, tendo em mente que é só uma primeira fonte de restrigäo sobre a natureza funcional do sintagma. Um outro teste reiaciona-se com uma ordern preferível. Os adjuntos säo percebidos como menos presos aos verbos, estruturalmente. Portanto, espera-se que adjuntos sejam mais flexíveis na sentenga e que complementos sejam mais presos ao verbo: (60) a. No escritório, Joäo colocou o livro. b. No escritório, Joäo leu um livro. Parece que (60a) é urna sentenga menos usual em portugués e que requer uma entonagáo mais específica. Ao contrario de (60b), que näo requer urna entonagäo específica. Isso se deve ao deslocamento do argumento em (60a), que parece ser menos permitido, e do deslocamento do adjunto em (60b), mais livre. Urna outra informacäo a respeíto de adjuntos é que, geralmente, säo expressóes de tempo, lugar, maneira, etc. e podem coocorrer com todos os verbos. Por isso, näo precisam ser especificados no léxico. Entretanto, existem verbos que expressam lugar ou tempo, e tém essas expressóes como argumentos e. portanto, como parte de sua grade temática; como é o caso de (56), que tem um locativo como argumento, expresso em sua grade temática. Ainda em relagäo ä grade temática dos verbos, podemos observar que alguns verbos formám urna classe semántica específica, de acordo com sua grade. Por exemplo, verbos como dar, emprestar, doar, pagar, etc., que expressam uma transferéncia a parti r do agente da agäo, teräo a seguinte grade temática geral: (61) Verbos de Transferéncia: < Agente, Tema, Alvo > Existe urn outro tipo de análise, do ponto do vista composioional, queatribuiria papéis temáticos näo somenie aos verbos, mas á composicäo dos verbos com seus complementos e seus adjuntos. Nessa análise, näo existiriam proolemas dessa natureza. Ver FRANCHI (1997) e CANQADO (1995, 2003a e b, 2005). CAPÍTULO 7 OS PAPÉIS TEMÁTICOS 121 Note que é uma maneira interessante de descrever características semánticas semelhantes. Outras classes específicas deverbos podem serdeverbos psicológicos: amar, detestar, adorar, admirar, etc.; verbos de trajetória: vir, ir, andar, etc. (62) Verbos Psicológicos: < Experienciador, Terna > (63) Verbos de Trajetória: < Agente, Fonte, Alvo > Uma última observacáo, a respeito das grades temáticas, já comentada na nota 2 děste capítulo. Até aqui, tratei apenas dos verbos, os atribuidores de papéis temáticos por exceléncia; entretanto, há autores como Anderson (1979), Cinque (1980), Torrego (1985) e Giorgi & Longobardi (1991) que também associam a alguns nomes (em geral, os deverbais, ou seja, nomes que se originam de verbos) a propriedade de atribuírem papéis temáticos; sáo nomes que pedem complementos: (64) a. A construgáo da casa b. O aperfeigoamento do curso Ainda Higginbotham (1985) estende a atribuigáo de papel temático aos adjetivos: (65) a. Orgulhoso deseus filhos b. Contente com seu desempenho E mesmo algurnas preposigóes, em determinados ambientes, também atribuem papel temático a seu complemento; sobre atribui o papel temático de locativo a seu complemento em (66a), e com atribui o papel temático de companhia ao seu complemento, em (66b): (66) a. Eleandou sobre as águas. (lugar) b. Ela veio com a Maria, (companhia) 5.1 Exercícios I. Dé as grades temáticas dos seguintes itens lexicais; 1) comprar 2) receber 3) dar 4) amar 5) preocupar 6) desmoronamento 7) vaidoso 8) sobre 9) diversáo MANUAL DE SEMÄNTICA 6. Motivacäo Empírica para o Estudo dos Papéis Temáticos Os indícios de que certos aspectos semänticos säo relevantes para a sintaxe das expressöes corroboram a tentativa de se tratar os papéis temáticos de uma maneira mais rigorosa, tendo um estatuto teórico em uma teoria gramatical. Alem das evidéncias empíricas da lingua de que existe uma relacäo de hierarquia entre as posigóes sintáticas e os papéis temáticos, existem ainda algumas outras propriedades sintáticas que parecem ter restricöes de ordern semäntica para ocorrer; por exemplo, as propriedades de ergativizagäo e de passivizagao. Ilustrarei essas evidéncias com alguns exemplos do portugués brasileiro. Comecemos com a ergativizagäo. A ergativizagäo é uma propriedade sintática, assim como a passivizagao, em que o sujeito, ou o argumento externo da frase é omitido, deíxando vaga a primeira posigáo argumental e algando, para essa posigáo, o objeto, ou o argumente interno; note que, para haver esse processo, é necessário que o evento descrito permanega o mesmo, ainda que seja omitido o agente desse evento. No entanto, näo sáo todos os verbos que permitem tal propriedade. Vejamos os exemplos a seguir: (67) a. José quebrou/espatifou um vaso de barro. b. José possui/adora um vaso de barro. (68) a. O vaso de barro quebrou/espatifou. b.*0 vaso de barro possui/adora. Para Whitaker-Franchi (1989) e Levin (1989), o processo de ergativizagäo só ocorre quando o argumente interno do verbo tem como papel temático um paciente. E o que acontece com (67a), em que os argumentos internos dos verbos tém como papel temático um paciente e permitem esse processo (68a). Diferentemente do que ocorre em (67b e 68b). Essa parece ser uma primeira restrigäo, embora näo seja a única. Um outro exemplo da relagäo entre sintaxe e semäntica é o processo de passivizagao. Cangado (1995, 2000) langa a hipótese de que toda sentenga, cujo argumente externo tenha como acarretamento a propriedade semäntica do controle ou do desen-cadeamento direto, aceita a propriedade sintática da passivizagao. Cangado segue, em parte, a proposta de Dowty (1989, 1991), em que papéis temáticos säo um grupo de propriedades acarretadas pelo verbo a um argumente determinado. Portanto, a hipótese restringe a passivizagao ä ocorréncia dos tipos semánticos de papéis temáticos. Nas sentengas abaixo, em que a propriedade do controle näo está associada ao argumente externo da sentenga, as passivas näo säo aceitas: (69) a. O fazendeiro possui cem alqueires de terra. b.*Cem alqueires de terra säo possuídos pelo fazendeiro. (70) a. Joäo recebeu um tapa. b.*Um tapa foi recebido por Joäo. CAPÍTULO 7 OS PAPÉIS TEMÄTICOS 123 Mas observe que, em sentengas nas quais se pressupóe o controle por parte de seus sujeitos gramaticais, a passiva é aceita: (71) a. O diabo possuiu o hörnern totalmente. b. O hörnern foi possuído pelo diabo. (72) a. Joäo recebeu uma heranca. b. A heranga foi recebida por Joäo. Com o exposto acima sobre os papéis temáticos, parece evidente que essas nogöes těm um papel crucial no conhecimento do falante sobre a lingua e que, por-tanto, säo nogöes que merecem continuar a ser investigadas, mesmo havendo tantos problemas teóhcos ainda a serem contornados. 6.1 Exercicios I. Construa para as sentengas abaixó as ergativas e as passivas correspondentes, se possivel. Caso essas alternäncias näo sejam possíveis, tente explicar o porqué, usando as nogöes de papel temático: 1) Joäo tem uma casa. 2) Maria teve seus filhos em uma manjedoura. 3) Joäo vendeu uma casa. 4) Joäo preocupou Maria. 5) Joäo assustou Maria. 7. Indicagóes Bibliográficas Em portugués: CAMQADO (1995, 2DD3 a e b; 2005), FRANC HI (1997) e ILARI & GERALDI (1987, cap. 2). Em inglés: SAEED(1997, cap. 6). PARTE 4 ALGLINS FENÔMENOS SEMÄNTICOS SOB A OTICA DE UMA ABORDAGEM PRAGMÁTICA CAPÍTULO 8 ATOS DE FALA E IM P LI C ATURAS CONVERSACIONAIS 1. Teoria dos Atos de Fala Vimos, até aqui, fenômenos semänticos tratados em teorias de referencia e em teorias de representagöes rnentais. Entretanto, todos concordam que a linguagem é mais do que a descricäo dos estados de coisas (como é tratada a linguagem na abordagem referencial), e mais do que estabelecer a relacäo entre o mundo e os conceitos rnentais (como é tratada a linguagem na abordagem mentalista). Existe uma série de outros usos que fazemos da linguagem, relacionados a práticas e a convengöes sociais, a intengöes, etc. Como propus no capitulo 1, vamos assumir que o significado, em urn sentido mais amplo, é determinado pela gramática (o estudo da semantical e pelo uso (o estudo da pragmática}. Neste capitulo, mos-trarei que, além de propostas referenciais e mentalistas, existem propostas sobre alguns aspectos do uso que também fazem parte de uma teoria do significado. As idéias que apresentarei a seguir säo perfeitamente compativeis com as teorias que tratam do significado literal, ou seja, as teorias de abordagem referencial. Säo propostas complementares, que seguern a idéia de Chomsky (1965) de que a linguagem divide-se em competéncia e em desempenho. Relembrando, a competéncia é um determinado sistema de conhecimentos que nos permite reconhecer, produzir, interpretar sequencias bem formadas da nossa lingua nativa e, segundo Chomsky, é uma capacidade inata. Uma teoria que trate do conhe-cimento estritamente semantico estaria investigando parte da nossa competéncia 126 MANUAL DE SEMÄNTICA lingüistica. O desempenho é o uso desse conhecímento em situagöes comunicativas concretas e está situado no ämbito da pragmática. Uma teoria que träte de situagöes do uso estaria investígando a questáo do desempenho.1 1.1 Sentengas náo-declarativas Voltando aos capítulos iniciais, podemos observar que as nocöes estudadas de acar-retamento, de sinonímia, de contradigäo e de outras que se valem do valor de verdade sempře tem como objeto de estudo sentengas declarativas simples. Para esse tipo de sentenga, parece bem natural a aplicagáo do conceito de valor de verdade: (1) Joäo quebrou o vaso. É perfeitamente possível afirmarmos algo sobre a verdade ou a falsidade da sentenga em (1). Entretanto, o que dizer de sentengas näo-declarativas do tipo: (2) a. Joáo, quebre o vaso!!! b. O Joáo quebrou o vaso? Náo parece fazer sentido afirmarmos algo sobre a verdade ou a falsidade da sentenga imperativa em (2a) ou da interrogativa em (2b). Entretanto, como observou Frege (1918), ainda podemos nos valer da nogäo de valor de verdade para estudar sentengas náo-declarativas. Veja que as sentengas em (1) e em (2a e b) tém um conteúdo em co-mum: o fato de o vaso quebrar. Em (1), esse fato está sendo afirmado; em (2a), o fato é objeto de um pedido; e, em (2b), o fato é o objeto de uma pergunta. Frege nomeou de conteúdo aquilo que as sentengas tém em comum; e nomeou de forpa aquilo que cada sentenga exprime, ou seja, a sua característica assertiva, imperativa ou interrogativa. As condigöes de verdade podem ser aplicadas na caracterizagáo do conteúdo da sentenga. Daí para frente, podemos tentar caracterizar a semántica dos diversos tipos de sentengas, ou seja, as forgas características de cada sentenga. 1.2 Os atos de fala Vamos assumir que o uso central da linguagem é a descrigäo dos estados de coisas e a troca de informagöes sobre esses estados. Entretanto, vamos assumir também que, alem desse tipo de uso, podemos imaginär que há uma série de outras agöes que podemos realizar quando empregamos, a esses conteúdos assertivos, determinadas forgas: ordenamos, pedimos, interrogamos, etc. Baseado nesse fato, Austin (1962) propöe que o ato comunicativo pode se apresentar em vários níveis, sendo os mais relevaates: o ato locutivo, o ato ilocutivo e o ato perlocutivo.2 O ato locutivo resume-se Acredito que as abordagens mentalistas náo tenham nada s dizer sobre essa divisäo e nam é esse o objeto de suas nvesťgagóes. 2 Encontram-se, também, as terminologias locurór/o, ihcutório eperlocutório. Sigo. aqui, a terminologia usada por Pagani. Negri e lisrr. na traducäo de CHIERCHIA (2003). CAPÍTULO 8 ATOS DE FA LA E IMPLICATURAS COMVERSACIONAIS no ato de proferir uma sentenga com um certo significado e um conteúdo informacional, ou seja, o sentido restrito da sentenga, a descrigáo dos estados de coisas. O ato ilocutivo é a intengáo do proferimento do falante, ou seja, as acóes que realizamos quando falamos: ordenamos, perguntamos, avisamos, etc. E o ato perlocutivo sáo os efeitos obtidos pelo ato ilocutivo, ou seja, o resultado que conseguimos com nosso ato de fala: assustamos, convencemos, desagradamos, etc. Por exemplo, meu fílho náo quer fazer o dever e eu digo: "vou desligar o videogame".3 O ato locutivo é o proferimento da sentenga vou desligar o videogame. Entretanto, posso ter pronunciado a sentenga com a intengáo de ameagar: esse é o ato ilocutivo. Inteiramente distinto de ambos os atos é o ato perlocutivo: o comportamento subseqůente que pretendo que meu filho tenha, ou seja, que se sinta ameagado e vá fazer o dever. A distingáo entre os atos ilocutivo e perlocutivo é importante: o ato perlocutivo é o efeito que o faiante espera conseguir sobre o ouvinte, ao pronunciar tal proferimento. Por isso, o ato perlocutivo náo é, geralmente, coňsiderado relevante para o estudo do significado linguístico4 e náo será focalizado neste livro. Em relagáo aos outros dois níveis, é importante realgar que náo podemos pensar que os atos ilocutivos sáo consequéncias dos atos locutivos. A sentenga vou desligar o videogame, sozinha, náo constitui uma ameaga. Já quando uso a sentenga, a forga empregada no ato de proferir essa sentenga atribui a ela uma forga ilocutiva particular (pode ser, ou náo, uma ameaga). Kempson (1977: 59) distingue essas třes análises da seguinte maneira: um falante profere sentengas com um determinado significado (ato locutivo) e com uma determinada forga (ato ilocutivo), para atingir determinado efeito sobre o ouvinte (ato perlocutivo). No exemplo acima, a forga ilocutiva estava implícita no proferimento, mas náo fazia parte do ato locutivo. Entretanto, existem casos em que a forga ilocutiva está explícita no próprio ato locutivo, recebendo o nome de proferimento performativo; nesse tipo de proferimento, as forgas locutiva e ilocutiva parecem coincidir: (3) Prometo-lhe que náo chegarei atrasada. (4) Aposto como ele vai voltar atrás. (5) Concordo que voce participe do grupo. Em relagáo a esses tipos de proferimentos, Austin (1962) afirma náo haver sentido em considerá-los verdadeiros ou falsos, pois náo constituem descrigóes, mas sim, acóes. Entretanto, veja que podemos ter proferimentos com os mesmos verbos, mas que constituem apenas descrigóes de situagóes: (6) Ela prometeu que náo chegaria atrasada. (7) Ela apostou que ele voltaria atrás. (8) Ela concordou que voce participasse do grupo. As sentengas acima náo podem ser entendidas como agóes de promessa, de aposta ou de concordáncia, mas como descrigóes de algumas situagóes e, portanto, podemos dizeralgo sobre a verdade ou a falsidade das sentengas. Em realidade, o que acontece é A utilizagao de aspas duplas indica o proferimento da sentenga, ou seja, a agáo realizada. o uso da sentenga; a utilizagao oo itálico indica a sentenga, enquanto entidade linguística, ou seja, a mengáo da sentenga. 4 Pa-a uma concepgáo contráría, ver GRICE (1957 e 1975) MANUAL DE SEMANTICA que existem verbos especificos dos proferimentos perforrnativos; entretanto, somente quando usados afirmativamente, na 1a pessoa do presente simples, dao origem a sentengas performativas. Exemplos desses verbos sao: (9) a. Eu te desculpo por tudo. b. Eu teautorizo fazer a prova depots. c. Nos te condenamos por todos os seus atos. d. Eu tenome/o rneu procurador. Apesar de a maioria das sentengas performativas ocorrerem na 1a pessoa do presente simples, singular ou plural, existem aigumas excegoes, com verbos ocorrendo na 3a pessoa do presente simples, Por exemplo: (10) a. Voce esta proibido de entrar aqui. b. Os passageiros do voo para Paris estao proibidos de entrar no pais. Urn interessante teste para verificar se uma sentenga e performativa, seria acres-centara expressao por meio deste... e ver se a sentenga tern aceitabilidade: (11) a. Por meio destas palavras, eu te desculpo por tudo. b. Por meio destas palavras, eu te autorizo fazer a prova depois. c. Nos te condenamos por todos os seus atos, por meio destas palavras. d. Por meio deste instrumento, eu te nomeio meu procurador. e. Por meio deste ato, voce esta proibido de entrar aqui. Caso nao seja performativa, a sentenga parecera estranha: (12) a. *Por meio destas palavras, eu canto. b. *Por meio destas palavras, eu acredito em Deus. c. *Por meio destas palavras, ele avisou para ela que sairia. 1.3 Condigoes de felicidade Embora os proferimentos perforrnativos nao possam ser avaliados pelo seu valor de verdade, ou seja, se sao verdadeiros ou falsos, eles podem ser avaliados pela sua adequagao ao contexto. Austin (1962) nomeia essa adequagao contextual de condigoes de felicidade.5 As condigoes de felicidade de um proferimento performativo sao as condigoes que o contexto deve satisfazer para que o uso de uma determinada expressao possa ser feliz, ou seja, possa ser adequado. Por exemplo, o presidente da Assembleia entra na sala de reunioes e profere: (13) Eu declaro que a sessao esta aberta! 5 Essas condigoes tamberr foram chamadas de condigoes de adequagao e de condigoes idesis. Usarei, aqui, o termo mais comumente empregado na literature: condigoes de felicidade CAPÍTULO 8 ATOS DE FALA E IMPLICATUHAS CONVERSACIONAIS Essa sentenga tem as condigöes de felicidade exigidas para ser um proferimento aceitável e vai desencadear o processo de abertura da sessáo. Entretanto, se um vígia entra no mesmo arnbiente e diz a sentenga em (13), a sentenga náo preenche as condigöes de felicidade e a agšo estabelecida pelo proferimento näo se desenca-deará. Portanto, de uma maneira geral, podemos estabelecer que uma das condigöes de felicidade de um ato ilocutivo de ordenar é que o falante deva ser um superior ou uma autoridade em relagäo ao ouvinte. Uma das condigöes de felicidade de um ato ilocutivo de acusar é que o acusado esteja errado sob algum ponto de vista. E assim por diante. Alem disso, existem condigöes padronizadas para que a comunicagäo seja bem-sucedida, tais como, os falantes faiarem a mesma lingua, os falantes partilharem das mesmas informagóes sobre o contexto social e outras. Por exemplo, se as pessoas envolvidas no exemplo em (13) näo souberem nada sobre como funcionam assem-bléias, o proferimento da sentenga eu declaro que a sessáo está aberta náo terá as condigöes de felicidade satisfeitas e o resultado que se espera näo se efetivará. Por isso, é necessário preencher todas as condigöes adequadas para determinado uso, para que o proferimento seja considerado bem-sucedido e adequado.6 Ate esse ponto da explicagäo sobre os atos de fala, relacionamos os atos ilocutivos a proferimentos. Portanto, a análise de Austin e de outros filósofos posteriores é uma explicagäo dos atos de fala dos proferimentos, näo tendo a pretensäo de ser uma explicagäo dos significados de sentengas. Entretanto, vale ressaltar que alguns lingüistas, seguindo a diregäo da análise de Austin, voltaram-se para os atos de fala como uma solucäo para os problemas relacionados ao significado. Porexemplo, Fillmore (1971) sugere que seria mais util falar de condigöes para uso adequado de sentengas e de palavras do que falar, de uma maneira sempre vaga, do significado de sentengas e de palavras. Tomemos a palavra acusar: em vez de falar o que essa palavra significa, pode-se estabelecer que essa palavra tem como condigöes para o seu uso adequado o fato de que o acusador assuma que o acusado é responsável por algum ato e que o acusador assuma que esse ato seja uma agäo näo desejável, má. Porém, uma proposta dessa natureza deixa de caracterizar o significado da maneira dual como o estamos caracterizando (ou seja, o significado mais abrangente como sendo a soma de aspectos estritamente semänticos e de aspectos estritamente pragmáticos), eliminando a dicotomia competéncia e desempenho, proposta por Chomsky. 1.4 Exercícios I. Explicite os possíveis atos envolvidos nas sentengas abaixo: 1) Desculpe-me, vocé está no meu caminho. 2) Por favor, passe-me o saí. 3) Eu te imploro perdáo. 4) Cuidado, tem um buraco no caminho. 5) Eu vou apagar seu nome da lišta. Searle desenvolve a nocäo de condigöes de felicidade de Austin, subclassificando-as em: condigöes preparaíórias, proposicionsis, de sinceridade e essenciais. Para detalhes sobre a proposta, ver SEARLE (1969, cap. 3). MANUAL DE SEMANTICA II. Quais verbos abaixo apresentam usos tipicamente performativos e por qué? 1) garantir 2) preocupar 3) indicar 4) desculpar 5) saber 6) esquecer 7} avisar 8) concordar 9} desejar 10} discordar III. Dé as condicöes de felicidade para cada ato ilocutivo abaixo: 1) o ato ilocutivo de prometer 2) o ato ilocutivo de desculpar 3) o ato ilocutivo de saudar 4) o ato ilocutivo de nomear 5) o ato ilocutivo de protestar 2. Implicaturas Conversacionais 2.1 Inferéncias Vimos, no capítulo 2, as nogöes de acarretamento e de pressuposigäo semantica, que säo inferéncias (ou implicagöes) ligadas ao conteudo semäntico. Veremos, agora, as inferéncias relacionadas ao discurso, ao uso da lingua. As inferéncias conversacionais säo feitas a partir do contexto. O ouvinte participa ativamente na construgäo do significado do que ouve, preenchendo lacunas que o falante deixa em seu discurso. Um primeiro exemplo a ser analisado sáo as inferéncias em que o falante recupera uma relagäo anafórica7 existente entre sentengas, ou seja, o falante identifica elementos de sentengas que se referem a uma mesma entidade no mundo: (14) Joäo caiu em uma escada ontem. A escada estava escorregando muito. (15) Eu vi seu irmäo esta manhä. O malandro nem me reconheceu. Como lemtrete, urr.a rela§io anafórica consiste em iaentricar objetos, pessoss, momentos, luosres e acöes através de uma referencia s outros objetos, pessoas, etc.. anteriormente mencionados no discurso ou na sentence. CAPÍTULO 8 ATOS DE FALA E ÍMPLICATURAS CONVERSACIQNAiS 1 Em (14), o ouvinte recupera que a escada é a mesma nas duas sentengas e, em (15), associa o irmäo ao malandro. Fagamos uma suposigáo de como pode se dar esse processo de preenchimento de informagäo näo fornecida pelo falante. Em (14), por exempfo, como a primeira sentenga faz referencia a uma escada qualquer e, na segunda sentenga, o artigo definido a retoma o nome escada como algo já faiado anteriormente, o ouvinte infere que a escada da segunda sentenga só pode se referir ä mesma escada da primeira sentenga. Em (15), a primeira sentenga faz referencia a seu irmäo e a segunda faz referencia a o malandro. Como o ůnico referente da primeira sentenga possível de ser associado a malandro é o seu irmäo, a maneira mais simples de analisar as duas sentengas em um único contexto é entender que o malandro tem o mesmo referente que seu irmäo. Essas seriam possíveis operagóes de interpretagáo feitas por ouvintes das sentengas (14) e (15). Um outro exemplo é a interpretagáo anafórica entre muitas sentengas. O ouvinte infere que isso só pode estar se referindo a todas as ocorréncias ditas anteriormente: (16) O aviáo chegou tarde, o hotel náo tinha lugar, os restaurantes estavam todos cheios. Acho que isso realmente desapontou Maria em sua viagem. Um outro tipo de inferéncia, apontada por Clark (1977), é aquela em que o ouvinte constrói pontes para que o discurso tenha coeréncia, a partir do seu conhecimento do mundo: (17) A professora entrou na sala. Os alunos já estavam todos lá. (18) Joäo saiu para um passeio. A noite estava linda. Pode-se dizer que a interpretagáo dessas sentengas também se dá por um processo anafórico. Por exemplo, em (17), o ouvinte, tendo conhecimento sobre salaš de aula, faz a ponte entre professora, sala e alunos e interpreta o lá como sendo a sala em que a professora entrou. Em (18), temos que fazer a ligacáo anafórica com um elemento implícito da sentenga anterior. Se as duas sentengas estäo justapostas e a segunda sentenga náo expíicita nenhum contexto específico, o ouvinte faz a ponte entre passeio e noite, inferindo que o passeio de Joäo deve ter sido naqueia noite linda. O falante usa um processo econômico, apostando que o ouvinte preencherá as informagóes náo explícitas nas sentengas, mas facilmente inferidas, se os interlocutores partilham do mesmo conhecimento de mundo. Os tipos de inferéncia seguintes säo exemplos em que, sabendo que o ouvinte vai preencher as lacunas deixadas pela sua informagäo, o falante se sente livre para simplesmente sugerir a idéia, em vez de dizé-la literalmente, ou seja, o falante confia nas inferéncias do ouvinte: (19) A. Vocé deu o dinheiro para a Maria? B. Eu estou esperando ela chegar. Informagäo náo dada por (B) que deve ser inferida por (A): (B) náo deu o dinheiro. (20) A. Vocé leu o texto para o seminário? B. Eu pretendo. Informagäo náo dada por (B) que deve ser inferida por (A): (B) náo leu o texto. MANUAL DE SEMÄNTICA Esses Ultimos tipos de inferéncia sáo chamados de implicatura conversacional, tema tratado extensamente por Grice (1975, 1978). O autor propöe que existe um principio cooperativo regendo as implicaturas conversacionais, um tipo de entendimento tácito entre os falantes que estabelece uma cooperagäo na comunicagäo entre as pessoaä. Vejamos, entäo, mais especificamente esse tipo de inferéncia. 2.2 Implicatura conversacional Grice (1975,1978) afirma que as implicaturas conversacionais podem ser previstas por um principio de cooperagäo entre os falantes. Esse principio tem regras que explicita o acordo mutuo existente entre os participantes de uma conversagäo. É importante realgarque esse principio näo pode sertomado de uma maneira muito ampla, compa-rando-o a regras fonológicas, morfológicas, sintáticas, ou mesmo a princípios morais. Também näo deve ser associado a uma linguagem ideal, utópica, em que todos nos entendemos de uma maneira racional e cooperativa. Ao contrario, devemos assumir que esse principio é aplicado em um micronível, em situagóes de comunicagäo bem específicas. É esse acordo subjacente de comunicagäo linguística que Grice identifica como sendo a cooperagäo entre falantes e ouvintes. Para o autor, os participantes de uma conversagäo sempře seräo cooperatívos no sentido de que a sua contribuigäo para aquela conversagäo seja adequada aos objetivos da mesma. Trata-se de um principio bastante simples e que pode ser entendido como um principio de economia ou de menor esforgo do ato comunicativo. A reaiizagäo linguística desse principio é traduzida, por Grice, em uma série de normas ou máximas, identificadas pelo autor da seguinte maneira: (21) Máximas de Grice (adaptado de Saeed, 1997:193) A) Maxima de Qualidade Tente fazer da sua contribuigäo uma verdade, ou seja, näo diga o que vocé acredita que seja falso, ou näo diga nada de que vocé näo tenha evidéncias adequadas. B) Maxima de Quantidade Faga a sua contribuigäo táo informativa quanto nece.ssário para o objetivo da comunicagäo, nem mais nem menos informativa. C) Maxima de Releváncia Faga que suas contribuigöes sejam relevantes. D) Maxima de Modo Seja claro e, especificamente, evite ambigüidades, evite obscuridades, seja breve e seja ordenado. Essas máximas podem ser entendidas, de uma maneira geral, como: o falante falará a verdade, tentará fazer uma estimativa do que o ouvinte sabe e tentará falar algo de acordo com o conhecimento do ouvinte; o falante tem alguma idéia do assunto em questäo e entende que seu ouvinte é capaz de entendé-lo. Äs vezeš, alguns desses parämetros náo sáo respeitados, e o falante pode ter consciéncia disso ou náo. cap:tulo a [ atos de FALA e Im PLI DATURAS COMVERSACíDNAIS , Entretanto, eles säo um tipo de guia de orientagäo que servirá como base para a comunicacäo. É realmente difícil imaginär a comunicagäo sem que essas máximas estejam presentes. Veja, por exemplo, se näo respeitássemos a maxima da releväncia, os diálogos seriam uma sucessäo de falas desconexas, do tipo: (22) A: Voce já almogou? B: Realmente eu vendo carros. Portanto. parece ser verdadeira a afirmagäo de que nossa comunicagäo é regida por alguns principios cooperatives, como as máximas de Ghee. Vejamos alguns exemplos de como essas máximas ajudam o ouvinte a chegar a algumas inferéncias. Um primeiro exemplo envolve a maxima da releväncia (faga que suas contribuigöes sejam relevantes): (23) A: Voce vai a festa hoje á noite? B: Puxa! Estou com uma gripe de matar. Implicatura: (B) näo vai á festa. Para analisar o exemplo em (23), tomamos como ponto de partida que (A) acredita que a informagäo de (B) é relevante para a resposta de sua pergunta e pode inferir que a resposta é negativa. Se o falante näo acreditar na releväncia de (B), ele náo terá como associar as duas sentencas em um diálogo coerente. A implicatura apresentada em (23) é resultado do contexto específico apresentado, e de nenhum outro; näo existe garantia de que a sentenga puxa! estou com uma gripe de matar seja interpretada como näo em outro contexto. Vejamos outro exemplo: (24) A: Vocés fizeram os exercícios pedidos? B: Puxa, está um sol terrível lá fora. Implicatura: os falantes de (B) näo fizeram os exercícios. Sabemos que a resposta de (B) é totalmente inadequada a pergunta de (A). Portanto, quem eseuta um diálogo desses tem duas opgöes: ou imagina que o falante (B) näo está conectado ao seu interlocutor; ou assume a maxima da releväncia, imaginando que a resposta de (B) é relevante de alguma maneira para a resposta de (A) e faz algum tipo de implicatura: por exemplo, eles näo fizeram os exercícios e estäo desviando a conversa. Vejamos agora um exemplo envoivendo a maxima de quantidade {faga a sua contri-buigäo tao inforrnativa quanto necessária para o objetivo da comunicacäo): (25) A: Vocé fez todos os exercícios pedidos? B: Eu fiz alguns. Implicatura: (B) näo fez todos os exercícios. (26) A: Vocé foi á festa ontem ä noite? B: Eu tive a intencäo. Implicatura: (B) näo foi ä festa. MANUAL DE SEMANTICA Veja que, em (25), o falante poderia ter feito todos os exercicios, pois quem fez todos, fez alguns. Entretanto, observando-se a maxima da quantidade, inferimos que (B) náo diria eu fiz alguns, se ele tivesse feito todos os exercicios. O mesmo ocorre em (26). O falante (B) pode ter tido a intengäo e depois ter ido efetivamente á festa! Mas se assumirmos haver uma maxima de quantidade que rege a comunicagáo, o falante (B) näo passaria a informagäo desnecessária eu tive a intengšo, se ele tivesse realmente ido ä festa. A interpretagáo dessas implicaturas segue, em geral, as máximas conversacionais. Espera-se, por exemplo, que a pessoa com quem conversamos esteja falando a verdade. Näo nos baseamos, a priori, na falsidade das sentengas. Entretanto, fica claro que esses princípios cooperativos divergem dos princípios linguísticos, no sentido de que eles podem ser e säo violados freqüentemente: muitas mentiras säo ditas, as conversagöes säo desviadas subitamente do seu curso por respostas desconexas e quem nunca conversou com alguém que dá muito mais informagöes do que as necessárias? O que ocorre é que essas normas podem servioladas de forma deliberada, de modo que o falante sabe e reconhece que a maxima foi desconsiderada de urna maneira intencional. E para lidar com esses desvios dos princípios cooperativos, o ouvinte tem duas alternativas. A primeira é alertar seu interlocutor de que ele está se desviando do que se esperaria da cooperagäo mútua para se efetivar uma comunicagáo, ou seja, que ele está desobedecendo ás máximas, dizendo: "vocé é um mentiroso", ou "isso é irrelevante", ou "vocé está dando mais informagöes que as necessárias". Ou o ouvinte pode escolher uma segunda alternatíva, que quase sempře é a preferida: supôe que o falante está observando o princípio cooperativo e. como o está violando, ele quer transmitir alguma informagäo extra que está de acordo com o princípio; além do mais, o ouvinte supôe que o falante sabe que ele, ouvinte, pode entender essa informagäo extra. Vejamos um exemplo do proprio Grice. Um professor, a quem pediram referéncias sobre um ex-aluno que se candidatara a um cargo de professor defilosofia, responde da seguinte maneira: (27) "Prezado Senhor, o domínio que Paulo tem da lingua portuguesa é excelente, e ele sempře compareceu regularmente as aulas." O professor está violando as máximas de quantidade e de releváncia, ou seja, o professor näo deu as informagöes necessárias e também forneceu informagöes que näo eram relevantes para a pergunta em questäo. A pessoá que recebeu essa carta como resposta certamente inferiu que. se o professor está violando as máximas do princípio cooperativo, ele deve estar querendo transmitir alguma informagäo näo explícita na carta: a informagäo de que Paulo näo é adequado para o cargo. Quando o destinatário dessa carta formula essa implicagäo, a carta deixa de violar o Princípio da Cooperagäo, pois é exatamente a implicagäo que está contida na carta que é a verdadeira mensagem do professor. Segundo Kempson (1977:76): "Essas implicaturas conversacionais säo suposigôes acima do significado da sentenga usadá, que o falante conhece e pretende que o ouvinte compreenda, frente a urna violagäo aparentemente clara do princípio cooperativo, para interpretar a sentenga do falante de acordo com esse mesmo princípio." CAFÍTULO B I ATOS DE FALA E [ M PLI C AT U R AS CONVERSACIGNAIS j Listarei, aqui, algumas características típicas das implicaturas conversacionais: 1) Dependem de assumirmos que existe um princípio cooperative e suas máximas. 2) Näo sáo partes do significado dos itens lexicais, já que muitas delas dependem de um conhecimento do significado convencional da sentenga. 3) Um proferimento pode ter mais de urna implicatura. Por exemplo: (28) A: Esqueci minha caneta lá em cima! B: Eu pego para vocé. C: Puxa! Que pena! Veja que o falante (B) pode ter interpretado que (A) fez um pedido e (C) pode ter interpretado que (A) fez apenas urna constatagáo. 4) A compreensäo de urna implicatura dependerá das suposigöes sobre o mundo que o falante e o ouvinte tém em comum. 5) As implicaturas sempre tém uma natureza cancelávei, ou seja, se adicionarmos outras informagôes, poderemos cancelar a implicatura, sem que sejamos contraditórios. Por exemplo, retomemos o exemplo (21) em (29): (29) A: Vocé vai a festa hoje á noite? B: Puxa! Estou com uma gripe de matar. A: Entäo vocé näo vai? B: Näo! Eu vou assim mesmo. Com a informagäo adicional de (B), cancelamos a implicatura iniciál de que o falante (B) näo iria ä festa. Para concluir, podemos perceber que os atos de fala de Austin fundem-se natural-mente com a teória de Grice sobre a comunicacáo: para os dois autores, a forga ilocutiva de um proferimento e as implicaturas que um proferimento possa ter dependem de suposigöes partilhadasentre o ouvinte e o falante. Como conseqüencia, temosqueaforga ilocutiva de um proferimento pode ser considerada como parte da mensagem implicada. Vejamos um exemplo dado por Kempson (1977), para ilustraressa afirmagáo. Alguém que profira a sentenga Joäo estará na festa hoje ä noite, sabendo que a ouvinte separou-se de Joäo recentemente. de maneira näo amigável, e levando-se em conta que a releváncia da comunicagäo está sendo mantida, está pretendendo fazer uma adverténcia ä ouvinte, esperando que ela entenda essa adverténcia: "Näo vá ä festa hoje ä noite." Ou seja, o ato ilocutivo empregado ä sentenga é de adverténcia. Entretanto, essa adverténcia só pode ser entendida a partir das possíveis implicaturas que a sentenga Joäo estará na festa hoje ä noite possa ter, se é proferida com base nas máximas da cooperacäo. Como em todos os casos, devemos pensar que essa é uma análise possível, mas näo a única possível, ou seja, podem existir para o mesmo proferimento outras forgas ilocutivas e outras implicaturas possíveis. MANUAL DE SEMÁNT1CA 2.3 Exercícios I. Explique como se dá o processo de inferéncia entre as sentengas a seguir: 1) Peguei aquela avenida as 6 horas da tarde. O tráfico estava simplesmente impossível. 2) Acordei tarde, dormi mal, saí de casa atrasada. Tudo isso me fez comegar dia com o pé esquerdo. 3) Eu comprei um filhote de pastor alemáo. O filhote rói tudo pela frente. II. Baseado na nogäo de implicatura de Grice, dé, para os díálogos abaixo, as possíveis implicaturas. Explique quais sáo as máximas envolvidas: 1) A. Vocé vem jantar aqui em casa hoje? B. Minha máe vem me visitar. 2) A. Me empresta sua blusa amarela. B. Ela esté novinha; acabei de comprar. 3) A. O Joáo é bom de bola? B. Ele corre muito rápido. 4) A. Quem quebrou este vidro? B. Eu näo tinha a intengao. III. Reiatarei abaixo um fato anedótico, extraído de Saeed (1997:201). Comente o comportamento dos envolvidos, em termos das máximas de Grice: Um dia, um vendedor encontrou um menino sentado na escada da frente de uma casa. Ele perguntou ao menino: "Sua máe está em casa?" "Sim", respondeu o menino. Entäo o vendedortocou a campainha várias vezeš, bateu na porta e chamou por alguém. Ninguém respondeu. O vendedor, entáo, se dirigiu ao menino, dizendo: "Eu pensei que vocé tivesse dito que sua máe estava em casa!" "Ela está", retrucou o menino, "só que esta náo é a nossa casa". 3. Ambigüidades Situacionais As implicaturas também podem apresentar um certo grau de ambigüidade, caracte-rística bastante comum em sentengas descritivas. Alguns autores, como llari & Geraldi (1987), falam de ambigüidades situacionais. Veja o exemplo abaixo: (30) Eu näo posso nem falar de chocolate. Em (30), parece pouco provável que o ouvinte entenda a sentenga em seu sentido literal, ou seja, eu estou proibida de falar de chocolate. Se o ouvinte souber, como um fato dado, que eu sou perfeftamentě capaz de falar de chocolate, ele seguirá a maxima CAPÍTULO 8 ATOS de FALA e implic ATURAS con VERS ACIO NAIS da qualidade, pensando que eu náo estou mentindo, e seguirá a maxima da releváncia, pensando que, se eu náo estou mentindo, eu devo estar querendo passar algum tipo de informagáo; com isso ele vai tentar inferir da sentenga algum tipo de significado. Normalmente, apesar de ser possível mais de um tipo de implicatura para uma sentenga, existe uma interpretagáo preferível, ou mais previsível. Assim, no exemplo de Grice do professor em (27), parece-me que a maioria dos falantes interpretaria que o professor náo queria recomendar o aluno (apesar de náo ser a única interpretagáo possível). Entretanto, existem sentengas em que a interpretagáo previsível é ambígua, ou seja, existe mais de uma possibilidade, igualmente preferida. É o que ocorre com o exemplo em (30). Acredito que os falantes do portugués brasileiro hesitaráo em afirmar qual é a interpretagáo mais previsível para (30) entre as sentengas: (31) Eu gosto tanto de chocolate, que só de falar eu quero comer. (32) Eu detesto chocolate, que só de falar eu passo mal. Para poder interpretar (30), escolhendo entre as possíveis implicaturas que possam decorrer dessa sentenga, o ouvinte tem que se valer de indícios de várias ordens, como gestos, entonagáo, expressóesfaciais, etc. Por isso, assume-se que esse tipo particular de ambiguidade tem um fundamento situacional e náo, linguístico. 3.1 Exercícios I. Dé exemplos de outras ambigůidades situacionais, explicando-as. 4. Indicagoes Bibliográficas Em portugués: CHIERCHIA (2003, cap. 5), ILARI & GERALDI (1987, cap. 5), HURF0RD & HEASLEY (1983, cap. 6) e KEMPS0N (1977, cap. 4 e 5). Em inglés: SAEED (1997, cap. 7 e 8) e CHIERCHIA & McCONNELL-GINET (1990, cap. 4). PARTE 5 TEORIAS SEMÄNTICAS CAPÍTULO 9 UM BREVE PERCURSO PELAS TEORIAS SEMÄNTICAS 1. As Várias Correntes Teóricas Farei aqui um breve percurso sobre alguns dos principals autores e teorias relativas a cada tipo de abordagem, retomando a divisäo iniciál dos tipos de abordagens usados para a investigacäo do significado'. em a) a abordagem referencial, que lida com a relaqäo da referenda no mundo e as palavras; em b) a abordagem mentalista, que propôe que o sentido também acontece em um nível intermediário entre o mundo e as palavras: o nível da representagäo mental; e em c) a abordagem pragmática, que estuda os usos situados da lingua. 2. A Semantics Formal A teória conhecida como semántica formal encaixa-se na abordagem referencial. O estudo dessa teoria tem suas raÍ2es na logica e na filosofia da linguagem. O aparecimento dessa teoria como parte de uma teoria semäntica de linguagem natural foi na forma de Montague Grammar, uma gramática desenvolvida originalmente por Richard Montague (1930-1971) e, posteriormente, modificada e estendida porlingüistas, filósofos e lógicos. Rapidamente, a semántica formal se tornou influente na linguística, e 140 MANUAL DE SEMÄNTICA linguistas tém desempenhado um importante papel na evolugäo da semäntica formal contemporänea.1 Os traqos mais constantes que permeiam a semäntica formal durante toda a sua evolugäo tém sido; o foco nos aspectos de condigäo de verdade do significado (Tarsky, 1944), a concepgäo de teória de modelos em semäntica e a centralidade metodológica do Princípio da Composicíonalídade (Frege, 1892). Explicando, brevemente, os trés conceitos acima, comecemos com a nogäo de valor de verdade. Para Tarsky, dar o significado de urna sentenga é dizer em que condigôes essa sentenga séria verdadeira. O raciocínio é o seguinte: consideremos a sentenga/) neve é branca e perguntemos em que condigôes essa sentenga é verdadeira ou falsa. A resposta é óbvia: a sentenga será verdadeira se a neve for branca, e será falsa se a neve nao for branca. Assim, vamos obter o seguinte: {1) A sentenga a neve é branca só é verdadeira, se, e somente se, a neve é branca. Lembre que a expressäo em itálico, a neve é branca, é a mengäo, ou seja, o objeto de estudo em questäo, e que a segunda sentenga a neve é branca é a linguagem usadá para estudar o objeto, ou seja, a metalinguagem. Seguindo a exposigao que Borges (2003) faz em seu texto, existem dois pontos a serem examinados aqui. Primeiro: é um procedimento razoável associar condigôes de verdade a significado? Vejamos um exemplo: (2) Um homem pulou o muro. Se tentarmos explicar o significado da sentenga em (2), diríamos que ela significa que uma pessoa, com as qualidades normalmente atribuídas a homem (sexo masculino, adulto...) fez um movimento para ultrapassar um obstáculo, chamado muro, etc. Por outro lado, se perguntássemos em que condigôes aceitaríamos essa sentenga como sendo verdadeira, provavelmente teríamos a seguinte resposta: a sentenga em (2) será verdadeira quando existir urna pessoa, com as qualidades normalmente atribuídas a homem (sexo masculino, adulto...), e essa pessoa fizer um movimento para ultrapassar o muro, etc. Portanto, ao especificarmos as condigôes que devem existir para que urna sentenga seja verdadeira no mundo, estamos, em realidade, caracterizando o que consideramos como o significado da sentenga. Um segundo ponto; é preciso deixar claro que saber as condigôes de verdade de urna sentenga näo é igual a saber se a sentenga é verdadeíra'ou falsa; muitas vezes sabemos em que condigôes a sentenga séria verdadeira, mas näo sabemos, de fato, se ela é verdadeira ou näo. Por exemplo: (3) O numero de gräos de areia dentro desta garrafa está na casa dos cem mii. Estabelecer em que condigôes a sentenga em (3) é verdadeira é um procedimento fácil: a sentenga será verdadeira se, e apenas se, o numero de gräos de areia da garrafa estiver realmente na casa dos cem mil. Já a verdade ou a falsidade da sentenga vai depender de contarmos os gräos de areia; o que séria urna tarefa quase irnpossível. Portanto, podemos saber quais säo as condigôes em que urna sentenga é verdadeira, Sob-e essasteorías formais, ver MONTAGUE (1970), PARSONS (1972), CRESSWELL (1973) e LEWIS (1973). CAPÍTULO 9 UM BREVE PERCLIRSO PELAS TOERIAS SEMÄNTICAS 1 sem saberrnos, de fato, se ela é verdadeira ou näo. O que é preciso ficar claro é que o significado da sentenga está associado äs condigóes de verdade da sentenga e näo, ä sua verdade ou faisidade. Em relagäo a uma teoria de modelos, podemos comegar a explicagäo pela definigäo do que seja um modelo. Ainda segundo Borges (2003), geralmente o termo modelo designa uma representagäo em forma de esquema de um objeto ou de um sistema complexo, que tem como objetivo facilitar a compreensäo desse objeto ou sistema. Äs vezes, queremos descrever um sistema muito complexo e näo sabemos como faze-lo. O que fazemos é construir um outro sistema mais simples, que tenha caracteristicas parecidas com as do sistema complexo que se deseja estudar e que, portanto, sirva de modelo para o estudo desse sistema mais complexo, Em seguida, construimos uma teoria para o sistema-modelo mais simples e aplicamos a mesma teoria ao sistema complexo. Se os resultados forem razoavelmente positives em relagäo ao sistema complexo, dizemos que o sistema simples é um bom modelo. Caso contrario, abandonamos o sistema simples, pois ele näo serve como modelo. Por exemplo, no caso das linguas naturais, podemos pensar que estudar a sintaxe e a semäntica das linguagens formais pode servir de modelo para o estudo das linguas naturais, pois ambas säo linguagens que tem caracteristicas comuns, e como a linguagem formal é mais simples do que a lingua natural, ela pode servir de modelo para a lingua natural. Portanto, o procedimento dos semanticistas formais tern sido esse, ou seja, propor modelos bastante simples das linguagens formais e tentar interpretar neles o maior numero possível de sentengas das linguas naturais, A medida que os modelos se revelam inadequados, eles väo sendo substituidos por modelos mais complexos que satisfagam os fatos que revelaram a inadequacäo dos modelos anteriores. Aadogäo de uma teoria de modelos para a linguagem natural contrapöe-se ao estudo da linguagem como uma entidade psicológica. A questäo da composicionalidade de Frege (1892) já foi tratada no capitulo 5 e pode resumir-se em: "O significado de um todo é a fungäo do significado de suas partes e da combinagäo sintática dessas partes," Se soubermos o significado das partes da sentenga e soubermos as regras que explicitam como combinar essas partes, entäo podemos deduzir o significado da sentenga, ou seja, se soubermos o significado das unidades e regras para montá-las em unidades mais complexas, entäo poderemos construir e interpretar uma infinidade de sentengas novas, assim como explicar por que certas interpretagöes näo säo possíveis. Uma das críticas que se faz a abordagerm formal é que, muitas vezes, essas teorias atendem somente a uma pequena parte da lingua, a tipos bem específicos de dados. Entretanto, é importante realgar a importäncia de se conhecer essa perspectiva formal. A primeira é que as outras teorias semänticas estabeleceram-se a partir da semäntica formal, äs vezes, tentando solucionar problemas que esse modelo näo resolvia, ou mesmo, propondo modelos alternatives. Por isso, é necessário conhecermos a base, ou seja, a semäntica formal, pois é de onde outros modelos surgiram. Uma segunda razáo é que os aspectos mais estudados sobre o significado tern seus estudos mais relevantes na semäntica formal. Introdugöes a essas teorias podem ser encontradas em Lyons (1977), Kempson (1977), Hurford & Heasley (1983), Chierchia & McConneU-Ginet (1990), Cann (1993), Larson & Segal (1995), Saeed (1997), Pires de Oliveira (2001) e Chierchia (2003). MANUAL DE SEMÄNTICA 3. A Semäntica Argumentativa A semäntica argumentativa é um desses modelos que surgem como alternativos ä semäntica formal. Podemos encaixar essa perspectiva teórica em uma abordagem pragmática. Seu aparecimento se dá nos anos 70, na Franca, com o trabalho de Ducrot (1972) sobre os operadores argumentatives. A idéia dessa linha teórica é que as sentengas säo pronunciadas como parte de um discurso em que o falante tenta convencer seu interlocutor de uma hipótese qualquer, ou seja, näo usamos a linguagem para falar algo sobre o mundo, mas para convencer o ouvinte a entrar no jogo argumentativo. Nessa abordagem, as condigöes de verdade de uma sentenga näo säo relevantes. A idéia que sustenta essa teória é a de que há interesse em contar corn categorias descritivas que dizem respeito mais ao possivel uso na interaeäo dos falantes/ouvintes, e menos no que diz respeito ä sintaxe ou ao conteudo objetivo da sentenga. Na análise sob uma perspectiva argumentativa, portanto, uma mesma sentenga podetervários significados, dependendo do seu uso. Desfazem-se, assim, os limites entre semäntica e pragmática. Normalmente, as nogöes envolvidas em análises dessa linha teórica dizem respeito ä classe argumentativa, forga argumentativa, escala, etc. Esses fenômenos revelam-se de grande interesse na lingua. Por exemplo, a nogäo de escala está envolvida em vários fenômenos lingüisticos, como o uso do até, a negagäo, muitas conjungöes coordenativas [mas, poisjä que) e algumas subordinativas {embora), escolha de perspectivas {Joäo trabalha comigo, eu trabalho com Joäo) e expressöes de polaridade negativa {um a mais näo trará o menorinconveniente). Certamente, os recursos usados pela semäntica argumentativa trazem explicagöes para fatos que outras análises semánticas näo contemplam. Entretanto, salientando a observagäo de llari Et Geraldi (1987), se adotarmos essa análise semäntica, parece-nos que estamos adotando o estudo da linguagem mais como um instrumento politico do que como um instrumento de informagäo. Ainda, esse tipo de análise apenas envolve uma reflexäo semäntico-pragmática, sem se articular com os outros componentes da gramática como a sintaxe, a fonologia ou a morfológia. Para contextuaiizar o estudo da semäntica argumentativa na literatúra lingüística, podemos dizer que esse estudo se aproxima da análise textual (Koch, 1996), da análise de discurso de origem francesa (Guimaräes, 1985) e, também, de um estudo da pragmática (Ducrot, 1987). 4. A Teória dos Atos de Fala Ateoria dos atos de fala surgiu com Austin (1962), sendo reformulada mais á frente por Searle (1969), tendo como foco o uso e a idéia de que parte do sentido de uma sentenga tem uma fungäo social. Näo é uma perspectiva de oposigäo á semäntica formal, mas complementar. A parte que näo pode ser resolvida pela semäntica formal, a das sentengas näo-declarativas, étratada dentro dessa perspectiva pragmática. Parece evidente para todos que aprender a se comunicar em uma lingua envolve mais do que adquirir a pronúncia e a gramática. Precisamos também saber como fazer perguntas, CAPÍTULO 9 1 UM BREVE PEHCURSO pela3 "OERIAS SEMÁNTICAS ! fazér sugestöes, darordens, agradecera pessoas, etc. Em outras palavras, precisamos-saberos usos convencionados para cada situagäo e como colocá-los em prática. Essas fungöes sšo os chamados Atos de Fala. Temos nessa teória o estudo das implicaturas conversacionais, as condigöes de felicídade de urna sentenga (Grice, 1975) e os atos locutórios, ilocutórios e perlocutórios, dentre outras propriedades. Essa teória está descrita no capítulo 8, de urna forma introdutória. Ainda, essa teória sempre consta como parte integrante de livros de introdugäo ä semäntica formal, podendo o leitor encontrar outros textos introdutórios em Lyons (1977), Kempson (1977), Hurford Er Heasley (1983), Chĺerchia & McConnell-Ginet (1990), Cann (1993), Larson & Segal (1995), Saeed (1997) e Chierchia (2003). 5. A Semäntica Cognitiva A semäntica cognitiva tem sua origem atrelada ao que ficou conhecido como semántica gerativa. A semäntica gerativa (Lakoff, 1971; McCawIey, 1971; Fillmore, 1968; entre outros) desenvolveu-se nos Estados Unidos, opondo-se ä centralidade da sintaxe adotada peio modelo gerativista. Como reagäo a essa semäntica, surge a semäntica interpretativa de Jackendoff (1972), que é uma abordagem semäntica compatível com o modelo gerativista. O fim dessa disputa se dá, na década de 1980, com o desaparecimento da semäntica gerativa e o nascimento de um modelo, de abordagem funcional, denominado semäntica cognitiva, que congrega os dissidentes da abordagem gerativa (Lakoff, 1987; Langacker, 1987; Fauconnier, 1985, 1994, entre outros). E um movimento de plena oposigäo ä sintaxe gerativa e ä semäntica formal, de cunho funcionalista, que concebe a relagäo da lingua com uma representagäo mental do mundo. A semäntica cognitiva acredita que o pensamento é estruturado por esquemas de imagens, mapeando dominios conceituais distintos. Assume-se a extensäo de conceitos temporais/espaciais para outros campos semänticos, em uma relagäo metafórica. Por exemplo, em: (4) Joäo gastou seu tempo com a Maria. Essa sentenga seria metafórica, pois a interpretagäo do tempo em (4) é de algo que se gasta, ou seja, de um objeto que pode ser consumido. Portanto, a interpretagäo dessa sentenga sería a manifestagáo de um mapa cognítivo que transporta a nogáo do tempo para uma nogáo de objetos consumíveis no tempo. Nesse tipo de abordagem cognitiva, também conhecida como gramátíca cognitiva, existe o abandono de uma estrutura sintática autonoma, como propöe Chomsky e seus seguidores. Lakoff (1987) alega que a abordagem formal näo percebe a centralidade da imaginagäo, por exemplo, quando concebe as expressöes metafóricas apenas como um desvio marginal da linguagem. Para os cognitivistas, a metafora é um processo cognitivo central que está no entendimento de expressöes táo banais como a primavera comega na semana que vem. Outra crítica de Lakoff diz respeito ä classificagäo das categorias. A nogäo tradicional de categorias, em que as coisas pertencem a determinadas classes, caso tenham certas propriedades necessárias e suficientes, näo encontra motivagäo na psicologia. Para Lakoff, categorizamos as coisas MANUAL DE SEMÄNTICA atraves de protötipos, membros centrais da categoria, com os quais outros membros mantem relacäo de semelhanga. Por exemplo, na categoria dos mamfferos, o macaco seria um membro prototfpico e a baleia seria periferica. Uma introdugäo äs ideias de Lakoff (1987) foi apresentada no capitulo 6; outro texto introdutörio interessante encontra-se em Saeed (1997). Para maiores detalhes ver os autores Lakoff & Johnson (1980), Lakoff (1987), Johnson (1987), Langacker (1987) e Fauconnier (1985 e 1994). G. A Semäntica Representational Paralelamente ao movimento da semäntica cognitiva, o representante da semäntica interpretativa, Jackendoff (1983, 1987, 1990), da um novo rumo ä sua pesquisa, com o que ele chama de semäntica representacional. É também um tipo de semäntica mentalista, pois percebe a mente como uma representagäo da realidade, distanciando-se da semäntica formal, baseada em inferéncias e condigöes de verdade. A semäntica representacional tem compromisso com a forma das representagöes mentais internas, que constituem a estrutura conceitual, e com as relacöes formais entre esse nívei e os outros niveis de representagäo (sintático, fonológico, visual, etc.). O que a semäntica conceitual de Jackendoff tem em comum com a sintaxe gerativa, por exemplo, é a concepgäo da existéncia do modulo de sintaxe autonoma, que faria correspondent com urn modulo de semäntica autonoma, o seu comprometimento com um formalismo rigoroso e a crenga em propriedades lingüisticas inatas. Por outro lado, também podemos perceber que a semäntica conceitual partilha com a semäntica cognitiva a adogäo de uma representagäo mental do mundo e sua relagäo com a lingua; vale-se de conceitos espaciais/temporais e de sua extensäo para outros campos semänticos. Entretanto. difere da semäntica cognitiva no que diz respeito ao näo abandono do nível de representagäo sintático, ao uso do formalismo em detrimento do funcionalismo, ao tentar aplicar seus resultados na psicologia perceptual e, finalmente, ao assumir a possibilidade de estruturas conceituais inatas. A semäntica representacional näo tem muitos seguidores — talvez o trabalho de Culicoverö Wilkins (1989) e Bierwish (1969) assemelhem-se ä proposta de Jackendoff. Contudo, o trabalho de Jackendoff (1983, 1987,1990, 1997 e 2002), mesmo sendo um trabalho isolado, é sempře respeitado e muito citado na literatura lingüistica. Um breve esbogo das idéias de Jackendoff encontra-se no capítuío 7. 7. A Semäntica Lexical Talvez possamos associar, também, o trabalho de Jackendoff ao trabalho de uma linha de pesquisa conhecida como a interface entre semántica lexical e sintaxe (Grimshaw, 1990; Levin, 1989; Levin&Ra pap port, 1995; Rappaport&Levin, 1986, etc.). Assumo isso, pois esses trabalhos těm em comum o estudo da estrutura argumental e a ligagáo entre CAPÍTĽILQ 9 UM BREVE PERCUfiSQ PELAS TOERIAS SEMÁN'TICAS urna estrutura sintática a uma estrutura sernäntica. Esses autores lexicalistas exploram as nogôes de papel temático, hierarquia temática, assumindo sempre a existencia de um módulo sintático; em geral, sáo teorias totalmente compatíveis com a gramática gerativa. Incluiria, ainda, nessa lista de sernäntica lexical, um trabalho recente, que vem sendo desenvoivido sobre a sernäntica do léxico, intitulado O léxico geratívo, de Pustejovsky (1995). O autor propôe estruturar o léxico de uma forma organizada, composicional e geradora de novas estruturas. E um trabalho que busca uma viabilidade de aplicagäo da teória linguística ä prática computacional. 8. Outras Teorias Para finalizar essa breve exposigao, cito urn estudo tambem conhecido como semantica lexical (Cruse, 1986; Evens, 1988; LehrerS- Feder, 1992). Diferentemente da semantica lexical dos autores citados no item 7, essa teoria semantica trabalha somente com a palavra e as relacoes entre elas (sinonimia, antonimia, hiponfmia, etc.). Alguns desses temas foram abordados no capitulo 3. Acredito quefica faltando a este livro incluir, entre as teorias semanticas, a semantica de eventos, que e um estudo a respeito da descricao dos eventos no mundo. Essas teorias abordam a nogao de aspecto: durabilidade, estatividade, telicidade, etc. das sentengas (Comrie, 1976); e, tambem, a nogao de aksionsart, que sao categorias propostas por Vendler (1967) (e depois estudadas .por Dowty, 1979) para tratar dos estados, aimdades, accomplishments eachievements. Ainda, fica faltando o estudo da semiotica (Greimas, 1966), que encaminha a reflexao para a integragao da semantica lexical numa teoria do sentido, situada na dimensao do discurso, conhecida como a semiotica do discurso. RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS Capítulo 1: A Investigagäo do Significado Exercicios 3.4 (p. 24} I. A compreensäo do significado envolve o conhecimento semäntico e o conhecimento pragmatice O conhecimento semäntico lida com os aspectos da interpretagäo que permanecem constantes quando uma palavra ou sentenga é proferida, ou seja, limita-se ao sistema lingüistico. O conhecimento pragmático, por sua vez, estuda os usos situados da lingua e considera, para tanto, os efeitos intencionais no discurso. Por exemplo, a sentenga o forno está ligado, sob a perspectiva de uma interpretagäo semäntica, constitui uma declaragäo sobre a condigäo física do eletrodoméstico: estar ligado. Se situarmos a mesma sentenga em um contexto no qual uma mäe se dirige a um filho pequeno que acaba de entrar na eozinha, temos um aspecto de significado que ultrapassa o anterior e se situa no ämbito da pragmática: cuidado com o forno, ele está quentel II. A nogäo de mengäo, que alude ao significado lingüistico de uma palavra ou sentenga, é o objeto de estudo da semäntica; e a nogäo de uso, que leva em consideracáo a forma como o falante emprega determinada palavra ou sentenga, é o objeto de estudo da pragmática. No exemplo anterior, para ilustraro conhecimento semäntico, mencionei a sentenga o forno está ligado, que é uma expressäo da lingua portuguesa — língua-objeto — e usei a propria lingua — metalinguagem — para deserever o significado. 148 MANUAL DE SEMÄNTICA A sentenga foi isoíada de contexto e apresentou um significado invariável. Para expli carmos o conhecimento pragmático da mesma sentenga, no entanto, foi necessário inseri-la em urna situagäo de discurso, pois o significado, aí, depende do contexto e varia de acordo com o uso da lingua. 1) A composicionalidade e a expressividade lingúística: urna teória semäntica deve atribuir significado(s) a cada palavra e sentenga das línguas, estabeiecer a natureza exata da relagäo entre o significado das palavras e o significado das sentengas e enunciar de que modo essa relagäo depende da ordem das palavras ou de outros aspectos da estrutura gramatical da sentenga. 2) As propriedades semänticas: urna teória semäntica deve caracterizar e explicar as relagôes sistemáticas entre palavras e entre sentengas de urna língua, urna vez que tal nocäo faz parte da competéncia lingúística dos falantes. Por exemplo, deve fazer parte de urna teória semäntica abordar as nocôes de implicagôes, sinonímias, contradigoes, ambigúidades, anomalias, etc. 3) A referencialídade e a representagäo: urna teória semäntica deve abordar questôes relativas ä natureza do significado. Segundo urna abordagem referencial, o estudo do significado diz respeito ä ligagäo entre as expressôes lingúísticas e o mundo. Já para urna abordagem representacional do significado, devemos levar em conta a ligagäo entre a linguagem e os construtos mentais que, de alguma maneira, representam ou codificam o conhecimento semäntíco do falante. Urna terceira postura séria adotar as duas naturezas como sendo complementares para a explicagáo do significado. Capítulo 2: Implicagôes Exercícios 2.1 (p. 30) 1) homem ->■ T+animado + bípede + racional + mamífero Há relagäo de hiponímia, porque o sentido de 'seranimado' (assim como 'bípede', 'racional', 'mamífero') está contido no sentido de 'homem'. 2) gente [+ críanga ] Aqui näo se verifica a relagäo de hiponímia, porque o sentido de 'crianga' näo está contido na palavra gente'. RESPDSTAS DOS EXERCiCIOS 3) onga V+ mamifero - quadrúpede - earnívoro + felino Há relagäo de hiponímia, porque o sentido de 'mamífero' (assim como 'quadrúpede', 'carnívoro', 'felino') está contido no sentido de 'onca'. 4) liquidificador + eletrodoméstico + triturador Há relagäo de hiponímia, porque o sentido de 'eletrodoméstico' (assim como 'triturador') está contido no sentido de 'liquidificador'. 5) vegetal [+ án/ore ] Aqui náo se verífica a relagäo de hiponímia, porque nem todo vegetal é uma árvore, ou seja, o sentido de 'árvore' náo está-contido na palavra 'vegetal'. 1) A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) náo é verdade. 2) A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) náo é contraditória á sentenga (a). É perfeitamente possível dizermos que algumas vezeš Joáo é um bom instrumentista, mas, na verdade, Joáo náo é um bom instrumentista. 3) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). 4) A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) náo é contraditória á sentenga (a). É perfeitamente possível dizermos que Joáo pensa que porcos náo těm asas, mas porcos těm asas (o que está em jogo aqui náo é a verdade no mundo real, mas a relagäo de verdade entre as sentengas). 5) A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), porque a negagäo da sentenga (b) náo é contraditória á (a). É perfeitamente possível dizer que Oscar e Jose säo ricos, mas que José náo é rico; somente os dois juntos sáo ricos. Isso se deve ao fato de (5a) ser uma sentenga ambígua, ou seja, gera duas possibilidades de interpretagäo: Oscar e José sáo ricos separadamente ou apenas em conjunto. 6) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). Aqui a sentenga (6a) náo é ambígua: näo existe a possibilidade de os dois juntos sérem de meia-idade. 7) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) náo é verdade. 8) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. 150 I MANUAL DE SEMANTICA I 9) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessaria-mente verdade. 10) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo é contraditória ä sentenga (a). É perfeitamente possivel dizermos que seu discurso me confundiu, mas näo me confundiu profundamente. 11) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) näo é verdade. 12) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessaria-mente verdade. 13) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) näo é neces-sariamente verdadeira. A sentenga (b) é ambígua. 14) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo é contraditória ä sentenga (a). É perfeitamente possivel dizermos que Maria e Joäo säo gémeos, mas näo těm a mesma fisionomia. 15) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). 16) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo é contraditória a sentenga (a). É perfeitamente possivel dizer que näo foi Maria que chegou tarde, na verdade, ninguém chegou tarde. 17) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). 18) A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo é contraditória a sentenga (a). É perfeitamente possivel dizermos que Maria acha que José já chegou, mas, na verdade, Jose näo chegou. 19) A sentenga (a) acarreta a sentenca (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). 20) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo é contraditória á sentenga (a). É perfeitamente possivel dizermos que houve um roubo no banco, mas o banco näo foi roubado; foi um assaltante que roubou a bolsa de uma diente. Veja que as sentengas (20a e b) sáo ambíguas. 21) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). 22) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo de (b) náo é contraditória á (a). E possivel dizermos: náo foi o menino que quebrou o vaso, ninguém quebrou o vaso. 23) A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), pois se (a) é verdade, (b) náo é verdade. 24) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). 25) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) também é verdade. RESPOSTAS DOS EXERCÍtľOS Exercícios 3.1 (p. 38) I. 1) A sentenga (a) acarreta a sentenca (b), porquese (a) éverdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. O Joáo näo adivinhou que Paulo estava aqui. a'. O Joáo adivinhou que Paulo estava aqui. a". O Joáo adivinhou que Paulo estava aqui? a'". Eu me pergunto se o Joáo adivinhou que Paulo estava aqui. A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 2) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). Família de (a): a. Joáo adorou ter conseguido um emprego. a'. Joáo näo adorou ter conseguido um emprego. a". Joáo adorou ter conseguido um emprego? a". Se Joáo adorou ter conseguido um emprego... A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 3) A definigäo de acarretamento näo se aplica a oragôes interrogativas. Família de (a): a. Sandra, vocé parou de vender perfumes? a'. Sandra näo parou de vender perfumes, a". Sandra parou de vender perí u mes. a"'. Se Sandra parou de vender perfumes,... A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 4) A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo é contraditória á sentenga (a). E perfeitamente possível dizermos que näo foi José que roubou a loja, na verdade, ninguém roubou a loja. Família de (a): a. Näo foi José que roubou a loja. a'. Foi José que roubou a loja. a". (Näo) foi José que roubou a loja? a"'. Se (näo) foi o José que roubou a loja, ... A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. MANUAL DE SEMÄNTICA 5) A definicäo de acarretamento näo se aplica a oragôes condicionais. Família de (a): a. Paulo parou de fumar. a'. Paulo näo parou de fumar. a". Paulo parou de fumar? a"'. Paulo parou de fumar. A sentenga (a) pressupóe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 6) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. Joäo certificou-se de que Maria tinha saído. a'. Joäo näo se certificou de que Maria tinha saído. a". Joäo certificou-se de que Maria tinha saído? a"'. Se Joäo certificou-se de que Maria tinha saído, ... A sentenga (a) näo pressupóe (b), porque a família de (a) näo toma (b) como verdade. Veja que se vocé faz a pergunta: "Joäo certificou-se de que Maria tinha saído?", vocé näo está tomando como verdade que a Maria tinha saído; isso é exatamente o que vocé quer saber. 7) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. O inventor da penicilina näo morreu. a'. O inventor da penicilina morreu. a". O inventor da penicilina näo morreu? a'". Eu me pergunto se o inventor da penicilina näo morreu,... A sentenga (a) pressupóe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 8) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. Dénis foi salvo por um lobo. a'. Dénis näo foi salvo por um lobo. a". Dénis foi salvo por um lobo? a'". Se Dénis foi salvo por um lobo, ... A sentenga (a) näo pressupóe (b), porque a família de (a) näo toma (b) como verdade. respostas dos EXERCÍCIQS 153 9) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. O rei da Franga é calvo. a'. O rei da Franga näo é calvo. a". O rei da Franga é calvo? a'". Se o rei da Franga é calvo, ... A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 10) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo ó contraditóría ä sentenga (a). E perfeitamente possível dizermos que näo foi D. Joäo que declarou a indépendéncia, na verdade, ninguém declarou a independéncia. Família de (a): a. Näo foi D. Joäo que declarou a independéncia. a'. Foi D. Joäo que declarou a indépendéncia. a". (Näo) foi D. Joäo que declarou a independéncia? a'". Se (näo) foi o D. Joäo que declarou a independéncia, ... A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 11) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. Joäo é solteiro. a'. Joäo näo é solteiro. a". Joäo é solteiro? a'". Se Joäo é solteiro, ... A sentenga (a) näo pressupôe (b), porque a família de (a) näo toma (b) como verdade. 12) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo é contraditória ä sentenga (a). É perfeitamente possível dizermos que näo foi Maria que perdeu o trem, na verdade, ninguém perdeu o trem. Família de (a): a. Näo foi Maria que perdeu o trem. a'. Foi Maria que perdeu o trem. a". (Näo) foi Maria que perdeu o trem? a"'. Se näo foi Maria que perdeu o trem, ... A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. MANUÁL DE SEMÁNTICA 13) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagáo de (b) está contida em (a). Fa mília de (a): a. Que Joáo tenha fugido náo aborreceu Maria. a'. Que Joáo tenha fugido aborreceu Maria. (Lembre-se que a negativa é a da oragáo principál, portanto, náo negue a oragáo c/t/e Joáo..., pois essa é o sujeito da oragáo principál, que já está na negativa na sentenga (a)). a". Que Joáo tenha fugido aborreceu Maria? a'". Se o fato de Joáo ter fugido aborreceu Maria, ... A sentenga (a) pressupóe (b), porque a família de (a) torna (b) como verdade. 14) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagáo de (b) está contida em (a). Família de (a); a. Paulo e José ainda sáo jovens. a'. Paulo e José náo sáo mais jovens. a". Paulo e José ainda sáo jovens? a"'. Se Paulo e José ainda sáo jovens, ... A sentenga (a) náo pressupóe (b), porque a família de (a) náo torna (b) como verdade. 15) A sentenga (a) náo acarreta a sentenga (b), pois a negagáo da sentenga (b) náo é contraditória á sentenga (a). É perfeitamente possível dizer que Joáo acha que Maria já saiu, mas, na verdade, Maria náo saiu ainda. Família de (a): a. Joáo acha que Maria já saiu. a'. Joáo náo acha que Maria já saiu. a". Joáo acha que Maria já saiu? a'". Se Joáo acha que Maria já saiu, ... A sentenga (a) náo pressupóe (b), porque a família de (a) náo torna (b) como verdade. 16) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagáo de (b) está contida em (a). Família de (a): a. Joáo lamenta que Maria o tenha deixado. a'. Joáo náo lamenta que Maria o tenha deixado. a". Joáo lamenta que Maria o tenha deixado? a'". Se Joáo lamenta que Maria o tenha deixado, ... A sentenga (a) pressupóe (b), porque a família de (a) torna (b) como verdade. HESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS 1 17) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. Foi José que deixou a porta aberta. a'. Näo foi José que deixou a porta aberta. a". Foi José que deixou a porta aberta? a'". Sefoi José que deixou a porta aberta, ... A sentenga (a) pressupóe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 18) A sentenga (a) acarreta a sentenca (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. Pedro se certificou de que havia fechado a casa. a'. Pedro näo se certificou de que havia fechado a casa. a". Pedro se certificou de que havia fechado a casa? a'". Se Pedro se certificou de ter fechado a casa, ... A sentenga (a) näo pressupóe (b), porque a família de {a} näo toma (b) como verdade. 19) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de(a): a. O inventor do saca-rolhas é um desconhecido. a'. O inventor do saca-rolhas näo é um desconhecido. a". O inventor do saca-rolhas é um desconhecido? a'". Se o inventor do saca-rolhas é um desconhecido, ... A sentenga (a) pressupóe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 20) A definigäo de acarretamento näo se aplica a oragôes condicionais. Família de (a): a. Maria parou de fazer regime. a. Maria näo parou de fazer regime, a". Maria parou de fazer regime? a'". Se a Maria parou de fazer regime, ... A sentenga (a) pressupóe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 156 MANUAL DE SEMÁNTICA 21) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) é necessariamente verdade. Família de (a): a. Alguns dos alunos näo väo se formar. a'. Nenhum aluno vai se formar. {A idéia mais próxima da negagäo em (a) será com nenhum. Veja que se voce usar alguns väo..., tem-se urna idéia de complementagäo, ou seja, se alguns väo, outros näo väo.) a". Alguns dos alunos (näo) väo se formar? a'". Se alguns dos alunos (näo) väo se formar, ... A sentenga (a) näo pressupôe (b), porque a família de (a) näo toma (b) como verdade. 22) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), porque se (a) é verdade, (b) näo é verdade necessariamente. A sentenga (a) é ambígua, ou seja, gera duas possibilidades de interpretagäo: Paulo e José säo poderosos separadamente, ou apenas em conjunto. Família de (a): a. Paulo e José säo poderosos. a'. Paulo e José näo säo poderosos. a". Paulo e José säo poderosos? a'". Se Paulo e José säo poderosos, ... A sentenga (a) näo pressupôe (b), porque a família de (a) näo toma (b) como verdade. 23) A sentenga (a) näo acarreta a sentenga (b), pois a negagäo da sentenga (b) näo é contraditória ä sentenga (a). É perfeitamente possível dizermos que näo foi a Linda que roubou o banco, na verdade, o banco näo foi roubado. Família de (a): a. Näo foi a Linda que roubou o banco, a'. Foi a Linda que roubou o banco, a". Näo foi a Linda que roubou o banco? a'". Se näo foi a Linda que roubou o banco, ... A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. 24) A sentenga (a) acarreta a sentenga (b), porque a informagäo de (b) está contida em (a). Família de (a): a. Eu já falava ingles, francos e grego, quando voce aprendeu a falar inglés. a'. Eu ainda näo falava inglés, francos e grego, quando vocé aprendeu a falar inglés. a". Eu já falava inglés, francos e grego, quando vocé aprendeu a falar inglés? a". Se eu já falava inglés, trances e grego, quando vocé aprendeu a falar inglés, ... A sentenga (a) pressupôe (b), porque a família de (a) toma (b) como verdade. respostas dos exercícios 157 II. Neste exercício, vocé tem que achar, no texto, as sentengas que podem estar em relagáo de acarretamento e de pressuposigäo com a sentenga dada, ou seja, em termos de sentengas (a) e (b), temos que a sentenga do texto será (a) e a sentenga dada será (b). 1 )a. A ex-chacrete Josefina Canabrava desmentiu boatos. b. Josefina Canabrava foi chacrete no passado. A sentenga (a) acarreta , porque a informagáo de (b) está contida em (a). Família de (a): a. A ex-chacrete Josefina Canabrava desmentiu boatos do reatamento de seu casamento com Tim Toneš. a'. A ex-chacrete Josefina Canabrava náo desmentiu boatos do reatamento de seu casamento com Tim Toneš... a". Josefina Canabrava desmentiu boatos do reatamento de seu casamento com Tim Toneš? a'". Se a ex-chacrete Josefina Canabrava desmentiu boatos do reatamento de seu casamento com Tim Toneš, ... A sentenga (a) pressupče (b), porque a família de (a) torna (b) como verdade. 3) a. Tim Toneš é filho do atual gerente das empresas Tabajara. b. O pai de Tim Toneš ainda vive. A sentenga 2) receber: < beneficiário, tema, fonte > 3) dar: < agente, tema, alvo > 4) amar: < experienciador, objeto estativo > 5) preocupar: < causa, experienciador > 6} desmoronamento: < paciente > 7) vaidoso: < objeto estativo > 8) sobre: < locativo > 9) diversáo: < experienciador > MANUÁL DE SEMÁNTICA Exercício 6.1 (p. 123) I. 1) Náo é possível construir a ergativa e a passiva a partir de (1). Tomando-se a restrigáo de que "o argumento interno do verbo deve apresentar o papel temátíco paciente, para que se possa ter uma ergativa correspondente", vé-se que, em (1). o argumento uma casa náo apresenta tal papel temático. Para a passiva, se observada a restrigáo "toda sentenga cujo argumento externo tem como acarretamento a propriedade semántica do controle ou o desencadeamento direto aceita a propriedade sintática da passivizagáo", tem-se que o argumento Joáo é desprovido de tal propriedade e, portanto, impede uma construcáo passiva correspondente. 2) Náo é possível construir a ergativa correspondente, porque o argumento interno os filhos náo recebe o papel temático de paciente. Nesse caso, o papei temático do argumento interno se relaciona mais com o sentido de que "algo náo existia e passou a existir". Passiva: os filhos de Maria foram tidos em uma manjedoura. Nesse caso, o argumento externo Maria apresenta a propriedade semántica controle. 3) Náo é possível construir a ergativa correspondente, porque o argumento interno uma casa nao recebe o papel temático de paciente. Passiva: Uma casa foi vendida porJoáo. 4) Ergativa: Maria se preocupou. Náo é possível construir a passiva correspondente, porque o argumento externo Joáo nao apresenta a propriedade semántica do controle. 5) Ergativa: Maria se assustou. Passiva: Maria foi assustada pordošo. Capítulo 8: Atos de Fala e Implicaturas Conversacionais Exercícios 1.4 (p. 129) I. 1) Pedir licenga. 2) Pedir um favor. 3) Pedir perdáo. 4) Chamar a atengáo de alguém. 5) Ameagar. II. 1) Apresenta uso performativo. Inserindo-se a expressáo por meio destas palavras, confirma-se o uso performativo do verbo garantir. "Por meio destas palavras, eu garanto sua vaga até que vocé me entregue os documentos." RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS 1 2) Náo apresenta uso performativo. 3) "Apresenta uso performativo: 'Tor meio destas palavras, eu o indico para o cargo de acessor." 4) Apresenta uso performativo: "Por meio destas palavras, eu o desculpo pela sua falha." 5) Náo apresenta uso performativo. 6) Náo apresenta uso performativo. 7) Apresenta uso performativo: "Por meio destas palavras, eu os aviso sobre a reuniáo de amanhá." 8) Apresenta uso performativo: "Por meio destas palavras, eu concordo com a argumentagáo do vereador." 9) Náo apresenta uso performativo. 10) Apresenta uso performativo: "Por meio destas palavras, eu discordo da argumentagáo do vereador." Ill) 1) Tern de haver uma pessoa que faca a promessa, a qual tern de ter em vista um projeto futuro (a promessa). 2) Tern de haver pelo menos uma pessoa que pega desculpas para o proferidor, o qual deve aceitar o pedido. 3) 0 proferidortem deestarchegando a um encontro (marcado ou acidentai)com uma ou mais outras pessoas. 4) O proferidor tern de ter algum poder sobre o objeto/pessoa ao qual nomeia. 5) Tern de existir ao menos um motivo pelo qual ao menos uma pessoa ficou inconformada. Exercicios 2.3 (p. 136) 1) O tráfico se liga anaforicamente a aque/a avenida. O artigo definido o sugere que o que vem depois dele já foi mencionado. Assim, para que ambas as sentengas fagam parte de um mesmo contexto, só se pode liga r o tráfico a aque/a avenida. 2) Para que as sentengas fagam sentido em um mesmo contexto, isso só pode ser ligado a todos os fatos mencionados na frase anterior. 3) 0 artigo o retoma aígo dito anteriormente. Os SNs o fí/hote e um fí/hote, para fazerem parte de um mesmo contexto, säo ligados a urna mesma referencia. I 176 MANUAL DE SEMÄNTICA II. 1) Implicatura: B näo irá jantar na casa de A. As máximas envolvidas na implicatura desse diálogo säo: de releväncia, em que A, esperando que B irá respondé-lo adequadamente, procura releväncia na fala de B, dai a implicatura de que B näo irá jantar na casa de A. Outras máximas envolvidas seriam a de qualidade, em que B assume estarfalando a verdade e a de quantidade, em que B faz sua contribuigäo täo informativa quanto necessária para a comunicagäo. 2) Implicatura: B näo irá emprestar a blusa para A. As máximas envolvidas säo de releväncia, quantidade, qualidade e modo. Para se dar a implicatura acima, A procura releväncia em B; B foi täo informativo quanto neces-sário para a comunicagäo e B deve assumir estar falando a verdade; alem disso, B foi preciso, claro e objetivo, evitando ambigüidade. 3) Implicatura: Joäo pode ou näo ser bom de bola, depende do que A pensa ser um bom jogador de bola: se A acha que para ser um bom jogador, é preciso correr muito rápido, Joäo o será; mas se A näo pressupöe rapidez em alguém para que este seja um bom jogador, interpretará, procurando por releväncia em B, que Joäo näo é bom de bola e que B está desviando o assunto para evitar admitir isso. A maxima de modo foi, portanto, violada. pois B näo foi claro e objetivo o suficiente. As máximas envolvidas säo: a de releväncia, já explicitada, e a de qualidade, em que B assume estar falando a verdade. 4) Implicatura: B quebrou o vidro. As máximas envolvidas säo a de qualidade, em que B assume ser verdadeiro; a de quantidade, em que B é täo informativo quanto necessário; a de modo, em que B é claro e objetivo e a de releväncia. III. No primeiro diálogo, a fala do menino atende äs máximas de quantidade, em que ele é täo informativo quanto necessário; de qualidade, em que ele diz a verdade, e de modo, em que o menino é claro e objetivo. No entanto, embora pudesse se julgar relevante, o menino näo o foi segundo o contexto e isso fica claro pelo segundo diálogo. Ele näo realizou a implicatura conversacional, seja por má-fé ou distragäo, de que o vendedor gostaria de falar com alguém adulto da casa onde ele se encontrava, e respondeu, atendendo ä maxima de qualidade, conforme a sua verdade: sua mäe estava em sua casa. REFERENCES ALLAN, K. (1986) Linguistic meaning. Londres: Routledge & Kegan Paul. 2 v. ANDERSON, M. (1979) Noun phrase structure. University of Conneticut. AUSTIN, J. L. 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SOBRE AAUTORA Marcia Cancado e doutora em Linguistica pela Universidade Estadual de Campinas (1995). Fez pos-doutorado no Departamento de Linguistica de Rutgers University (EUA, 2001/2002). E professora de Linguistica, especificamente das areas de sintaxe e de semantica, na Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais, desde 1995. Atualmente, desenvolve pesquisa na interface sintaxe/semantica lexical, tendo varios artigos publicados em periodicos nacionais e internacionais de Linguistica e, tambem, orientagoes de teses e dissertagoes concluidas e em andamento. A experience de Marcia Cancado como professora € pesquisadora de Semantica deu on gem a es: e livro, Que visa supnr a caréncta de material didáhco da area. Ass im, esie Manual, constnjido com exempfos do porlurjués brasileiro, oferace a alunos e professores um panorama da hibliogralia bäsica em Sémantice, per meio dti uma axposicáo tBÓrica e um conjunto de exercícios acompanhados das respostas, possibilitando o acesso a temas e aulores centrais da area. PRÓ-REITORIA DE GRADUApÄO UNIVERStDADf FEDERAL DE MINAS GEflAIS 9788570416803